• Nenhum resultado encontrado

INCLUSÃO E PARTICIPAÇÃO DA PESSOA IDOSA NA DEFINIÇÃO DE POLÍTICAS DE

SAÚDE

A literatura enfatiza que a tendência demográfica regional converge para um cenário de envelhecimento associado a uma alteração do perfil epidemiológico (LEE, 2003; WHO, 2012), dominado nos países de rendimento médio e elevado por patologias crónico-degenerativas pelo que, para além da gestão da cronicidade da doença nos idosos, importa dilatar a sua capacidade funcional, condição essencial para potenciar a sua autonomia. Deve reconhecer-se que o perfil de competências dos idosos, nas sociedades desenvolvidas, sofreu uma progressiva modificação. Os baby boomer (1946- 1964) dos países mais ricos, beneficiaram de maiores e melhores oportunidades de escolarização quando comparados com a geração anterior. Conquistaram o direito de acesso ao desenvolvimento de uma carreira e proteção social, incluindo competências digitais que envolvem a utilização de tecnologias de informação e comunicação (Figura 4).

Conjugadamente, estas evidências sustentam a existência de novos perfis de idosos que podem e devem ser consideradas no sentido de ampliar e melhor aproveitar as suas competências em saúde, bem como o modo de lidar com a incapacidade severa, cuja prevalência tem diminuído nos países de rendimento elevado. O contexto de gestão da saúde e da doença, o modo de acesso dos utilizadores aos cuidados prestados, bem como o perfil de serviços, deverão ter em conta estes novos encadeamentos, ajustando-se. Todavia, tal como reconhece o Relatório

134

Figura 4 – Utilizadores de internet entre os 65–74 anos (% da população).

Fonte: OCDE, 2016. Organização: NOSSA, 2016.

Mundial de Envelhecimento e Saúde (WHO, 2015), apesar de prévias e reiteradas recomendações, formuladas principalmente através do Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento (WHO, Madrid, 2002), e do relatório – Active ageing: a

policy framework (WHO, 2002), onde se procuravam

instituir trajetórias positivas para o envelhecimento, persiste uma evidente necessidade de ajustamento e adaptação dos sistemas de saúde a estes novos cenários:

Ainda que comportamentos pouco saudáveis sejam prevalentes entre pessoas idosas, os sistemas de saúde estão desalinhados face às necessidades destas populações, em muitas partes do mundo é inseguro ou é mesmo impraticável para um idoso deixar a sua casa, muitas vezes os seus cuidadores são pouco qualificados, pelo menos 1 em cada 10 pessoas mais velhas é vítima de alguma forma de abuso (…).

135

Numa revisão recente dos progressos globais observados desde 2002, envolvendo 130 países (UNPF, 2011), verifica-se uma baixa prioridade das políticas de saúde face aos desafios da transição demográfica; existem baixos níveis de treino e formação em geriatria e gerontologia entre os profissionais e saúde apesar do número crescente de idosos, os cuidados e o apoio aos cuidadores… não constituem um foco prioritário de ação sobre o envelhecimento. (WHO, 2015, p. 4. Tradução livre).

Para além das barreiras físicas existentes no acesso aos cuidados de saúde (ENSOR; COOPER, 2004. PEREIRA; FURTADO, 2010), maioritariamente relacionadas com o progressivo declínio funcional dos mais idosos, deve também discutir-se a existência de barreiras de procedimento e de comunicação que muitas vezes configuram práticas de idadismo, enquadradas por atitudes paternalistas. De acordo com a WHO (2015, p. 91), em diferentes regiões do globo, as barreiras de acesso aos cuidados de saúde, envolvendo adultos idosos, são diversas e podem passar por dificuldades de transporte, impossibilidade de suportar o custo dos cuidados, mesmo em países de elevado rendimento ou, simplesmente, resultam de uma abordagem pouco empática, ampliada por preconceito e deficiente comunicação, pressupondo os relatos dos mais idosos como insuficientes ou pouco credíveis para que possam ser valorizados como doença, desencadeando nestes utilizadores a perceção de mau trato ou mesmo de indesejabilidade (Tabela 1).

