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Investigação qualitativa

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 81-84)

CAPÍTULO 3 Metodologia

3.1 Paradigmas de investigação

3.1.1 Investigação qualitativa

O paradigma escolhido para servir de base a esta investigação é o qualitativo, também designado por hermenêutico, interpretativo ou naturalista. Desta maneira, a investigação assentará na busca pela compreensão, significado e ação, penetrando no mundo pessoal dos sujeitos envolvidos no estudo, professores e alunos. (Creswell, 2014).

Segundo Bogdan e Biklen (1994), as principais características do paradigma qualitativo são cinco e não têm que estar todas presentes numa investigação com o mesmo nível de profundidade.

A primeira característica refere-se ao facto de na investigação qualitativa a fonte directa de dados ser o ambiente natural, sendo o investigador o instrumento principal. O investigador acaba sempre por se introduzir, com maior ou menor grau, no ambiente onde pretende recolher os dados e quer esteja munido ou não de alguns equipamentos de vídeo ou áudio ou apenas de papel e lápis, acaba sempre por desempenhar um papel primordial na sua análise. É ele que tem que rever na totalidade os materiais registados, sendo o seu entendimento sobre esses materiais o principal

instrumento de análise. A frequência dos locais de estudo é essencial para compreender o contexto e as acções pois estas são observadas no seu ambiente natural. Com vista a não perder o significado, o investigador não deve separar os actos, palavras ou gestos do seu contexto.

A segunda característica está relacionada com o facto de a investigação qualitativa ser descritiva. Os dados recolhidos são quase sempre organizados sob a forma de palavras ou imagens, em vez de números. Os investigadores procuram analisar os dados usando toda a sua riqueza e respeitando a forma em que eles foram registados ou transcritos. Tudo deve ser analisado com base no princípio de que nada é trivial e que tudo pode vir a constituir uma pista para estabelecer uma maior compreensão do objeto de estudo. Assim, quando se pretende que sejam tidos em conta todos os detalhes, a descrição parece ser um bom método de recolha de dados.

A terceira característica está relacionada com o facto de os investigadores qualitativos se interessarem mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados e produtos. A forma como as pessoas negoceiam os significados, como começam a utilizar certos termos ou como certas noções começam a fazer parte do senso comum são indicadores de que na actividade dos investigadores os processos desempenham um papel primordial. Tomando como exemplo a investigação educacional, a ênfase qualitativa no processo tem sido importante no desenvolvimento da ideia de que o desempenho cognitivo dos alunos é afectado pelas expectativas dos professores. Esta conclusão, que é corroborada pelos métodos quantitativos, encontra nas estratégias qualitativas uma forma de evidenciar como as expectativas se traduzem nas actividades, procedimentos e interações diárias.

A quarta característica está relacionada com a forma como os investigadores qualitativos analisam os dados, admitindo uma tendência para que esta análise seja feita de forma indutiva. A recolha de dados não é feita com o objectivo de provar hipóteses previamente estabelecidas, mas antes para construir abstrações com base no agrupamento dos dados particulares. A teoria é assim construída com base nas várias peças individuais da informação recolhida que se vão inter- relacionando, dando origem àquilo que se pode designar por teoria fundamentada. O investigador vai usar parte do estudo para perceber quais são as questões importantes, ao invés de partir do pressuposto que já sabe essas questões antes de efectuar a investigação.

A quinta e última característica prende-se com o significado, que é considerado de importância vital para a abordagem qualitativa. Os investigadores qualitativos têm como principal preocupação certificarem-se que estão a apreender as diferentes perspectivas adequadamente. Por vezes os dados recolhidos são de novo mostrados aos indivíduos sobre os quais incide a investigação, por forma a poder proporcionar ao investigador a segurança de que os registos são rigorosos e reflectem de forma clara os significados que os sujeitos lhe atribuíram. Os investigadores qualitativos estabelecem estratégias e procedimentos que lhe permitem tomar em consideração as experiências do ponto de vista do sujeito.

