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segundo a humanidade, por nós e para nossa salvação, gerado da Virgem Maria, mãe de Deus [Theotókos] [embate de Cirilo versus Nestório, resolvido no Concílio de Éfeso em 431]

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Para Maraschin, a expressão theotókos é um paradoxo, e segundo ele, fruto da metafísica trancendentalista e da lógica aristotélica da linguagem dos Padres, diz que “a filha de Deus passa a ser a mãe de Deus, contradizendo a própria estrutura do Tomo de Leão, fundamentador das declarações dogmáticas do Concílio de Calcedônia.”56 À frente, explica

pormenorizadamente sua posição, afirmando:

Esse Concílio (451 A.D.) elabora a mais contraditória das definições da pessoa de Cristo, ao traçar a origem divina à substância (ousia) do Pai e a origem humana à maternidade de Maria. Se de Maria procede o ser humano de Jesus, e não o divino, posto que a divindade vinha do próprio Pai, preexistente “antes de todos os mundos”, Maria não poderia propriamente ser chamada de theotokos, “mãe de Deus”. Além disso, a mesma definição insiste na confissão de que as duas naturezas, a divina e a humana, são “inconfundíveis, imutáveis, conseparáveis e indivisíveis” (em dyo physein, asygchytos, atreptos, adiairetos, achoristos). Ora, se as naturezas, segundo a lógica de Calcedônia, são assim “inconfundíveis”, a afirmação de que Maria, fonte da humanidade seja “mãe de Deus”, resulta, segundo essa mesma lógica, em confusão das naturezas. Ela não poderia ser, ao mesmo tempo, mãe do “homem” Jesus, e a mãe de Deus. Se insistirmos na afirmação da maternidade divina, a primeira parte da definição de Calcedônia perde o sentido. Se o Cristo for confessado, como tem sido ao longo da história da Igreja, como o Logos, gerado do Pai (sendo o Cristo a natureza divina de Jesus, o Cristo), Maria não poderia nem mesmo ser chamada de “mãe de Cristo” como às vezes se prefere.57

A Confissão da Fé Apostólica expressa um entendimento diferente deste termo,

Theotokos, usado pelo Credo Niceno-Constantinopolitano e confirmado pela Fórmula de

Calcedônia:

Todos os cristãos aceitam a confissão afirmada pelo Concílio de Éfeso (431) de que Maria é “Theotokos”, mãe daquele que também é Deus, por meio do poder criador do Espírito de Deus. Ao se referir à maternidade de Maria, o Credo quer mostrar que o Filho de Deus é um ser humano como nós, participante na nossa experiência de nascer e de ser amado por sua mãe, e acompanhado pelo cuidado de seus pais. Mas Maria é também uma discípula que ouve a palavra de Deus, responde a ela e a guarda. Maria, pela obediência a Deus e pela perfeita dependência do Espírito Santo, é o exemplo por excelência de nosso discipulado. Desde os primeiros séculos, ela tem sido considerada a representante da filha de

56 Jaci Maraschin, p. 136. 57 Jaci Maraschin, p. 136-137.

Sião, esperando a realização das promessas messiânicas e da vinda do Reino.58

A controvérsia acerca do uso litúrgico do termo theotokos surge no ano de 428, quando Nestório, o antioqueno patriarca de Constantinopla, prega um sermão contra o uso de tal expressão atribuída a Maria, dando início assim a uma das maiores polêmicas de cunho teológico e também político da história do cristianismo. A tradução literal do termo é “portadora de Deus”, no entanto, normalmente é traduzida como “mãe de Deus”. A despeito desta distinção “o título Theotokos na verdade serve como indicador da verdadeira divindade de Jesus. Quando Maria deu à luz o seu Filho, deu à luz Deus.”59 Este era o conceito que o Credo Niceno-Constantinopolitano afirmara. O uso desta expressão por Constantinopla era um ponto pacífico, portanto, o sermão de Nestório causou grande espanto ao povo da cidade e a fúria dos alexandrinos, principalmente Cirilo. Para Nestório a questão importante envolvida dizia respeito a uma possível confusão das diferentes naturezas de Jesus Cristo. Nestório levou a cristologia de Teodoro de Mopsuéstia até à sua conclusão lógica, argumentando que a natureza divina é imutável, impassível, perfeita e incorruptível. Fazendo uma distinção importante para sua argumentação, dizendo que embora a natureza humana de Jesus Cristo houvesse nascido de Maria, a sua natureza divina não. Assim sendo, aceitava o uso do termo