Este tipo de avaliação reforça a ideia de que, por demasiado tempo, mantivemos o status quo das políticas e práticas em saúde moldadas por um paradigma de atuação paternalista, autoritário e curativo, conjugado com uma reforma insuficiente

136

dos cuidados de saúde, particularmente ao nível dos cuidados primários, pouco centrados nas alterações das necessidades evidenciadas pelo perfil demográfico das comunidades. Este cenário é ainda marcado por escassos recursos alocados à promoção e prevenção da saúde, consequência de um modelo de gestão centralizado e hierárquico (top-down) e que, em alguns países, como Portugal, permaneceu excessivamente centrado na doença e no cuidado hospitalar, onde as necessidades específicas de alguns grupos, entre os quais os mais idosos, podem receber atenção insuficiente.

Tabela 1 – Razões apresentadas por adultos (60+ anos) param não acederem aos serviços de saúde (por país e categoria de rendimento).

Fonte: WHO, 2015; p. 91 [dados obtidos num inquérito global: 2001-2004; WHO. Resultados com significância estatística (p<0,005)].

Autores como Sourdet et al. (2015) concretizam esta desconformidade através de uma avaliação realizada aos cuidados diferenciados prestados por hospitais franceses de grande dimensão. Estimam

137 que, no momento da alta hospitalar, 20% dos pacientes com ≥ 70 anos registam um declínio significativo na capacidade de execução tarefas básicas para o seu dia-a-dia, quando comparado com a data de internamento, admitindo-se a reversibilidade destas limitações em metade dos casos. Observa-se ainda que o declínio da capacidade funcional destes pacientes poderia ter sido evitada, sendo mesmo prevenível em 80% dos casos, através da adoção de programas alternativos orientados para uma adequada mobilização, compreensão e gestão das limitações já existentes nestes doentes.

De um modo sistemático, documentos estruturais sublinham a vantagem de adequação do perfil das políticas de saúde às novas necessidades (WHO, 2012; CRISP et al., 2014), menos focadas em políticas reativas/curativas, adotando estratégias mais comprometidas com uma saúde positiva, centradas na prevenção e promoção, atuando de forma tão precoce quanto possível sobre as trajetórias de vida dos sujeitos e das comunidades onde residem, antecipando condições potenciadoras de incapacidade, retardando ou mesmo revertendo o declínio de competências funcionais e intrínsecas. Deve notar-se que a generalidade dos países OCDE efetuou cortes na despesa global em saúde durante a crise económica internacional (2009-2013) e que, de forma preocupante e paradoxal, o decréscimo de investimento foi mais acentuado ao nível dos cuidados de longa duração, tendencialmente mais consumidos por adultos idosos, a par de uma redução ainda mais significativa do investimento alocado ao domínio da prevenção, com uma taxa de crescimento negativa neste intervalo de tempo (2009-2013; -0.3%), face ao valor de 5,6% verificado no quinquénio anterior (Figura 5).

138

Figura 5 – Crescimento per capita da despesa na saúde (Média OCDE, 2005-2013).

Fonte: OCDE – Health Statistics; 2015.

Sentindo necessidade de acrescentar operacionalidade e eficiência às políticas de saúde europeias, aproveitando os 25 anos de experiência do projeto Cidades Saudáveis, os decisores assumiram que a Fase VI (2014-2018) deveria aprofundar, à escala local, a estratégia de saúde e bem-estar - Saúde 2020, transformando a Rede de Cidades Saudáveis num veículo privilegiado para o desenvolvimento do que designaram por “diplomacia em saúde”, tendo a cidade como palco privilegiado de atuação (City

health diplomacy; WHO, 2013, p. 6), influenciando a

agenda e os decisores/parceiros locais de modo a que sejam adotadas estratégias proactivas e holísticas na concretização dos objetivos gerais da estratégia Saúde

139 2020: combater as desigualdades em saúde; melhorar a liderança e governação participativa em saúde.

Para a concretização destas metas, até 2018, a Rede de Cidades Saudáveis deverá desenvolver, com as comunidades, planos de ação locais subordinados aos 4 temas-chave de atuação: capacitação e investimento em saúde ao longo da vida; combater os principais desafios em saúde na Europa nos domínios das doenças crónicas e infeciosas; reforçar a atuação dos sistemas de saúde centrados nas pessoas, melhorar a capacidade de intervenção em saúde pública e na prevenção de situações de alerta e emergência; criar ambientes favoráveis e comunidades resilientes.

