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Hipóteses de cabimento nos procedimentos especiais

Além das previstas no art. 311, o novo CPC prevê outras hipóteses que também devem ser incluídas na categoria da tutela antecipada de evidência, vista em contraposição à tutela de urgência. Trata-se das liminares autorizadas em procedimentos especiais, as quais guardam as mesmas características das medidas previstas no art. 311, quais sejam, a cognição sumária, a dispensa da urgência e a presença de elementos que justificam a distribuição do ônus do tempo de maneira diferenciada.

Esse último requisito, nos procedimentos especiais, em regra, diz respeito ao direito material tutelado, tal como no caso do art. 311, inc. II, seja em razão da “constatação de que o direto tutelado pode ser evidenciado de plano ou merece um tratamento diferenciado por sua relevância social”.321 Os procedimentos especiais, aliás, foram os primeiros em nosso ordenamento a permitirem a concessão de tutela antecipada.

De toda forma, mesmo nesses procedimentos o legislador pode exigir algo, além da natureza da matéria tratada, para autorizar o deferimento da tutela antecipada de evidência. Veja-se, por exemplo, o caso das tutelas possessórias,

320 VALLADÃO NOGUEIRA, O Projeto... cit., p. 585.

em que além de o processo relacionar-se à posse, a liminar exige que a ação seja de força nova, ou seja, que o esbulho tenha ocorrido há menos de ano e dia.

No novo CPC, os procedimentos que preveem expressamente tutelas que podem ser consideradas de evidência são as ações possessórias, os embargos do devedor e os embargos de terceiro.

No primeiro caso, o novo CPC mantém a sistemática do CPC anterior e prevê, em seu art. 562, o cabimento de medida antecipada, quando a posse e o esbulho estiverem devidamente comprovados. Nesse rito especial, contudo, a exigência de prova é menos rigorosa do que nos demais casos de tutela de evidência, pois se a inicial não estiver devidamente instruída, o juiz autorizará a produção de provas pelo autor em audiência de justificação, autorizando-se, assim, a concessão da medida com base na produção de prova testemunhal (arts. 562 e 563).

No caso das ações possessórias, nos termos do art. 558, caput e parágrafo único, o cabimento do procedimento especial depende do lapso temporal havido entre o esbulho e a propositura da ação. Como leciona Antonio Carlos Marcato, “circunstâncias de natureza temporal e relacionadas ao bem da vida reclamado pelo autor é que irão determinar a adoção, caso a caso, do procedimento adequado para o processamento das ações de manutenção ou de reintegração de posse”.322 Assim, se a ação for de força velha (lapso de mais de ano e dia), o rito será comum; se de força nova (lapso de menos de ano e dia), o rito será o especial. Se for adotado o rito especial, bastará a prova da posse e do esbulho para a concessão da liminar.323

No caso de adoção do rito comum, por sua vez, será cabível a tutela provisória genérica, de urgência ou de evidência, conforme o caso concreto. Isso porque, tratando-se de procedimento comum, não há razão para restringir o cabimento de tais tutelas ao autor da pretensão possessória, desde que

322 MARCATO, Procedimentos... cit., p. 156.

323“É que naqueles casos o legislador entendeu de fixar uma presunção legal de evidência do direito, como, v.g., quando a lesão data de menos de ano e dia, o direito à posse assim evidenciado e lesado merece proteção imediata. Com isso, o legislador insculpiu norma in procedendo, retirando o arbítrio do juiz. Havendo a lesão, nesse prazo, nada recomenda o aguardo do delongado e ritual procedimento ordinário. A tutela deve engendrar-se e realizar-se de plano” (FUX, Tutela... cit., p. 323).

presentes os respectivos requisitos. Afinal, trata-se de procedimento comum para todos os efeitos.324

Nesse sentido, aliás, deve-se sopesar que o rito especial representa um verdadeiro privilégio concedido a esse tipo de direito material, pois serve para dispensar o autor dos requisitos genéricos das tutelas provisórias, autorizando a concessão dela, mediante a simples prova do direito. Não faz sentido, dessa forma, que afastado o rito especial, o titular passe a ter menos direitos do que o postulante ordinário e passe de privilegiado à pária, apenas em razão da data do esbulho.

A ação de embargos de terceiro, da mesma forma, prevê a possibilidade de concessão de medida liminar, independentemente de qualquer urgência, bastando que o embargante comprove suficientemente o domínio ou a posse dos bens constritos judicialmente, hipótese na qual o juiz determinará a suspensão de tais medidas, bem como a manutenção ou a reintegração da posse (art. 678 do novo CPC).

No caso dos embargos do devedor, o art. 919, § 1.º, do novo CPC dispõe que o efeito suspensivo poderá ser concedido se houver prévia garantia e forem verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória, o que coloca a de evidência no âmbito de abrangência do dispositivo. Assim, preenchidos os requisitos de quaisquer das quatro hipóteses do artigo, os embargos receberão o efeito suspensivo, independentemente de qualquer urgência, com fulcro apenas na qualificação da probabilidade de procedência dos embargos.325

Por fim, deve ser mencionada a existência no novo CPC de hipótese de antecipação da tutela recursal fundada em evidência, conforme se verifica no art.