Christotokos, ou seja, “portadora de Cristo”. Afirmava ser correto dizer que Cristo nasceu de

uma mulher, mas errado dizer que Deus nasceu de uma mulher. Sua intenção com esta distinção não era negar a divindade de Jesus Cristo, sua questão dizia respeito à ênfase que ele dava à divindade do Logos, negando qualquer atribuição de características próprias da criatura. Tão pouco Nestório era contrário ao dogma do nascimento virginal de Maria, acreditava realmente que ela deu à luz o homem Jesus Cristo e que desde o momento de sua concepção estivera unido ao eterno e divino Logos de Deus. É possível que o uso do termo

Christotokos por Nestório tenha sido motivado por querelas político-teológicas contra a

escola oposta de Alexandria. Após ampla discussão com Cirilo e inúmeras cartas, bem como informações passadas por espiões alexandrinos em Constantinopla, o termo Theotokos saiu-se vitorioso no Concílio de Éfeso, Nestório foi exilado e considerado herege.

58 A Confissão da Fé Apostólica, p. 69. 59 Roger Olson, p. 215.

Um só e mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar, em duas naturezas, [conforme a cristologia ocidental defendia] inconfundíveis e imutáveis, [contra

Eutiques e outros pensadores anteriores] conseparáveis e indivisíveis. [contra o nestorianismo]

Com estes quatro advérbios, a Fórmula de Calcedônia deseja demarcar o caminho a ser construído pela cristologia ortodoxa. Tentando assim estabelecer uma união entre as duas escolas contrárias, a saber: A Escola de Antioquia e a Escola de Alexandria. Expressa a negação da fusão tanto quanto da separação a respeito da pessoa e das naturezas de Jesus Cristo. Estabelecendo assim os limites para a construção realizada a respeito da união hipostática, duas naturezas co-existindo perfeitamente em uma única pessoa, Jesus Cristo. Os advérbios “inconfundíveis” e “imutáveis” são usados para evitar o eutiquianismo e o monofisismo, que na tentativa de preservar a pessoa defendiam uma única natureza após a encarnação. Já os advérbios “conseparáveis” e “indivisíveis” expressam cautela contra os excessos do nestorianismo, que tendiam a enfatizar a separação entre divino e humano a ponto de defender duas pessoas distintas. Tais advérbios não definem o dogma da encarnação, apenas estabelecem limites, preservando assim o mistério da encarnação.

A distinção de naturezas de modo algum é anulada pela união, mas, pelo contrário, as propriedades de cada natureza permanecem intactas, concorrendo para formar uma só pessoa. [indicativo da natureza racional e da substância individual de Cristo; contrário ao

monarquianismo]

Para os teólogos do período a grande questão que envolvia a discussão sobre a união das naturezas na pessoa de Jesus Cristo dizia respeito à salvação, por isto o desejo incansável em expressar esta doutrina, pois somente um salvador divino-humano poderia unir o abismo existente entre Deus e o homem. Ao que parece, segundo alguns, o desejo primordial não era propriamente explicar como duas naturezas, a divina e a humana, subsistiam em uma única pessoa, mas tão somente salvaguardar o mistério em que tal relacionamento estava envolvido, protegendo assim o evangelho da salvação. O Concílio de Calcedônia expressou o dogma da “união hipostática” como uma definição doutrinária declarando-o obrigatório para os cristãos. O que não significa propriamente que a partir de então as controvérsias se encerraram, tão pouco que todos, no Oriente e no Ocidente, vieram a professá-lo.

Neste aspecto referente à doutrina da união hipostática percebemos a grande influência que Cirilo efetuou na formação da Fórmula de Calcedônia. Pois tal doutrina surge inicial com ele, ou pelo menos as suas idéias básicas. Segundo Olson esta doutrina “tornou-se o alicerce da Grande Igreja na explicação e interpretação do mistério da encarnação de Deus em Cristo.”60 E, “A doutrina que ele [Concílio de Calcedônia] encerra e expressa é a união

hipostática.”61 O que em linha gerais de modo simplificado “significa que o sujeito da vida de

Jesus Cristo era o Filho de Deus que assumiu uma natureza e existência humana, sem deixar de ser verdadeiramente divino.”62

A Confissão da Fé Apostólica diz:

Embora o Credo Niceno-Constantinopolitano não defina o modo da unidade existente entre Jesus e o Filho eterno, o Concílio de Calcedônia no quinto século explicou-o e definiu-o por meio do conceito da “união hipostática” das duas naturezas de Cristo: as naturezas divina e humana existem sem confusão nem divisão, mas a natureza humana possui um modo de ser único e particular ao ser sustentada inteiramente pela presença ativa do Verbo eterno. Assim, o Verbo divino não substitui nenhuma parte da existência humana de Jesus, mas age por meio de sua completa humanidade.63