Importa, pois, repensar de que modo os cenários sociais e as culturas organizacionais devem modificar os procedimentos de resposta às necessidades de saúde das populações e, neste caso particular, as necessidades dos mais idosos, que não podem e não devem ser observados como um grupo homogéneo, permitindo e até mesmo estimulando a sua inclusão e participação na definição de políticas de saúde.

Sabe-se que as condições de trabalho, habitação e alimentação, bem como fatores comportamentais e psicossociais – designados por determinantes intermediários em saúde (CDSS, 2010), ainda que experienciados em fases precoces, impactam a saúde dos sujeitos no presente e fazem-se sentir os seus efeitos em idades mais avançadas. Por tal, o processo de capacitação em saúde, sempre que possível, deve ser objeto de uma abordagem precoce e sistemática, indo para além dos sujeitos de um modo individual, colocando o centro da ação na comunidade, tal como sugerido pela Carta de Ottawa (1986).

Motivos diversos, fundamentalmente relacionados com modelos de desenvolvimento

140

económico e social, acesso à escolarização, bem como hábitos culturais de participação, a par de um despertar tardio para a problemática do envelhecimento por parte dos decisores, contribuíram para que os processos de capacitação em saúde fossem, com atraso, percebidos como uma ferramenta imprescindível para a concretização de estratégias de envelhecimento ativo, orientados quase que exclusivamente para adultos seniores (65+ anos). Disto dá-nos conta GREEN (2012) numa revisão sobre estratégias desenvolvidas em cidades amigas dos idosos (age-friendly cities), defendendo a eficácia daquilo que designa por capacitação comunitária em

continuum, orientada para escalar competências e

soluções centradas na saúde, iniciadas pelos sujeitos de modo individual, em fases precoces, envolvendo progressivamente pequenos grupos com interesses comuns, organizações comunitárias, captando parceiros, culminando numa estruturação coletiva de ações com o poder de influenciar decisões e recursos importantes para a saúde e seus determinantes:

Ao ampliar a conscientização/capacitação das pessoas mais velhas as cidades evitam a ortodoxia de uma bomba-relógio demográfica, onde um número cada vez maior de pessoas idosas dependentes são um fardo para a economia e uma carga crescente nos serviços de saúde e de apoio social. (GREEN, 2012, p. S125).

Objetivamente, o reconhecimento da necessidade de um acréscimo de capacitação individual e comunitária orienta o debate para a pertinência dos processos de participação e governação em saúde que, como verificámos, estão explicitamente presente nos objetivos Saúde 2020. Como reconhecem Kickbusch; Gleicher (WHO, 2012,

141 p. 4), a saúde das populações não pode ser alcançada sem a adoção de abordagens colaborativas:

[…] Isto exige o envolvimento dos cidadãos e de uma ampla gama de organizações sociais de modo a que se possa alcançar motivação e compromisso. Embora uma atuação governativa conjunta possa ser critica para a formulação de políticas que envolvem os determinantes sociais da saúde, muitos desafios em saúde requerem abordagens que incluam toda a sociedade porque saúde é, acima de tudo, como as pessoas podem ser saudáveis no seu quotidiano. Isto está relacionado com questões sobre como a sociedade se deve organizar para garantir saúde e, portanto, inclui questões muito básicas de justiça social e equidade. (KICKBUSCH; GLEICHER in: WHO, 2012, p. 4).

Esta mudança de paradigma, apesar de sistematicamente reconhecida como necessária e inadiável, tem enfrentado um percurso incerto nos últimos 40 anos. A sociedade civil, que progressivamente tem enfatizado a necessidade mudança, fundamentalmente através do uso do direito de participação, tem alcançado alguns avanços enquanto prática de cidadania, com impacte na formulação de políticas públicas. Por meio das mídias e de canais digitais, a informação tem sido disponibilizada e partilhada para além dos grupos restritos de peritos, reunindo os cidadãos melhores condições para compreenderem direitos/deveres, interpretarem o conceito de risco e o conceito de autocuidado em saúde.

