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6.2 Dando Voz aos Sujeitos de Pesquisa

6.2.4 Importância atribuída à formação

Interessados em saber as consequências da formação continuada para os professores do ensino superior, perguntamos aos docentes pesquisados “em que a formação continuada contribuiu para as implicações da sua prática docente?”, e depois de analisarmos as respostas dadas, pudemos identificar as seguintes categorias: segurança para exercer a atividade

docente; reflexão sobre as ações executadas em sala de aula; mudança na prática docente; compreender os alunos; mudança no planejamento; conhecer melhor a universidade e outras áreas de conhecimento; e mudança na avaliação.

Ao serem questionado a respeito das implicações da formação continuada para a sua prática docente, um dos sujeitos da nossa pesquisa afirmou que esta lhe proporcionou uma maior segurança para exercer a atividade docente, já que esta lhe deu mais tranquilidade no exercício de sua profissão: “contribuiu muito para me dar certa tranquilidade e poder adquirir uma segurança melhor ao desenvolver essa atividade [a docência].” (P1).

Essa insegurança vivenciada por este docente, que exerce essa atividade há pouco tempo (seis anos), pode ser compreendida visto que a maioria dos docentes universitários não possui uma formação pedagógica ao ingressarem na universidade, e a partir desse ingresso passam a assumir a atividade docente sem nenhuma preparação.

De acordo com Almeida e Pimenta (2011, p. 36) na docência no ensino superior, “raramente se exigiu dos docentes que aprendessem a ensinar, e menos ainda, acrescentamos, que obtivessem referências para aprender a lidar com os processos pedagógicos e organizacionais mais amplos do ensino superior.”.

Desse modo, esses professores ficam relegados à própria sorte e vão criando mecanismo de ação — sejam eles oriundos da prática ou da imitação das ações desenvolvidas pelos docentes que estes tiveram durante a sua formação — para lhe auxiliarem em sua prática pedagógica. Por isso, o docente entrevistado afirma ter adquirido segurança para desenvolver a docência, pois durante a formação continuada eles puderam discutir as suas

incertezas e seus questionamentos com as professoras formadoras e com os outros docentes participantes dessa formação.

Outra implicação dessa formação, revelada pelos docentes pesquisados, foi à reflexão

sobre as ações executadas em sala de aula, o que visualizamos a partir das falas abaixo:

[...] em segundo, na questão de refletir constantemente sobre o que está sendo feito (P1).

eu acho que esse curso daqui, ele deu uma... Deu uma levantada, puxa a gente a pensar, faz a gente pensar, refletir o melhor para o aluno (P5).

[...] eu acho que foi importante para a gente repensar alguns conceitos (P6).

lá eu aprendi que não existe uma receita de bolo para se dar aula, né? Aprende-se dar aula, dando aula, na prática e refletindo sobre essa prática, aprendendo com... Aprendi muito lá, com... Com... As experiências dos outros professores muito mais experientes do que eu, né, o que já tinha passado dentro da sala de aula (P8). o que mudou foi realmente a maneira de enxergar pedagogicamente a... a... o meu trabalho cotidiano, rotineiro [...] (P9).

[...] comecei a perceber coisas que eu não percebia tanto na prática docente quanto ao desenvolvimento do processo educativo, não é? (P10).

acredito que a formação continuada do NUFOPE é uma ação muito importante para a universidade, uma vez que dá ao professor a possibilidade de refletir sobre a sua prática docente como um todo (no que diz respeito à sua organização, ao seu planejamento, à sua avaliação). (P12).

[...] nos cursos oferecidos pelo NUFOPE [dois] em que participei descobri outras formas de lecionar com as quais não sabia que existiam, apesar de lecionar, às vezes de forma parecida com algumas das práticas didáticas mostradas nos cursos, isso era apenas “instinto de professor”. Com as práticas didáticas que passamos a conhecer, fez com que nós, professores, realizássemos uma retro análise e alterássemos nossas práticas de ensino (P13).

Para Almeida e Pimenta (2011, p. 23-24), o professor universitário precisa atuar de forma reflexiva, crítica e competente no exercício de sua prática docente, explicando o sentido de sua disciplina, o seu significado e a sua contribuição no processo de formação dos seus estudantes e no projeto político-pedagógico do curso, onde se encontra vinculada.

