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A improvisação aproveita o divertimento do Jogo para desenvolvimento da consciência criativa.

! Como ocorrem os processos de improvisação e quais são as suas implicações nos processos de aprendizagem em contexto

D) COMO SABER COM O SE ESTÁ A LIDAR?

6.4 J OGO COMO BASE DE PARTIDA PARA A IMPROVISAÇÃO COLECTIVA

6.4.1 A improvisação aproveita o divertimento do Jogo para desenvolvimento da consciência criativa.

A improvisação, a composição, a literatura, a pintura, o teatro, a invenção, todos os actos criativos são formas de divertimento. Carl Jung diz-nos no seu livro “O Homem e os seus símbolos” que: A criação do novo não é conquista do intelecto mas do instinto de prazer agindo por uma necessidade interior. Segundo ele a mente criativa brinca com os objectos que ama, (Jung 1961, Franz 1964)

O ponto de partida da criatividade no ciclo de desenvolvimento humano é uma das funções vitais básicas. Sem divertimento, a aprendizagem e a evolução são impossíveis (Hallam e Ingold 2007).

O divertimento é a raiz de onde jorra a arte original; é o material bruto que o artista canaliza e organiza com as ferramentas do conhecimento e da técnica. A própria técnica nasce da diversão, porque não podemos adquirir técnica apenas por meio do exercício da prática repetida, da insistente experimentação e utilização de nossas ferramentas, num teste contínuo aos limites de resistência (Nachmanovitch, 1993).

Improvisar não significa criar “um monte de coisas” sem participar do que se está fazendo. Improvisar é ouvir e ver verdadeiramente, apropriando-se criticamente do que se faz. Neste jogo permanente de criação não existe certo e errado, pois estamos convivendo com a sensibilidade, com o humano. O que existem são diferentes possibilidades a serem experimentadas pelos diferentes participantes.

A brincadeira é um acto natural nos mamíferos superiores, e exacerbada nos macacos e chimpanzés. Entre os humanos, como demonstra Johan Huizinga no seu livro “Homo Ludens: um estudo sabre o elemento diversão na cultura”, o divertimento intervém em todas as facetas de nossa vida e tem assumido as mais diversas formas,

algumas altamente evoluídas, como o ritual, as artes, a política, o desporto e a própria civilização.

“Mas quando se alcança a diversão", escreve Huizinga (1999), “ adquire-se compreensão, porque onde há diversão não existem problemas.”

O enunciado principal da obra “Homo ludens” é a de que o jogo é uma realidade originária, que corresponde a uma das noções mais primitivas e profundamente enraizadas em toda a realidade humana, sendo do jogo que nasce a cultura, sob a forma de ritual e de sagrado, de linguagem e de poesia, permanecendo subjacente em todas as artes de expressão e competição, inclusive nas artes do pensamento e do discurso, bem como na do tribunal judicial, na acusação e na defesa polémica, portanto, também na do combate e na da guerra em geral.

A noção de jogo – segundo a contribuição de Huizinga (1999) no livro acima indicado – é mais primitiva do que a cultura, pois faz parte daquelas coisas que o homem partilha em comum com os animais. O jogo é de facto mais antigo que a cultura, pois esta, mesmo nas suas definições mais rigorosas, pressupõe sempre a sociedade humana; mas, os animais não esperaram que os homens os iniciassem na actividade lúdica (Huizinga,1999 p.3).

Para Nachmanovitch (1993), o divertimento desafia hierarquias sociais. Juntando elementos que anteriormente estavam separados. As nossas acções tomam caminhos inusitados. Brincar é libertar-se de restrições arbitrárias e expandir o próprio campo de acção. A brincadeira possibilita uma maior riqueza de reacções e melhora a nossa capacidade de adaptação. Esse é o valor evolucionário da diversão — ela torna-nos mais flexíveis. Ao reinterpretar a realidade e criar coisas novas, protegemo-nos contra a rigidez. A brincadeira permite-nos reorganizar as nossas capacidades e a nossa verdadeira identidade para que possamos utilizá-las de formas inesperadas.

Mas para Nachmanovitch, “brincar” é diferente de “jogar”. Brincar é ter o espírito livre para explorar, ser e fazer por puro prazer. O jogo, por sua vez, é uma actividade definida por um conjunto de regras, como no futebol, na composição de um soneto, de uma sinfonia ou na diplomacia. A brincadeira é uma atitude, uma disposição, uma

maneira de fazer as coisas, ao passo que o jogo é uma actividade definida por regras e que depende de um campo de aplicação, de regras e de jogadores.

Por outro lado Johan Huizinga constata que:

O jogo transporta-nos para além das regras da lógica quotidiana, um mundo onde reina algo diferente da claridade do dia. O mundo selvagem, da criança e do poeta, o mundo do jogo. [...] Por detrás de toda expressão abstracta oculta-se uma metáfora, e toda metáfora é um jogo de palavras. Assim, ao dar expressão à vida, o homem cria um outro mundo, um mundo poético, ao lado do da natureza (Huizinga, 1999, p.7). Para Huizinga, outras características naturais do jogo são a excitação e a fascinação. O seu poder de fascinação pode ser analisado pelas suas manifestações mesmo fisiológicas: de um lado, a fascinação tem capacidade de excitar e invadir a intensidade psicológica do homem; por outro lado, há raízes biológicas para esse sentimento. Portanto, estão explícitos no jogo dois planos em que se coloca nele o que se experiencia pelos humanos. Um no plano subjectivo, do sentimento individual ou colectivo, com raízes biológicas, na natureza, mas que se efectivam no plano da alma humana, e o outro que podemos chamar de plano objectivo, o da cultura.

