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2. APARATO LEGAL E INSTITUCIONAL DE GESTÃO DOS RECURSOS

2.3 INSTRUMENTOS DE GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS

Segundo COIMBRA (2000), a eficiência dos processos de gestão dos recur- sos hídricos no Brasil está relacionada às estratégias de aplicação dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH, instituída pela Lei nº 9.433 de 8 de janeiro de 1997.

Segundo o Art. 5º, os instrumentos da PNRH são: os planos de recursos hí- dricos; o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderan- tes da água; a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos; a cobrança pelo uso; a compensação a municípios e o sistema de informação sobre recursos hídricos.

Conforme publicação normativa de técnicas e procedimentos administrati- vos do Sistema de Apoio ao Gerenciamento do Usuário da Água – SISAGUA6, “a ou- torga de direito de uso se destaca dentre os instrumentos da PNRH como um dos mais importantes, pois tem como objetivo assegurar o controle quantitativo da água bem co- mo o efetivo exercício dos direitos de acesso” (COIMBRA, 2000). Cabe ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH, conforme o Decreto 2.612, de 03 de junho de 1998, que dispõe sobre as competências do CNRH, o estabelecimento dos critérios ge- rais para a outorga de direitos de uso. Segundo a PNRH, os instrumentos de gestão dos recursos hídricos estão descritos na Tabela 09 quanto aos seus objetivos e órgãos res- ponsáveis e/ou ligados ao processo de implementação do referido instrumento.

O Plano Estadual de Recursos Hídricos, estabelecido pela Lei 13.199/99, definiu a agenda de recursos hídricos para bacias hidrográficas, delineando ações de gestão, programas e projetos, obras e investimentos prioritários discutidos pelos poderes públicos e a sociedade civil.

Como documento norteador dos demais instrumentos de gestão, o Plano Di- retor deve conter grande número de informações: quanto à disponibilidade das águas, a evolução do quadro demográfico e sócio produtivo, os conflitos potenciais, definição de metas quanto à melhoria da qualidade e quantidade dos recursos hídricos, estimativa de custos, diretrizes e critérios para cobrança pelo uso das águas, criação de áreas sujeitas à restrição de uso, dentre outras ações relacionadas à racionalização e proteção ambiental.

O instrumento econômico, cobrança pelo uso de recursos hídricos, não é uma taxa ou imposto, mas sim uma forma de precificação do bem, uma compensação paga por usuários de água visando garantia ou manutenção de padrões de quantidade e qualidade segundo os regimes. Ainda com grande limitação em sua operacionalização em Minas Gerais, a definição de uma metodologia que estabeleça o cálculo de valores a serem cobrados, frente às singularidades de cada bacia, parece ser o grande obstáculo à cobrança pelo uso das águas (IGAM, 2011c).

6 Esse documento refere-se aos procedimentos administrativos e gerenciais relativos à tramitação dos pleitos de outorga encaminhados à SRH e ao SISAGUA apresentando suas finalidades, principais funções e características de cada um dos três sistemas que o compõe, a saber: Sistema de Controle de Outorgas – SISCO; Sistema de Informações Georreferenciadas de Outorgas – SIGEO e Sistema Quali-quantitativo de Outorgas – SQAO. Atualmente SISAGUA corresponde ao Sistema de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano.

Tabela 09 – Instrumentos de gestão dos recursos hídricos

Instrumentos de

gestão das águas Definição e Objetivo

Órgãos Ligados

Plano de Recursos Hídricos

Documentos que visam fundamentar e orientar a implementação da PNRH e o gerenciamento dos recursos hídricos. Seu conteúdo deve incluir o di- agnóstico da situação atual dos recursos hídricos, análises e estudos prospectivos da dinâmica socio- econômica, identificação de conflitos potenciais, metas de racionalização e cobrança, além de proje- tos a serem implantados na bacia hidrográfica, por Estado e para o País.

CNRH SNRH COMITÊ

Enquadramento

Estabelecimento do nível de qualidade (classe) a ser alcançado e/ou mantido em um segmento de corpo d’água ao longo do tempo. Tem como objetivo assegu- rar às águas qualidade compatível com os usos mais exi- gentes a que forem destinadas, além de diminuir os cus- tos de combate à poluição das águas.

CNRH CONAMA

COMITÊ

Outorga

Ato administrativo, de autorização, mediante o qual o poder público outorga ou faculta ao outorgado o uso de recurso hídrico, por prazo determinado, nos termos e nas condições expressas no respectivo ato. Tem como objetivo assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos diretos de acesso à água respeitando as prioridades de uso.

