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Ao iniciarmos a busca desse conceito no dicionário, tínhamos como ideia central, embora simplista e talvez ingênua, irmos na “origem” do termo e trazer uma explicação que nos possibilitaria sermos compreendidas por um número maior de pessoas, dado que este conceito está articulado às relações de gênero, na base de nossas reflexões sobre o professor homem na Educação Infantil. O conceito de identidade está definido como “[...] conjunto de caracteres próprios e exclusivos de uma pessoa: nome, idade, estado civil, profissão, sexo, defeitos físicos, impressões digitais, etc. [...]”, (AURÉLIO, 1988, p. 349) e, que de fato identificam um indivíduo em alguns aspectos, mas que não dá conta de apreender o sujeito em sua totalidade: psíquica, biológica, social, política etc.

Assim, nos deparamos com um conceito genérico, múltiplo e complexo, que possui diversas definições a partir dos vários campos de conhecimento, dentre eles: Direito, Matemática, Sociologia, Antropologia, Psicologia, Filosofia, Psicanálise etc.

Nessa perspectiva, e dado os processos de globalização presentes nas sociedades contemporâneas que imprimem transformações sociais, tecnológicas, políticas, econômicas, culturais, entre outras, suscitam discussões com relação à “identidade” e a consequente “crise de identidade” global, local e pessoal devido aos conflitos que estão presentes nesta construção, como afirma Hall “[...] uma completa desconstrução das perspectivas identitárias em uma variedade de áreas disciplinares, todas as quais, de uma forma ou outra, criticam a ideia de uma identidade integral, originária e unificada” (HALL, 2006, p. 103). Vê-se que a identidade é um conceito que busca uma (re)conceitualização dos sujeitos.

De acordo com Woodward (2006), a identidade tem que ser explicada por suas dimensões: psíquica, simbólica e social que contribuem para uma completa conceitualização desse conceito. As dimensões sociais e simbólicas são importantes para compreender como as “posições de identidades” (WOODWARD, 2006, p. 12), são produzidas, mas além destas, as teorias psicanalíticas possibilitam ampliar essa análise, na compreensão dos processos que asseguram o investimento do sujeito em uma “dada” identidade a partir de sua própria subjetividade.

Para esta autora, na base da discussão sobre questões da existência de uma crise da identidade e o investimento das pessoas em “posições de identidade” (idem, 2006, p. 12), está a tensão entre perspectivas essencialistas da identidade – em que esta é vista como fixa e imutável, baseada em reivindicações da natureza (étnica, raça, relações de parentesco) ou da história e do passado, representada como verdade imutável; e perspectivas não-essencialistas – onde são focalizadas as diferenças, assim como as características comuns ou partilhadas, tanto dentro de um mesmo grupo quanto deste com outros grupos e, inclusive a observação de como as definições do que significa ser de um determinado grupo muda ao longo dos tempos. Essas considerações de Woodward (2006), sobre posições de identidade, nos possibilitam pensar na realidade de “ontem” e de “hoje” dos/as profissionais que atuam na Educação Infantil e os investimentos dos sujeitos em uma dada posição de identidade, que se aproximam mais das perspectivas essencialistas, visto a representação simbólica presente na atuação com crianças pequenas expressas por adjetivos como: paciência, delicadeza e doçura. Buscamos também, em Silva (2006), uma referência para discutir o conceito de identidade, para quem seria fácil definir esse conceito pela sua positividade, isto é, aquilo que se é (ex.: sou brasileira), ou pela sua negatividade, aquilo que não se é (ex.: não sou argentina, não sou italiana, etc.), ou pelo que o outro é (ex.: ela é argentina, ela é negra, etc.), portanto, pela diferença. Ao exemplificar com a identidade e diferença cultural, ou seja, com a afirmação da identidade brasileira, ressalta que por detrás desta há uma extensa cadeia de negações de identidade do que não se é. Assim sendo, afirma que identidade contém em si mesma o traço da diferença, do outro que não é: “A mesmidade (ou a identidade) porta sempre o traço da outridade (ou da diferença)” (SILVA, 2006, p. 79).

Nesse sentido, pode-se dizer que tanto identidade como diferença são interdependentes, inseparáveis e mutuamente determinadas, pois são produzidas na e pela linguagem no contexto das relações sociais e culturais. O autor enfatiza que tanto a identidade como a diferença dependem da linguagem, e é onde ambas adquirem sentido, embora sejam tão indeterminadas e instáveis quanto esta, posto que são o resultado de um processo de produção simbólica e discursiva.

