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Jornalismo e acontecimento: uma comunidade interpretativa

Em uma sociedade midiatizada, o jornalismo, no plano da compreensão dos acontecimentos, tem um papel importante, pois é ele que, nos processos de descrição dos acontecimentos, constrói uma interpretação. Tendo em vista essa característica, faz-se necessário perceber como o jornalismo se configura na atualidade como esse espaço de

interpretação. Dessa forma, lançamos mão da noção de jornalismo como comunidade interpretativa para buscar elementos para a composição da reflexão a ser feita a partir de autores como Ponte (2005), Traquina (2004a, 2004b, 2005a, 2005b), Tuchman (1978, 2002) e Zelizer (1993), entre outros.

A compreensão do jornalismo como uma “comunidade interpretativa” surge com a pesquisadora norte-americana Barbie Zelizer (1993). A partir das concepções dessa noção, trazidas da Antropologia e dos estudos literários, a autora explica que os jornalistas são uma comunidade interpretativa por se manterem coesos, com base em práticas sustentadas em um repertório de acontecimentos do passado, de uma memória e de uma cultura profissional que geram modelos de práticas e ações no presente. Já Ponte (2005) ressalta que a noção de comunidade interpretativa é próxima da concepção de “comunidade hermenêutica”, compreendida por pontos comuns de interpretação e de valorização, mesmo que seus membros não estejam no mesmo espaço e tempo.

Zelizer (1993) vê a noção de comunidade interpretativa como alternativa explicativa do jornalismo para além da sua atividade profissional, possibilitando descrever os jornalistas e suas práticas pelos processos intersubjetivos resultantes das percepções desses profissionais e do seu oficio, assim como das compreensões partilhadas acerca da realidade social da qual fazem parte e constroem nas narrativas do mundo.

A explicação do jornalismo como profissão foi, segundo Zelizer (1993), importante para descrever a funcionalidade dessa atividade profissional e para que os jornalistas se identificassem com os demais colegas de ofício no desempenho de uma atividade comum, criando um sentimento de partilha e de autoridade sobre uma especificidade de atuação. Esse sentimento de partilha e de autoridade, de acordo com o autor, gerou condições para a circulação de um grupo de valores relacionados a um tipo de tratamento que um profissional do jornalismo desempenha na composição de textos, tais como ser objetivo, neutro ou até mesmo independente.

Zelizer (1993) questiona, no entanto, a perspectiva meramente profissional, pois entende que ela não dá conta de explicar os elaborados mecanismos de construção da realidade por meio das dinâmicas textuais. No seu entender, a noção de “comunidade interpretativa” aponta para a necessidade de compreender que existe uma rede informal elaborada entre os jornalistas, na qual assimilam e compartilham regras, demarcam fronteiras e permitem estabelecer as atitudes apropriadas e inapropriadas para o exercício da atividade profissional. Essa visão aponta para a ideia de que os jornalistas não atuam sozinhos, e sim em uma rede coletiva que vai além dos limites organizacionais das empresas jornalísticas, e

que isso pode ser percebido nas práticas jornalísticas de realizar trocas interpessoais não formais, que estabelecem um discurso sobre essa prática e sobre os acontecimentos retratados por ela.

Vale ressaltar que as regras deontológicas ou educacionais são menos importantes do que uma circulação difusa que possibilite percepções interpretativas comuns, levando a uma leitura e narrativa da realidade. A identidade e o modo de ser do jornalista são consolidados a partir do discurso que ele tem sobre si mesmo e de como estabelece padrões de autoridade e de uma memória acumulada sobre o que é jornalismo e como ele deve ser feito. Essa perspectiva leva-nos à compreensão de como os jornalistas se autoimputam o poder da interpretação dos acontecimentos e como isso se materializa nos procedimentos de elaboração do texto (ZELIZER, 1993).

A prática jornalística é norteada pela memória acumulada das consideradas “boas práticas” ou “boas coberturas” jornalísticas realizadas anteriormente e confirmadas pelas várias premiações concedidas aos jornalistas por esses trabalhos. Quando se concede um Prêmio Pulitzer32 (Estados Unidos) ou um Prêmio Esso33 (Brasil) a um jornalista, por exemplo, o trabalho realizado, materializado no texto, está sendo apontando como um “bom trabalho” do profissional, e passa a ser motivo de prestígio e de credibilidade jornalística. Essas práticas jornalísticas são uma forma de os jornalistas atenuarem os aspectos instrumentais do discurso jornalístico e, ainda, de conservarem as fronteiras dessa comunidade interpretativa. Assim, a visão de Zelizer (1993) possibilita a compreensão da prática jornalística a partir da concepção de um espaço comum de partilha simbólica, e não apenas baseada nos contornos profissionais.

