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2.2. Drenagem urbana e manejo de águas pluviais

2.2.2. Urbanização e inundação

Mudanças fundamentais ocorrem na hidrologia dos rios devido às modificações na superfície urbanizada. Grande parte da bacia hidrográfica urbana passa a ser pavimentada e se torna impermeável; o solo se torna compacto devido às construções, causando redução significativa da capacidade de infiltração; os sistemas urbanos de drenagem de águas pluviais aumentam a velocidade do escoamento em direção ao rio, devido ao aumento em sua magnitude e ao aumento, à frequência e à duração dos picos de vazão; a infraestrutura implantada obstrui o escoamento; a deposição de lixo e sedimentos obstrui canais; projetos de obras inadequadas de drenagem não chegam a eliminar o impacto de inundações (POMPÊO, 2000; CENTER FOR WATERSHED PROTECTION, 2003; TUCCI, 2004; TUCCI, 2006; BORBA et al, 2012; URBAN FLOOD/EU, c.201315). Na Figura 5, estão representados os efeitos da urbanização frente à área de pré-desenvolvimento urbano: o aumento da vazão máxima das cheias, a antecipação do pico de vazão e o aumento do volume do escoamento superficial, os níveis de ocupação do solo urbanizado, os efeitos da impermeabilização do solo e o limite da área de inundação frente à zona sem ocupação urbana. Os alagamentos são a entrada da água em residências e demais edificações características do ambiente urbano: indústrias, comércio, vias públicas, locais de recreação, hospitais, empresas, escolas e equipamentos sociais, entre outras.

Enchentes em áreas ribeirinhas que atingem a população assentada junto ao leito maior dos rios ocasionam danos aos sistemas urbanos existentes. Tucci (2004) diferencia as inundações ribeirinhas das inundações devido à urbanização e à incapacidade da drenagem urbana. As inundações ribeirinhas ocorrem quando a precipitação é intensa e é menor a capacidade de infiltração no solo. Neste caso, o excedente não drenado da água ocupa as planícies fluviais de

15 A página do Projeto URBAN FLOOD da União Europeia disponibiliza sua produção científica, apresentações e

demonstrações sobre inundações urbanas. http://www.urbanflood. Eu/Pages/ScientificPublications. Aspx. Acesso janeiro 2013.

acordo com a topografia. As inundações devido à urbanização e à incapacidade da drenagem ocorrem devido à impermeabilização do solo e à canalização, aumentando e acelerando o escoamento superficial e tornando insuficientes os sistemas de drenagem.

Figura 5 - Urbanização e inundação Fonte: Schueler, 1987, apud Tucci 2002

Nas áreas de florestas ou de cobertura do solo onde plantas, fungos e material orgânico em decomposição absorvem a umidade e facilitam a infiltração, aproximadamente 50% da água de precipitação é absorvida e somente 10% escoa em direção aos cursos d‟água e outros

corpos hídricos para a alimentação de raízes e restos de plantas. Christofoletti (1974) sugere que em solos não urbanizados apenas 1/8 das águas de um rio escoam para o mar ou para o interior enquanto 7/8 das águas são infiltradas

Nas bacias urbanas, os níveis de infiltração são baixos, o escoamento superficial é de maior volume e a evapotranspiração16 é reduzida, conforme ilustrado pela Figura 6.

Figura 6 - Efeitos da impermeabilização do solo em áreas urbanas Fonte: OECD, 1986 apud Tucci, 2002.

Em realidade, esta é apenas uma aproximação de níveis de impermeabilização e suas conseqüências quanto ao escoamento superficial, à infiltração rasa e profunda e à

16Evapotranspiração pode ser definida como a combinação da evaporação – a água perdida da superfície do solo para a

atmosfera – com a transpiração – a água perdida das folhas de plantas para a atmosfera. http://ga.water.usgs. Gov/edu/watercycleevapotranspiration. Html

evapotranspiração. Shuster e colaboradores (2005) estudaram as diferenças entre os vários tipos de superfície impermeabilizada e seus impactos na hidrologia de uma bacia e descrevem a maneira como essas superfícies são avaliadas frente aos presumíveis impactos. Concluem que são grandes os impactos das superfícies impermeáveis, já que a modificação do ciclo hidrológico em áreas urbanas pela atividade humana impacta o escoamento superficial da água, sua infiltração e a evapotranspiração. São efeitos contínuos, assim como o efeito da contaminação e da poluição das águas. Sua observação deve trazer resultados importantes para a adoção de medidas de controle.