E subsistência [hipóstases]. [indica uma existência pessoal e real; contra o gnosticismo, o

arianismo e o sabelianismo]

Os capadócios formularam a distinção entre ousia e hipóstase, defendiam a fórmula: Deus é uma só ousia e três hipóstases. Stead explica este uso que os capadócios fizeram dos termos ligando-os à sua fonte influenciadora direta, ou seja, o neoplatonismo, quando afirma que “antes dessa época parece que não se fizera uma distinção formal; mas podemos observar preferências não formuladas. Ambos os termos são quase igualmente correntes no sentido muito geral de “existência” (como fato), ou “coisa existente”; ambos são comumente usados para significar “materialidade”, “elemento material de que algo é feito”, “coisa material”; mas

ousia é de longe o mais comum no sentido categorial de “substância”, indicando ou a espécie

60 Roger Olson, p. 222. 61 Roger Olson, p. 238. 62 Roger Olson, p. 222.

ou um membro de uma espécie, a “substância ordinária” de Aristóteles, mas não fazendo referência formal a essa distinção. Para “realidade inteligível” o uso varia; muitos platônicos preferiam chamá-la ousia, seguindo o uso do próprio Platão; foram os neoplatônicos que introduziram “hipóstase” como terminus technicus [termo técnico].”64

Basílio fazia uso da distinção entre substantivos gerais e limitados para explicar a distinção existente, segundo o pensamento capadócio enfatiza, entre ousia e hipóstase. Dizia ele que “o que é referido de modo especial e peculiar é indicado pelo nome de hipóstase. [...] Essa, portanto, é a hipóstase, ou “subqualidade”; não o conceito indefinido da essência ou da substância [ousia], que, sendo geral no seu significado, não encontra nenhuma “qualidade”, mas o conceito que, por meio das peculiaridades expressas, confere qualidade e circunscrição ao geral e não-circunscrito.”65 Deus é descrito por Basílio como “um único ser ou substância divina, formado de três subsistências distintas, porém inseparáveis. Os outros pais capadócios ofereceram analogias diferentes, mas todos defendiam o mesmo argumento básico.”66 A distinção básica era a seguinte: ousia (substância) esta relacionada ao conceito platônico de forma como uma proposição universal; hipóstase (subsistência) não dizia respeito ao ser individual, mas a ênfase recaía na comunhão (ou comunidade). Para Basílio, bem como para os outros capadócios, as três pessoas da Trindade compartilham da mesma substância divina e a realidade deste fato supera a suposta individualidade, mostrando assim que as hipóstases são inseparáveis, o que não significa que sejam idênticas em todos os aspectos.

Gregório de Nazianzeno explicava o termo hipóstase (pessoa) como o “relacionamento” que ocorre dentro da própria Trindade, onde não existem três seres, mas três relacionamentos (mesmo que as hipóstases da Trindade sejam consubstanciais (homoousios), não são idênticas). Estes relacionamentos não são substâncias tão pouco são simplesmente modos de atividade. Para ele havia uma realidade ontológica nos relacionamentos. “As três pessoas de Deus, portanto, não devem ser entendidas como seres individuais, como núcleos independentes de consciência e vontade (...), mas como verdadeiros relacionamentos interdependentes dentro de uma única comunidade de existência e substância.”67

A filosofia platônica com o seu conceito de realidade das proposições universais foi o fundamento teórico utilizado por Gregório de Nissa para explicar a unidade da existência de

64 Christopher Stead, p. 168. 65 Roger Olson, p. 188. 66 Roger Olson, p. 189. 67 Roger Olson, p. 192.

Deus harmonizando com a distinção de pessoas na Trindade. Defendia que “a “natureza” (ousia) era como a “forma” platônica, uma proposição universal genuína que une muitas coisas diferentes. A natureza ou essência de Deus, portanto, era semelhante à forma da natureza humana, e a forma da natureza humana, semelhante à forma do próprio Deus.”68 Argumentava ele que Deus tem uma só existência (substância) e não três, assim as três hipóstase agem sempre em conjunto e toda ação é comum às três pessoas da Trindade.

Não dividido ou separado em duas pessoas, mas um só e mesmo Filho Unigênito, Deus Verbo, Jesus Cristo Senhor. [contra Nestório; também demonstra claramente a influência do

prólogo joanino nos quatro primeiros concílios ecumênicos].

