• Nenhum resultado encontrado

Os novos contextos político, social e cultural originados do desequilíbrio, do antagonismo, da desigualdade, das mudanças e da desconstrução do sujeito tão marcantes na contemporaneidade, quebraram antigos paradigmas e formas de ser e pensar, originando novos conceitos, discursos, sujeitos individualizados e novos objetivos sociais.

A globalização — que não é um fenômeno recente e que surge com o início do capitalismo — quando os primeiros comerciantes sentiram a necessidade de saírem viajando de um lugar para o outro visando adquirir novos produtos e vender suas mercadorias — trouxe consigo a formação de um sujeito intercultural, inserido em um mundo conexionista, marcado pela confrontação, conflito, entrelaçamento e relação de negociação de conflito. Dessa forma, os sujeitos pós-modernos tornaram-se produtos de narração midiática e a mídia tornou-se a materialização do sistema capitalista.

A respeito disso, Canclini (2004, p. 148) afirma que,

la desconstrucción más radical de la subjectividad está siendo realizada por procedimentos genéticos y sociocomunicacionales que favorecen la invención y simulación de sujetos. Desde la robótica hasta la clonación, desde el travestismo de género hasta el fingimento de personalidades em juegos electrónicos, la pregunta por lo que hoy significa ser sujetos está – más que cambiando – asomándose al precipicio de la disolución.

Os sujeitos tornaram-se “simulados” a partir dos sistemas de significação midiática, ou seja, as identidades tornaram-se produtos de narrações e atuações produzidas pelos discursos capitalistas consumistas, e difundidos nas telenovelas, desenhos animados, filmes, músicas, programas de TV e rádio, revistas e propagandas comerciais.

Pois, de acordo com Carvalho (2010), há certo consenso de que tudo ou quase tudo o que se produz pode ser consumido, segundo a regra básica do capital (o consumo) que no século XX confirmou processos de expansão dos recursos econômicos e materiais por meio das tecnologias de comunicação e de informação.

Dessa forma, as identidades formadas na contemporaneidade são construídas no processo de interação e de comunicação. A mídia transformou a identidade em um objeto consumidor, onde a vida e o prazer estão vinculados ao ato de comprar e de possuir; causando assim, profundas mudanças na condição humana, pois, o que era sólido, concreto e

organizado se desfaz, ganhando novos sentidos ou se perdendo diante das novas transformações sociais (BAUMAN, 2001).

A identidade torna-se, assim, fragmentada, desvinculadas de tempos, lugares e tradições específicos; e o sujeito pós-moderno esquizofrênico torna-se marcado pela fragilidade nos laços pessoais e pela indiferença em relação ao outro. Segundo Hall (2006), as identidades passaram a ser “descentradas”, isto é, deslocadas ou fragmentadas pelo processo de globalização, pois as transformações no cenário mundial passaram a influenciar também as identidades pessoais, ou seja, as pessoas perderam o sentido estável de si, tanto em relação ao lugar ocupado na sociedade e na cultura, quanto a si mesmos — constituindo uma “crise de identidade” para o sujeito.

Diante da instabilidade, mutabilidade, confusão e desestabilização tão marcantes na contemporaneidade, o sujeito se vê mergulhado em meio a inúmeras informações e a toda forma de discurso que o faz questionar, modificar, aceitar ou produzir novas ideologias, ações, pensamentos e formas de viver que influenciam na formação da sua identidade e na criação de uma nova representação discursiva.

O capitalismo, diariamente, vem impondo a sociedade novas formas de ser, de pensar, de sentir, de valorizar, de se relacionar, ditando regras/leis e discursos de verdades que vão se tornando indispensáveis para a vida de cada pessoa. Para isso, ele não aboliu as antigas autoridades nem as tornou dispensáveis, ao contrário permitiu que inúmeras autoridades coexistissem ao passo que nenhuma delas pudessem se manter por muito tempo e assim se anulassem mutuamente (BAUMAN, 2001).

Regidos pelas regras do consumo, os seres humanos foram impelidos às compras. Cria-se assim uma sociedade do consumo movida pelo consumismo e pelo “ato de comprar” só pelo “prazer de comprar”. As lojas se transformam em verdadeiros templos de consumo, a mídia se torna o veículo de criação desses novos consumidores, o privado se torna público, e a vida se orienta pela sedução cada vez mais intensa e volátil de possuir.

