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(1)UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. CHRISTIAN BRIALLY DE MEDEIROS. O Auto-Esvaziamento do Logos uma análise da Cristologia Quenótica de Gottfried Thomasius. SÃO BERNARDO DO CAMPO 2006.

(2) CHRISTIAN BRIALLY DE MEDEIROS. O Auto-Esvaziamento do Logos uma análise da Cristologia Quenótica de Gottfried Thomasius. Dissertação apresentada ao curso de PósGraduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ciências da Religião. Orientador: Prof.º Dr. Etienne Alfred Higuet. SÃO BERNARDO DO CAMPO 2006.

(3) 3. CHRISTIAN BRIALLY DE MEDEIROS. O Auto-Esvaziamento do Logos uma análise da Cristologia Quenótica de Gottfried Thomasius. BANCA EXAMINADORA. _____________________________________________ Prof.º Dr. Etienne Alfred Higuet Universidade Metodista de São Paulo. _____________________________________________ Prof.º Dr. Cláudio Oliveira Ribeiro Universidade Metodista de São Paulo. _____________________________________________ Prof.º Dr. Antonio Manzatto Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da As.

(4) 4. AGRADECIMENTOS. Ao Rev. Ms. Wilson Santana pela cara amizade e incentivo constante. Ao Rev. Dr. Hermisten Maia pela cara amizade e firme acompanhamento. Ao Presbitério do Oesteriograndese pelo apoio e confiança. À Igreja Presbiteriana Betel pela compreensão e suporte necessários. Ao Rev. Luthero de Aguiar pelo cuidado pastoral. Ao Presb. Joel de Souza Reis, amigo e irmão, pelo auxílio e amizade.. Ao Prof. Dr. Etienne Alfred Higuet pela paciênci.

(5) 5. À. minha. esposa. companheirismo,. Kaliane. dedicação. e. pelo pelas. privações da minha presença sofridos nestes meses de labuta..

(6) 6. RESUMO. A presente dissertação versa sobre o tema da cristologia quenótica do teólogo luterano alemão do século dezenove, Gottfried Thomasius, como uma possibilidade de resposta ao problema das duas naturezas, divina e humana, na pessoa de Jesus Cristo. Levando em consideração a cristologia tradicional conforme formulada pelo Concílio de Calcedônia o proponente do quenoticismo sugere que o Logos, o eterno Filho de Deus, auto-esvaziou-se voluntariamente de seus atributos não-essenciais ou aqueles que possuem uma relação direta com a natureza, ou seja, a onipresença, a onipotência e a onisciência.. A Fórmula de. Calcedônia se constitui no objeto pelo qual Thomasius promove uma reinterpretação com o intuito de torná-la inteligível à sua época, daí a dissertação oferecer a base de construção de tal teoria. No entanto, mostra-se como um teólogo preocupado em preservar suas tradições diante do criticismo do século XIX. Apresenta-se também o desenvolvimento posterior da cristologia quenótica em que os teólogos subseqüentes divergem em alguns pontos, desenvolvem outros, reagem e procuram superar problemas e dificuldades iniciais da teoria como formulada por Thomasius. Oferece adiante soluções inovadoras ao problema cristológico da encarnação com o apoio de John Hick que com sua perspectiva pluralista sugere uma abordagem ao tema da encarnação mediante o uso do discurso teológico como metáfora religiosa. E também Roger Haight ao final, propondo uma abordagem simbólica da formulação cristológica de Calcedônia como meio de enfatizar o seu aspecto positivo e isto feito de modo compreensível ao tempo presente.. Palavras chaves: quenosis, cristologia, encarnação, síntese, Logos, naturezas..

(7) 7. ABSTRACT. To present dissertation it turns on the theme of the German Lutheran theologian's of the nineteenth century kenotic christology, Gottfried Thomasius, as an answer possibility to the problem of the two natures, divine and human, in Jesus Christ's person. Taking into account the traditional christology as formulated by the Council of Chalcedon the proposer of the kenoticism suggests that Logos, eternal Son of God, solemnity-empty-if voluntarily of their no-essential attributes or those that possess a direct relationship with the nature, in other words, the omnipresence, the omnipotence and the omniscience. The Formula of Chalcedon is constituted in the object for which Thomasius promotes a reinterpretation with the intention of turning her intelligible to time, then the dissertation to offer the base of construction of such theory. However, it is shown as a concerned theologian in preserving their traditions before the criticism of the century XIX. It also comes the subsequent development of the kenotic christology in that the subsequent theologians diverge in some points, they develop other, they react and they try to overcome problems and initial difficulties of the theory as formulated by Thomasius. It offers innovative solutions ahead to the christological problem of the incarnation with John Hick's support that suggests an approach to the theme of the incarnation by the use of the theological speech as religious metaphor with pluralist perspective. It is also Roger Haight at the end, proposing a symbolic approach of the christological formulation of Chalcedon as middle of emphasizing positive aspect and this done from a comprehensible way to the present time.. Keywords: kenosis, Christology, incarnation, synthesis, Logos, natures..

(8) 8. SUMÁRIO INTRODUÇÃO __________________________________________________________________ 1 1 – INTRODUÇÃO À CRISTOLOGIA QUENÓTICA _________________________________ 15 1.1 – CONCÍLIO DE CALCEDÔNIA ____________________________________________________ 15 1.2 – INFLUÊNCIAS NA FORMAÇÃO DO PENSAMENTO QUENÓTICO ________________________ 42 1.2.1 – O CRISTO DA FILOSOFIA DE HEGEL E O QUENOTICISMO _____________________________ 42 1.2.2 – CRISTO NA TEOLOGIA DE SCHLEIERMACHER ______________________________________ 45 2 – ANÁLISE DA CRISTOLOGIA QUENÓTICA DE GOTTFRIED THOMASIUS ________ 50 2.1 – ISAAK AUGUST DORNER ______________________________________________________ 52 2.2 – QUESTÃO DE FONTE __________________________________________________________ 58 2.3 – SOBRE GOTTFRIED THOMASIUS (1802-1875) ______________________________________ 60 2.4 – EXPOSIÇÃO DA CRISTOLOGIA QUENÓTICA DE THOMASIUS __________________________ 63 2.4.1 – INTRODUÇÃO ______________________________________________________________ 63 2.4.2 – A BASE DA ENCARNAÇÃO _____________________________________________________ 69 2.4.3 – A POSSIBILIDADE DA ENCARNAÇÃO _____________________________________________ 70 2.4.4 – O ATO DA ENCARNAÇÃO ______________________________________________________ 71 2.4.5 – A ENCARNAÇÃO COMO APROPRIAÇÃO DA NATUREZA HUMANA _______________________ 72 2.4.6 – A ENCARNAÇÃO COMO AUTO-LIMITAÇÃO DO FILHO DE DEUS ________________________ 74 2.4.7 – A PESSOA DO DEUS HOMEM___________________________________________________ 83 2.4.8 – RESPOSTA A DORNER ________________________________________________________ 89 3 – RETOMADA DA QUESTÃO: CALCEDÔNIA E O QUENOTICISMO _______________ 91 3.1 – O DESENVOLVIMENTO DO QUENOTICISMO POSTERIOR A GOTTFRIED THOMASIUS ______ 91 3.1.1 – O QUENOTICISMO DE EBRARD _________________________________________________ 91 3.1.2 – O QUENOTISICMO DE GESS ____________________________________________________ 93 3.1.3 – O QUENOTICISMO DE MARTENSEN ______________________________________________ 96 3.1.4 – O QUENOTICISMO DE GORE ___________________________________________________ 97 3.2 – A PROPOSTA DE JOHN HICK: A ENCARNAÇÃO COMO METÁFORA ____________________ 99 3.3 – A PROPOSTA DE ROGER HAIGHT: ENTENDER CALCEDÔNIA PELA ÓTICA DO SÍMBOLO ___ 108 CONSIDERAÇÕES FINAIS _____________________________________________________ 120 BIBLIOGRAFIA _______________________________________________________________ 125.