A Confissão da Fé Apostólica sobre esta questão, afirma: “Pode-se dizer que a metodologia patrística desde os primeiros tempos seguia a linha “confessional”. Aceitava o relato de Jesus, testemunhado pelos evangelhos e em todas as demais partes do Novo Testamento, muito embora a perspectiva fosse a do Evangelho de João. Podiam assim estabelecer a ligação crucial entre Jesus e o Criador do mundo, cujo Logos eterno tornara-se manifesto na vida de Jesus. A mesma preocupação transparece na formulação do Credo Niceno, no qual Jesus é chamado de “verdadeiro Deus de verdadeiro Deus” (cf. Jo 1.1). Essa linguagem sugere fortemente o uso preferencial do prólogo joanino.”69

Conforme os profetas outrora a seu respeito testemunharam, e o mesmo Jesus Cristo nos ensinou e o credo dos pais nos transmitiu.

Indicação do propósito inicial de confirmar a fé nicena; demonstrando o entendimento que o Antigo Testamento pré-anunciou a vinda de Cristo; aceitando o relato da Vida de Jesus e do seu discurso como contido nos evangelhos como fonte confiável para o entendimento deste dogma.

68 Roger Olson, p. 183.

A conclusão a que Lorenzo Perrone chega quanto à definição dogmática estabelecida pelo Concílio de Calcedônia é pertinente e adequada como uma explicação clara e abrangente do efeito produzido por tão expressivo conclave de líderes eclesiásticos do V século, ei-lo:

Depois de vinte anos de Éfeso – que no evento salvífico do Verbo encarnado havia sublinhado de maneira particular a união inseparável do homem com a divindade –, Calcedônia inverte, de certa maneira, a ênfase insistindo na humanidade de Deus. Na realidade, o resultado doutrinário do concílio é mais complexo e, ao mesmo tempo, mais equilibrado. Ele é um meio termo entre os diversos modelos cristológicos das tradições alexandrina e antioquena e, pela primeira vez, insere de maneira decisiva na elaboração dogmática a contribuição da Igreja ocidental, através da intervenção do papa Leão. Esse resultado está numa definição que não é concebida como profissão de fé distinta ou mais completa do que o símbolo niceno-constantinopolitano, mas sim como sua fiel interpretação e esclarecimento. Ele se limita, de fato – como declara o amplo preâmbulo –, a expor a doutrina cristológica correta, objeto das discussões daquele período, sem pretender reformular a fé da Igreja no seu conjunto.

O esforço de harmonização de instâncias teológicas diferentes e, com isso, o fiel espelhamento dos dois pólos ontológicos que constituem a única realidade do ser de Cristo são facilmente perceptíveis no texto da definição conciliar. Testemunha-o de forma eloqüente a estrutura binária da primeira parte das afirmações relativas ao Deus encarnado. Os enunciados que se sucedem compõem-se sobretudo de duplas de termos que se evocam mutuamente: ao termo divino se associa imediatamente o termo humano. O “único e mesmo nosso Senhor Jesus Cristo” é proclamado “perfeito na divindade e perfeito na humanidade”, “verdadeiro Deus e verdadeiro homem”, “consubstancial ao Pai segundo a divindade e consubstancial a nós segundo a humanidade”. Essa dialética da unidade e da distinção baseia-se ontologicamente em algumas formulações que se utilizam do aparato conceitual da metafísica antiga muito mais abundante do que ocorrera em Nicéia.70

Berkhof expressa sua opinião sobre as mais importantes contribuições da Definição de Calcedônia, mostrando as seguintes implicações:

(1) As propriedades de ambas as naturezas podem ser atribuídas a uma só Pessoa, como por exemplo, onisciência e conhecimento limitado.

(2) Os Sofrimentos do Deus-Homem podem ser reputados como real e verdadeiramente infinitos, ao mesmo tempo em que a natureza divina não é passível de sofrimento.

(3) É a divindade, e não a humanidade, que constitui a raiz e a base da personalidade de Cristo.