CNRH

Cobrança pelo uso

Cobrança de recursos financeiros pelo uso da água. Tem por objetivo indicar o valor da água, incentivar a racio- nalização, obter recursos para financiamentos e progra- mas pró-gestão dos recursos hídricos.

CNRH SNRH COMITÊ

Compensação aos municípios

Embora esteja vetada em Lei, algumas leis estaduais o aprovam. Para as bacias hidrográficas pertencentes a esses, deverão ser propostos critérios para compensação aos municípios que possam vir a ter áreas inundadas por reservatórios ou restrições de uso para fins de proteção dos recursos hídricos, definidos no PDRH.

CONSELHOS COMITÊ Sistema de informação sobre recursos hídricos

Sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recu- peração de informações sobre recursos hídricos, bem como sobre fatores intervenientes em sua gestão, com dados gerados pelos órgãos integrantes do SINGRH. São princípios básicos para a sua organização: des- centralização da obtenção e produção de dados e in- formações; coordenação unificada do sistema; acesso garantido a toda sociedade. São objetivos: reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação quantitativa e qualitativa dos recursos hídricos, atualizar informações e fornecer subsídios para elabora- ção dos Planos de Recursos hídricos.

CNRH SINGRH

SNIRH COMITÊS

OUTROS

É assegurado pelo instrumento de outorga, o direito de uso dos recursos hí- dricos. Com a emissão de autorização ou concessão, parcial ou total, é possível ao IGAM, órgão responsável pelos atos, executar a gestão quantitativa e qualitativa dos usos que representem quaisquer níveis de intervenções às reservas ou corpos d’água. Com vista à manutenção da disponibilidade hídrica, a outorga possibilita o monitora- mento dos usos, sejam subterrâneos ou superficiais, atendendo às necessidades prioritá- rias e de interesse coletivo (ibidem).

Além de buscar assegurar o cumprimento de metas de qualidade para os corpos d’água, assim como a garantia de usos preponderantes, o enquadramento dos corpos d’água em classes, deve estar associado às propostas de mitigação dos impactos diretos sobre os usos instalados em determinado curso d’água. Para tanto, é necessário identificar as condições atuais de qualidade das águas e definir os usos preponderantes da bacia.

O enquadramento é importante instrumento na compatibilização de usos múltiplos dos recursos hídricos superficiais, auxiliando no planejamento ambiental das bacias e no uso sustentável de seus recursos naturais. Fornece subsídios aos outros ins- trumentos de gestão, como outorga e cobrança pelo uso da água, de forma complemen- tar, quando implementados, além de disponibilizar recursos e informações facilitadoras do processo de gestão.

Segundo a Resolução CONAMA 357/20057, o enquadramento deve ser fei- to de forma participativa e descentralizada. Deve estar de acordo com as expectativas e necessidades dos usuários. São os comitês de bacias hidrográficas que têm por respon- sabilidade a aprovação da proposta de enquadramento, bem como sua implantação no âmbito da bacia.

7 Dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes e dá outras providências.

Tabela 10 – Classificação das águas doces segundo Resolução do CONAMA 357/05

Classe Cor Usos Possíveis

Especial

Abastecimento para consumo humano com desinfecção; Pre- servação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas; Pre- servação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral.

I (um)

Abastecimento para consumo humano após tratamento simpli- ficado; Proteção das comunidades aquáticas; Recreação de contato primário (natação); Irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvem rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película; Pro- teção das comunidades aquáticas em terras indígenas.

II (dois)

Abastecimento para consumo humano após tratamento con- vencional; Proteção das comunidades aquáticas; Recreação de contato primário; Irrigação de hortaliças, plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, onde o público possa vir ter contato direto à água; Aquicultura e atividade de pesca.

III (três)

Abastecimento para consumo humano após tratamento Con- vencional ou avançado; Irrigação de culturas arbóreas, cerealí- feras e forrageiras; Pesca amadora; Recreação de contato se- cundário; Dessedentação de animais.

IV (quatro) Navegação; Harmonia paisagística. Fonte: BRASIL (2005).

O autor ainda menciona que os instrumentos de gestão ambiental (Tabela 11) tornam-se instrumentos da gestão dos recursos hídricos ao induzirem o cumpri- mento de planos e normas que estejam voltados a garantir a qualidade e disponibilidade das águas, como um dos recursos ambientais. Desta forma, podem ser previstos e esta- belecidos, durante a elaboração dos planos de recursos hídricos, o Zoneamento Ecológi- co-Econômico - ZEE.