Desse modo, percebemos a relevância da reflexão a respeito da prática docente que está sendo realizada em sala de aula, pois cabe a cada docente refletir se a prática exercida por este está atingindo os objetivos por ele planejados, se está cumprido às finalidades da educação superior e se está auxiliando na formação (humana e profissional) dos seus discentes.

Além disso, sete dos treze professores, participantes dessa entrevista, afirmaram que a participação nessa formação continuada, trouxe mudança em sua prática docente, que era

limitada a algumas técnicas de ensino, sem problematização e participação dos alunos; conforme as seguintes declarações:

Eu era muito limitada a dar aulas expositivas, tipo palestras, então, agora eu tento diversificar ao máximo as atividades e pensar em atividades que possam, de fato, contribuir para um melhor entendimento dos alunos (P1).

Mudou a forma de eu pensar a sala de aula. Eu sabia que existiam técnicas, eu poderia usar a televisão, eu poderia usar o vídeo, eu poderia usar um texto, eu poderia usar um estudo dirigido, eu poderia usar um questionário, uma leitura, né; eu sabia que existiam essas diversas técnicas, mas é... Eu não tinha uma visão direcionada a problematização. [...] a minha visão era limitada nesse sentido, e aí, mudou; sim mudou, a partir do momento que eu pude ver e pude entender – isso não é completo, claro, ainda continuo com as minhas limitações – mas, que o conteúdo pode ser problematizado de determinadas formas, que o aluno também pode participar e aprender aquele conteúdo, sem ser apenas uma aula expositiva, naquele eu sei e te entrego ou você apenas lê um texto e apresenta esse texto; então, é nesse sentido (P2).

Então, acho que isso me fez despertar e ser mais compreensível, entendeu? Procurar buscar caminhos mais alternativos para esse... Para essa passagem desse possível conhecimento que eu tenho que passar, entendeu? (P4).

[...] é um espaço muito importante, eu acho para discussão e para se repensar ideias principalmente na prática pedagógica. Assim, eu acho que foi muito bom (P6). Olha, eu acho que eu consegui assimilar alguma coisa e... O retorno disso eu vejo nos próprios alunos, não é? (P7).

[...] eu aprendi que uma aula não tem que ser uma palestra: só o professor fala e os alunos ouvem. Tem que ter um diálogo, tem que ter uma reciprocidade, uma troca de... De informações. E ao longo... Depois que eu passei lá no curso, no NUFOPE, ah... A gente também vai tentando melhorar a nossa aula a partir da experiência que a gente tem em sala de aula, né? [...] Antes a minha aula era mais um monólogo, agora é menos, eu faço muito mais perguntas aos alunos para eles interagirem durante a aula e para eu sentir também se eles estão absorvendo o que eu tento passar para eles. No final do semestre eu converso com os alunos para ver como é que eu posso melhorar nas minhas aulas para o semestre seguinte. Eu tento sempre buscar esse feedback deles para melhorar nos próximos semestres, que é uma melhora contínua não adianta fazer o curso, melhorar e depois se estagnar, tem que sempre buscar melhorar (P8).

Eu nunca me senti, em nenhuma instância da docência universitária, incentivado a melhorar a minha prática pedagógica, eu acho que ali, no curso, é que isso me foi proporcionado pela primeira vez e assim, não de uma maneira autodidata, mas sim de uma maneira sistematizada e organizada (P9).

De acordo com Veiga (2008b), os docentes tem que estar dispostos a realizarem mudanças em suas rotinas pedagógicas e nos seus procedimentos didáticos, questionando os seus próprios saberes e os saberes do ensino de modo geral; objetivando assim, romper com a visão conservadora de ciência e a fragmentação do conhecimento, refletir sobre a relação existente entre teoria e prática e analisar os processos de avaliação que devem deixar de ser classificatórios e punitivos para serem processuais.

Ou seja, os professores precisam estar sempre dispostos a refletirem e a mudarem a sua prática pedagógica, rompendo assim, a visão conservadora de docência, a qual afirma que cabe ao professor (visto como o detentor do conhecimento a ser ensinado) repassar o conhecimento a seus alunos (percebidos como receptáculos vazios, prontos a receber as informações lançadas pelo professor) por meio de um monólogo em uma aula expositiva.