Pretende-se com este estudo caraterizar a aprendizagem dos alunos e identificar cenários metodológicos que favoreçam a aprendizagem do Cálculo, considerando os seguintes objetivos

específicos: (1) Caraterizar o nível de preparação dos alunos para a aprendizagem do Cálculo; (2) Descrever o papel dos conhecimentos prévios na aprendizagem dos novos conceitos do Cálculo; (3) Caraterizar a aprendizagem dos alunos ao longo do estudo de tópicos específicos do Cálculo. Para a validação dos resultados apoiaremo-nos em quatro pilares definidos por Lincoln e Guba (1991): credibilidade, transferibilidade, consistência e aplicabilidade ou confirmabilidade.

A credibilidade consiste na confirmação dos resultados por parte dos participantes na investigação. Tem a ver com o quanto as construções/reconstruções do investigador reproduzem os fenómenos em estudo e/ou os pontos de vista dos participantes na pesquisa. Obtém-se a credibilidade "submetendo [os resultados] à aprovação dos construtores das múltiplas realidades em estudo" (Lincoln & Guba, 1991, p. 296). A credibilidade pode ser operacionalizada através do "prolonged engagement" (Lincoln & Guba, 1991), através do "peer debriefing" (Erlandson et al., 1993), ou através do "member checks" (Coutinho, 2014). A credibilidade é o termo homólogo à "validade interna" do paradigma quantitativo.

"Prolonged engagement" — empenho prolongado — é um investimento no tempo que se considere necessário para atingir os objetivos da pesquisa que passa por aprender a cultura dos participantes, testar informações contraditórias introduzidas por distorções tanto do investigador como dos participantes e criar confiança nos participantes. "Peer debriefing" — revisão de pares — consiste em permitir que um par, um colega ou um profissional fora do contexto com conhecimento geral sobre a problemática e sobre o processo de pesquisa, analise os dados, teste as hipóteses de trabalho e sobretudo escute as ideias e preocupações do investigador. "Member checks" — revisão pelos participantes — consiste em devolver aos participantes do estudo os resultados da análise feita pelo investigador às informações que lhe forneceram através de entrevistas, observações diretas ou indirectas, para que estes possam verificar/confirmar se as interpretações do investigador refletem de facto as suas experiências/sentimentos.

Segundo Coutinho (2014), a transferibilidade, numa pesquisa qualitativa, consiste na possibilidade de os resultados obtidos num determinado contexto poderem ser aplicados noutro contexto. É o conceito correspondente ao de "generalização" ou "validação externa" na metodologia quantitativa, mas que deve ser encarado em termos totalmente distintos na pesquisa interpretativa. Podem-se considerar três graus ou níveis de generalização dos resultados de um estudo empírico: da amostra para a população, analítica e a relacionada à teoria. No plano qualitativo a generalização é analítica ou relacionada à teoria.

Para Coutinho (2014), a consistência é a capacidade de replicar o estudo, o que é possível se os instrumentos de pesquisa forem "neutros", ou seja, aplicados outra vez produzem os mesmos resultados. Na pesquisa qualitativa este tipo de replicabilidade é impossível de conseguir fruto da flexibilidade do desenho, da constante interação entre investigador e participantes que levam a que os resultados sejam "irrepetíveis". Deste modo, nos estudos qualitativos a questão da consistência pode ser enunciada da seguinte forma: "Se outra pessoa fizesse o mesmo estudo, obteria os mesmos resultados e chegaria às mesmas conclusões a que chegou o investigador?". Portanto, traduz-se na

obtenção dos mesmos resultados e conclusões de um mesmo estudo, mas com participantes diferentes. No paradigma quantitativo o conceito equivalente é o de fiabilidade.

Segundo Lincoln & Guba (1991), aplicabilidade ou confirmabilidade é a capacidade de outros investigadores confirmarem as construções do investigador. No paradigma quantitativo o conceito equivalente é o de objetividade.

Tendo em conta a natureza do problema em estudo e as questões de investigação, optámos por uma metodologia qualitativa de natureza interpretativa. Esta metodologia mostra-se como a opção mais adequada por permitir caraterizar com profundidade os desempenhos dos alunos em diferentes etapas da lecionação da unidade curricular Matemática I. A análise, de natureza interpretativa, dos dados recolhidos consiste no processo de busca e organização sistemática de material documental, respostas a questionários, bem como transcrições de entrevistas. Procurámos, tendo em conta Merriam (1988), analisar os dados a três níveis: (1) organização dos dados recolhidos; (2) estabelecimento de categorias; (3) clarificação do significado dos dados e da sua influência na compreensão do fenómeno em estudo.

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 81-84)