• Nenhum resultado encontrado

7 A PESQUISA

7.1 Metodologia e forma de análise dos resultados

7.1.5 Interdiscurso e intradiscurso

Há uma relação entre o já-dito e o que se está dizendo, ou seja, entre o interdiscurso e o intradiscurso, ou ainda, entre a constituição do sentido e sua formulação (ORLANDI, 2002). O interdiscurso é o conjunto de formulações realizadas e já esquecidas que determinam o que se diz.

Brandão (2002) remete-se a Maingueneau, quando explica que o estudo de especificidade de um discurso se faz colocando-o em relação com outros discursos; o interdiscurso passa a ser o espaço de outros discursos. Para explicitar o que vem a ser um interdiscurso, faz-se a seguinte distinção:

Universo discursivo: conjunto de formações discursivas de todos os tipos que

interagem numa dada conjuntura. É muito amplo, o que para o analista serve apenas para definir o horizonte, a partir do qual serão construídos os campos discursivos.

Campo discursivo: um conjunto de formações discursivas que se encontram em

concorrência, se delimitam reciprocamente em uma região determinada do universo discursivo. Exemplos de campos discursivos: político, filosófico, gramatical, etc. Suas formações discursivas possuem a mesma formação social. Como não é possível estudar o campo discursivo em sua totalidade, recortam-se subcampos, os espaços discursivos.

Espaços discursivos: são recortes que o analista isola dentro de um campo

discursivo tendo em vista propósitos específicos de análise. É necessário um conhecimento histórico para tal. Maingueneau (1997) sugere que na maioria das vezes, o analista extrai um espaço discursivo do campo discursivo de modo que este se constitua de, no mínimo, dois posicionamentos discursivos que mantenham relações particularmente fortes.

Neste trabalho, dentro do amplo universo discursivo, encontra-se uma região delimitada pelo discurso em questão, ou seja, o campo discursivo a ser analisado, que é o discurso pedagógico dos docentes entrevistados. Como este campo discursivo ainda prevalece amplo demais para os objetivos desta pesquisa, delimitou-se o espaço discursivo do ensino de Astronomia e as dificuldades que os professores dos anos iniciais apresentam quando trabalham com este tema.

Com estas distinções, um discurso nunca seria autônomo, pois se remete a outros discursos. O interdiscurso inscreve-se no intradiscurso. Cabe ao analista decifrar esta dupla face dos enunciados: um direito e um avesso, ou seja, não só apreender uma formação discursiva, mas também suas relações (BRANDÃO, 2002).

Outra definição dada por Orlandi (2000) seria o domínio de memória ou memória discursiva para Brandão (2002), como sendo o conjunto de seqüências discursivas que

preexistem à enunciação da seqüência discursiva em questão, no seio de um processo. A horizontalidade corresponde à enunciação, e a verticalidade corresponde ao enunciado (interdiscurso), e é neste último que se encontra o repetível. Na horizontal, temos a formulação discursiva, isto é, a produção da seqüência lingüística específica (intradiscurso), onde o sujeito intervém. Assim, o interdiscurso está no intradiscurso.

Enunciar é se situar sempre em relação a um já-dito. Por exemplo, na medida em que se retira de um discurso fragmentos e estes são inseridos em outro discurso, a significação

desses fragmentos ganha nova configuração semântica. Pode-se neste trabalho explicar esta teoria pela seguinte figura:

Para Orlandi (2002), a memória discursiva é a base do discurso atual, disponibilizando dizeres que têm origem em situações passadas (interdiscurso). O dizer não é propriedade particular, elas significam pela historia e pela língua. Há uma relação entre o já- dito e o que se está dizendo, que é a que existe entre o interdiscurso e o intradiscurso. O já- dito faz parte do dizível, ou interdiscurso, ou memória discursiva, ou constituição de sentido (conjunto de formulações já feitas e esquecidas que determinam novas formulações). Estas novas formulações formam o intradiscurso. Este último num eixo horizontal e o primeiro num eixo vertical.

Maingueneau (1997) explica que a memória discursiva é uma propriedade de alguns tipos de discursos como de matemática ou filosofia, pois o leitor tem de estar sempre retomando as definições para compreender o significado de uma passagem. Uma formação discursiva pode ter dupla memória: uma externa (que se liga a formações discursivas anteriores) e uma interna (com enunciados anteriormente produzidos no interior da mesma formação discursiva).

Intradiscurso

Interdiscursos

Formulação discursiva – Enunciação Repetível;

Enunciado

Orlandi (1996) explica que em um discurso pedagógico pode ou não haver explicitações de citações de outros discursos, o que torna um tanto difícil de decidir sobre os limites dele e as vozes que falam nele. O professor, por sua vez, apropria-se do cientista e se confunde com ele sem se mostrar como voz mediadora.

Coracini (1991) afirma que “um texto qualquer resulta do entrecruzamento de uma série de outros textos, de outros ‘autores’, outros indivíduos, diferentes grupos ideológicos, enfim, de diferentes discursos”. Considerando o ato de ler como um ato de produzir textos, outros textos se acrescentam ao primeiro, produzido pelo primeiro enunciador que, por sua vez, constitui um intertexto.

Há ainda o domínio da antecipação, onde se reúne seqüências discursivas que entretêm no nível intradiscursivo relações interpretáveis como efeitos de antecipação. Isto garante a impossibilidade de se atribuir um fim ao processo discursivo (BRANDÃO, 2002), resultando num mecanismo que regula a possibilidade de respostas e dirige a argumentação, pelo fato do locutor se colocar no lugar do ouvinte (ORLANDI, 2000).

Orlandi (1996) mostra que a antecipação diz respeito a um mecanismo mais complexo que o de discordar e concordar, pois quando um locutor supõe o que o outro vai pensar, na realidade, este locutor pretende saber a relação existente entre o que o interlocutor vai dizer e o seu lugar, e isto vai constituir o seu próprio dizer.