(9) 9. Introdução. O grande problema ao qual atêm-se este trabalho é referente à pergunta metafísica: Qual a relação da pessoa de Cristo, e/ou o Jesus Histórico, com o Ser de Deus na segunda metade do século XIX na cristologia do teólogo luterano Gottfried Thomasius? De onde surgem outras questões relacionadas. Como conciliar uma natureza humana e uma natureza divina em um único ser? Tanto Thomasius como Dorner afirmam que estas naturezas estão unidas e de tal união a salvação é completamente dependente. Como explicar a união do divino com o humano? Como tal síntese se torna possível? Thomasius procura defender o dogma metafísico da encarnação com a teoria do esvaziamento (quenosis), onde o Logos préexistente abre mão dos atributos metafísicos da divindade (ou aqueles que o relacionam com a criação), no entanto, os atributos morais permanecem. Mas para que os atributos morais de Deus se tornem completamente encarnados em um homem, este homem teria estes mesmos atributos na medida em que a divindade os possui, ou seja, em uma medida infinita. Como um homem (finito) teria tais qualidades que devem ser infinitas? No processo dialético proposto por Thomasius é possível afirmar que a síntese do Logos esvaziado seja uma união de Deus e homem? Ou o Cristo dele é algo completamente diferente tanto da divindade quanto da humanidade (Thomasius desejava explicar Calcedônia de modo compreensivo no século XIX, não negá-la)? O escopo desta pesquisa consiste em levantar elementos no decorrer da história do dogma (principalmente nos período relacionados aos Concílios de Nicéia e Calcedônia) pautados nos temas: síntese entre Deus e homem e cristologia da encarnação do Logos. Com o intuito de compreender as vias de pensamento da teoria da cristologia quenótica proposta por Thomasius, o colocaremos diante da crítica feita por Dorner, de modo que seja possível após exposição desta teoria aos questionamentos no seu próprio contexto histórico levantar questões pertinentes na atualidade. A pretensão do tema proposto é estudar um período profícuo em termos de sistemas teológicos, herdeiros diretos dos dois grandes pensadores Hegel e Schleiermacher, que segundo Tillich afirma, produziram a grande síntese filosófica e teológica, respectivamente.. Admitiremos como possibilidades de resposta, quanto ao.

(10) 10. paradoxo da encarnação, as interpretações de Calcedônia conforme foram propostas por John Hick e Roger Haight. A motivação de Thomasius era produzir uma síntese entre o conceito das duas naturezas expresso pelo Concílio de Calcedônia e o pensamento moderno do século XIX, de modo que a síntese que Hegel tanto insistia em manter entre Deus e Humanidade fosse observada sem o distanciar-se da ortodoxia luterana. A resposta foi o auto-esvaziamento do Logos divino. Segundo Thomasius a idéia central da teoria quenótica diz respeito ao abandono dos atributos divinos (onipotência, onisciência e onipresença) quando da encarnação do Logos divino vivendo uma vida segundo os limites da humanidade. Seu interesse era combinar a fé na divindade de Jesus Cristo com a sua vida plenamente humana, ou, a vida de um homem pleno. Esta é a forma como Thomasius tentava interpretar e atualizar o conceito de duas naturezas em Cristo formulado pelo Concílio de Calcedônia. Thomasius tomara uma posição contrária à de Dorner que falava de uma encarnação gradual: Jesus começou o início de sua vida como mero homem, e ao final dela era Deus. Para Dorner, principal representante da teologia da mediação, Deus e homem se parecem e existe na natureza essencial de Deus a necessidade e o impulso de comunicar-se com a humanidade.. Desta forma a encarnação foi um evento histórico necessário. independente do dogma da queda de Adão. Cristo possibilitou uma nova humanidade com a capacidade de receptividade do divino melhorada. No entanto, a encarnação não ocorre de súbito, mas sim de forma gradual; a cada estágio a capacidade receptiva do divino em Jesus Cristo era aumentada gradativamente, encontrando seu ápice na ressurreição. A justificativa para a produção deste trabalho se dá pelas seguintes razões categorizadas a seguir: a) Contribuição Histórica: a teoria quenótica criada por Gottfried Thomasius surge em um contexto de novas descobertas intelectuais, superação e desenvolvimento do pensamento humano, a modernidade. O pensamento teológico sofre uma maturação através da influência de Hegel e Schleiermacher, tais mudanças são observadas até o século XXI. b) Contribuição Acadêmica: em meio a embates o pensamento teológico desenvolveu-se por toda a história da igreja, neste período não é diferente. Thomasius foi o primeiro na história do.

(11) 11. pensamento cristão a propor o esvaziamento do Logos como possibilidade de explicação das duas naturezas em Cristo, criando assim a teologia quenótica que viria a desenvolver-se nos anos seguintes em diversas propostas. Contrário a Thomasius surge Dorner com a encarnação gradual, possibilitando assim a ambas as posições a lapidação de seus argumentos. Tencionamos uma pesquisa de base, que ofereça dados elementares, que se possível, darão suporte para a realização de estudos mais aprofundados sobre o tema posteriormente. Também o intento desta pesquisa objetiva descrever as características do objeto de estudo, ou seja, a teoria da Cristologia Quenótica apresentada por Thomasius. A pesquisa está interessada no porquê e nas fontes da teoria quenótica. Pretende identificar os fatores que contribuíram para ocorrência e o desenvolvimento deste fenômeno teológico-histórico quanto a uma possibilidade de explicação do mistério da encarnação. Buscam-se aqui as fontes, as razões de tal proposição teórica. Também temos em mente outros objetivos mais específicos e diretos, a seguir: 1.. Levantar elementos no decorrer da história do dogma (séculos IV, V e XIX). pautados nos temas: síntese entre Deus e homem e cristologia da encarnação do Logos; 2.. Compreender as vias de pensamento da teoria da cristologia quenótica proposta. por Thomasius, submentendo-o à crítica feita por Dorner em sua proposta de encarnação gradual; 3.. Expor esta teoria aos questionamentos no seu próprio contexto histórico;. 4.. Levantar questões pertinentes na atualidade;. 5.. Estudar um período profícuo em termos de sistemas teológicos, herdeiros. diretos dos dois grandes pensadores Hegel e Schleiermacher. Esta será uma pesquisa histórico-qualitativa com fundamentação discursiva. Para conduzir a efeito a aludida pesquisa como parte deste processo, procederemos a um estudo da história que permeia o nascimento da teoria quenótica e os desenvolvimentos teológicos e filosóficos relacionados, não deixando de perceber o tempo, o lugar, as contingências e circunstâncias em que o pensamento forma-se. Também estudaremos documentos produzidos pelos agentes formadores do pensamento neste momento histórico, ou seja, Gottfried Thomasius e August Dorner que por sua fez foram compilados por Claude Welch na obra God and Incarnation in Mid-Nineteenth Century German Theology..

(12) 12. O escopo da pesquisa se constitui eminentemente de pesquisa teórica, um levantamento bibliográfico referente ao desenvolvimento e/ou conceitos da cristologia quenótica na história do dogma, mesmo quando esta cristologia possui apenas conceitos embrionários, numa tentativa de fazer um levantamento conceitual de interpretações acerca da encarnação. Procurando ater-nos aos textos clássicos, ou seja, obras primárias quando possível. Quanto aos escritos de Thomasius e Dorner concentramo-nos na compilação de Claude Welch, o uso desta obra se dá pela dificuldade em ter acesso a obras alemãs do século XIX, as quais estão disponíveis apenas em antiquários europeus, o que inviabiliza no momento o uso destas fontes primárias. Para um parâmetro da possibilidade de uma cristologia quenótica na atualidade e de interpretação de Calcedônia utilizaremos propostas atuais, conforme já sugerimos, como Roger Haight e John Hick. Executaremos neste trabalho a análise e a exposição do pensamento de Gottfried Thomasius procurando a objetividade na exposição sem perder a fidelidade ao pensamento do autor. No capítulo central nos concentraremos primordialmente ao texto do autor pela via da compilação feita por Claude Welch. Iremos associar ao pensamento de Thomasius, precisamente quanto à abordagem nas categorias psicológicas, a elaboração e superação cristológica produzida por Jacques Dupuis quanto a esta questão específica.. Apesar de nos concentrarmos mais. detidamente em expor a teoria quenótica de Thomasius, contudo, não nos olvidaremos a elaborações cristológicas de teólogos contemporâneos.. Procuraremos relacionar a teoria de. Thomasius com o principal teólogo divergente de sua posição, com o intuito de observar como as relações dialéticas se deram entre eles. E também como estas moldaram a estrutura da teoria que é por hora nosso objeto de estudo. Em um primeiro momento, o capítulo inicial, nós desejamos situar Thomasius dentro do seu contexto. Pois entendemos que as formulações teológicas não surgem no vácuo. São sim, resultado de inúmeros fatores que por vezes não temos a capacidade de adentrarmos numa completa compreensão das relações envolvidas devido à distância do objeto em estudo. Portanto, sustento que para a compreensão das assertivas conforme propostas por Thomasius é necessário situá-lo no seu contexto influenciador direto e também relacioná-lo quanto às suas fontes. Partindo da idéia de que estudamos o passado para compreender o presente.. Não. poderíamos deixar a teoria quenótica pressa nas grades do passado, sem analisarmos e expormos os seus desenvolvimentos posteriores. Fazemos isto para enxergarmos as reações, as críticas, as.