Dada a importância da linguagem, Silva (2006) afirma que a identidade e diferença são ativamente produzidas por meio de atos de linguagem, e que, portanto, têm que ser nomeadas. Busca em linguistas como Saussurre e Sapir, assim como na linguagem filosófica de Derrida, argumentos para a sua conceituação, pois segundo ele, identidade e diferença não podem ser compreendidas fora dos sistemas de significação nos quais adquire sentido, e que

não são, em absoluto, sistemas fixos, naturais ou predeterminados – “a linguagem vacila” (SILVA, 2006, p. 80).

Assim sendo, identidade, tal como a diferença, é uma relação social, ou melhor, uma “produção social” (SILVA, 2006, p. 96), isso significa dizer que elas não são definidas, mas impostas, visto que estão em estreita conexão com relações de poder; uma vez que onde existe diferenciação, aí está presente o poder. As marcas que traduzem a presença do poder podem ser: incluir/ excluir, demarcação de fronteiras (quem fica dentro/ quem está fora), classificação (atribuição de valor) e normalização, que levam à hierarquização de um(s) em relação ao(s) outro(s).

Esmiuçando estas marcas da presença do poder, na afirmação da identidade e da marcação da diferença, temos que: incluir/excluir significa dizer “estes pertencem, aqueles não”, portanto dizer “quem está incluído” e “quem está excluído”. Com relação à demarcação de fronteiras, ou seja, entre “nós” e “eles”, há uma separação e distinção, que vai além de simples pronomes gramaticais e é evidente qual termo acaba por ser privilegiado. Por classificar, Silva (2006) define dividir o mundo social entre “nós” e “eles”, sendo que a mais importante forma de classificação é aquela que se estrutura em torno de duas classes polarizadas e assimétricas (binarismos), onde um dos termos é sempre privilegiado em relação ao outro. Como afirma Silva (2006, p. 83) “As relações de identidade e diferença ordenam-se, todas, em torno de oposições binárias: masculino/feminino, branco/negro, heterossexual/homossexual”.

E por fim, normalização, que significa fixar uma identidade como norma, com todas as características positivas, e eleger arbitrariamente esta específica como parâmetro em relação a qual as outras identidades são avaliadas de forma negativa e hierarquizadas. Nessa perspectiva, pode-se dizer que a identidade “normal” é invisibilizada, uma vez que é vista como “a” identidade, e não como “uma” identidade. “A identidade hegemônica é permanentemente assobrada pelo seu Outro, sem cuja existência ela não faria sentido” (SILVA, 2006, p. 84), até porque a diferença faz parte da formação da identidade, poderíamos dizer que é seu duplo.

Nesse sentido, na Educação Infantil é lícito supor que a norma são mulheres no cuidado e educação de crianças, não há espaço para “uma” identidade, “a” identidade hegemônica passa a ser a mulher: maternal, carinhosa, delicada. O seu Outro, o homem, “tornar-se estrangeiro” em território considerado “naturalmente” feminino, e como todo “estrangeiro”, levanta suspeitas, curiosidades, e consequentemente, fabrica-se “verdades” sobre este ser “forasteiro”.

Retornando ao texto de Silva (2006), ele nos chama atenção para os dois movimentos que estão presentes no processo de produção da identidade, a saber: fixação/estabilização e subversão/desestabilização. Observa que a partir da teoria cultural e social pós-estruturalista, têm sido analisadas as identidades nacionais, as identidades de gênero, as identidades sexuais, as identidades raciais e étnicas, com o intuito de tentar descrever os processos que tendem a fixar as identidades, assim como aqueles que impedem a sua fixação. Ressalta, entretanto, que embora constituam as diversas dimensões da identidade cultural e social, possuem dinâmicas diferentes e exemplifica:

[...] enquanto o recurso à biologia é evidente na dinâmica da identidade de gênero (quando se justifica a dominação masculina por meio de argumentos biológicos, por exemplo), ele é menos utilizado nas tentativas de estabelecimento das identidades nacionais, onde são mais comuns os essencialismos culturais (SILVA, 2006, p. 85).

De posse do argumento do autor sobre a produção da identidade, parece acertado dizer que o homem na Educação Infantil, ao assumir a identidade do “cuidador de crianças”, desestabiliza a ordem natural – “cada coisa no seu lugar” –, pois cuidar de criança pequena é “naturalmente” função da mulher. Argumento este baseado em uma ordem natural, biológica, que justifica que é ela (mulher) quem possui todos os atributos para cuidar de seu rebento e por extensão dos outros.