Tabela 11 – Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente

Instrumentos Definição Tipos

Instrumentos de intervenção

ambiental

Mecanismos normativos desti- nados a condicionar a atividade particular ou pública aos fins da Política Nacional do Meio Ambi- ente.

− Estabelecimento de padrões de quali-

dade ambiental;

− Zoneamento ambiental;

− Avaliação de impacto ambiental; − Criação de espaços territoriais, especi-

almente protegidos pelo poder federal, estadual e municipal, tais como estações ecológicas, reservas biológicas, áreas de proteção ambiental, de relevante inte- resse ecológico e reservas extrativistas;

− Incentivos à produção e instalação de

equipamentos, criação ou absorção de tecnologias, voltados para a melhoria da qualidade ambiental.

Instrumentos de controle

ambiental

Atos e medidas destinados a veri- ficar a observância das normas e planos que objetivam não só a defesa e a recuperação da quali- dade do meio ambiente, como também do equilíbrio ecológico. Em função do momento de sua utilização, estes instrumentos podem ser classificados em:

− Prévios, quando o controle se realiza

através de estudo e avaliação de im- pacto ambiental e do licenciamento pré- vio de obras ou atividades potenci- almente poluidoras;

− Concomitantes, quando o controle se

efetiva, quer por inspeções, fiscaliza- ções e divulgação de relatórios de qua- lidade do meio ambiente, quer pelo ca- dastramento das atividades potencial- mente poluidoras ou usuárias dos recur- sos ambientais, ou daquelas de defesa do meio ambiente;

− Posteriores, quando o controle se dá

mediante vistoria e exames, a fim de se verificar se a ação cumpriu às exi- gências legais de proteção ambiental. Instrumentos

de controle repressivo

Sanções administrativas, civis ou penais, voltadas à correção dos desvios da legalidade ambiental.

− Multas, interrupção das atividades, pro-

cessos criminais.

Fonte: LEAL (2001).

Nos planos de gerenciamento dos recursos hídricos é estimada a oferta e ca- racterizada a demanda por recursos hídricos. Os seguintes instrumentos, destinados a esse propósito, são apresentados na Tabela 12.

Tabela 12 – Instrumentos aplicados à gestão da oferta e demanda

Gestão da oferta Gestão da demanda

a) regularização de descargas por meio de barragens e reservatórios de acumulação;

b) recuperação de recursos hídricos mediante obras e serviços de trata- mento de esgotos urbanos e industri- ais;

c) transferência de reservas hídricas para compensar desequilíbrios e ca- rências regionais, por meio da trans- posição de vazões entre bacias hidro- gráficas ou da recarga artificial de aquíferos subterrâneos ou, ainda, da dessalinização de águas salobras; d) melhoria da produtividade hídrica quantitativa e qualitativa na bacia hi- drográfica mediante articulação com programas de desenvolvimento ur- bano, reflorestamento, proteção do solo e aplicação de fertilizantes e de- fensivos agrícolas;

e) redução de perdas regionais por evaporação e evapotranspiração.

a) gerenciamento efetivo do direito de uso de recursos hídricos da bacia, considerados como um bem público escasso e susceptível de pla- nejamento plurianual que compatibilize os múltiplos interesses convergentes ou diver- gentes dos usuários e da população sediada na bacia;

b) cadastro dos usuários e medição ou avalia- ção das respectivas demandas, com atualização frequente do perfil de cada usuário significa- tivo em termos de qualidade, quantidade e sa- zonalidade;

c) cobrança pelo uso de recursos hídricos; d) regularização técnica da fabricação e insta- lação de equipamentos e dispositivos que utili- zem água;

e) fixação de normas e padrões técnicos para o volume e concentração de nocividades nos efluentes a serem descarregados nos cursos de água;

f) incentivos e orientação técnica para o con- trole de perdas, a recirculação de água nas ins- talações industriais, a reutilização de efluentes, o desenvolvimento tecnológico de processos industriais ou agrícolas menos poluentes ou com menor consumo de água e o ma- crozoneamento de novos usuários em função do binômio qualidade e quantidade disponível na região.

Fonte: LEAL (2001).

A aplicabilidade de qualquer instrumento na gestão dos recursos hídricos necessita de um arcabouço legal e institucional que garanta o cumprimento de suas fun- ções, os direitos dos usuários e amenize situações de conflito.

3. DIAGNÓSTICO DA BACIA DO RIO PRETO: QUADRO FÍSICO, SOCIOE-