(13) 13. relações e as superações que fazem a teologia uma matéria dinâmica. Assim procedendo, nós iremos compreender as propostas quenóticas que são esboçadas no presente. Bem como, também poderemos enxergar à diante, ou seja, poderemos ver as possibilidades futuras do desenvolvimento da cristologia. Adotamos a grafia aportuguesada para o termo grego kēnosis, e também para os seus correlatos diretos. Ou seja, usaremos as palavras: quênosis, quenótico, quenótica, quenoticismo. Apesar de que nas diversas publicações em português são utilizadas grafias inúmeras para o termo grego quando este surge em discussão. Optamos pelo uso do português. Vejamos em um breve resumo como pretendemos atingir o objetivo que nos propomos neste trabalho: O capítulo primeiro foi construído de modo a estabelecer a contextualização necessária para a compreensão da teoria quenótica de Thomasius. As bases, influências e pressupostos de Thomasius são apresentados. Na primeira parte deste capítulo nos concentramos em analisar um dos concílios mais importantes da era cristã, o Concílio de Calcedônia. Mas também dedicamos esforços para compreendermos o resultado deste concílio: a Fórmula de Calcedônia, em suas relações cristológicas anteriores. A Definição de Calcedônia é o ponto de partida utilizado por Thomasius para construir sua cristologia, não desejava ele sair dos limites estabelecidos neste concílio. Na segunda parte deste capítulo, nos dedicamos em expor rapidamente aspectos da cristologia de Hegel e Schleiermacher que foram altamente motivadores para Thomasius. As propostas, questões e dificuldades cristológicas levantadas por estes autores, nortearam a proposta quenótica de Thomasius como resposta satisfatória diante da ortodoxia luterana e do pensamento moderno. Já no segundo capítulo encontramos o ponto central deste trabalho. O nosso objeto de estudo propriamente dito está neste ponto. Primeiramente expomos um esboço da cristologia de Isaak August Dorner, principal crítico do quenoticismo na segunda metade do século XIX, portanto, contemporâneo de Thomasius. A importância de Dorner não consiste somente na contemporaneidade com Thomasius, mas também por ter sido um dos proficientes teólogos do período em exame. A seguir, de modo sucinto explicamos a fonte que utilizamos para analisar o pensamento cristológico de Thomasius. Isto ocorre devido às diversas dificuldades que tivemos de ter acesso ás obras originais do autor, mas também existem problemas relacionados à compreensão destas obras em um alemão de mais de 150 anos atrás. A seguir, nos dedicamos a conhecer melhor.

(14) 14. o autor, nosso objeto de estudo. Afinal de contas as obras, sejam teológicas ou literárias, são fruto do trabalho de pessoas que estiveram condicionadas aos seus respectivos ambientes e também às funções que desempenharam no decurso de suas vidas. Por fim, neste capítulo, encontramos o núcleo central deste trabalho: a exposição da teoria quenótica conforme foi proposta por Gottfried Thomasius na Alemanha na segunda metade do século XIX. Procuramos expor o seu pensamento seguindo as suas próprias estruturas de argumentação, de modo seqüencial como vão surgindo à medida que desenvolve sua teoria quenótica. Para tanto, nós iremos apresentar as principais partes do projeto cristológico de Thomasius que estão relacionadas com a encarnação do Logos, ou como ele preferia, com o auto-esvaziamento do Logos. Estas partes principais são as seguintes: a base da encarnação, a possibilidade da encarnação, o ato da encarnação, a encarnação como apropriação da natureza humana, a encarnação como auto-limitação do Filho de Deus, a pessoa do Deus-homem e a resposta de Thomasius a Dorner em defesa do quenoticismo. Enfim, estas são as partes constituintes do processo de expor e analisar a teoria quenótica de Gottfried Thomasius. No capítulo final nos concentraremos em apresentar os diversos modos ou vias que a cristologia quenótica tomou após a sua forma inicial encontrada em Thomasius. Na primeira parte mostraremos o pensamento quenótico de alguns teólogos posteriores ao quenoticismo inicial, quatro teólogos ao todo. Portanto, estaremos longe de pontuar completamente a influência da cristologia quenótica em toda a sua amplitude de ação. Desejamos mostrar apenas os principais expoentes desta possibilidade teológica de resposta ao problema da doutrina da encarnação do Logos.. Assim, mostraremos o quenoticismo dos seguintes. teólogos: J.H.A. Ebrard, W.H.C.F. Gess, H.L. Martensen e C. Gore. A seguir apresentaremos a proposta atual de John Hick. Segundo ele a doutrina tradicional da encarnação do Logos não precisa ser descartada, apenas deve-se utilizar uma chave hermenêutica diferente, propõe a metáfora. A linguagem metafórica é a linguagem teológica por excelência. Por fim, mostraremos a tese de Roger Haight, Jesus como símbolo de Deus. A inovação está numa possibilidade de entendimento da formulação cristológica de Calcedônia pelo veio do simbólico.. Para ele, Jesus é o símbolo concreto que medeia a presença de Deus à. humanidade. Assim seguiremos em nossa empreitada..

(15) 15. 1 – Introdução à Cristologia Quenótica Neste primeiro momento é necessária uma exposição dos movimentos teológicos e dos principais pensadores que direta ou indiretamente foram influenciadores do conteúdo, método e pressupostos teológicos de Thomasius.. São estes: o Concílio de Calcedônia, já que. Thomasius pretende expressar a doutrina das duas naturezas de Cristo, mormente desejando uma atualização deste dogma dentro do seu contexto teológico; depois temos Hegel, de quem Thomasius toma emprestado seu método da dialética, aplicando-o na tentativa de responder à sociedade moderna acerca da encarnação; por fim temos Schleiermacher, influenciador direto do método, conteúdo e formulação usados por Thomasius na construção de sua teologia quenótica, principalmente se utilizando do Cristo conforme expresso pelo “Pai da Teologia Moderna”.. 1.1 – Concílio de Calcedônia As partes envolvidas na disputa ocorrida no Concílio de Calcedônia eram concordes em um ponto, a saber, a doutrina da Trindade. A divergência dizia respeito à natureza de Jesus Cristo, discutiam a cerca da terminologia apropriada para descrever a pessoa e a existência de Jesus. O cerne deste embate era sobre a salvação. A posição corrente era que Jesus para ser salvador e trazer a efeito a salvação, deveria ser verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem. Se a doutrina cristológica fosse expressa sem a defesa das duas naturezas, a capacidade de Jesus Cristo para salvar, estava sendo subvertida.. Benedito. Ferraro diz que, “O que está em jogo neste concílio é a distinção entre a natureza divina e a natureza humana de Jesus Cristo.”1 Para levar a efeito tal propósito o Concílio de Calcedônia retoma as definições anteriormente construídas. Desta feita é necessário revermos alguns conceitos, escolas e momentos históricos que influenciaram diretamente na composição deste Concílio. A cristologia de Antioquia ao enfatizar a humanidade expressava Cristo como exemplo humano e não como salvador divino, “Antioquia dava importância ao estudo de documentos, que continham a vida de Jesus segundo consta nos evangelhos e que, portanto, apreciava a sua humanidade”2. Já a cristologia de Alexandria descrevia a Jesus Cristo como o 1 2. Benedito Ferraro, Encarnação: questão de gênero?, p. 32. Kenneth Scott Latourette, Historia del Cristianismo, p. 219..