Apesar da importância que o termo “comunidade” tem na reflexão de Zelizer (1993), a autora deixa claro que não é possível precisar os fundamentos, os processos e os contornos de uma rede de interações informais que fornece os parâmetros avaliativos. Desse modo,

32 O Prêmio Pulitzer, concedido pela Universidade de Colúmbia, Nova York, às pessoas que realizaram

trabalhos de excelência nas áreas de jornalismo, literatura e composição musical, foi criado em 1917 por desejo de Joseph Pulitzer, que em 1912, já à altura de sua morte, havia legado recursos à Universidade para que criasse o Curso de Jornalismo. O Pulitzer é subdividido em 21 categorias, e em 20 delas os vencedores recebem um prêmio de dez mil dólares em dinheiro e um certificado. O vencedor da categoria Serviço Público de Jornalismo ganha uma medalha de ouro, e o prêmio é sempre atribuído a um jornal, e não a um indivíduo, mesmo que este seja citado. No âmbito do jornalismo, apenas matérias e fotografias publicadas por jornais nos Estados Unidos podem concorrer ao Pulitzer.

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O Prêmio Esso de Jornalismo, anteriormente denominado Prêmio Esso de Reportagem, é a mais importante distinção conferida a profissionais de imprensa no Brasil. O prêmio, patrocinado pela Esso Brasileira de Petróleo Ltda., é concedido anualmente a jornalistas e veículos de comunicação que se destaquem com reportagens e outros trabalhos de mídia ao longo do ano. A premiação vem ocorrendo ininterruptamente desde 1955 e possui 13 categorias, além de uma premiação especial dedicada à contribuição à imprensa. O prêmio tem alta reputação e credibilidade, e os profissionais que o recebem gozam de grande prestígio na imprensa brasileira.

conforme a autora, é preciso atentar para o risco de se conceber uma identidade única jornalística, homogeneizando os jornalistas e os jornalismos, sem levar em conta a diversidade de formas, realidades, valores e práticas, nas diversas partes do mundo.

Com base no olhar de Bauman (2003) sobre comunidade, Leal e Jácome (2013) esclarecem que os jornalistas não formam um grupo social estável e definido, e sim um grupo de caráter performático, constituído a partir de trocas e interações que permitem diferentes modos de pertencimento e de permanência nele. Talvez seja esse o motivo de Traquina (2004b, 2005b) não utilizar o termo comunidade para referir-se ao conjunto dos jornalistas, e sim o de “tribo” jornalística, em vários dos seus estudos sobre o jornalismo. No entanto, Ponte (2005, p. 123-124) ressalta que apesar de as comunidades interpretativas serem atravessadas por variáveis locais, temporais e políticas, podem ser identificados traços comuns na prática profissional do jornalismo em sociedades abertas e se o espaço e o tempo são seus elementos estruturadores. Pontua também a autora que não se pode falar de uma comunidade supra- histórica que ignore

[...] a diversidade de trajectórias que marcaram o jornalismo (por exemplo entre um modelo anglo-americano, de crença na separação entre factos e opiniões e um modelo mais interpretativo e opinativo, na imprensa latina, ou um prolongado constrangimento à liberdade de imprensa, como na sociedade portuguesa). (PONTE, 2005, p. 123-124)

A concepção de “comunidade jornalística” defendida por Traquina (2004b, 2005b) está sustentada em duas perspectivas complementares: a de que os jornalistas possuem critérios para estabelecer o que é noticiável (os valores-notícia) e a de que possuem um modo específico de agir, de falar e de ver, além de competência profissional e imediatismo e estão imersos em uma cultura profissional. Essa comunidade está, de acordo com o autor, fortemente enraizada em valores surgidos no século XIX, tais como as notícias, a procura pela verdade, a independência dos jornalistas, a exatidão e a noção de jornalismo como serviço público.