No jogo, a consciência criativa está no saber lidar com os momentos de imprevisibilidade e de surpresa do que vai acontecer nas improvisações, aí está o potencial lúdico, o desafio ao corpo em mover-se na direcção do novo; onde não há pontos de apoio, sem recorrer aos procedimentos habituais, permanecendo aberto à incerteza do momento presente pois, como diz Nachmanovitch “à medida em que nos sentimos seguros do que vai acontecer, trancamos as possibilidades futuras e defendemo-nos contra as surpresas essenciais” (Nachmanovitch, 1993, p.30).

Os momentos de imprevisibilidade sobre o que vai acontecer no jogo, estabelecem o potencial lúdico de encontros criativos, do aprender a encontrar soluções e lidar com sua criatividade de forma consciente. “Improvisar é aceitar, a cada respiração, a transitoriedade e a eternidade” (Nachmanovitch, 1993, p.30). É no mistério contido em cada momento da improvisação que está a aventura para novas criatividades, para o desenvolvimento da consciência criativa de si e em relação ao meio.

Cabe lembrar que a cooperação não é um estado, uma situação estável, um estágio estático que, depois de ser alcançado, já é elemento pronto, existente organicamente no trabalho. É uma situação dinâmica, que depende de uma série de elementos e da relação

do sujeito com o meio. Depende também, de como o sujeito constrói essa interacção pensando também pela relação que cada colega do grupo estabelece com o jogo, se esta estará garantida e se será satisfatória, permitindo que se identifique e se encontre caminhos para o mesmo.

Quando a improvisação é colectiva, ela emerge da relação que cada participante tem com a linguagem e meio que está a utilizar e de como esses sujeitos constroem o diálogo entre as diferentes formas de conceber o fazer artístico. Quando dois ou mais artistas estão improvisando, precisam de compreender e se fazer entender um pelo outro, para que o jogo ocorra. Mas como estabelecer esta comunicação se, como já foi visto, cada participante constrói diferentemente o seu trabalho?

A construção de um jogo colectivo que envolve as características individuais de cada um depende da construção de estruturas (físicas e mentais), no plano das relações sociais. Nessa situação é preciso coordenar as acções, não a partir de um único ponto de vista particular, mas procurar compreender o ponto de vista dos demais participantes do jogo. É preciso conhecer como cada participante se relaciona com a linguagem do teatro e construir caminhos comuns que possibilitem o entendimento e a comunicação durante improvisação.

O jogo surge, ao nível da cooperação, não só das trocas inter-individuais, mas como resultado de um processo que ocorre como um todo. O fazer criativo acontece nas relações que o artista consegue construir entre real e imaginário, nas trocas de diferentes pontos de vista que acrescentam e transformam as relações uns dos outros e no total envolvimento com o jogo, que possibilita estar atento e interagir com o material existente, com os colegas, o espaço aonde o jogo é delineado, a linguagem utilizada para esse fim e como juntos constroem esse diálogo. Evitando, assim, impor a sua vontade ou submeter-se à vontade dos outros, mas encontrando uma linguagem e uma estrutura comum a todos para que o jogo aconteça. Tendo consciência da necessidade de se estabelecer um jogo cooperativo, o participante possui instrumentos que lhe permitem perceber os problemas na improvisação e buscar soluções adequadas ao momento. Compreender o significado da cooperação na improvisação em grupo não garante necessariamente que o jogo esteja garantido e que será satisfatório, mas permite que se identifique e encontre caminhos para o mesmo.

Os Jogos de Improviso transcendem os limites do teatro para outras áreas da vivência humana, como os da Psicoterapia e da Educação (Chacra, 2007). Para Spolin (2006) todas as pessoas são capazes de improvisar, aprendendo através da experiência e da vivência no jogo.

As questões ligadas ao jogo como ponto de partida para a improvisação são comuns e transversais a todas as expressões das artes e é a partir dele que se procura enunciar aqui algumas hipóteses de jogos recorrendo a premissas comuns e fáceis de ser aplicadas a um conjunto alargado de participantes oriundos de diversas áreas das expressões artísticas.

Usando, portanto as variáveis e acções (abaixo descritas) poder-se-á criar inúmeros fluxos e jogos, orientando a criação ao dinamismo de cada participante ou a que for definida pelo grupo, permitindo que o jogador saia da rigidez de uma composição pré construída na qual ele não pode opinar. Com estes jogos, os participantes podem influenciar a composição, a forma e o feeling de cada sessão, podendo tomar decisões e seguir caminhos de forma informal e democrática.

6.4.2 Alguns exemplos de possibilidades de jogos e de interacções:

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