(16) 16. salvador divino, o Logos de Deus e não como pessoa humana, “Alexandria, interpretava as Escrituras alegoricamente, reduzia ao mínimo o histórico e, portanto reduzia também a parte humana de Jesus, e dava grande peso a sua divindade”3. No entanto, seria necessário a ele, possuir as naturezas divina e humana que o tornariam apto a realizar a salvação através da mediação das duas naturezas. Alguns pensadores e personagens diretamente relacionados aos acontecimentos se destacam neste período quanto ao tema, mormente em questão, veremos sucintamente alguns deles. Cirilo de Alexandria (†444), patriarca desta cidade de 412 a 444, defendia a fórmula de uma natureza depois da união, e essa natureza única de Cristo era mais divina que humana. Cirilo também “afirmou uma “união hipostática” em que a humanidade e a divindade de Cristo eram vistas como duas naturezas distintas e inseparáveis. Ocorreu alguma confusão porque ele usava physis para referir-se ao Logos divino, mas não à humanidade de Cristo. Falava de “uma natureza de Deus, o Verbo encarnado”, que era uma frase apolinariana. Tal ênfase e tais formulações abriram caminho para a posição monofisita que veio a predominar na teologia alexandrina depois da sua morte.”4 Historicamente falando, a única conclusão sobre a cristologia de Cirilo é que ela é ambígua.. Mesmo assim, Cirilo contribuiu. grandemente com o desenvolvimento do pensamento cristão, precisamente em matéria de cristologia quando lançou as bases para a doutrina da união hipostática. Olson diz que a união hipostática “... tornou-se o alicerce da Grande Igreja na explicação e interpretação do mistério da encarnação de Deus em Cristo. Em poucas palavras, ela significa que o sujeito da vida de Jesus Cristo era o Filho de Deus que assumiu a natureza e existência humana, sem deixar de ser verdadeiramente divino. Por outras palavras, segundo Cirilo, não havia nenhum sujeito pessoal humano na encarnação. A hypostasis (subsistência pessoal) de Jesus Cristo era o eterno Filho de Deus que condescendeu em assumir a carne humana através de Maria. Segundo o argumento de Cirilo, Maria deu à luz a Deus em carne. Essa é a essência da encarnação.”5 Cirilo admitia que Jesus possuía uma alma humana e reconhecia a psicologia humana de Jesus, argumentava ele, que Jesus cresceu em graça e sabedoria e não somente fisicamente, mas os seus sofrimentos estão associados à sua alma, também exemplo de sua obediência humana. Todavia, cautelosamente para não assemelhar-se a Nestório (divisão de 3. Kenneth Scott Latourette, p. 219. L.G. Whitlock in Walter A. Elwell (ed.), Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, vol. I, p. 282. 5 Roger Olson, História da Teologia Cristã, p. 222. 4.

(17) 17. pessoas), enfatizou a unidade da pessoa em Jesus Cristo, onde apenas o Logos divino é verdadeiramente ativo. Diante destas idéias a implicação é que Cristo não possuía uma autoconsciência humana (ou centro de consciência humano), e se porventura esta existisse, estava inativa. Para Cirilo a personalidade de Jesus Cristo era formada pelo Logos divino (a própria personalidade), explicada pelo uso do termo anhypostasia (uma humanidade impessoal), ou seja, o homem Jesus não possuía existência pessoal à parte do Logos. Cirilo expressava a encarnação da seguinte forma: “Deus, o Logos, não entrou em um homem, mas ele ‘verdadeiramente’ tornou-se homem sem deixar de ser Deus.”6. Para ele a união. hipostática era algo tão forte que após esta havia uma só natureza. Expressar as idéias de divindade e humanidade de Cristo se constituía de um simples aspecto conceitual de se falar das duas naturezas, no entanto, dizia ele que a união ocorrida após a encarnação produziu uma só natureza e uma só pessoa.. Desembocava agora, naturalmente, no seu conceito de. communicatio idiomatum, a única pessoa Jesus Cristo era tanto divino, como humano, uma única pessoa com dois modos de ser (o divino e o humano). Nestório provavelmente nasceu em Antioquia no final do século IV e morreu no exílio em um deserto na África do Norte († 451). Foi aluno e discípulo do mais importante teólogo antioqueno Teodoro de Mopsuéstia. Foi consagrado bispo de Constantinopla em 428 pelo imperador Teodósio II (favorável ao pensamento teológico da escola antioquena e, por conseguinte contrário a Alexandria). Como bispo da cidade mais importante do Império, também foi considerado patriarca da região e papa do Oriente. Neste período, por causa da posição adotada por Teodósio II e Nestório o partido teológico alexandrino sofre grande perseguição por parte destes. Esta perseguição era provocada pela defesa das idéias de Apolinário sobre a pessoa de Cristo, ou seja, uma única natureza após a encarnação. Nestório criticava o uso do termo Theotokos, dizendo não ser próprio chamar Maria de “portadora de Deus”, cerne do problema dizia respeito à confusão entre as duas diferentes naturezas de Cristo, ou seja, a natureza divina não pode nascer e embora a natureza humana de Cristo tenha nascido de Maria, a sua natureza divina não, portanto, segundo Nestório, o termo correto para se atribuir a Maria é Christotokos (“portadora de Cristo”). “A cristologia de Nestório pode ser mais bem considerada como uma tentativa de levar a cristologia de Teodoro de Mopsuéstia a uma conclusão lógica. (...) Nestório procurou elaborar uma maneira de explicar a verdadeira humanidade de Jesus e sua verdadeira divindade que preservasse a integralidade Aloys Grillmeier, Christ in Christian tradition, vol. 1 – From the beginnings to the Council of Chalcedon, p. 462 Apud Roger Olson p. 223. 6.

(18) 18. natural das duas realidades na sua pessoa. Não podia conceber uma natureza (physis) humana sem uma pessoa (prosopon) ligada a ela. Um axioma básico do pensamento de Nestório era que a verdadeira humanidade não pode existir de modo algum sem uma pessoa humana individual que seja o centro da natureza humana. Prosopon (pessoa) e physis (natureza) estão juntos, tanto na humanidade como na divindade.”7. Assim sendo, a implicação a que. logicamente chegamos diante da tese de Nestório é que Jesus Cristo é duas pessoas. Nestório expressa o seu conceito de encarnação do Logos como uma mútua habitação das duas pessoas, uma na outra, que sejam o eterno Filho de Deus e o ser humano Jesus, formando a pessoa composta Jesus Cristo. Para ele Deus uniu a pessoa divina com a natureza humana, sem, contudo negar (modificar e/ou alterar) as duas pessoas (divina e humana) que correspondem respectivamente a cada uma das naturezas unidas em Jesus Cristo. A grande tarefa de Nestório era explicar como duas pessoas podem ser uma única, ou seja, explicar a união do divino e do humano em Jesus Cristo. Como solução a esta questão cunhou o termo synapheia (conjunção) com o intuito de expressar a “conjunção” da natureza-pessoa divina com a natureza-pessoa humana em Jesus Cristo (o Logos divino e o homem Jesus). Para Nestório este conceito de conjunção possibilitava expressar Jesus Cristo como verdadeiramente Deus e ainda verdadeiramente humano sem contudo haver mistura entre as duas pessoas (claramente contrário ao conceito de “communicatio idiomatum” de Cirilo). A pessoa humana agia conforme a natureza humana e a pessoa divina conforme a natureza divina. Embora fazendo esta distinção, Nestório dizia que as atividades eram realizadas conjuntamente. Finalmente, a despeito de sua tentativa de explicar a sua tese da conjunção (duas pessoas que equivaliam a uma única), a implicação da qual nunca se desvencilhou foi que seu Cristo era dois indivíduos, onde o Logos não entrou verdadeiramente na existência humana, mas apenas em uma associação com o homem.8 Eutiques (378-455) era um monge que vivia em Constantinopla. Apoiava Alexandria; após a morte de Cirilo seguiu Dióscoro quanto à natureza única de Cristo. “Embora seja difícil averiguar exatamente qual era o ensino de Eutiques a respeito de Cristo, não há dúvida de que foi um passo além da linguagem de Cirilo e, sobre o processo de encarnação, afirmou que se tratava de “duas naturezas antes da união (de Deus com a humanidade), mas uma só natureza depois ou como resultado da união”.”9 Negou a humanidade de Cristo ao afirmar que não era consubstancial com o homem. Dizia ele que por causa da encarnação, o corpo de 7. Roger Olson, p. 219. Vd. Roger Olson, p. 215-222. 9 Roger Olson, 231. Cp. Earle E. Cairns, O Cristianismo Através dos Séculos, p. 110. 8.

