• Nenhum resultado encontrado

Teoria da Engenharia Didática de Michèle Artigue

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 32-34)

CAPÍTULO 2 Revisão de literatura

2.2 Teorias de investigação em Educação Matemática

2.2.6 Teoria da Engenharia Didática de Michèle Artigue

A Engenharia Didática é uma metodologia de pesquisa que foi formulada com o objetivo de analisar situações didáticas — Nota-se aqui relação com a teoria das Situações Didáticas de Guy Brousseau. Embora, conforme afirma Pais (2002), seja uma teoria que pode ter analogia com o trabalho de um engenheiro, no sentido da conceção, planeamento e execução de um projeto, ela não pode ser vista como um conjunto automatizado de repetições, mas sim em sentido pleno, o que envolve a gestão, ao longo de toda ela, de ideias e o seu reflexo em termos práticos. Para Machado (2002), Engenharia Didática pode ser vista como um esquema experimental baseado em realizações didáticas na sala de aula, ou seja, sobre a conceção, a realização, a observação e a análise de sequências de ensino.

Segundo a autora da teoria, Artigue (1996), a noção de Engenharia Didática surgiu na Didática da Matemática da comunidade académica francesa, no início da década de 80, com o objetivo de destacar uma forma de trabalho didático. A Engenharia Didática tem uma forma própria de organizar os procedimentos metodológicos da pesquisa, o que abarca, de maneira interligada, a dimensão teórica e a dimensão experimental. A interligação entre as dimensões teórica e experimental constitui-se numa vantagem desta metodologia.

Nesta teoria distinguem-se dois níveis de engenharia didática, o nível necessário e o complementar. O primeiro nível, também denominado microengenharia, é aquele em que o objeto de pesquisa de determinado estudo é um assunto. O segundo nível, também denominado macroengenharia, é o das pesquisas que permitem uma ligação entre a complexidade das pesquisas da microengenharia e os fenómenos ligados à duração nas relações de ensino e de aprendizagem. Quanto às fases metodológicas, a Engenharia Didática divide-se em quatro fases, nomeadamente análises preliminares, conceção e análise a priori das situações didáticas, a experimentação e análise a posteriori e validação (Artigue, 1996).

Fase de análises preliminares

Para Artigue (1996), esta fase é realizada através de considerações feitas sobre o quadro teórico-didático geral, bem como sobre conhecimentos didáticos anteriormente adquiridos. Nesta fase identifica-se as possíveis causas do problema assim como as possíveis formas do seu tratamento. A autora considera que a análise preliminar geralmente assenta nas seguintes situações:

• a análise epistemológica dos conteúdos visados pelo ensino; • a análise do ensino habitual e dos seus efeitos;

• a análise das concepções dos alunos, das dificuldades e obstáculos que marcam a sua evolução;

• a análise do campo de constrangimento no qual virá a situar-se a realização didática efetiva;

• e, naturalmente, tendo em conta os objetivos específicos da investigação. (Artigue, 1996, p.198).

Fase de conceção e análise a priori das situações didáticas

Em consequência do trabalho feito na fase anterior, a autora define a direção do seu trabalho escolhendo as variáveis sobre as quais deverá atuar. Segundo Artigue (1996), para o sucesso desta fase, é importante distinguir dois tipos variáveis de comando:

• as variáveis macro-didáticas ou globais, que dizem respeito à organização global da engenharia;

• e as variáveis micro-didáticas ou locais, que dizem respeito à organização local da engenharia, isto é, à organização de uma sessão ou de uma fase, podendo umas e outras ser, por sua vez, variáveis de ordem geral ou variáveis dependentes do conteúdo didático cujo ensino é visado. (Artigue, 1996, p. 202)

Fase de experimentação

Esta fase é caraterizada por uma sequência de ações experimentais. Para Pais (2001), a referida sequência didática é formada num determinado número de aulas — também conhecidas por sessões — planificadas e analisadas previamente com o objetivo de constatar situações de aprendizagem sobre os conceitos na pesquisa. A execução da sequência permite também confirmar a proximidade dos resultados práticos à análise teórica.

Para Machado (1999), trata-se de uma fase da engenharia didática iniciada mediante contato do pesquisador/professor/observador (es) com a população de alunos — objetos do estudo. Tal fase implica:

• a explicitação dos objetos e condições de realização da pesquisa à população de alunos que participará da experimentação;

• o estabelecimento do contrato didático; • a aplicação dos instrumentos de pesquisa;

• o registro das observações feitas durante a experimentação (observação cuidadosa descrita em relatório, transcrição dos registros audiovisuais, etc.). (Machado, 1999, p. 206).

Fase de análise a posteriori e validação

Segundo Artigue (1996), esta fase apoia-se nos dados recolhidos durante a fase de experimentação. Analisa-se a produção dos alunos, bem como as observações realizadas sobre o comportamento dos mesmos durante a execução da sequência didática e da experimentação. Para a autora, nesta fase, averigua-se o alcance das expetativas consideradas na fase de análises

preliminares. Mediante a confrontação das análises preliminares e a posteriori valida-se, ou não, a hipótese de pesquisa.

Artigue (1996) indica algumas dificuldades existentes na fase de validação encontradas nos trabalhos publicados sobre engenharia didática:

• Na maior parte dos textos publicados relativos a engenharias, o confronto das duas análises, a priori e a posteriori, exibe distorções. Elas estão longe de ser sempre analisadas em termos de validação, a saber, investigando aquilo que, nas hipóteses consideradas, as distorções constatadas invalidam. Com grande freqüência, os autores limitam-se a propor modificações da engenharia, visando a sua redução, sem se envolverem, pois, verdadeiramente, num procedimento de validação.

• As próprias hipóteses explicitamente envolvidas nos trabalhos de engenharia são, com grande freqüência, hipóteses relativamente globais, que põem em jogo processos de aprendizagem a longo prazo, que a amplitude da engenharia não permite necessariamente fazer entrar, de facto, no procedimento de validação (Artigue, 1996, p. 209).

Pais (2001) refere que metodologicamente a validação faz parte de uma fase em que a vigilância deve ser reforçada, uma vez que se trata de certificar a existência do caráter científico. Assim sendo, a engenharia didática, enquanto procedimento metodológico, fundamenta-se em registos de estudos de caso, cuja validade é interna e permeia o contexto da investigação realizada.

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 32-34)