Outro aspecto destacado por três docentes entrevistados foi que essa formação continuada, oferecida para eles, possibilitou-lhes compreender melhor os seus discentes, visto que estes passaram a observar o grupo, no qual estavam trabalhando, e assim puderam compreender as dificuldades que estes apresentavam, o que mais lhe estimulavam, enfim, a realidade que eles viviam; o que observamos nas falas seguintes:

[...] eu tento mais, colocar-me na figura do aluno, e tentar entender o que é que dificulta o entendimento de algo (que para mim é tão claro), e que muitas vezes fica difícil de você enxergar as dificuldades e poder arrumar uma solução e outra forma de tentar passar aquele conhecimento, intermediar a construção daquele conhecimento (P1).

Então assim, a experiência [...] me fez repensar uma série de coisas, né, sobre como é que eu posso... Principalmente, como é que posso estimular mais os meus alunos. [...] O que faz me ver diferente agora, é que talvez eu... Eu... Entenda melhor os meus alunos. No sentido, que assim, eu achava que eles tinham a obrigação de gostar daquilo que eu estava ensinando, não é? De que eles estavam aqui e tinham a obrigação de formar... e hoje, eu tenho um olhar um pouco assim... Assim... Solto... Não digo solto, a palavra exatamente, mas é... Eu procuro entender mais o lado deles, né? (P4).

Acho que a minha própria relação com os alunos melhorou, não no sentido de ser bonzinho ou malzinho, não é dessas coisas que eu estou falando. É no sentido de você tentar compreender as realidades que são muito diferentes da minha e tentar... É... Compartilhar uma realidade que é diferente da deles (P10).

A partir disso, podemos afirmar que compreender os alunos é parte importante no processo educacional, pois este é um sujeito atuante no processo de ensino e aprendizagem, já que ocupa um espaço pedagógico, na concepção de educação formativa (voltada para o processo de formação e emancipação humana). (VEIGA, 2008b, p. 289).

Durante as nossas entrevistas, também pudemos verificar que a formação continuada trouxe, aos professores participantes, mudança nos seus planejamentos; influenciando na maneira como eles organizam as suas aulas, os seus trabalhos e os seus planos de ensino; o que percebemos a partir das falas abaixo listadas:

Influenciou, principalmente, na forma de que... É... Eu estruturo, eu planejo a minha aula. Isso mudou [...] A forma de eu ver e de constituir o meu plano de ensino mudou, não é? [...] Então, naquele momento em que nós... É... Pudemos assim, sentarmos e discutirmos os nossos planos de ensino, foi crucial para que eu pudesse

rever a forma como eu estava planejando as minhas aulas, as técnicas que eu estava utilizando para transmitir ou problematizar aquele conteúdo, não é? Isso foi muito bom (P2).

Eu modifiquei a minha forma de... O meu planejamento de aulas. [...] Ajudou-me muito também a organizar os meus trabalhos, organizar meus planos de ensino, meus planos de aula... (P5).

[...] Acho que melhorou o meu planejamento [...] Eu acho que no meu plano de ensino, também houve uma melhoria, eu tento detalhar melhor, eu tento deixar mais claro aos alunos quais são os caminhos que são necessários trilhar para a gente... É... Para a gente aprender coletivamente, não só cumprir o conteúdo programático – que também faz parte, não é? – mas, cumprir de certa forma prazerosa, e que ele encontre elementos que o ajudem nas suas atividades, na sua realidade seja ela profissional ou pessoal (P10).

Sobre isso Veiga (2008b, p.268) defende que “a organização de um processo tão complexo como a aula não pode resultar de um movimento mecânico e simplista.”. Pois, a aula não pode ser vista como um receituário ou como uma ação improvisada, já que as situações complexas não apresentam soluções uniformes que podem ser repassadas de uma pessoa para outra; ou seja, elas requerem uma atitude profissional, bem estruturada, que possa responder cada uma de suas situações particulares. Para isso, o professor necessita realizar um trabalho criativo e responsável.

Pois, a organização da aula tem como objetivo evitar a improvisação das tarefas docentes, visto que toda atividade pedagógica tem sua finalidade, e esta deve estar articulada com o projeto político-pedagógico da instituição na qual se educa e, mais especificamente, com o projeto pedagógico do curso, em questão (VEIGA, 2008b).

Desse modo, podemos perceber que os professores passaram a compreender a importância de se realizar o planejamento das atividades a serem executadas durante as aulas, deixando mais claro, a seus alunos, as ações que serão realizadas e a finalidade de cada uma delas.