(19) 19. Cristo havia sido deificado a tal ponto que não era consubstancial com o homem (humanidade). “Segundo a teologia de Eutiques, a realidade humana de Jesus não fazia diferença ao Logos e até mesmo era absorvida na união da encarnação.”10 Eutiques acreditava que Cristo não possuía uma personalidade humana, uma existência humana individual e nem mesmo uma natureza humana como a nossa. Estas idéias indicam algo bem próximo do apolinarismo e do docetismo radical. “Ele ensinava que, desde o momento da concepção em Maria, Jesus Cristo era um ser híbrido entre a humanidade e a divindade – uma única natureza divina-humana –, que juntava e misturava as duas naturezas de tal maneira que a natureza humana era subjugada e absorvida pela divina.”11 Segundo Bettenson: “Em 433, elaborou-se um credo de união para conciliar os princípios alexandrinos com os princípios antioquianos. Admitiu-se o termo Theotókos e a palavra ‘união’ substituiu ‘conjunção’. Na realidade, ninguém ficou satisfeito.. Os alexandrinos, inquietos pelo que lhes parecia insistência. excessiva na distinção das duas naturezas, estavam prontos, nem bem desaparecido Cirilo, para defender o alexandrinismo extremista de Eutiques, monge de Constantinopla, cujo antinestorianismo não se baseava numa teologia suficientemente esclarecida. Eutiques, em novembro de 448, foi convocado pelo Sínodo de Constantinopla para responder à acusação de heresia.”12 Quando da realização do Sínodo de Constantinopla em 448, Dióscoro manipulou este sínodo para condenar Eutiques, na verdade ele era favorável ao monge de Constantinopla, desejava apenas tirar proveito próprio da situação. Vejamos Olson: “O motivo de ter causado a condenação de Eutiques era oferecer ao monge de Constantinopla refúgio e comunhão com Alexandria e depois usar sua condenação e subseqüente comunhão para forçar uma confrontação com os líderes de Antioquia e até mesmo com o próprio patriarca de Constantinopla.”13 Sobre Dióscoro, Gonzalez afirma que ele: ... foi muito além de seu predecessor tanto em seu zelo pelo que ele cria ser ortodoxia, quanto em sua disposição de usar todos os meios disponíveis para alcançar a vitória final de sua própria causa. Ele via a fórmula conciliatória de 433 como uma vitória da heresia sobre a verdadeira fé e como uma humilhação da antiga diocese de Alexandria, que deveria gozar de primazia no Oriente. 10. Roger Olson, p. 232. Roger Olson, 232. 12 Henry Bettenson, Documentos da Igreja Cristã, p. 96. 13 Roger Olson, 233. 11.

(20) 20. Quando Dióscoro sucedeu Cirilo, as circunstâncias pareciam estar arranjadas do modo ideal para a execução do projeto de destruir, de uma vez por todas, a cristologia antioquiana, e assim humilhar a sé de Antioquia. (...) As condições políticas também favoreciam Dióscoro, pois Teodósio II, muito velho e fraco para governar, praticamente colocou os afazeres do estado nas mãos de seu alto-oficial Crisáfio, que ficaria facilmente tentado pelo ouro alexandrino. Finalmente, Dióscoro tinha o apoio de uma hoste de monges espalhados por todo o Oriente – e até mesmo em Antioquia – que estavam implorando por uma oportunidade de defender a verdadeira fé contra os hereges.14. Eutiques trabalhou grandemente durante o período entre o Sínodo em Constantinopla (448) e o Concílio dos Ladrões em Éfeso em 449, procurando obter a ajuda de Leão (440461), bispo de Roma. Dióscoro usava as riquezas de Alexandria para atrair o imperador para o seu lado. “Por trás de Êutiques e Dióscoro está uma grande parte do movimento monástico e da piedade popular, que tendem irresistivelmente para a cristologia monofisita, que parece garantir melhor a divinização de Cristo e do homem.”15 Flaviano, patriarca de Constantinopla, foi obrigado a dar apoio ao Sínodo que condenou Eutiques. Já no Concílio Ecumênico em Éfeso em 449, ou o assim chamado Sínodo dos Ladrões, o eutiquianismo foi aprovado pelo uso da força por Dióscoro e Teodoreto de Ciro (393-466) (principal representante de Antioquia) e os nestorianos (seguidores das idéias de Nestório foram condenados e depostos de suas funções eclesiásticas). Flaviano de Constantinopla levou ao Sínodo um documento do bispo de Roma, Leão, contra Eutiques, mais conhecido como Tomo de Leão16. Flaviano até que tentou ler o documento no Sínodo, mas foi espancado pelos monges egípcios que Dióscoro trouxe, fato que levou Flaviano à morte mais tarde. Alexandria estava com a vitória. O imperador Teodósio II apoiou o Concílio. Eutiques triunfou. Esclarecedor é o relato do historiador católico Franco Pierini quanto a este fato ocorrido: Leão I, enviada a carta dogmática ao patriarca Flaviano, aceita a iniciativa do imperador Teodósio II de reunir um novo concílio ecumênico em Éfeso, fazendo-se representar pelo bispo Júlio, pelo presbítero Renato e pelo diácono Hilaro. Em Éfeso, porém, em agosto de 449, o patriarca alexandrino Dióscoro consegue impor a própria vontade aos 135 bispos presentes, recorrendo à violência através de monges fanáticos e com a ajuda das tropas imperiais: frente aos constrangidos 14. Justo L. Gonzalez, Uma História do Pensamento Cristão, vol. I, p. 356. Franco Pierini, A Idade Antiga, p. 201. 16 “O conteúdo desta carta pode ser assim resumido: Cristo é Deus e homem, nascido de Maria, tendo a virgindade dela sido preservada. As duas substâncias seguem sendo o que elas eram, mas combinadas em uma só pessoa.” Reinhold Seeberg, History of Doctrines, vol. I – history of doctrines in the ancient church, p. 270. 15.

(21) 21. legados pontifícios, reabilita Êutiques, depõe os principais bispos adversários, como Teodoreto de Ciro, Domno de Antioquia, Eusébio de Doriléia, Ibas de Edessa, enquanto o patriarca Flaviano é gravemente ferido, tanto que morre três dias depois. Os legados de Leão I, fugindo de Éfeso, levam ao papa os apelos de Flaviano, de Eusébio e de Teodoreto; todavia, as disposições tomadas naquele que passou para a história como “latrocinium ephesinum” permanecem em vigor até que Teodósio II, totalmente submisso ao protetor de Êutiques, Crisáfio, desaparece da cena, morrendo no dia 28 de julho de 450.17. Após o encerramento do Sínodo, o bispo Leão enviou uma carta ao imperador Teodósio II exigindo a reparação dos erros, ou seja, que Eutiques fosse condenado, Teodoreto de Ciro voltasse a ocupar o cargo de líder da Igreja de Antioquia e que os assassinos de Flaviano fossem punidos. O imperador negou completamente os pedidos feitos. Em 28 de julho de 450 Teodósio, literalmente veio a cair do cavalo e morrer. Pulquéria, sua irmã, assumiu o Império ao lado de Marciano e convocaram um novo Concílio com o propósito de revogar o Sínodo dos Ladrões, que se realizou em Calcedônia (451). Concílio e Definição de Calcedônia Iniciou em 8 de outubro de 451, havia vários bispos e oficiais de estado do mais alto escalão, e juntamente o casal imperial, Pulquéria e Marciano.. Quanto a este assunto. específico referente ao número de participantes, onde não há consenso entre os historiadores, é deveras importante a conclusão de Lorenzo Perrone: “... o concílio mais freqüentado da antiguidade (...) A respeito do número efetivo de participantes não reina unanimidade entre os historiadores, e as próprias fontes contemporâneas dão indicações discordantes. Enquanto Leão fala de “quase 600” participantes (...) e seu legado Lucêncio (...) confirma tal cifra, o relatório do concílio enviado a Leão a abaixa para 520. Por sua vez, a lista das assinaturas apostas à definição de fé traz cerca de 450 nomes (...). A cifra de 630 parece ter valor simbólico, em relação aos 318 padres de Nicéia. Dos tradicionais 600 se chega hoje a cerca de 350 membros, a partir das listas dos participantes das sessões. Os nomes a mais devem ter sido acrescentados em segundo tempo.”18 À frente continua: “Embora com participação tão ampla, o concílio continuava sendo assembléia composta quase que exclusivamente por bispos do Oriente. À parte os legados romanos – os bispos Pascasino de Lilibeu (Marselha) e Lucêncio de Áscoli, o padre romano Bonifácio e o representante do papa em Constantinopla, 17. Franco Pierini, p. 204. Lorenzo Perrone, De Nicéia (325) a Calcedônia (451) – Os quatro primeiros concílios ecumênicos: instituições, doutrinas, processos de recepção in Giuseppe Alberigo (org.), História dos Concílios Ecumênicos, p. 93. 18.

