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Prova suficiente dos fatos constitutivos do autor

4.5 Defesa não fundada em prova

4.5.1 Requisitos

4.5.1.1 Prova suficiente dos fatos constitutivos do autor

A exigência de prova documental não difere daquela exigida para as demais hipóteses do art. 311. A expressão “suficiente” não parece qualificar de

307 Ibidem, p. 628.

308 ZUFELATO, Tutela... cit..

309 MARINONI, Antecipação... cit., 2011, p. 279. Marinoni, aliás, em monografia sobre o tema, inclui, em sua concepção do abuso do direito de defesa, o oferecimento de defesa de mérito indireta infundada, na qual o réu admite a veracidade dos fatos alegados pelo autor, mas a eles contrapõe fato impeditivo, modificativo ou extintivo, sem, entretanto, produzir prova pré- constituída de suas exceções (MARINONI, Abuso... cit., p. 103 e seguintes).

310 Para Didier Jr., Braga e Oliveira essa hipótese de cabimento exige a presença de três requisitos: 1) evidência demonstrada pelo autor e não abalada pelo réu, por meio de prova exclusivamente documental; 2) prova documental dos fatos constitutivos do direito do autor; 3) ausência de contraprova documental suficiente do réu, que seja apta a gerar dúvida razoável (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, Curso... cit., 2015, p. 629). Entendemos, contudo, que o item 1 é apenas a reunião dos itens 2 e 3.

forma específica a prova exigida para esse caso, pois em todas as hipóteses ela deve ser suficiente, ou seja, apta a provar aquilo a que se destina. O legislador, ao que parece, quis expressar que a prova exigida é apenas a suficiente, não sendo necessário que seja irrefutável, tal como previa a redação do projeto aprovado originalmente no Senado Federal (PLS 66/2010, art. 278, inc. III).

A prova documental deve comprovar todos os fatos constitutivos de que decorre o direito do autor. Se o pedido decorre da existência de um contrato e da mora, ambos os fatos deverão estar provados documentalmente.

Conforme observa Marinoni, a doutrina distingue o núcleo do fato constitutivo dos seus elementos secundários. Os primeiros devem ser provados, situação em que os segundos serão presumidamente aceitos, somente demandando prova, se forem postos em dúvida pelo réu. Cita o exemplo dado por Moniz de Aragão de que o autor não precisa provar que o tabelião que assinou o instrumento agiu dentro de suas atribuições.311 Assim, apesar de comporem os fatos constitutivos, os fatos secundários não demandarão prova por parte do autor, para que a antecipação seja deferida. Ainda que o réu alegue algum vício nos fatos secundários, diante da prova documental suficiente do núcleo dos fatos constitutivos e da presunção de veracidade dos fatos secundários que daí decorre, permanecerá havendo fundamento para o deferimento da tutela de evidência, até porque a simples alegação não deve ser considerada “prova capaz de gerar dúvida razoável”.

Considerando a ratio do dispositivo, a exigência de prova documental suficiente deve ser considerada satisfeita nos casos em que haja dispensa de prova. Com efeito, se um fato deve ser tido por verdadeiro, independentemente de prova, não há razão para dar-lhe tratamento menos vantajoso do que àquele que está comprovado documentalmente e que ainda pode ser submetido à contraprova.

A razão do dispositivo, sem dúvida, é privilegiar uma espécie de prova. Não se deve, porém, esquecer-se da finalidade a que as provas se destinam, que é de produzir convicção no julgador a respeito dos fatos alegados.312 Se

311 MARINONI, Abuso... cit., p. 106-107.

312 “Com efeito, a função da prova é permitir o embasamento concreto das proposições formuladas, de forma a convencer o juiz de sua validade, diante da sua impugnação por outro sujeito do diálogo. É por essa razão que somente os fatos (rectius, as afirmações de fato) controvertidos são objeto de prova; as afirmações de fato sobre as quais não se levanta (por

essa convicção é alcançada mais fortemente, mas por outro meio, como pelo sistema de presunções legais, o fato deve ser considerado como se tivesse sido provado para todos os fins, inclusive para o deferimento da tutela de evidência.

Dessa forma, entende-se aqui que os fatos presumidos verdadeiros em caso de revelia, confissão, inércia em caso de ordem de exibição de documentos, etc., devem ser considerados como provados suficientemente, para os fins do art. 311, inc. IV. Corrobora essa posição o fato de que não se pode premiar o réu que, chamado a juízo, não se opõe aos fatos e ao mesmo tempo não satisfaz a obrigação, pois, como bem leciona Marinoni:

É sabido que um dos principais princípios do processo civil moderno impõe as partes o dever de colaborar com o juízo. A parte que opta por não contestar não só despreza este princípio, como também coloca em risco a validade daquele outro que diz caber ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Este último princípio, como já foi dito, não só visa possibilitar a redução da massa dos fatos controvertidos, como também permitir uma melhor elucidação da matéria fática, contribuindo para uma melhor prestação jurisdicional. [...] Admitir que o réu pode comparecer em juízo, optar por não contestar e ainda não adimplir a sua obrigação é desconsiderar o direito do autor, e abrir espaço para que o tempo do processo seja utilizado pelo réu para retardar um direito que se mostra desde logo incontroverso. 313

Neste ponto, observamos que não pode ser considerada abusiva a conduta do réu revel, pois ele sequer maneja o direito de defesa. Não faz sentido, porém, dar tratamento mais benéfico ao réu que não oferece defesa do que àquele que oferece defesa inconsistente, já que a evidência que exsurge no primeiro caso é ainda mais intensa do que no segundo. Isso conduz à conclusão de que, nos casos de ausência de controvérsia do pedido, além do cabimento de julgamento antecipado (arts. 355 do novo CPC), pode ser deferida a tutela de evidência.

Outra situação em que a tutela do inc. IV deverá ser deferida é aquela em que o juiz, aplicando a teoria das cargas dinâmicas do ônus da prova, prevista no art. 373, § 1.º, do novo CPC, atribua ao réu o ônus de provar a inexistência

nenhum dos sujeitos do processo) qualquer dúvida são incontroversas e, portanto, estão fora da investigação processual (arts. 341 e 374, III, CPC/2015, com a ressalva de que, ao contrário do que diz o último dispositivo, não são os fatos que são incontroversos, mas sim as afirmações feitas sobre eles)” (MARINONI; ARENHART, Prova... cit., p. 65).

dos fatos constitutivos. Como, nesse caso, os fatos constitutivos são presumidos verdadeiros até a prova em contrário produzida pelo réu, devem ser considerados provados, desde logo, para fins da tutela antecipada.

Todavia, não sendo o caso de presunção legal e não havendo prova documental, o juiz não estará autorizado a deferir essa tutela antecipada, por mais irrefutáveis que sejam as provas produzidas durante a instrução.