Em vista disso, Naymam (1973 apud TRAQUINA, 2005b, p. 36) considera que os jornalistas formam uma “comunidade mais ou menos homogênea, cujos membros partilham identidade, valores, definição de papeis e interesses” e fazem parte de uma cultura composta de uma série de crenças, mitos, valores, símbolos e representações que marca a produção das notícias. Essa identidade profissional, para Traquina (2005b), é um ethos, pois define a forma de ser jornalista e estar no jornalismo, e para compreendê-lo desenvolve seis categorias

essenciais: o imediatismo, a competência profissional específica, a maneira de ver, a maneira de falar, a maneira de agir e a cultura profissional.

Os elementos que caracterizam essa comunidade interpretativa, a partir da perspectiva de Traquina (2004b, 2005b), Tuchman (1978, 2002) e outros autores, serão discutidos nos itens a seguir. É importante compreendermos que as notícias e a produção noticiosa estão inseridas em um contexto específico na organização do trabalho informativo, a saber: nas redes noticiosas em constante negociação; no ritmo do trabalho jornalístico; na relação entre fatos e fontes, baseadas na rede noticiosa em instituições legitimadas; e nas negociações entre jornalistas e concorrência.

3.3.1 Ordem no tempo e no espaço

Para compreender a complexidade e a variabilidade dos tempos jornalísticos, Ponte (2005) aponta ser necessário lançar um olhar mais apurado sobre o que significa isso no jornalismo, mediante a diferenciação entre um tempo natural e um tempo social. O primeiro é um tempo cósmico e de grandes ciclos que se repetem, enquanto o segundo é a nossa percepção do tempo a partir de uma perspectiva social e que possui diversas modalidades (ecológicas, técnicas, econômicas, míticas, históricas e ritualísticas), resultante de tempos diferentes. Assim, o jornalismo, na concepção da autora (2005), é uma das modalidades mais complexas desse tempo social, pois, para perceber o tempo jornalístico, faz-se necessário “entender a dimensão sincrónica com que um conjunto de acontecimentos se apresenta e situar essa sincronia numa dimensão diacrónica, que aponta para processos de identificação, de memória e de reconhecimento pelas partes envolvidas” (p. 126).

Um dos elementos desse tempo jornalístico é a noção polissêmica de atualidade, que não significa necessariamente um presente histórico. Ponte (2005) reconhece que a atualidade no jornalismo contém “acto, enunciação performativa que afecta a nossa percepção dos acontecimentos”, pois aceitamos, como público, que o “passado recente ou a prospecção futura de acontecimentos nos sejam apresentados como sendo o presente” (p. 125). A autora reforça esse ponto de vista afirmando que o manejo do tempo presente, e em “particular nos títulos, evoca um presente narrativo, não histórico, não-cronológico, destinado a uma dramatização da acção relatada” (PONTE, 2005, p. 125).

Para Traquina (2005a), o imediatismo é essencial para se compreender como essa “tribo” se articula em torno de um deus Kronos, posto que a organização jornalística funciona dentro de um ciclo temporal (“o dia noticioso”), que impõe limites à natureza das notícias, e

segundo uma lógica na qual a urgência é um valor dominante, e o planejamento torna-se essencial para lidar com as horas de fechamento. Parte dos trabalhos é planejada no início do dia de trabalho – a agenda, como se diz no jornalismo –, na tentativa de dar ordem ao caos e à imprevisibilidade.

O imediatismo é um fator determinante para definir a competência profissional específica de um jornalista, que é determinada pela capacidade de domínio de tempo desse profissional. A capacidade performativa do jornalista está centrada em um conjunto de saberes profissionais, que são baseados na sua capacidade de reconhecer quais são os acontecimentos que possuem valor como notícia; nos passos que deve seguir para a coleta de dados para a elaboração da notícia; na identificação e verificação dos fatos envolvidos no acontecimento; e, ainda, na capacidade de lidar com a linguagem jornalística, a partir de regras estilísticas, a saber: escrita direta e concisa, palavras concretas, voz ativa, descrição detalhada e precisão pormenorizada (TRAQUINA, 2005b, p. 42-43). A maneira de agir dos jornalistas está profundamente arraigada em suas capacidades performativas, ou seja, no seu saber de procedimento.

A “tirania do tempo” na produção noticiosa obriga as empresas jornalísticas a lançarem mão de estratégias para dar conta do desafio diário de lidar com uma matéria-prima (os acontecimentos), que surge em qualquer lugar e a qualquer momento. As estratégias para lidar com essa imprevisibilidade é impor uma ordem no tempo e no espaço, tecendo uma rede noticiosa para “capturar” os acontecimentos (MOLOTCH; LESTER, 1974; TUCHMAN, 1978, 2002 apud TRAQUINA, 2004a, p.187-188).