(22) 22. o bispo Juliano de Cós –, havia apenas dois bispos norte-africanos, refugiados após as invasões vândalas.”19 Leão não esteve presente por não agradar-se do fato do Concílio ter se realizado no Oriente e não no Ocidente como era do seu desejo. No Concílio havia dois partidos distintos e contrários: os seguidores de Leão e antioquenos de um lado contra Dióscoro e seus seguidores (eutiquianos) do outro.. A despeito das questões políticas. envolvidas, Perrone, sobre os concílios ecumênicos de um modo geral, mostra três características importantes: “A concentração primária na formulação de ‘profissões de fé’ (oroi). Profissões que nascem da vital necessidade de ‘prestar contas da fé’, ainda que em larga medida condicionadas pelo confronto com as correntes heréticas. Às profissões acrescentam-se disposições disciplinares para a vida interna das comunidades (cânones). Em segundo lugar, a participação nos trabalhos conciliares é ‘aberta’ tanto a teólogos quanto a leigos, embora sendo essencial (mas não exclusiva) a intervenção de bispos e, aos poucos, tornando-se conditio sine qua non o envolvimento dos cinco patriarcas apostólicos (pentarquia). Constitui também um fator bastante destacado a participação de representantes dos ambientes monásticos, dado seu crescente prestígio espiritual e social.”20. À frente. Perrone expressa a importância deste concílio juntamente com os três anteriores dizendo que, “dentre os sete concílios da antiguidade cristã, ainda hoje tidos como ecumênicos pela maioria das igrejas, destacam-se pela autoridade doutrinária e importância histórica os quatro primeiros, de Nicéia (325) a Calcedônia (451). O primado a eles concedido deriva sobretudo do fato de que formularam os dogmas fundamentais do cristianismo, relativamente à Trindade (com Nicéia e Constantinopla II) e à Encarnação (com Éfeso e Calcedônia). Por isso, já Gregório Magno (Ep. 125) os via, junto com os evangelhos, como a pedra quadrangular colocada como fundamento do edifício da fé.”21 O concílio de calcedônia foi convocado em 451 para desfazer as decisões tomadas em Éfeso, no assim chamado “Sínodo dos Ladrões”, após este uma carta do papa Leão tomou proeminência. A carta do papa Leão serviu como base para o Concílio de Calcedônia.. A. carta não foi expressamente aprovada, mas o Concílio decidiu escrever uma nova fórmula, no entanto, manteve seu teor claramente de linha ocidental. O relato de Olson é deveras esclarecedor quanto às decisões tomadas neste Concílio, bem como à forma como procederam os delegados, vejamos: 19. Lorenzo Perrone, p. 93. Lorenzo Perrone, p. 5-6. 21 Lorenzo Perrone, p. 13. 20.

(23) 23. Um dos primeiros eventos da primeira sessão do Concílio foi a entrada de Teodoreto de Ciro, que tinha sido condenado, deposto e quase queimado pelo Sínodo dos Ladrões. Houve o princípio de um tumulto, mas a imperatriz e seu guardas impuseram a ordem entre os bispos e Teodoreto foi conduzido a um assento de honra. Depois, as atas do Sínodo dos Ladrões em Éfeso foram lidas em voz alta e debatidas. Paulatinamente, os partidários de Dióscoro abandonaram-no e ao Sínodo dos Ladrões e expressaram remorso pela participação na perseguição de Teodoreto e na morte de Flaviano. Somente Dióscoro sustentou, em atitude de desafio, a validez do que havia acontecido em Éfeso em 449 e defendeu suas ações. Ao cair da noite, os bispo votaram em favor de depor Dióscoro do seu cargo de patriarca de Alexandria e de exilá-lo, junto com os líderes do infame Sínodo de Éfeso. A imperatriz e o imperador ratificaram a decisão. Dióscoro foi imediatamente exilado para o deserto.22. Os bispos reunidos no Concílio de Calcedônia decidiram que a assim chamada, Fórmula de Calcedônia, ou apenas Definição de Calcedônia, fosse apenas uma interpretação e elaboração do Credo de Nicéia (381) e não um novo credo que estava sendo redigido. A maioria dos bispos presentes não desejava a formulação de um novo credo, apenas queriam a confirmação (ou reafirmação) do Concílio de Nicéia (fé nicena ou credo niceno); e o reconhecimento do valor obrigatório das Cartas Dogmáticas de Cirilo e do Tomo de Leão (papa). Nestório e Eutiques foram condenados. O Concílio de Calcedônia fora claramente contrário ao posicionamento teológico dos alexandrinos. A Fórmula de Calcedônia assinada por todos os bispos era constituída, primeiro, de um preâmbulo e da afirmação solene do Credo de Nicéia como o padrão da ortodoxia, “colocando a seu lado o Credo do Concílio de Constantinopla (...) como refutação das heresias que surgiram depois de Nicéia.”23 Segundo, reconheceu as Cartas de Cirilo e o Tomo de Leão como interpretação correta do credo e confirmação da fé verdadeira, e por serem contrários ao nestorianismo e ao eutiquianismo. Terceiro, apresentou uma confissão de fé formal. A fórmula redigida pelo Concílio de Calcedônia rejeitava o pensamento tanto de Nestório quanto de Eutiques, ou seja, o diofisitismo extremado e o monofisitismo radical, respectivamente. O Concílio de Calcedônia condenou os que advogavam a existência de “dois filhos” e também aqueles que defendiam duas naturezas de Cristo antes da união e apenas uma após a união. Nestório foi condenado. Como bem diz Hägglund: “A decisão de Calcedônia é o resultado final das várias controvérsias surgidas, e constitui o resumo 22 23. Roger Olson, p. 235-236. J.N.D. Kelly, Doutrinas Centrais da Fé Cristã, p. 256..