De acordo com o dito: Quem pariu Matheus que o embale..., ter outra mulher para embalá-lo, mantém aquilo que se acredita um continuum desta ordem. Mas, se ao invés de outra mulher é um homem? Por que um homem não haveria de poder embalá-lo? Eles não sabem fazê-lo? São questões que se colocam e nos remetem a pensar se, de fato, o aspecto biológico justifica que “embalar uma criança” é um dado que pertence só e exclusivamente às mulheres. Embalar uma criança subverte a ordem, e consequentemente, surgem os incômodos que daí advém explicitado por alguns dos professores entrevistados para este estudo, quando referem que normalmente ficam com as crianças maiores.

Nesse sentido, embora nesses três anos de trabalho na creche, isso nunca tenha ocorrido com o professor Claudio, ele diz “[...] Normalmente acontece isso, normalmente homem ele tem (...), sempre volta para o Maternal sim, porque elas (crianças) são maiores um pouco, eu não sei se é certo; eu não tenho uma opinião sobre isso. Nunca ocorreu isso comigo” (PROFESSOR CLAUDIO).

De volta aos argumentos de Silva (2006), ele refere que a teoria cultural contemporânea destaca movimentos que buscam complicar e subverter a tendência da identidade à fixação, entre estes é destacado o hibridismo ligado a movimentos demográficos, movimentos migratórios, que podem ser tanto literais, no sentido concreto do movimento de

grupos, por opção ou por obrigação, que de fato “cruzam fronteiras”; ou metaforicamente, mover-se livremente entre os territórios das diferentes identidades.

Cruzar, estar ou permanecer na fronteira, como argumenta Silva (2006), mais do que a partida ou a chegada é que é o acontecimento crítico e que evidenciam a instabilidade da identidade. A teoria feminista e a teoria queer11, ao chamarem atenção sobre o caráter cultural e construído do gênero e da sexualidade, que através dos binarismos (masculino/feminino, heterossexual/homossexual) buscam fixar identidades de gênero e identidades sexuais, contribuem de forma decisiva para o questionamento desses. E, consequentemente, favorecem a possibilidade dos homens poderem embalar bebês, ampliando a concepção de gênero e ressignificando a fixidez de papéis/funções de homens e de mulheres, na medida em que produz outros sentidos nas práticas sociais.

De acordo com a argumentação de Woodward (2006, p. 35), esses “novos movimentos sociais”, que emergiram no Ocidente nos anos 60, colocam em jogo identidades que não têm sido reconhecidas e que têm ocupado lugares às margens da sociedade. As lutas em torno da identidade, pelos “novos movimentos sociais”, provam através do apagamento das fronteiras entre o pessoal e o político, que as identidades são diversas e cambiantes, tanto nos contextos sociais que vivemos, quanto nas posições de identidade que assumimos, reafirmando identidades pessoais e culturais, daí o argumento da autora que existe uma crise de identidade nas sociedades contemporâneas.

Além dos sistemas de significação ao qual identidade e diferença, estão inevitavelmente ligadas, elas também têm que ser representadas. Silva define, a partir da perspectiva pós-estruturalista, o conceito de representação, primeiro “a representação é [...], sempre marca ou traço visível, exterior. Em segundo lugar, [...] a representação é um sistema lingüístico e cultural: arbitrário, indeterminado e estreitamente ligado a relações de poder” (SILVA, 2006, p. 91). Portanto, identidade e diferença adquirem sentido através da representação, daí que questioná-las implica em questionar os sistemas de representação que lhes dão sustentação e suporte.

Contudo, nos alerta para ter cuidado em não compreendê-la de forma descritiva, que pode estar subjacente ao conceito de representação, levando-nos à fixação da identidade e diferença. Para contornar esse problema, busca no conceito de performatividade, ou seja, no deslocamento da ênfase na identidade “como aquilo que é” (descrição), para a ideia de

11“A expressão queer significa esquisito, ridículo, [...] homossexual etc. Os estudos queer invertem seu uso e

passam a utilizá-la como marca diferenciadora e denunciadora da heteronormatividade”. (BENTO, 2008, p. 171).

“tornar-se”, que implica em movimento e transformação. Desenvolvido inicialmente por Austin (1998), para quem há proposições que ao ser enunciadas, algo se efetiva - “Eu vos declaro marido e mulher” e, portanto, só podem ser consideradas quando necessárias para o resultado que anunciam.