Ainda que seja difícil a exata medida do impacto da impermeabilização, pesquisadores são unânimes com relação ao efeito da urbanização e da impermeabilização sobre a hidrologia dos rios (HOLLIS, 1975; KONRAD, 2003; CENTER FOR WATERSHED PROTECTION, 2003; TUCCI, 2004; FRAZER, 2005; SHUSTER et al., 2005; VENDRAME, 2005; WHITE & KEITH, 2005; CRUZ & TUCCI, 2008). Além de alterar o ciclo da água, podem levar a mudanças no formato e tamanho dos corpos hídricos, e reduzir a qualidade da água, contribuem para o aumento e o rigor das inundações, das erosões e da destruição do habitat aquático. São transformações hidrológicas que comprometem o funcionamento dos cursos d‟água. Do ponto de vista da Geomorfologia, a intervenção antrópica em áreas urbanizadas provoca o assoreamento das redes naturais de drenagem, os escorregamentos, os sulcos profundos, as ravinas, as perdas de volume das formações superficiais, exposição de horizonte C 17, entre outras causas indicadas por Lima (1990).

A gravidade do problema se situa, ainda, na poluição das águas do escoamento superficial em área urbana, onde há um acréscimo na produção de sedimentos e material sólido devido às construções de edifícios, vias públicas, e limpeza de terrenos para novos loteamentos. Acrescenta-se a isto a consequência da poluição difusa formada, sobretudo, por detritos que impregnam as vias públicas e que, após os primeiros momentos de chuva, escoam para os cursos d‟água. São, sobretudo, restos de freios de automóveis; resíduos de pneus; resíduos de pinturas em geral; fezes de animais; resíduos de ferro, zinco, cobre, alumínio e asbestos e

17Horizonte C – rocha madre em erosão. A – solo, B- subsolo. A => superficial, enriquecido com material orgânico. B

=> intermediário, que surge entre A e C. C => mais próximo do mat. de origem (rocha alterada). Composição do Horizonte C:Camada mineral de material inconsolidado, ou seja, por ser relativamente pouco afetado por processos pedogenéticos, o solo pode ou não ter se formado, apresentando-se sem ou com pouca expressão de propriedades identificadoras de qualquer outro horizonte principal.

OBS: Processos pedogenéticos são reações ou mecanismos de caráter químico, físico e biológico que produzem no interior do solo zonas características, correlacionadas com os chamados fatores de formação.

outros provenientes de materiais de construção; deposição seca e úmida de particulados de hidrocarbonetos, restos de vegetação, derramamentos de óleo de comércio de mecânicas, fuligem, poeira, enxofre, pesticidas, nitritos e nitratos, cloretos, fluoretos, silicatos, cinzas, compostos químicos e resíduos sólidos, bactérias e vírus patogênicos (PORTO, 1995; TUCCI, 1997; TUCCI, 2004). Com isso, quer-se deixar claro que os problemas relativos a alagamentos não se referem somente à quantidade de água extravasada. Em igual proporção, referem-se a sua qualidade, fundamental para a saúde humana. A Lei 9.433 de 1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH (BRASIL, 1997), é clara quanto ao fato de serem quantidade e qualidade da água indissociáveis. Um dos objetivos da PNRH é assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos (Art. 2º, inciso I), e uma de suas diretrizes de ação propõe a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade (Art. 3º, inciso I).

Como qualidade de vida e preservação do meio ambiente são indissociáveis, conclui-se que não há qualidade de vida em ambientes poluídos. A percepção que se tem é que as cidades brasileiras cresceram, mesmo a sua parte formalizada e regularizada, sem qualquer planejamento integrado e de maneira espontânea para atender a outras demandas que não a de um meio ambiente equilibrado e de qualidade de vida digna. Dados do Censo demográfico realizado pelo IBGE indicam que, em 2010, 84,37% da população brasileira vivia em área urbana 18.

Inundações em áreas onde é densa a ocupação, onde moram e trabalham as pessoas, são consideradas „crises‟ ou uma séria ameaça às estruturas básicas e aos valores e normas fundamentais de um sistema que, sob a pressão do tempo e de circunstâncias altamente incertas, exigem a tomada de decisões vitais (BRITO, 1926; WHITE, 1945; ROSENTHAL et al, 1989, apud KOLEN, 2012.; RUBY, s.d.; KONRAD, 2003; FRAZER, 2005;).