(24) 24. confessional dos desenvolvimentos teológicos que floresceu na esfera cristológica.”24 Calcedônia combinou as posições da Alexandria e Antioquia (alexandrina e antiquena). As idéias de Cirilo foram reconhecidas como ortodoxas. O alvo era reunir as posições orientais e ocidentais em torno de decisões e questões dogmáticas. “As idéias de Roma, Alexandria e Antioquia foram combinadas numa formulação doutrinária comum e ortodoxa.”25 A Definição de Calcedônia é concorde com o Tomo de Leão e favorável ao pensamento de Tertuliano (160-depois de 220). O Concílio encerrou-se em 7 de fevereiro de 452. A Definição de Calcedônia expressa a doutrina da união hipostática com apenas poucas alterações em relação ao modo como fora elaborada por Cirilo, como por exemplo, a communicatio idiomatum não é mencionada, mesmo tendo sido utilizada por Leão no seu Tomo. A conclusão de Olson é própria: “A Definição de Calcedônia talvez soe esotérica ou extremamente abstrata ou filosófica, mas na realidade é simplesmente uma tentativa de expressar e proteger o mistério da encarnação de qualquer distorção.”26 A posição de Olson é corroborada por Relton: “Pode-se reconhecer que a Definição não é uma explicação do mistério da encarnação. O próprio fato de ela não conseguir solucionar o insolúvel é sua melhor recomendação para nossa cuidadosa consideração. Os que elaboraram a Definição não se preocuparam tanto em formular uma teoria como em salvaguardar a verdade de duas soluções propostas com caráter errôneo e em preservar para nós a verdade oculta sob esses dois erros.”27 A Fórmula de Calcedônia foi, em linhas gerais, uma tentativa de conciliar dois extremos teológicos em matéria de cristologia e de preservar o mistério da encarnação. Ferraro nos diz “que estamos diante de uma clara intencionalidade: afirmar o que é humano em Jesus e que este humano é absorvido pela divindade, mantendo-se a alteridade da humanidade na mesma pessoa. (...) Podemos dizer que o concílio de Calcedônia teria sido um passo adiante na afirmação da plena humanidade de Jesus e, levando-se em conta a evolução da psicologia e filosofia no tocante à compreensão da pessoa humana, podemos afirmar, sem. 24. Bengt Hägglund, História da Teologia, p. 83. Bengt Hägglund, p. 84. 26 Roger Olson, p. 238. 27 H. Maurice Relton, A Study in Christology: the problem of the relation of the two natures in the person of Christ, p. 36, apud, Roger Olson, p. 238. 25.

(25) 25. negar a intencionalidade de Calcedônia, que Jesus é também uma pessoa humana.”28 Afirma a verdadeira humanidade de Cristo e suas duas naturezas (segundo a teologia de Antioquia), no entanto, também declara que as duas naturezas não devem ser divididas ou separadas e que são pertencentes a uma só pessoa. Calcedônia afirma que as duas naturezas de Jesus Cristo não devem ser misturadas, tão pouco foram alteradas por meio da união hipostática no Logos (concepção contrária à cristologia alexandrina). Vejamos uma vez mais o que Olson diz: A verdadeira essência da Definição de Calcedônia é conhecida como os quatro limites de Calcedônia – “sem confusão, sem mudança, sem divisão, sem separação”. Essas quatro expressões são “limites” em torno do mistério da união hipostática – as duas naturezas plenas e completas de Cristo numa só pessoa. “Sem confusão, sem mudança” protegem o mistério da heresia do eutiquismo e do monofisismo, que tentam preservar a unidade da pessoa ao criar um híbrido, tertium quid (um terceiro algo), com a divindade e a humanidade. “Sem divisão, sem separação” protegem o mistério da heresia do nestorianismo, que procura enfatizar a distinção entre a humanidade e a divindade dividindo-as em duas pessoas diferentes. A Definição está dizendo: contanto que não ultrapasse nenhum desses limites, você pode expressar de várias maneiras diferentes o mistério da encarnação. Tudo o que ela realmente faz é expressar e proteger um mistério. E não explica coisa nenhuma.29. Ferraro levanta uma outra questão deveras importante: O concílio de Calcedônia nos coloca uma questão de fundo: Como, então, conhecer a natureza divina? A natureza humana conhecemos pela história humana de Jesus, ou seja, pela sua vida, prática e inserção na história. Em relação à natureza divina, a lógica do concílio de Calcedônia é que são esses mesmos atributos que nos permitem conhecer a natureza divina e não o caminho inverso. À pergunto “como é Deus?” nós a saberemos responder seguindo a história de Jesus. Não é que tenhamos dois caminhos para conhecer a natureza divina: um conhecendo-a diretamente e outro conhecendo-a por meio de Jesus. Só temos um caminho: por meio de Jesus é que conhecemos quem é e o que é Deus.30. Cirilo e Leão foram os principais influenciadores da Fórmula de Calcedônia, e, por sua vez, sofreram influencia direta de Atanásio e Tertuliano respectivamente.. 28. Benedito Ferraro, p. 33, 34. Roger Olson, p. 238-239. 30 Benedito Ferraro, p. 35. 29.

(26) 26. Observemos a relação das sentenças da fórmula de Calcedônia com os pontos de vista anteriores e também com as diferentes controvérsias, a anterior apresentação das controvérsias nos dá o contexto necessário ao entendimento, desta forma podemos discorrer como Calcedônia solucionou tais problemas (ou pelo menos tentou) e condenou os “hereges”.31 Antes, é de grande proveito observar Maraschin falar sobre os paradigmas norteadores da linguagem que servem como parâmetros no entendimento dos Concílios dos primeiros séculos, que seguindo Lindbeeck, afirma: Poderíamos concluir que os antigos teólogos da Igreja chegaram à afirmação de três princípios reguladores da linguagem a respeito de Deus. Havia, em primeiro lugar, o princípio monoteísta que significava mais ou menos o seguinte: qualquer coisa que dissermos a respeito de Deus não pode contradizer a afirmação de sua unidade. Em segundo lugar, havia o princípio da especificidade histórica: Jesus era uma pessoa histórica, um homem verdadeiro. O terceiro princípio era o cristológico. Esse princípio significava a aceitação da pessoa humana de Jesus como a mais perfeita pista para se perceber, em termos humanos, a presença de Deus na história. Ele revelava a experiência humana de Deus. Segundo Lindbeck, esses três princípios estiveram por detrás de todo o desenvolvimento dos primeiros quatro séculos da história da Igreja e das doutrinas. O longo capítulo da condenação das heresias cristológicas era, no fundo, a condenação das tentativas de relacionar os três princípios expostos. Pareceu à Igreja que a linguagem de grupos representativos de teólogos docetas, gnósticos, sabelianistas, arianos, nestorianos, entre outros, transgredia os limites desejáveis estabelecidos nos três critérios discutidos há pouco. Isso não significa que a linguagem do Credo tenha sido infalível. Apenas quer dizer que a formulação adotada parecia “menos dissonante” do que as outras em face dos três princípios. Essa formulação do Credo, mais tarde reafirmada em Calcedônia, tornou-se paradigmática para a posterior discussão teológica. Não pretendeu ser uma espécie de fechamento dos debates. Na verdade, o que os teólogos sempre buscaram e ainda buscam são formulações da mesma doutrina, mais adequadas aos tempos em que vivem.32. A Definição de Calcedônia33 Passemos agora a uma breve exposição das afirmações existentes na Fórmula de Calcedônia.. 31. Cp. Bengt Hägglund, p. 83. Jaci Maraschin, O Espelho e a Transparência – O Credo Niceno-Constantinopolitano e a teologia latinoamericana, 1989, p. 98-99. 33 Henry Bettenson, p. 101. 32.

(27) 27. Fiéis aos santos pais, todos nós, perfeitamente unânimes, ensinamos que se deve confessar um só e mesmo Filho. Contra Nestório, que distinguia a tal ponto entre as duas naturezas (divina e humana) que defendia a tese de que existiam duas pessoas distintas. A identidade de Deus na forma de Pai – no sentido assumido pela palavra no uso cristão – é vista na maneira como Jesus revelava Deus em termos de Pai só se mostrar com seu Filho absolutamente devotado.”34 “Embora a linguagem do Credo possa parecer estranha ao começar suas afirmações sobre Jesus Cristo com a idéia do Filho pré-existente, dá-nos uma contribuição importante: a realidade humana de Jesus em relação com Deus Pai só pode ser entendida enquanto manifestação do Deus eterno. A eternidade não se aplica apenas ao Deus referido por Jesus, mas também ao Filho que dessa maneira se relaciona com o Pai.35. A Confissão da Fé Apostólica expressa a importância soteriológica da afirmação de que Jesus Cristo é Filho de Deus da seguinte forma: ... o Filho de Deus estava com Deus desde a eternidade, foi o próprio Deus que veio no Filho no meio do povo e continua, por meio do poder do Espírito Santo, a se fazer presente a atuante nesse mesmo povo. Assim, a nossa confiança na vida e na morte não repousa num ser humano abençoado e utilizado por Deus, mas no Filho de Deus de eternidade em eternidade.36. Nosso Senhor Jesus Cristo. Segundo A Confissão da Fé Apostólica, o senhorio de Jesus Cristo como afirmado pelo Credo Niceno-Constantinopolitano está fundamentado na “sua ressurreição dentre os mortos pelo próprio poder de Deus.”37 Esta ressurreição “confirma a vida e os atos de Jesus na qualidade do Verbo eterno de Deus proferido por nós e pela nossa salvação.” 38 O Credo expressa uma autoridade divina, universal e eterna de Jesus Cristo como resultado ocorrido segundo a ressurreição. Desta feita, chega à conclusão de que “Jesus deve ser reconhecido e A Confissão da Fé Apostólica – Explicação Ecumênica da Fé Apostólica segundo o Credo NiceConstantinopolitano (381), p. 64. 35 A Confissão da Fé Apostólica, p. 65. 36 A Confissão da Fé Apostólica, p. 65. 37 A Confissão da Fé Apostólica, p. 64. 38 A Confissão da Fé Apostólica, p. 64. 34.