Para tentar impor uma ordem no “espaço acontecimental”, Tuchman (1978 apud TRAQUINA, 2005a, p. 181) descreve três estratégias utilizadas pelas empresas jornalísticas: 1) divisão do mundo em áreas de cobertura (territorialidade geográfica); 2) escalação de jornalistas para estarem em determinadas organizações que possam produzir acontecimentos noticiáveis; 3) divisão interna dos produtos jornalísticos em seções e/ou editorias sobre determinados assuntos (especialização temática).

Essas estratégias partem do pressuposto de que os acontecimentos dignos de se tornarem notícias ocorrem em determinados locais e em outros não, o que pode levar a “buracos” na rede noticiosa, concentrando a cobertura das empresas jornalísticas nos grandes centros urbanos, em detrimento do interior do país ou de países em desenvolvimento. O que estiver fora dessa área de cobertura só se tornará notícia em situações de desordens naturais

(catástrofes ambientais)34, sociais (manifestações, conflitos e guerras) e morais (crime, corrupção), ou quando grandes autoridades se deslocarem para essas localidades, o que gera a cobertura mais pela notoriedade das autoridades do que pela localidade em si.

A mesma lacuna ocorre com a especialização organizacional, cuja cobertura estará centralizada em determinadas organizações, principalmente as públicas, em detrimento de outras pouco noticiadas. Por exemplo, instituições políticas como a Presidência da República, o Senado e a Câmara de Deputados recebem dezenas de jornalistas cotidianamente para cobrir os acontecimentos que ali ocorrem, enquanto outros órgãos recebem menos cobertura, pelo fato de os jornalistas acreditarem serem eles menos relevantes, portanto, menos noticiáveis.

E, por fim, a especialização temática leva a uma homogeneização dos produtos jornalísticos. As seções temáticas são praticamente as mesmas na maioria dos jornais (editorias de política, economia, cultura, esporte, internacional, cidades e ciências), alterando um item ou outro da sua oferta temática e diversificando sua cobertura com os suplementos e cadernos especiais. A especialização temática intensificou-se nas últimas décadas nas empresas jornalísticas, em decorrência da segmentação no jornalismo, o que levou à implementação e publicação de suplementos e cadernos diários e/ou especiais com o claro objetivo de alcançar determinadas fatias de público. A temática ambiental vem ganhando espaço nos grandes jornais, com editorias específicas e seções, tanto nas edições impressas como nas plataformas digitais desses veículos, demonstrando a importância que esse tema vem recebendo na cobertura jornalística. Recorrendo a Deleuze (1996), podemos afirmar que enquanto alguns temas e assuntos ganham visibilidade na mídia, outros são silenciados. Luzes são projetadas em alguns objetos, enquanto outros ficam nas sombras da invisibilidade. Temos, aqui, os temas ambientais ganhando cada vez mais visibilidade midiática.

As empresas jornalísticas também procuram impor, a partir do seu próprio biorritmo, uma série de estratégias para a realização de seu processo diário de produção noticiosa: 1) estabelecimento de uma rede temporal; 2) busca de planejamento do futuro pelos acontecimentos previstos (agenda). Essa teia temporal também gera alguns problemas que precisam ser destacados. Para Traquina (2005a), a rede noticiosa gera “lapsos temporais”, pois parte da premissa de que os acontecimentos com noticiabilidade ocorrem em determinadas horas do dia, concentrando a maioria das suas equipes nesses períodos. Fora desse horário, um acontecimento tem de provar que concentra valores-notícia importantes para que os veículos jornalísticos lhe deem atenção.

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Por exemplo, a ampla cobertura do desmoronamento dos morros nas cidades serranas do Rio de Janeiro em 2011, entre outras coberturas de desastres e catástrofes naturais.

A grande consequência a que se expõem os veículos de comunicação, a partir dessa dinâmica do trabalho jornalístico com um ritmo próprio, baseado no imediatismo e em relatos atuais dos acontecimentos do presente, é a de dar ênfase aos acontecimentos, e não às problemáticas, por exemplo, na cobertura de temáticas socioambientais, quando muitas vezes as notícias ficam centradas na abordagem das catástrofes naturais, não apresentando suas causas. Para Tuchman (2002, p. 98), os “acontecimentos estão concretamente enterrados na teia da facticidade” e as perguntas do lide tradicional (quem, o quê, quando, onde, como e por quê) refletem essa lógica.

