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Da queixa espontânea à descrição de contingências de reforçamento

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igualmente, afetariam a probabilidade futura de ocorrência de com portam entos equivalentes.

Estas duas classes possíveis de interação são denominadas “contingências" e constituem as duas classes conceituais fundamentais para o trabalho de descrição e análise do com portam ento para o Behaviorism o Radical. Relações funcionais são estabelecidas na medida em que registramos mudanças na probabilidade de ocorrência dos comportam entos que procuramos entender, em relação à mudança, quer nas conseqüências, quer nos contextos, quer em ambos (Matos, 1997).

A partir disso, o terapeuta deverá levar o cliente a discriminar todas essas contingências e testar seu funcionamento. Ao sugerir quais contingências estão atuando, é possível para o terapeuta elaborar algumas formas de previsão e controle dos comportamentos do cliente e do meio social em que vive. Porém, só a previsão não é suficiente. Há a necessidade de manejar as contingências, com o objetivo de demonstrar que são elas que estão controlando o comportamento em questão.

Mas, como manejar as contingências? Acredito que qualquer terapia não alienante deva basear-se nas ações (classes de respostas) do cliente, no contexto em que está inserido. Nesse sentido, como disse Skinner (1991): "O terapeuta dá conselhos, regras,

etc. para preparar o cliente para um mundo fora da terapia". Assim, só as variações de

ações fora da terapia é que permitirão a alteração das contingências. O cliente precisa interagir com o ambiente e observar seus efeitos. Apenas desse modo, a descrição de contingências de reforço poderá ser confirmada ou refutada.

Análise de um Caso Clínico

Uma mãe procurou a terapeuta pedindo uma entrevista para falar sobre as dificuldades de seu filho.

Queixa Espontânea:

“Bom, deixa-me ver por onde começar... deixa eu me organizar. Então, primeiro eu vou contar como ele está na escola, depois em casa".

“Na escola, a orientadora pedagógica e a diretora falaram que ele nào terrrnenhum amigo. Não conversa com ninguém, e o problema m aior ô quando tem trabalho em grupo, ele sempre sobra, ninguém quer e le ”.

“No recreio, ele fica isolado e as notas estão baixas. Não consegue fazer as tarefas e não estuda para as provas".

“Bem, na minha casa, o que a gente observa é o seguinte: ele está muito triste, se isola, não fez nenhuma amizade no condomínio".

“Eu acho que o problema dele é o pai. Ê que e u e o meu marido estamos passando por muitos problemas há muito tempo. Estamos tentando nos separar, mas ele (marido) não quer, há muitas brigas e o V(filho) presenciou muitas delas".

"Hoje, eu tento discutir no quarto, mas ele (filho) já viu brigas terríveis, de eu me descontrolar, ficar perdida, então, eu acho que isso influenciou muito o jeito que ele está hoje".

"O meu marido è médico, ele trabalha muito, o dia inteiro. Sai às oito da manhã, antes das crianças, nâo almoça em casa e só volta depois das onze da noite, porque depois do consultório ele vai direto para a faculdade de direito. Ele não vê as crianças. Nos finais de semana, ele tem grupo de estudo, só volta para casa à tarde e, quando está em casa, fica lendo, não interage com ninguém".

"Eu fico com as crianças em casa, levo para a escola, vivo em função delas".

“Eu não sei o que está acontecendo. Ele (filho) tem poucos contatos, desistiu dos esportes, odeia futebol, não anda de bicicleta. Acho que a presença do pai seria importante. Eu não sei mais o que fazer, por favor, ajude meu filho".

Análise da Queixa Inicial

A queixa relatada pela mãe, anteriormente, refere-se ao seu filho, um menino, V, de doze anos (início da terapia), cursando a sexta sórie de uma escola particular. Os pais estão casados há quinze anos e tôm mais uma filha, L, de quatro anos.

A queixa espontânea geralmente ó constituída por relato de sentimentos e/ou ações, ou até mesmo sugere relações causais entre eventos (com forte tendência internalista). Em geral, tais relatos não definem completamente a problemática do cliente.

A mãe, no relato descrito anteriormente, expõe suas preocupações. E traz alguns dados bastante importantes sobre os problemas do cliente. Descreve, geralmente, classe de respostas (não estuda, não conversa com ninguém, se isola) do cliente e alguns aspectos de interação com o ambiente (não é escolhido para grupos). No relato constam, ainda, algumas características do ambiente em que ele está vivendo: uma mãe muito ansiosa, frágil e que está em guerra contra o marido, e um pai ausente. Porém, qual a relação desses dados com a problemática apresentada pelo cliente através do relato da mãe? Segundo a mãe, o problema é o pai. Mas, esse dado parece ter mais relação com as queixas da mãe do que com a problemática do filho.