Assistimos, pois, a um contexto potenciador de uma crescente capacitação de movimentos de cidadãos que, com interesses comuns, geram movimentos de base onde questionam desigualdades

142

e injustiças em saúde, ou no acesso à saúde, com base na idade, sexo, raça, entre outros fatores. Alguns destes movimentos são suportados por aquilo que Palmlund (1992, op. cit. ARAÚJO; GUNTER, 2009) identificou por peritos-leigos, cidadãos ou grupos que, numa dupla condição associam-se para discutir com o Estado a clarificação e adaptação de estratégias de prevenção (primária, secundária e terciária, que em alguns casos evoluem para grupos de autoajuda). Estes ativistas/defensores conformam organizações que emergem da sociedade civil, de âmbito local ou regional, podendo envolver sujeitos diferenciados, com níveis de formação e especialização diversos, com capacidade de influência técnica e política e que, em algumas situações, assumem protagonismo na defesa dos seus “objetos”.

Neste alinhamento, um grupo de peritos estruturou para Portugal um “Novo Pacto para a Saúde” (CRISP et al; 2014), onde se reconhece a urgência e o direito que as pessoas têm de intervirem mais ativamente na gestão da sua própria saúde, contribuindo positivamente para moldar todo o sistema, beneficiando da democratização e crescente facilitação de uso e acesso da comunicação online, o que confere aos profissionais e aos cidadãos a possibilidade de aceder a informação e conhecimento onde quer que se encontrem no país ou no mundo: “Os cidadãos terão de estar na posse dos seus registos de saúde, de dispor de informações sobre a qualidade e os custos dos serviços e de participar nos processos de decisão” (CRISP et al., 2014, p. 28). Todavia, como sinalizam Shaw & Baker (2004; op.

cit. van OLMEN et al., 2010, p. 387), isto exige uma

profunda mudança de paradigma, uma vez que os profissionais de saúde são mais propensos a modificar a sua tradicional relação com os pacientes apenas

143 quando existe uma convergência com as normas e interesses vigentes. A divulgação das evidências sobre a eficácia clínica de determinadas estratégias de capacitação são importantes para mostrar que, em vez de simplesmente serem um fardo, os pacientes emancipados são um recurso para melhores resultados em saúde. A questão da participação que aqui se coloca, não implica uma mera partilha de poder. Significativamente vai mais longe do que isso:

A capacitação dos pacientes significa que eles podem (e muitas vezes estão) legitimamente em desacordo com seu prestador de cuidados. Isso exige uma mudança de atitude entre os provedores, sentir-se responsável para com os seus pacientes, em vez de responsável pelos seus pacientes. (ANDERSON; FUNNELL, 2005; op. cit. van OLMEN

et al., 2010; p. 387).

Para além da importante afirmação da dimensão da autonomia, respeito e dignidade, associa-se de forma expressiva a questão da sustentabilidade. Tal como já foi indicado, nas sociedades desenvolvidas, face ao paradigma epidemiológico dominante, o principal peso dos custos dos sistemas de saúde decorre da prestação de cuidados a pessoas com doenças crónicas de longa duração. De acordo com Crisp et al. (2014), só será possível alcançar sustentabilidade financeira através da diminuição da incidência destas doenças e da comorbilidade que lhes está associada, desenvolvendo novos modelos de cuidados de saúde onde a prevenção precoce e a promoção da saúde emergem como pontos centrais no sistema de saúde.

Embora o envelhecimento populacional de per

se seja regularmente referenciado como um fator

144

da inovação terapêutica e das crescentes aspirações da população sobre o desempenho dos sistemas de saúde, não poderemos deixar de mencionar a perspetiva de “investimento com retorno adequado” que é discutida no Relatório Envelhecimento e Saúde (WHO, 2015, p. 16-18), onde se incentiva a capacitação e participação dos idosos na gestão da sua saúde e, consequentemente, na discussão das suas necessidades em saúde, categorizando este aspeto como um “imperativo económico”.

Uma investigação produzida no Reino Unido (2010) e apresentada por Cook (2011, op. cit. WHO, 2015), observou que a soma de todos os apoios sociais dispensados aos idosos, contabilizados como despesa pública (prestações sociais e custos com saúde e bem- estar), totalizando £ 136 mil milhões, alcançou um regresso de £ 45 mil milhões através de processos de tributação, £ 10 mil milhões por outras contribuições indiretas, às quais se acrescentou um retorno adicional de £ 76 bilhões colocados na economia através do seu consumo e, não menos importante, porque intrinsecamente depende da qualidade do seu estado de saúde, um retorno de £ 44 mil milhões através de benefícios tangíveis na assistência social e voluntariado, prestada por estes mesmos idosos, numa devolução quase que invisível à sociedade (Figura 6).