É preciso destacar o processo interativo da produção das notícias, tendo em vista que os diversos agentes sociais têm um papel ativo e constante no processo de negociação. Molotch e Lester (1974 apud TRAQUINA, 2005a, p. 185-187) estabeleceram três categorias de pessoas organizadas em torno do trabalho jornalístico: os promotores de notícias35; os news assemblers36 e os consumidores de notícias37. Na primeira categoria, temos aquele que fez parte do acontecimento (executor) ou que não participou do acontecimento e assume o papel de informar aos jornalistas sobre o acontecimento (informador).

Os diversos agentes sociais têm posições diferentes quanto aos acontecimentos, pois alguns deles têm interesses em que se tornem públicos e outros, não. Desse modo, os jornalistas são o alvo prioritário da ação estratégica dos agentes sociais, em particular do campo político, que buscam visibilidade. Mas esses profissionais da notícia têm suas próprias necessidades de acontecimentos, o que nem sempre coaduna com a dos agentes sociais interessados em publicizar determinadas ocorrências.

3.3.2 A “tribo jornalística”: valores e narrativa

A “tribo jornalística”, como denomina Traquina (2005b), possui uma cultura profissional sustentada no seu imediatismo, na sua maneira de agir, de falar e de ver o mundo. Essa cultura é rica de mitos38, símbolos e representações que estabelecem uma liturgia entre o bem e o mal. Ao formar uma comunidade que encara a profissão não como simples trabalho, e sim como a própria vida, o jornalista casa-se com a profissão.

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Os news promotors são aqueles indivíduos que identificam uma ocorrência especial para ser tornar notícia.

36 Os news assemblers são todos os profissionais que transformam as ocorrências em acontecimentos públicos

para publicações ou radiodifusão.

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Os news consumers são aqueles que assistem a determinadas ocorrências disponibilizadas pela mídia.

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Traquina (2005b) explica que a mitologia jornalística coloca os jornalistas no papel de servidores públicos, os “cães de guarda” na proteção dos cidadãos contra os abusos de poder, na função de “Quarto Poder’.

A discussão de Traquina (2005b) está centrada na compreensão do processo de transformação dos acontecimentos em notícias, e a que ordens e estratégias elas estão submetidas. Saber como as notícias se formam – mediante as rotinas produtivas de acesso ao campo jornalístico, na relação estabelecida pelo repórter com as fontes e suas redes de interação com outras instituições sociais – é um ponto importante para as reflexões do autor e sobre as quais nos deteremos a seguir.

Na busca por responder “o que as notícias são”, Traquina (2005a) parte da perspectiva da teoria construcionista para elaborar outra teoria, a interacionista, reunindo uma grande gama de descobertas de diversas pesquisas antecedentes. Para essa explicação teórica, as notícias são o resultado de uma interação social que ajuda na construção da realidade, que por sua vez é uma das condições de formação das notícias.

As notícias também refletem: 1) os acontecimentos cotidianos; 2) os constrangimentos organizacionais impostos pelos proprietários das mídias e/ou por fatores econômicos; 3) o condicionamento da atividade jornalística pelas rotinas produtivas; 4) as narrativas que direcionam a escrita jornalística; 5) os valores de noticiabilidade dos jornalistas; 6) as identidades das fontes que fornecem informações aos jornalistas. São todos esses elementos que, mediante um processo de interação social, constituirão o resultado final: as notícias. Traquina (2005a, p. 180) tem as notícias como um produto resultante “de um processo de produção, definido como a percepção, seleção e transformação de uma matéria-prima (acontecimentos)”.

Os acontecimentos são um mar de matérias-primas que podem e são selecionadas entre o que é digno de se tornar público ou não. Esse julgamento, realizado pela noticiabilidade, são os valores de saliência que a comunidade jornalística fornece a alguns acontecimentos, em detrimento de outros. Na busca por preencher as páginas e os espaços diários com notícias, os jornalistas vivem o que Traquina (2005a, p. 181) chama de “tirania do tempo”, que estabelece o trabalho jornalístico como “atividade prática e quotidiana, orientada para cumprir as horas de fechamento”.

A “tribo” jornalística tem uma maneira de ver que se deve, em grande parte, aos valores-notícia partilhados por essa “comunidade interpretativa”. Traquina (2005b) explica