Entretanto, Silva (2006), apóia-se principalmente no conceito de performatividade desenvolvido pela filósofa Buttler (1999), para quem a repetida enunciação de uma sentença, sobre certas características identitárias de algum grupo ou pessoa, antes descritiva, acaba por produzir o “fato”, visto ser a possibilidade da repetição do ato linguístico que lhe confere a força “de verdade” no processo de produção de identidade (hegemônica). Contudo, Buttler vai além nesta definição, ao afirmar que a mesma repetibilidade que garante a eficácia dos atos performativos pode significar também a possibilidade de interromper, questionar, contestar essa ocorrência no processo de citações, que reforçam as identidades existentes, significando a produção de novas identidades.

Como ressalta Soihet e Pedro (2007, p. 293), acerca do conceito de performatividade de Butler “a performatividade do gênero é um efeito discursivo, e o sexo um efeito do gênero”.

Finalizando, o seu texto A produção social da identidade e da diferença, Silva (2006) faz uma síntese do que a identidade não é e é, apontando que esta vale igualmente para a diferença:

Primeiramente, a identidade não é uma essência; não é um dado ou um fato – seja da natureza, seja da cultura. A identidade não é fixa, estável, coerente, unificada, permanente. A identidade tampouco é homogênea, definitiva, acabada, idêntica, transcendental. Por outro lado, podemos dizer que a identidade é uma construção, um efeito, um processo de produção, uma relação, um ato performativo. A identidade é instável, contraditória, fragmentada, inconsistente, inacabada. A identidade está ligada a estruturas discursivas e narrativas. A identidade está ligada a sistemas de representação. A identidade tem estreitas conexões com relações de poder (SILVA, 2006, p. 96-7).

A partir dessas definições do que é e do que não é identidade e diferença, Silva (2006) nos convoca a olhar para estas na relação com o outro enquanto um problema, tanto do ponto de vista social como do pedagógico e curricular, dada a estreita relação da sociedade com a escola e vice-versa, pois não é possível abordar o multicultularismo em educação como tolerância à diversidade cultural.

Estendemo-nos nas minúcias do texto de Silva (2006) porque compreendemos a importância de suas contribuições conceituais de identidade e diferença, articuladas às práticas pedagógicas, posto que o pedagógico, como afirma Kramer (2008), tem na base “uma dimensão cultural” e, consequentemente, ao projeto político pedagógico da escola, que é o

locus institucional onde os professores homens deste estudo exercem suas atividades e que também tem sofrido mudanças no cenário educacional.

Silva (2006) argumenta que é um problema social o encontro com o outro, numa sociedade onde a identidade torna-se cada vez mais difusa, dada a complexidade da sociedade, e onde esse outro se expressa por meio de muitas dimensões: “O outro é o outro gênero, o outro é a cor diferente, o outro é a outra sexualidade, o outro é a outra raça, o outro é a outra nacionalidade, o outro é o corpo diferente” (SILVA, 2006, p. 97), porque vivemos em um mundo heterogêneo e o encontro com o diferente, com o estranho é inevitável.

Mas é também um problema pedagógico e curricular, visto que o “outro” e a diferença deve ser matéria de preocupação, porque está presente no espaço da escola, na interação entre os sujeitos e quando reprimida ou ignorada, eclode em conflitos, hostilidades e violência. Posto que as identidades são um produto das representações (tanto negativas, estereotipadas; como das positivas, de afirmação) que circulam em diferentes contextos, apoiadas em relações de poder assimétricas e hierarquizadas.

Partindo dessas considerações, tendo como foco as estratégias pedagógicas possíveis, Silva aponta como primeira: a “liberal” (2006, p. 97), que segundo o autor consiste em estimular e cultivar bons sentimentos para com a diversidade cultural – respeitando-a e tolerando-a, ou simplesmente reconhecendo-a e celebrando-a. Nessa abordagem, identifica que o problema central é que se deixa de questionar as relações de poder e o processo de diferenciação que produzem a identidade e a diferença.

Denomina de “terapêutica” (SILVA, 2006, p. 98), a segunda estratégia, que aceita também a diversidade como “natural” e boa, mas atribui ao outro e à diferença, distúrbios psicológicos, para quem é necessário tratá-los, como estratégia pedagógica, através de dinâmicas de grupo, exercícios corporais, etc.