Para Bauman (2001) o sucesso, a felicidade, a satisfação individual e social não está ligada ao interior ou a produção. O vazio, a incerteza e a angústia desse ser humano pós- moderno fragmentado são saciados pelo desejo impulsivo e insaciável de comprar. O comprar compulsivo que revigora, anima e expulsa a insegurança e a incerteza tão marcantes em nossos dias.

Os consumidores podem estar correndo atrás de sensações — táteis, visuais ou olfativas — agradáveis, ou atrás de delícias do paladar prometidas pelos objetos coloridos e brilhantes expostos nas prateleiras dos supermercados, ou atrás das

sensações mais profundas e reconfortantes prometidas por um conselheiro especializado. Mas, estão também tentando escapar da agonia chamada insegurança (BAUMAN, 2001, p. 97).

E esse comprar compulsivo, tão presente nas sociedades pós-modernas, vem sendo alimentado pela indústria do consumo por meio das ações midiáticas e governamentais que estão voltadas para o incentivo ao desejo, à fantasia, ao gosto, ao sonho, à posse material, à autoimagem, enfim, à dita liberdade e a tudo aquilo que deve ser adquirido para depois serem descartados e substituídos.

De acordo com Costa (2010, p.138), “a cultura midiatizada opera dispositivos poderosos com profundas repercussões na reconfiguração de todas as instâncias e dimensões da condição humana nas sociedades contemporâneas.”. Dessa forma, crianças e jovens vão dando rumo as suas vidas, a partir das experiências vivenciadas nesse contexto econômico, onde a economia é livre de bloqueios políticos, éticos e culturais.

Nesse quadro de transformação educativa, política, cultural e pedagógica, que influencia diretamente na formação dos sujeitos, na composição de suas identidades, na disseminação de práticas e condutas, e no delineamento de formas de ser e viver na contemporaneidade; os discursos midiáticos assumiram também o papel educacional na sociedade atual.

Esse discurso, assim como qualquer outro, passa a ser escrito e enunciado por várias pessoas que o incorporam em suas práticas cotidianas e nas suas vidas. Para Foucault (1970), o discurso que pode ser de inclusão ou de exclusão não é contínuo, podendo aparecer e desaparecer, sem mesmo identificarmos a sua origem; mas, para que esse seja difundido, ele precisa de um local para legitimá-lo e distribuí-lo. E a mídia é esse local de legitimação e distribuição de identidades.

Identidades que são vistas como transitórias, mutáveis, flexíveis e fluidas, desestruturando assim, a visão sólida, harmônica, consistente e lógica que se forma em nossa mente quando se fala sobre “identidade”. Em condição eterna de inconclusão, esta está sempre “em processo”, “em alteração”, e na busca incessante para solidificá-la, tentasse dar forma ao inconsistente e ao disforme, criando finas camadas frágeis de serem absorvidas e fragmentadas (BAUMAN, 2001).

Sobre isso, Melo (2009) afirma que, “na contemporaneidade a mídia tem um papel discursivo importante na (re) construção identitária destes novos ‘valores’ nas práticas sociais, pois estamos à mostra de diferentes que acaba nos causando desestabilização”. Contribuindo assim para a crise de identidade tão presente na contemporaneidade.

Dentro desse contexto pós-moderno e materialista o indivíduo passou a voltar seus olhos para si e para os seus bens materiais, as relações sociais se tornaram, em sua maioria, relações de mercado, e o outro passou a ser esquecido, ignorado, excluído. Segundo Gruman (2007), “as relações humanas são vistas de modo fragmentado e descontínuo em oposição às redes estáveis de deveres e obrigações mútua, promovendo desta forma um distanciamento entre o indivíduo e o outro.”. Mas, como construir essa identidade sem a presença do outro?

Apesar da flexibilidade e do vazio da sociedade contemporânea não se pode negar a necessidade do outro no cotidiano, pois ele serve como anteparo para a construção dessa identidade, que parece tão frágil, fragmentada e líquida. Mas, como combater essa indiferença que nos cerca? Onde fica a responsabilidade social da educação? Qual é o papel do professor dentro desse sistema? Como deve ser realizada a docência? Como é construída a identidade docente? Refletindo sobre esses questionamentos, apresentaremos, na próxima seção, o processo de construção da identidade docente.