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No tocante à Bahia, os dados revelam também, a prevalência deles no comércio: ―Na

4.8. IMIGRANTE PORTUGUÊS: UM BENFEITOR

Em 1850, é instalado o Gabinete Português de Leitura e, cinco anos mais tarde, é inaugurado, pelos mesmos portugueses homens de projeção e notoriedade na sociedade, o Real Hospital Português de Beneficência de Pernambuco no Recife. O discurso de inauguração do Gabinete Português de Leitura proferido pelo médico português, homeopata viajado, formado em Lisboa e profissional na cidade do Rio de Janeiro, Dr. João Vicente Martins, seu primeiro presidente, revela a pregação da estratégia de harmonia e da integração dos lusitanos, consoante epígrafe referida anteriormente.

Possa a instituição do Gabinete Português de Leitura ser uma demonstração bem clara dos sentimentos de

fraternal amizade que unem os portugueses com os brasileiros

que muitas instituições como este Gabinete pacíficas,

morigeradoras e de caridade sejam estabelecidas. (apud

AREIAS E NOGUEIRA, 2000, p.14, grifo nosso).

Já o Real Hospital Português de Beneficência, idéia nascida no espaço do Gabinete, foi uma instituição de muito maior visibilidade e penetração no simbólico da sociedade pernambucana, mesmo sendo um hospital destinado primeiramente aos imigrantes, ele foi, também, ofertado à sociedade local, oficialmente, em carta dirigida ao presidente da Província.

Seu objetivo declarado foi o de ajudar a comunidade a enfrentar o sério problema da epidemia da cólera que acabara de chegar ao

70 Quando se menciona a palavra instituição, o propósito deliberado é o de

acentuar as características organizacionais dos entes a serem analisados a seguir. O importante é enfatizar que no plano das criaturas organizacionais uma instituição não sobrevive do lucro ou da contraprestação de serviços, mediante uma remuneração. Na verdade, as instituições enquadram-se na caracterização teórica formulada por Pereira e Fonseca: “As instituições são organizações que incorporam normas e valores

considerados valiosos para seus membros e para a sociedade. São organismos vivos, produtos de necessidade de pressões sociais valorizadas pelos seus membros e pelo ambiente. Portadores de identidade própria, preocupados não apenas com lucros e resultados, mas com sua sobrevivência e perenidade. Uma instituição é guiada por um claro senso de missão‖. (1997, p.97).

Pará, à Bahia e fatalmente chegaria ao Recife. Com essa iniciativa, todavia, os portugueses reduziram ou mitigaram, em muito, a rejeição ou as hostilidades contra eles. No mínimo, em relação àquelas expressas pelas autoridades, pela elite e pelos meios de comunicação da época, que, em certo sentido, foram cooptados pelos lusos. A instalação deu-se em tempo recorde, entre os dias 9 de setembro de 1855, data da constituição da comissão71 para arrecadar fundos dos patrícios e, no dia 21 do mesmo mês, houve a solene inauguração, sendo efetivamente, posto em funcionamento no dia 25 de novembro do mesmo ano.

Sobre a celeridade, algumas observações.

Por um lado, havia a epidemia da cólera a se alastrar na província e, sem dúvida, deveria alcançar os patrícios, logo, tal ameaça exigiria providências urgentes, mas em outras circunstâncias ou mesmo sobre outras matérias, a mobilização não passara de pressão sobre as autoridades, veja-se o caso das necessidades do porto da cidade e a ação da Associação Comercial, basicamente de caráter retórico. Por outro, salta à vista a capacidade de mobilização da comunidade a indicar espírito gregário e de solidariedade. 72

Com o passar do tempo e o desaparecimento da cólera73, a iniciativa e concretização não esmoreceram os ânimos, todavia. Em novembro do ano seguinte, isto é, num intervalo de 12 meses, um novo hospital, com o fito de servir à comunidade lusitana, é adaptado em casas adquiridas para esse fim, sendo finalmente aberto ao público no dia 22, a demonstrar, mais uma vez, a robustez da poupança dos portugueses. A rápida adesão financeira à iniciativa, revela que eles estariam em condições tão boas que dispuseram de poupança para realizar um investimento dessa envergadura, na velocidade necessária.

71 A comissão foi integrada por 40 pessoas escolhidas para obter subscrições de

recursos nos principais bairros comerciais de então: Recife, Santo Antônio, Boa Vista e São José. p.2. In, Jubileu do Hospital Português de Beneficência em Pernambuco. Recife: Imprensa Industryal, 1905.

72 Esse é um tema relevante na investigação em curso e a literatura da matéria é

vasta e controvertida. NIZZA DA SILVA (1992) advoga ser uma característica forte na migração o associativismo, identificando-a em todas as etnias migratórias para o Brasil. No mesmo rumo, LOBO (2001) discute o tema, rechaça a posição de Buarque de Holanda que vê no luso individualismo, e ao mesmo tempo, endossa a posição de Freyre cuja interpretação é favorável a uma visão de solidariedade do povo português.

73 A cidade do Recife, como de resto muitas do período, sofreu severas dificuldades

com a convivência de epidemias que atingiam a população. Somente na segunda metade do século XIX ocorreram as seguintes epidemias: 1 de varíola com 2.204 mortes, 3 de febre amarela, 1 sarampo, 1 influenza, 1 de desinteira com 2.886 óbitos e a gripe espanhola com 1.783 óbitos registrados. (MELO, 1985).

Retornando à questão econômica e empresarial, vale assinalar que, em virtude da necessidade de novos investimentos no açúcar, no algodão, nas indústrias têxteis futuras e na infra-estrutura da cidade somente volume de capitais mais robustos seriam capazes de financiá-los. Logo, logo, os bancos ingleses e outras empresas européias iriam assumir ou participar desses riscos ao lado dos governos e, nesse sentido, tiveram a oportunidade de realizar obras estruturadoras no país e na cidade do Recife.

A expressão econômica e financeira dos lusitanos, porém, suficiente para mobilizações daquela feita para a construção do hospital, não ultrapassava, em sua grande maioria, as atividades mercantis, tanto no varejo como na de grosso cabedal e na esfera das trocas internacionais, nacionais e locais.

O capítulo seguinte, número de ordem V, aprofunda o conteúdo da presença dos lusos sob o ponto de vista da cultura empresarial.

CAPÍTULO V

O SANGUE LUSO QUE CORRE NA