(4) O Logos não se uniu a um indivíduo distinto, e sim à natureza humana. Não houve primeiro um homem já existente com quem se teria associado a Segunda Pessoa da Deidade. A união foi efetuada com a substância da humanidade no ventre da virgem.71

Philip Schaff esboça, segundo a sua compreensão, sete idéias principais que o símbolo cristológico conforme reafirmado pelo Concílio de Calcedônia expressa acerca da encarnação do verbo, como: 1. Uma verdadeira encarnação do Logos, ou segunda pessoa da Trindade, onde esta encarnação não se constitui em uma conversão ou transmutação de Deus em homem, tão pouco do homem em Deus ou uma absorção de um ao outro ocasionando uma confusão dos dois, ou uma mera habitação de um no outro, nem uma conexão externa, transitória dos dois fatores, mas uma união real e permanente dos dois numa vida pessoal; 2. Uma precisa distinção entre natureza e pessoa. Natureza ou substância (essência) denota a totalidade de poderes e qualidades que constituem um ser; enquanto que pessoa é o Ego, a autoconsciência, a auto-asserção e a ação do sujeito. O Logos assumiu, não uma pessoa humana (então teríamos duas pessoas, uma divina e outra humana), mas uma natureza humana que é comum a todos os homens; 3. O Deus-homem é o resultado da encarnação. Cristo não é um ser duplo com duas pessoas (nestorianismo); nem uma combinação gerando um meio termo ou terceiro algo, um outro algo (apolinarismo ou monifisitismo); é sim uma pessoa divina e humana; 4. A dualidade das naturezas. A doutrina ortodoxa manteve, contra o eutiquianismo, a distinção de natureza até mesmo depois da encarnação, por um lado diz que esta relação é sem confusão e sem mudança, e por outro sem divisão e sem separação, de forma que o divino permanece divino e o humano permanece humano, e ainda as duas naturezas têm uma vida continuamente comum e interpenetrada uma à outra como as pessoas da Trindade; 5. A unidade da pessoa. A união da natureza divina e humana em Cristo é um estado permanente, pois é o resultado da encarnação, ou seja, uma real, sobrenatural, pessoal e inseparável união. A autoconsciência de Cristo nunca é dividida; a pessoa de Cristo consiste em uma união tal do humano e a natureza divina, que a natureza divina é o assento da autoconsciência que penetra e anima o humano; 6. A totalidade da obra de Cristo é atribuída à sua pessoa, e não há uma ou outra natureza exclusivamente; 7. A natureza divina é a base da personalidade de Cristo.72

Já para Stead o resultado do Concílio de Calcedônia não é dos mais otimistas:

71 Louis Berkhof, A História das Doutrinas Cristãs, p. 98-99.

72 Philip Schaff, Creeds of Christendom, with a History and Critical notes. Volume I. The History of Creeds, 6a. Ed. in http://www.ccel.org/ccel/schaff/creeds1.thml. CCEL, 2003, primeira publicação em 1877. p. 46-48.

No essencial, assumo a posição de que a definição calcedonense foi uma conquista bastante limitada; foi uma afirmação das condições a que era preciso fazer frente, dentro de dado horizonte de pensamento, para uma doutrina satisfatória a respeito de Cristo; não representou uma solução concreta. Não procurarei defender que, dentro desse horizonte de pensamento, o problema era insolúvel; nem, ao contrário, que se tenha encontrado uma solução e que ela possa ser agora apresentada. O que eu defendo é que naquela época o problema não poderia ser resolvido porque estava em debate, simultaneamente, um número demasiado grande de questões, algumas das quais eram objeto de controvérsia declarada, outras eram pressupostos não detectados e incongruências.73 Beneditto Ferraro diz que o Concílio evidencia as tensões político-religiosas existentes entre o papa e o imperador, onde o controle do imperador se faz evidente através da presidência do Concílio efetuada por meio de uma comissão de funcionários imperiais. Percebe-se o desejo de solucionar um impasse doutrinário mediante a ampla participação de bispos, no entanto, a presença do Oriente ainda é superior. O Concílio retoma conceitos estabelecidos nos concílios anteriores (Nicéia, Constantinopla I e Éfeso). Enfatiza a unidade do Filho, bem como, atem-se à distinção entre natureza divina e natureza humana de Jesus Cristo, insistindo na consubstancialidade com a humanidade e com a divindade. Diz ele: “Cremos que estamos diante de uma clara intencionalidade: afirmar o que é humano em Jesus e que este humano não é absorvido pela divindade, mantendo-se a alteridade da humanidade na mesma pessoa.”74 Afirma o Concílio de Calcedônia ser um passo adiante na expressão da

plena humanidade de Jesus, concluindo (“levando em conta a evolução da psicologia e filosofia no tocante à compreensão da pessoa humana.”), sem negar a intencionalidade de Calcedônia, que Jesus é também uma pessoa humana. Sustenta tal afirmação lembrando dos Evangelhos que mostram Jesus agindo, posicionando-se quanto aos dilemas de seu tempo, e enfatizando que quem entregou-se ao Pai não foi apenas uma natureza, mas o próprio Jesus,

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