Além dessas implicações da formação continuada didático-pedagógica, citadas anteriormente, quatro dos docentes entrevistados revelaram também que a participação nessa formação, proporcionou-lhes conhecer melhor a universidade, mais especificamente, outras

áreas de conhecimento; conforme as seguintes afirmações:

[...] foi uma coisa que me fez, por incrível que pareça, conhecer melhor a universidade. Porque naquele curso, foram dois cursos que eu fiz, naqueles cursos eu me deparei com realidades que eu nunca tinha me deparado aqui na universidade (P3).

veja, foi muito bom ter um curso onde você conversasse com pessoas de outras áreas [...] E os encontros foram bons para a gente ouvir é... Como é o dia-a-dia das outras

áreas. [...] e a gente começar a pensar em trazer isso para um pouco do dia-a-dia da gente [...] (P6).

eu fiz tudo o que existia lá, todo o viés, apareceu um curso sou voluntário, sou voluntário para tudo, não é? Até que eu esgotei o que existia, fiz muitas amizades lá, dei-me muito bem, conheci bastante gente e... Eu acho que eles estão no caminho certo, tentar suprir essa necessidade [...] (P7).

o fato de o curso agregar professores oriundos de diferentes áreas/realidades é, também, bastante positivo. A formação da qual participei foi importante nesse aspecto da troca de experiência [...] (P12).

Como podemos ver, essa formação proporcionou uma interação de professores de diversas áreas de conhecimento, que passaram a entender outras realidades diferentes daquela vivenciada em seu curso ou departamento; permitindo assim, que esses docentes trocassem experiências e que eles se integrassem — reconhecendo em áreas de diferentes conhecimentos, semelhanças e diferenças, e ampliando a visão fragmentada que alguns professores universitários possuem, de só enxergarem o seu grupo e o seu departamento; restringindo toda universidade a essa percepção.

Pois, de acordo com Pimenta e Anastasiou (2011), para desenvolver a docência universitária, é essencial realizar um diagnóstico dos problemas presentes na instituição, para que assim, coletivamente, possa se discutir uma proposta a ser implantada. Nesse caso, é imprescindível que todos os sujeitos envolvidos nessa ação (independente de qual área estejam vinculados) discutam as questões centrais a serem trabalhadas.

Nesse caso, podemos perceber a relevância de se conhecer e de se integrar a universidade como todo, pois, desse modo, compreendendo as diversas situações e os diversos problemas enfrentados nesse meio, os professores tornam-se mais participativos e atuantes na busca de soluções para os desafios identificados coletivamente.

Por fim, destacamos, também, que o processo de formação continuada vivenciado por nossos sujeitos de pesquisa trouxe como consequência a mudança no processo de avaliação

vivenciado pelos participantes da pesquisa, que deixou de ser realizada em apenas um

momento e de uma única maneira, para ser percebida como um processo ao longo de um período; conforme o exemplo abaixo:

hoje, eu vislumbro várias formas de avaliar o meu aluno, não é? É... e não apenas aquela questão da palavra prova... escrita, para avaliar o seu conhecimento. Eu acho que a gente acaba encontrando outras formas, outras maneiras de avaliar o conhecimento que você passa para o aluno e aquilo que ele mostra para você em reciprocidade (P3).

A respeito disso, Veiga (2008b, p. 288), defende a ideia de que, “a avaliação deve se colocar na concepção integrada de ensino e de aprendizagem, visto que ela não se restringe a um simples instrumento de mensuração ou uma atividade isolada da ação educativa.”. Pois, ela deve ser percebida como uma articulação entre o trabalho pedagógico e curricular (estruturado pelos docentes) e a ação mobilizadora do processo de ensino e de aprendizagem (realizada pelos docentes e discentes em sala de aula).

Pois, o mecanismo de avaliação deve abranger processos complexos do pensamento, motivando os alunos para a resolução de problemas; dessa forma, é necessário propiciar avaliações mais abertas, utilizando vários procedimentos e instrumentos para coleta de informação, e assim, analisar de forma sistemática as informações obtidas (VEIGA, 2008b).

De modo geral, podemos inferir que a formação continuada didático-pedagógica vivenciada por nossos entrevistados, permitiu a estes professores refletirem sobre as ações que estavam sendo executadas, por eles, em sala de aula; ocasionando assim, mudanças em sua prática docente (na maneira de entender seus discentes, na mudança da avaliação e no planejamento) e um melhor conhecimento da organização e das diversas áreas de conhecimento que compõe a universidade.