Neste contexto, cabe aqui salientar a perspetiva advogada por Barros (2013, p. 32-33) demostrando que, se atuarmos proactivamente sobre a manutenção da saúde dos mais idosos, os custos associados não evidenciam um crescimento exponencial como frequentes vezes se faz pensar:

Cada pessoa ao longo da sua vida tem um momento de grande necessidade de cuidados de saúde, e logo

145 Figura 6 – Investimento e retorno em populações demograficamente envelhecidas.

Fonte: WHO (2015, p. 17; adapt. Economic Forum´s Global Agenda

Council on Ageing, 2013).

um volume elevado de despesas associado a essa necessidade, nos dois últimos anos de vida. Essas despesas de fim de vida não são muito diferentes quer os dois últimos anos de vida ocorram aos 50 anos ou aos 80 anos. (…) o crescimento da despesa provocado pelo envelhecimento corresponde, então, apenas às despesas tidas nos anos de vida adicionais, excluídos os dois últimos anos de vida da contagem (em média). (BARROS, 2013, p. 32- 33).

Demonstrado o valor acrescentado pela participação dos cidadãos nos sistemas de saúde e nas políticas que os regulamentam, impõe-se perceber como é que o conceito de governação em saúde é afetado por esta “nova perspetiva”, advogada pela Rede de Cidades Saudáveis. Para Gonçalves (2005), de um modo abstrato, o conceito de governação envolve padrões de articulação e cooperação construídos entre diversos atores sociais e políticos,

146

incluindo os arranjos institucionais que coordenam e regulam essas mesmas transações incluindo, quer os mecanismos tradicionais de agregação e articulação de interesses, quer outros processos mais ou menos informais, que podem passar por lobbying, redes sociais e associações de diverso tipo.

Kickbusch; Gleicher (WHO, 2012, p. XI) acrescentam que a governação, e especificamente a governação em saúde, para além de assumidamente dever ser um processo partilhado, envolvendo múltiplos atores, é também um processo contínuo, através do qual interesses conflituantes ou diversos podem ser acomodados e ações cooperativas podem ser tomadas, indo para além do plano estatal, interagindo com a sociedade:

A governação bem-sucedida para a saúde exige coprodução, bem como participação e cooperação dos cidadãos, consumidores e doentes. À medida que a governação se torna mais difundida na sociedade, trabalhar diretamente com os cidadãos poderá reforçar a transparência e a responsabilização. (KICKBUSCH; GLEICHER in: WHO, 2012, p. XI).

A prática de boa governação é, neste e noutros contextos, uma importante ferramenta que ajuda a fortalecer a democracia e os direitos humanos, contribuindo para a promoção da economia, favorecendo a prosperidade e a coesão social, reduzindo a pobreza, e aprofundando a confiança no governo e na administração pública (OCDE, 2012). Os representantes dos cidadãos, incluindo os cidadãos seniores, têm que ter voz neste(s) processo(s) e devem ser ouvidos em diversos aspetos que se relacionam com a gestão da sua saúde, da sua autonomia, dignidade e gestão da sua vida quotidiana, estando

147 formalmente representados em diversos órgãos de governo com impacte na saúde, replicando boas práticas já existentes no âmbito da Rede de Cidades Saudáveis. Assim, podemos socorrer-nos de diversos e adequados exemplos de participação, como a constituição de Conselhos Séniores (Elders Council – Newcastle; Copenhaga e Barcelona), assessorados ou não por especialistas e académicos que, de forma concertada, podem exercer o papel de mentores (GREEN, 2013).

Uma governação inteligente em saúde comporta um conjunto de princípios, fatores e capacidades que se constituem em ferramentas adequadas para lidar com condições dinâmicas, incertas, mas exigentes da sociedade do conhecimento (KICKBUSCH; GLEICHER

in: WHO, 2012). Um sistema de saúde participado,

não pode prescindir da voz dos seus destinatários e da sua ajuda na compreensão e descodificação das barreiras, de perceber porque motivos são inativos, que abordagem devem prosseguir para combater a solidão, como e quando se sentem excluídos, como podem ajudar a transformar o meio onde vivem e as estruturas de apoio de modo a que “possam envelhecer bem tendo oportunidade de alcançar o seu potencial” (BUFFEL apud PEREIRA, 2015).