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CAPÍTULO II A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL

II. 1.3 – Implicações para o caso brasileiro

Embora a relação dívida / PIB seja muito menor no Brasil do que nos países analisados, o reduzido prazo médio da dívida torna a questão da solvência da mesma uma questão crucial, dado o grande volume de rolagem da dívida a cada período. A questão da solvência passa a ser relevante quando os agentes começam a imaginar que o governo poderá não ser capaz de honrar vencimentos futuros da dívida e passam a não adquirir mais títulos públicos nos leilões.

Contribui para esta percepção, no caso brasileiro, o fato de que nunca houve preocupação, em governos anteriores, com a questão fiscal, de forma que o compromisso público com a austeridade fiscal recebe credibilidade reduzida.

A experiência brasileira não se encaixa a nenhum dos casos dos países citados na seção anterior no que diz respeito às causas da elevação nos níveis de endividamento. Entretanto, do ponto de vista macroeconômico, as conseqüências sobre a economia de cada um dos países pode servir como exemplo para o que pode ser realizado no caso brasileiro.

Das saídas mencionadas acima, pode-se argumentar que todas apresentam obstáculos. Em primeiro lugar, a hipótese de repúdio à dívida deve ser descartada de imediato, devido a alguns fatores:

1) Embora a razão dívida/PIB tenha se elevado consideravelmente nos últimos anos, seu percentual é ainda bastante inferior ao dos casos analisados aqui, de forma que esta saída, pelas conseqüências que gera, seria a última a ser considerada;

2) Esta solução pressupõe que o governo não mais necessitará se financiar no futuro, o que, a despeito dos significativos superávits primários obtidos recentemente, não pode ser considerada como hipótese de trabalho.

A literatura argumenta que há casos em que um repúdio será “desculpável”, como no caso dos países acima, em que a hipótese de envolvimento em guerras fazia com que, na contratação na dívida, esta hipótese já estivesse implícita no contrato, ou dívida acumulada ao longo do tempo em contraposição à dívida acumulada por conta de circunstâncias especiais.

A hipótese de “capital levy” enfrenta as mesmas críticas que a hipótese de repúdio, na medida em que representam uma mudança repentina nas regras do jogo, não estando dentro das hipóteses aceitáveis pela sociedade brasileira.

No que se refere à experiência alemã, em que a redução do estoque real de dívida foi obtido por meio de elevadas taxas de inflação, esta saída seria absolutamente inócua no caso brasileiro, dada a estrutura de curto prazo da dívida e, em especial, sua

composição, bastante sensível às taxas de curto prazo, que refletem imediatamente os efeitos das expectativas sobre as taxas futuras de inflação.

Ainda, é importante lembrar que, para o caso brasileiro, o desenvolvimento institucional foi tal que o financiamento monetário dos déficits é virtualmente impossível, dada a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n.º 101, de maio/2000). Desta forma, déficits fiscais (ou a própria rolagem da dívida) devem ser necessariamente financiados por novas emissões de títulos.

Por fim, a hipótese tradicional, qual seja, a de gerar superávits primários significativos e persistentes já vem sendo seguida pelo governo brasileiro. Entretanto, as elevada taxas reais de juros pagas para a rolagem dos títulos públicos têm suplantado os ganhos fiscais obtidos com a redução dos gastos, havendo pouco espaço para aprofundamentos do ajuste fiscal.

Obviamente, não há solução pronta para a questão do endividamento, mas apenas um conjunto de opções que apresentam custos e benefícios para os diversos setores da sociedade.

Enquanto na literatura há quem argumente que alguns dos países mencionados acima viveram crises de refinanciamento causadas pela rigidez nas taxas de juros aceitas pelo governo para os títulos públicos, no caso do Brasil pode-se imaginar situação em que ocorra o argumento inverso, ou seja, a flexibilidade das taxas de juros gera um círculo vicioso no qual a dívida só é rolada a taxas de juros maiores, o que por sua vez, aumenta o estoque da dívida e gera novos receios de incapacidade futura de refinanciamento, gerando maiores dificuldades na colocação de novos papéis, o que só é feito via aumento de taxas de juros e assim sucessivamente.

Em suma, as soluções podem ser sumariadas da seguinte forma: um default explícito ou alongamento compulsório da dívida apresenta riscos de perda da credibilidade futura e conseqüente perda da capacidade de obter novos financiamentos. A implantação de um

Capital levy apresenta riscos de fuga de capital, perda de credibilidade do governo com

políticas futuras e conseqüente desestímulo à poupança. Além disso, a experiência internacional mostra que é de difícil implementação prática, em especial em governos

democráticos. Para o caso brasileiro, a inflação por si só não resolveria, dada a composição da dívida, em sua grande parte indexada (LFT ou NTN-C e NTN-D) ou de curtíssimo prazo (LTN).

Assim, a solução parece estar mais para o “modelo norte-americano” buscando-se a disciplina fiscal, aliada ao crescimento da economia, viabilizado por taxas de inflação menos rígidas. Ainda, e segundo o modelo de Alesina, esta solução de consenso poderia de fato recair sobre algo como a experiência daquele país, onde um pouco mais de inflação viabilizou taxas mais elevadas de crescimento econômico, e em conseqüência, redução da relação Dívida-Produto. No caso brasileiro, esta solução tem a vantagem de agradar a todos os grupos da sociedade, na medida em que a estrutura da dívida brasileira imuniza os credores de perdas com a inflação.