Chama a atenção para uma terceira estratégia, que situa entre as duas anteriormente citadas, e que, segundo Silva (2006), talvez seja a mais utilizada, que consiste em apresentar as diferentes culturas de forma superficial e distante, em que o outro é visto como exótico, como uma curiosidade.

Por fim, argumenta em favor de uma estratégia pedagógica e curricular, a partir das contribuições da teoria cultural de inspiração pós-estruturalista, para quem a identidade e a diferença devem ser tratadas como questões de política – tendo estas no centro do debate como produção, e consequentemente, fazem-se necessário os seguintes questionamentos:

Quais mecanismos e instituições que criam e fixam as pessoas em determinadas identidades? Quais as separam por meio da diferença cultural?

Ao término do seu texto, Silva (2006) conclama por uma política pedagógica e curricular que tenha uma teoria, que além de explicar, questione os processos de produção da identidade e da diferença. Propõe estimular os/as estudantes a explorar estratégias: hibridismo, nomadismo, travestismo, cruzamento de fronteiras que tendem a colocar em xeque o campo das identidades existentes, tornando difícil o retorno do eu e do nós ao idêntico. Para concluir nos remete à

[...] ‘filosofia da diferença’– a diferença do múltiplo e não do diverso. [...] O múltiplo é sempre um processo, uma operação, uma ação. A diversidade é estática, é um estado, é estéril. [...] A multiplicidade é uma máquina de produzir diferenças – diferenças que são irredutíveis à identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e multiplica, prolifera, dissemina. A diversidade é um dado – da natureza ou da cultura. A multiplicidade é um movimento. A diversidade reafirma o idêntico. A multiplicidade estimula a diferença que se recusa a se fundir com o idêntico (SILVA, 2006, p. 100-01).

Respeitar a diferença para Silva (2006) é a possibilidade de acolher o outro naquilo que eu não sou e não posso ser; o outro enquanto estrangeiro em sua irredutível e infinita diferença, isto é, diríamos nós, na sua força constitutiva. Dessa forma, argumenta que, pensar na pedagogia como diferença – uma vez que educar é provocar a diferença num mundo que sem ela é um mundo idêntico, parado, morto; é a possibilidade de abertura para um outro mundo, que não questionasse somente a identidade, mas também o poder a ela associada.

As contribuições de Tomaz Tadeu da Silva são importantes na medida em que nos possibilitam discutir identidade a partir da diferença – nas suas formas simbólicas e sociais, que marcam as diferentes posições dos sujeitos, e por meio das quais os significados em um sistema classificatório são produzidos, tão presente na discussão sobre as relações de gênero, onde inevitavelmente estão presentes os discursos sobre o “outro” e as relações de poder, uma vez que é no campo das relações sociais que se constroem e se reproduzem as desigualdades entre os sujeitos. Portanto, o que caracteriza os seres e a sociedade humana é a diferença, e não as similaridades tomando como base a teoria cultural e social pós-estruturalista.

Diante disso, Hall afirma:

É precisamente porque as identidades são construídas dentro e não fora do discurso que nós precisamos compreendê-las como produzidas em locais históricos e institucionais específicos, no interior de formações e práticas discursivas específicas, por estratégias e iniciativas específicas. Além disso, elas emergem no interior do jogo de modalidades específicas de poder e são, assim, mais o produto da marcação da diferença e da exclusão do que o signo de uma unidade idêntica, naturalmente constituída, de uma identidade em seu significado tradicional – isto é, uma “mesmidade” que tudo inclui, uma identidade sem costuras, inteiriça, sem diferenciação interna (HALL, 2006, p. 109).

Cabe, pois, concluir que somos posicionados e também nos posicionamos de acordo com as diferentes expectativas e restrições sociais, envolvidas em diferentes situações nas quais estamos atuando, embora possamos nos sentir como se fossemos a mesma pessoa em todos os nossos diferentes encontros e interações. Como afirma Woodward (2006, p. 30): “Diferentes contextos sociais fazem com que nos envolvamos em diferentes significados sociais”; até porque como vimos, não há identidade única, “inteiriça” como nos lembra Hall.

Assim, considerando-se a Educação Infantil, enquanto um campo feminizado, devido ao número de mulheres e os significados produzidos neste locus, qual o discurso veiculado e que circula quando os professores homens são inseridos?

Quais significados e interpretações são produzidas sobre eles e neles?

Ao falarmos em sujeitos, precisamos estar atentos à multiplicidade que é anterior à identidade. Mas também aos lugares que ocupam ou não a partir dessas “identidades”.