(28) 28. obedecido na qualidade de Senhor sobre todos e todas as coisas” e “todos os seres humanos, todos os domínios e níveis da realidade estão debaixo da promessa e do mandamento do único Senhor Jesus Cristo.”39 Assim sendo, os cristãos confessam a “Jesus Cristo em termos de Senhor absoluto da mesma maneira como acreditam em Deus uno, Pai do universo.” 40 Jaci Maraschin diz: A confissão da fé “em um Senhor Jesus” é seguida da palavra “Cristo”. Se, por um lado, acentua a plena humanidade do homem Jesus, imediatamente qualifica essa humanidade. Esse Jesus não é qualquer judeu da Palestina, mas um homem muito particular que foi considerado o Cristo. Isso significa que não podemos confessar a fé apenas pela metade. (...) Esse nome assim qualificado não pode ser pronunciado isoladamente. Ele é Jesus, o Cristo.41. Perfeito quanto à divindade e perfeito quanto à humanidade. Contra o dinamismo, Ário e Nestório, contra o docetismo de Marcion, Sabéio e Apolinário; e o gnosticismo - Aceitaram o dualismo grego que considerava a matéria como inerentemente má e oposta ao espírito, pois, o corpo humano tinha conotações más, porque é matéria. A função de Cristo era a de vir como emissário do Deus supremo trazendo a gnosis, que é o conhecimento verdadeiro. Como um ser divino, Cristo não assumiu o corpo humano, nem morreu, mas temporariamente habitou num ser humano, Jesus, ou assumiu aparência humana, uma espécie de fantasma, com aparência de homem. A salvação proposta pelos gnósticos era que eles possuíam uma centelha do divino, ou uma espécie de natureza espiritual que lhes havia sido implantada de cima.. Verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, constando de alma racional e de corpo. Contra Apolinário, que substituía a alma humana de Cristo pelo Logos divino e ensinava que o Logos assumira “carne celestial”; também contrário ao pensamento de Eutiques que defendia a idéia de uma pessoa e uma natureza; e ao ebionismo que negava a plena divindade de Jesus Cristo. 39. A Confissão da Fé Apostólica, p. 64. A Confissão da Fé Apostólica, p. 64. 41 Jaci Maraschin, p. 75. 40. Observando as afirmações da Fórmula de Calcedônia.

(29) 29. podemos perceber o propósito de preservar o mistério a respeito da encarnação, bem como o desejo de estabelecer um acordo entre as escolas teológicas mais proeminentes, evitando seus extremos radicais. Olson diz que: Ela afirma claramente, seguindo uma teologia antioquena moderada, a verdadeira humanidade de Jesus Cristo e suas duas naturezas. Mas declara que as duas naturezas não devem ser divididas nem separadas e que cada uma delas, na sua plena integridade, permanecem juntas em uma só pessoa. (...) Calcedônia também afirma com clareza, contra a cristologia alexandrina radical, que as duas naturezas de Cristo não devem ser confundidas (ligadas ou misturadas), nem se deve pensar que foram alteradas mediante a união hipostática no Logos.42. Consubstancial [homoousios] ao Pai, segundo a divindade, [em consonância com o Credo Niceno] Os termos ousia43 e homoousios não devem ser entendidos nos termos da distinção feita por Aristóteles entre substância primária e secundária. Isto porque nos primeiros séculos a formação do pensamento teológico cristão não foi influenciada, pelos menos não diretamente, pelas categorias da filosofia aristotélica. A teologia latina falava de três Pessoas e uma só substância. Os gregos falavam de três hipóstases e uma só ousia. Hipóstase e ousia são termos utilizados pelo Concílio de Nicéia (325) e confirmados pelo Concílio Constantinopla I (381), onde em suas formulações credais afirmam que o Filho é homoousios, ou consubstancial com o Pai. A dificuldade de linguagem surge logo em seguida, quando o termo latino essentia correlato direto do termo grego ousia, cai em desuso. Diante disto, os teólogos latinos passaram a empregar a palavra substantia em referência análoga ao termo grego ousia. O problema está exatamente no fato de substantia ser equivalente à palavra grega hipóstase. Desta feita a dificuldade lingüística está instaurada, pois os teólogos latinos se utilizavam da expressão substantia com o intuito de proclamar a unidade da Trindade.. Já os gregos usavam hipóstase para expressar a. distinção das três Pessoas da Trindade. A implicação pelo caráter lingüístico em voga era que os gregos pensavam que o uso latino da expressão una substantia como hipóstase, estariam negando a Trindade. De modo inverso, os latinos supunham que os gregos defendiam três. 42 43. Roger Olson, p. 238. Sobre os diversos sentidos da palavra, ver Christopher Stead, A Filosofia na Antiguidade Cristã, p. 165..

(30) 30. deuses distintos. Não de somenos importância para a discussão terminológica estava o fato de que os latinos enfatizavam a unidade e os gregos as Pessoas da Trindade.44 O professor de teologia Christopher Stead falando sobre o uso do termo homoousios, diz que: O próprio Concílio de Nicéia foi, é claro, objeto de discussões sem fim. É difícil apurar os fatos, já que não foram conservadas atas oficiais. Por que foi o homoousios introduzido no Credo, e qual se supunha ser o seu significado? No momento, nenhuma resposta segura pode ser dada. Costumava-se pensar que Constantino, ou Osio, o tivesse imposto como um termo “ocidentalizante”, destinado a enfatizar a unidade divina antes que a distinção das Pessoas (...). Mas nós temos pouca indicação do seu real uso no Ocidente; e uma importante objeção contra essa teoria é o fato de o posterior Concílio de Sérdica (342-3), que favorecia uma teologia monarquianista, não ter feito menção do homoousios, mas ter antes falado de “uma hipóstase”. É mais provável que, em Nicéia, vários diferentes motivos estiveram em ação. Uma razão para introduzir homoousios foi o simples fato de que o próprio Ario o tinha rejeitado (...); e o próprio Constantino pode ter preferido não definir seu significado de modo muito preciso (...); seu objetivo era não fazer vítimas, mas isolar Ario de seus defensores, e atrair o maior número possível deles para o lado vencedor.45. A Confissão da Fé Apostólica – Explicação da Fé Apostólica segundo o Credo Niceno-Constantinopolitano (381), Documento de Estudo da Comissão de Fé e Ordem do Conselho Mundial de Igrejas, quanto ao uso do termo homoousios por tal Concílio afirma no § 94: A expressão mais difícil e controvertida deste Credo no segundo artigo é homoousios, “consubstancial com o Pai”. Esta palavra aparece aí com a intenção de excluir qualquer idéia de que o Filho era um tipo de realidade diferente da realidade do Pai, contingente e criado. Ao contrário, o Filho, embora dependente do Pai, é inseparável da vida do Pai: o Filho vive da mesma maneira como vive o Pai, em amor, liberdade, eternidade e criatividade incondicionais. Assim, Deus sempre existe em relação de dádiva e reação, num movimento de amor que se derrama e que volta para si. Alguns padres da Igreja, já num período mais desenvolvido (por exemplo, Gregório de Nazianzeno) disseram que a palavra “Deus” não queria dizer mais do que a vida ativamente participada pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo. O significa específico da intenção expressa no termo homoousios é o fato de que nossa salvação em Cristo se tornou possível pelo poder de Deus.46. 44. Christopher Stead, p. 150. Christopher Stead, p. 158. 46 A Confissão da Fé Apostólica, p. 59. Ver também, p. 67. 45.

Referências

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