Não devemos, então, ficar sob controle apenas desse relato. Ele é um dado a ser relacionado com outras observações, podendo até exercer controle sobre investigações terapêuticas subseqüentes. Há muito ainda a ser pesquisado.

Primeira Interação da Terapeuta com o Cliente

Ventra na sala e senta na poltrona.

C: Dura essa cadeira.

T: Se você quiser sentar no sofá, pode ser mais confortável. C: Nossa! Mas está quebrada esta cortina.

T: É mesmo, eu nâo tinha reparado. Mas, por que você está prestando atenção nisso? C: Não, nada.

T: Vamos conversar um pouco sobre o motivo de você estar aqui. Sua mãe veio conversar comigo e eu gostaria de saber o que você acha de ter vindo aqui.

C: Minha mãe não falou nada. Só falou para eu vir.

T; Na conversa com sua mãe, ela me pareceu preocupada com vocô, percebendo algumas dificuldades...

C: Eu sei que os psicólogos ajudam as pessoas, e eu tenho alguns problemas. T: Então, vamos falar sobre isso.

C: Eu tenho problemas na escola, não estou indo bem. T: O que está acontecendo?

C: É um problema educacional.

T: Educacional? Como assim? Explique-me melhor.

C: O que acontece é que os professores ganham mal, tôm pouca motivação, e vão dar aula sem vontade. Eu não consigo entender o que eles dizem e eles não conseguem me entender. Dão muita matéria, ó aquele problema, ganham pouco e dá nisso.

T: Vocô estuda em escola pública ou particular? C: Particular.

T: Mas, em escola particular, não é um pouco diferente, os professores não ganham mais? C: É, mas veja a minha professora de inglôs, eu vou mal na matéria dela. Ela ó solteira, né? Então, eu acho que ela tem problema assim... de casar, e, então, ela desconta tudo na gente.

T: Eu compreendo.

C: Ela fala baixo, também não é bem treinada, não há boas escolas para fazer professores. T: Me parece que vocô não gosta muito da escola.

C: Se eu pudesse, sairia de lá hoje. Minha mãe falou para eu falar com vocô. Eu não sei, não gosto, não quero ficar lá.

T: Mas, o que acontece na escola, alóm desses problemas ‘'educacionais"? C: Eu não tenho muitos amigos. É um problema cultural.

T: Cultural?

C: Sabe, os meninos dessa idade pensam e falam coisas, vocô sabe. T: Eu não sei. Conta-me.

C: é cultural... eles lôem coisas que eu não concordo. T: Tipo o quê?

C: Você sabe do que menino gosta nessa idade. T: Têm muitas coisas. O que seria exatamente? C: Minha educação não me permite falar. T: Se a sua educação não permite, não precisa falar.

C: E também têm uns problemas de grupo, o grupo dos inteligentes e o dos não muito inteligentes, eu náo consigo entrarem nenhum.

T: Eu percebo que vocô está com muitas dificuldades na escola, com os professores, com seus colegas e eu acho que seria bom a gente estar conversando outras vezes. O que vocô acha?

C: Sim e não.

T: O que vocô quer dizer?

C: Sim ó que eu quero fazer terapia, e não... eu não sei, preciso pensar, sei lá... T: Vocô está um pouco confuso em relação a isso?

C: Digamos que 10% confuso. T: Mas, 10% confuso ó muita confusão. C: Vocô acha?

T: Acho.

C: O que seria não estar confuso para vocô? T: 1%.

C: É, mas em uma escala de 1 a 100, náo ó muito.

T: (a terapeuta sorri) Realmente. Vocô é muito bom de argumentação. C: É verdade. Mas, eu vou fazer terapia.

T: Que bom, fico contente com a sua decisão. C: Mas, daria para negociar de 15 em 15 dias?

T: Acho que não vai ser possível, precisamos nos ver com mais freqüência, talvez até duas vezes, para nos conhecermos melhor, entender suas dificuldades e te ajudar. Pense nisso, talvez não seja tão ruim.

C: Tudo bem, vamos ver.

Análise da Primeira Sessão

A sessão, em um primeiro momento, tem um conteúdo bastante peculiar, sendo até engraçado. Porém, a meu ver, são exemplos que ilustram muito bem as dificuldades sociais do cliente:

1. Não reforça positivamente o comportamento da terapeuta, pelo contrário, puniu vários comportamentos da terapeuta. Esses comportamentos, em situação natural (contatos com colegas, professores, grupos), devem produzir, nos outros, comportamentos de contra- controle ou de esquiva da companhia dele (grupos que não o aceitam) ou, ainda, punição dos comportamentos do cliente.