324 Nesse sentido: DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, Curso... cit., 2015, p. 576; NERY JUNIOR; NERY, Código de Processo Civil... cit., art. 273, nota n. 18. Essa também é a posição reiterada do Superior Tribunal de Justiça, conforme assinalado na seguinte ementa: “Agravo Regimental – Ação de Reintegração de Posse – Tutela antecipada rejeitada na Corte local – Decisão monocrática que conhece e nega provimento a Agravo em Recurso Especial. Insurgência do demandado. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico no sentido de que é possível a concessão de tutela antecipada em ação de reintegração de posse, ainda que se trate de posse velha, desde que preenchidos os requisitos do art. 273 do CPC. 2. A análise do preenchimento dos requisitos autorizadores da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional (artigo 273 do CPC) reclama o reenfrentamento do contexto fático-probatório dos autos, providência inviável em recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido.” (AgRg no Ag 1232023/PR, Rel. Ministro Marco Buzzi, 4.ª Turma, julgado em 27.11.2012, DJe 17.12.2012).

325 Nesse sentido: BODART, Tutela... cit., p. 154; NERY JUNIOR; NERY, Comentários... cit., p. 1817.

1.012, § 4.º, o qual prevê a possibilidade de concessão de efeito suspensivo à apelação se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação. A conjunção alternativa ou no dispositivo deixa claro que a probabilidade de provimento do recurso é requisito suficiente para a concessão do efeito, de forma que a antecipação da tutela recursal poderá ser concedida, tanto em razão da urgência como da evidência.

4.6.2 Legislação extravagante

Na legislação processual extravagante, da mesma forma, estão previstas medidas liminares que têm natureza de tutela antecipada de evidência, pois seguem a mesma lógica e possuem a mesma estrutura das medidas previstas nos procedimentos especiais previstos no novo CPC, diferenciando-se apenas topologicamente.

Entre elas, podemos citar: a) a liminar da ação de alimentos (Lei n. 5.478/1968, art. 4.º);326 b) a liminar da ação de despejo (Lei n. 8.245/1991, art. 59, § 1.º);327 c) a liminar de reintegração ou imissão na posse, em caso de perda da propriedade nos contratos envolvendo alienação fiduciária de imóvel (Lei n. 9.514/1997, art. 30);328 d) a liminar nas ações de busca e apreensão de veículos alienados fiduciariamente (Decreto-Lei n. 911/1969, art. 3.º);329 e e) a liminar de indisponibilidade de bens nos casos de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992, art. 7.º).330

326 “Art. 4.º Ao despachar o pedido, o juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita.”

327 “§ 1.º Conceder-se-á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo: [...]”.

328 “Art. 30. É assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força do público leilão de que tratam os §§ 1.º e 2.º do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do disposto no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome.” 329 “Art. 3.º O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2.º do art. 2.º, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário. (Redação dada pela Lei n. 13.043, de 2014)” 330 “Art. 7.º Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.”

A última hipótese trata, na verdade, de medida cautelar, o que, por essência, exigiria periculum in mora. O dispositivo, porém, em sua literalidade, dispensa qualquer risco de dano, o que ensejava controvérsia a respeito da necessidade ou não de tal requisito. Em sede de julgamento recurso especial repetitivo n. 1.366.721/BA, porém, o STJ pacificou a questão, reconhecendo ser dispensável a existência de risco concreto, já que ele estaria implícito no caso, em face dos valores protegidos pela referida hipótese.331 Considera-se, portanto, que se trata de hipótese fundada na evidência, pois deverá ser deferida independentemente de alegação e prova de urgência.332

Por fim, vale observar que no rito especial do mandado de segurança, a concessão da liminar exige a alegação (e prova, se o caso) do receio de ineficácia da medida (Lei n. 12.016/2009, art. 7.º, inc. III),333“expressão que deve ser entendida da mesma forma que a consagrada expressão latina periculum in

mora, perigo na demora da prestação jurisdicional”,334 o que afasta a medida da categoria das tutelas provisórias de evidência. Assim, nesse rito, a tutela definitiva é de evidência, mas a tutela provisória é de urgência.

331 “Processual civil e administrativo. Recurso especial repetitivo. Aplicação do procedimento previsto no art. 543-C do CPC. Ação civil pública. Improbidade administrativa. Cautelar de indisponibilidade dos bens do promovido. Decretação. Requisitos. Exegese do art. 7.º da Lei n. 8.429/1992, quanto ao periculum in mora presumido. Matéria pacificada pela colenda primeira seção. [...] 5. Portanto, a medida cautelar em exame, própria das ações regidas pela Lei de Improbidade Administrativa, não está condicionada à comprovação de que o réu esteja dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora encontra-se implícito no comando legal que rege, de forma peculiar, o sistema de cautelaridade na ação de improbidade administrativa, sendo possível ao juízo que preside a referida ação, fundamentadamente, decretar a indisponibilidade de bens do demandado, quando presentes fortes indícios da prática de atos de improbidade administrativa. 6. Recursos especiais providos, a que restabelecida a decisão de primeiro grau, que determinou a indisponibilidade dos bens dos promovidos. 7. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e do art. 8.º da Resolução n. 8/2008/STJ” (STJ, REsp 1.366.721/BA, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Og Fernandes, 1.ª Seção, julgado em 26.02.2014, DJe 19.09.2014).

332 Nesse sentido, conferir: BODART, Tutela... cit., p. 107; COSTA, Eduardo Jose da Fonseca. Tutela de evidência e tutela de urgência na ação de improbidade administrativa (ou a indisponibilidade liminar de bens à luz da teoria da “imagem global”). In: ______; LUCON, Paulo Henrique dos Santos; COSTA, Guilherme Recena. Improbidade administrativa: aspectos processuais da Lei nº 8.429/92. São Paulo: Atlas, 2013. p. 167.

333 “Art. 7.º Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: [...]

III – que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.”

334 BUENO, Cassio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança: comentários sistemáticos à Lei n. 12.016, de 7-8-2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 41.

4.7 Pedido parcialmente incontroverso: a separação pelo novo CPC da