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Teoria da Reificação

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 63-65)

CAPÍTULO 2 Revisão de literatura

2.5 Teoria da Reificação

2.5.1 Fundamentos da teoria

Anna Sfard (1991), autora da teoria, alega poder-se encontrar na origem da maioria dos conceitos matemáticos duas formas de pensamento fundamentalmente diferentes: uma conceção operacional, onde as noções matemáticas são tidas como produto de certos processos ou identificáveis com os mesmos processos, e a conceção estrutural, para a qual as noções matemáticas são vistas como entidades de objetos reais, como estruturas permanentes, estáticas manipuláveis e combináveis em estruturas mais complexas.

Com base nesta sustentação, para o modelo de desenvolvimento concetual de Sfard a conceção operacional surge primeiro, dando em seguida lugar, através da reificação de processos, a um desenvolvimento que desemboca no surgimento de objetos matemáticos. Para tal, para a travessia do estado de conceção operacional para o estado de objetos matemáticos, a autora propõe a passagem por três fases: (1) interiorização — onde os processos são aplicados a objetos matemáticos já conhecidos e familiares para o indivíduo que os manipula; (2) condensação — onde os processos anteriores evoluem, na mente do indivíduo, até ao estado de unidades compactas; (3) reificação — onde o indivíduo adquire a capacidade de reconhecer as unidades compactas como objetos permanentes por direito próprio, como objetos familiares. (Sfard, 1991)

Para Sfard (1991), a Matemática, no que toca à inacessibilidade, parece estar acima das outras disciplinas científicas, pelo que a autora reconhece haver algo de especial no pensamento que envolve a construção do conhecimento matemático. Desta forma, e para analisar esta caraterística própria da aprendizagem da Matemática, a autora procurou conceber uma teoria que envolvesse de forma simultânea a Filosofia e a Psicologia da Matemática, considerando da mesma maneira o pensamento matemático como processo de construção de conhecimento e como produto de tal construção. Procurou ainda construir a sua compreensão a partir de discursos filosóficos, que se debruçam sobre a natureza do pensamento matemático, de matemáticos. Procurou também compreender a essência psicológica do surgimento de tal pensamento.

2.5.2 Processos e objetos

A dualidade concetual — processo e objeto, o que também pode ser visto como operacional e estrutural — de abordagem desta teoria não revela antagonismo, mas sim complementaridade, são os dois lados de uma mesma moeda, portanto, duas entidades inseparáveis. As duas formas de encarar conceitos matemáticos são imprescindíveis para a construção de conhecimento matemático. É preciso passar pelo, normalmente longo, caminho da operacionalização ou dos processos para se chegar e passar a percorrer o caminho das estruturas e dos objetos.

Para Sfard (1991), a abordagem de um conceito matemático da perspetiva operacional ou da perspetiva estrutural depende, para além do nível de conhecimentos e habilidades em Matemática que o indivíduo tenha, do foco da sua atenção no momento que lida com um determinado conceito. Deste modo, quando o indivíduo for capaz de reconhecer rapidamente um conceito, de o tratar como algo real e de o manipular como todo não se atendo aos processos que o originam, o conceito poderá ser considerado um objeto. O mesmo conceito será considerado potencial e não atual, quando for interpretado pelos processos que o originam. Para a autora, a conceção estrutural carateriza-se por ser estática, instantânea e integrativa, ao passo que a operacional carateriza-se por ser dinâmica, sequencial e detalhada.

A seguir (Tabela 5) apresentamos em síntese a comparação entre as duas conceções. Tabela 5: Conceções operacional e estrutural (Sfard, 1991, p. 33)

Conceção operacional Conceção estrutural

Caraterísticas gerais

A entidade matemática é concebida como um produto de certo processo ou é identificada com o próprio processo

A entidade matemática é concebida como uma estrutura estática, como se fosse um objeto real

Representações internas É apoiada por representações

verbais É apoiada por imagética visual

O seu lugar no

desenvolvimento de conceitos

Desenvolve-se na primeira fase da formação do conceito

Desenvolve-se a partir da conceção operacional

O seu papel nos processos cognitivos

É necessária, mas não suficiente para uma eficaz aprendizagem e resolução de problemas

Facilita todos os processos cognitivos (aprendizagem, resolução de problemas)

Na tabela seguinte apresentamos uma comparação entre conceções operacional e estrutural de três conceitos matemáticos estudados nesta tese: o de função, o de derivação e o de integração. Utilizando três conceitos em estudo, damos corpo ao que sinteticamente Anna Sfard descreve na tabela 2.5. A tabela 2.6 constitui uma ferramenta auxiliar na caraterização das conceções dos alunos sobre conceitos de Cálculo. Dito de outra forma, a tabela a anterior é a referência e a tabela seguinte é a que, com base na referência, permitiu distinguir as perspetivas operacional e estrutural de três conceitos em estudo. A mesma foi feita tendo em conta o trabalho de Sfard (1991) sobre descrição estrutural e operacional de noções matemáticas.

Tabela 6: Exemplo de conceções operacional e estrutural

Conceção operacional Conceção estrutural

Função

Sequência de passos que nos

permitem a substituição de números reais, cálculo e obtenção de outros números reais

Lei que associa um conjunto numérico a outro

Derivação

Limite do quociente incremental de uma função; função obtida

aplicando regras e fórmulas da tabela de derivação

Declive de uma função; lei da velocidade de um deslocamento; custo marginal, ou seja, taxa de variação da função custo total em determinado ponto

Integração

Soma das áreas entre a curva da função integranda e o eixo das abscissas; função obtida aplicando regras e fórmulas da tabela de integração

Conjunto de funções com um mesmo declive; conjunto de leis de deslocamento com a mesma lei de velocidade; conjunto de funções custo total com o mesmo custo marginal

No documento Aprendizagem do Cálculo para economistas (páginas 63-65)