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Capítulo II – Enquadramento teórico

3. Orações subordinadas adjetivas e orações subordinadas substantivas – contexto

3.2. Em latim

Em comparação com o português, tentaremos, neste momento, assinalar as principais diferenças e semelhanças entre tais construções sintáticas em latim – orações subordinadas relativas e orações subordinadas completivas – e as que lhes correspondem em português.46 Procuraremos, fundamentalmente, destacar os aspetos que consideramos

mais relevantes no âmbito do nosso estudo.

3.2.1. Orações subordinadas relativas (adjetivas)

Este tipo de orações em latim corresponde às orações subordinadas adjetivas relativas (com antecedente) em português. Designam-se por “relativas”, pois, tal como em português, são introduzidas por conectores relativos (pronome relativo “qui”, “quae”, “quod”, nas suas variantes flexionais) que substituem, na oração subordinada, o antecedente presente na oração subordinante. Importa referir que o pronome relativo em latim concorda, por via de regra, em género e número com o seu antecedente, no entanto expressa-se no caso correspondente à função sintática que ocupa na oração subordinada que introduz. Estas orações são ainda designadas por “adjetivas”, porque, também em latim, modificam uma expressão nominal à qual se referem.

Ao contrário do que acontece em português, a distinção entre orações relativas adjetivas (com antecedente) e orações relativas substantivas (sem antecedente), e entre orações relativas (adjetivas) restritivas e orações relativas (adjetivas) explicativas, não integram a tipologia de classificação de orações subordinadas em latim. No entanto, é importante clarificar que isso não significa que essas estruturas sintáticas não existam em latim; elas existem, mas as gramáticas não consideram tais distinções.

Na língua latina, as orações subordinadas relativas apenas se distinguem pelo modo verbal – modo indicativo ou modo conjuntivo – exprimindo, cada um destes, valores semânticos diferentes: enquanto as orações que se encontram no modo indicativo

46 Como apoio à nossa reflexão foram consultadas as gramáticas latinas de Borregana (1999: 206-215) e

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assumem um valor assertivo, as que se encontram no modo conjuntivo associam o valor restritivo a um valor circunstancial.

3.2.2. Orações subordinadas completivas

Estas orações em latim correspondem às orações subordinadas substantivas completivas em português. Designam-se por “completivas”, já que, tal como na língua portuguesa, completam o sentido da oração subordinante.

Também em latim, este tipo de orações pode ser introduzido por conjunções subordinativas ou não conter qualquer elemento de ligação (apresentando o verbo no modo infinitivo): as que se ligam à oração subordinante por uma conjunção subordinativa (por exemplo, “ut”, “quod”, “ne” e “quin”) são classificadas como orações subordinadas completivas conjuncionais; as que não possuem um elemento de ligação têm o verbo no modo infinitivo (presente, perfeito ou futuro) e classificam-se como orações subordinadas completivas infinitivas. Estas orações podem ainda ser introduzidas por pronomes interrogativos, advérbios interrogativos e partículas interrogativas, sendo-lhes atribuída a designação de orações subordinadas completivas interrogativas indiretas.

Enquanto na língua latina é realizada a distinção entre estes três subtipos de orações subordinadas completivas, de acordo com critérios como, por exemplo, o tipo de verbo ou o elemento de ligação, em português não ocorre essa distinção, ou seja, não existe uma subclassificação para este tipo de orações.

Em latim, as completivas infinitivas são as mais frequentes. Em português, apesar de a sintaxe da oração infinitiva ainda existir, esta não é a forma preferida. Este subtipo de orações completivas contém o sujeito (e o predicativo do sujeito, se existir) no acusativo, pois ambos integram o complemento direto da frase – função sintática desempenhada pela oração subordinada completiva infinitiva.

Assim como em português, este tipo de orações (tanto as infinitivas como as conjuncionais) ocupa, normalmente, a função sintática de complemento direto; há, no entanto, orações deste tipo que ocupam a função sintática de sujeito da frase (quando acompanhadas por verbos ou expressões impessoais), mantendo o sujeito (e o predicativo do sujeito) em acusativo.

3.2.3. Importância do estudo das orações em latim para a aprendizagem das mesmas em português

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Relembrando que, no ponto 2.2. deste capítulo, defendemos a importância do ensino do latim na escola, pretendemos agora demonstrar em que medida o estudo destes conteúdos gramaticais em latim poderá facilitar a compreensão dos mesmos em português. Partindo da comparação que fizemos com o português, desenvolveremos essa tese, explicando o que nos leva a crer nessa ideia.

Em primeiro lugar, é necessário ter em conta que as aulas de latim assentam num paralelismo constante entre a língua portuguesa e a língua latina; portanto, consideramos que seguir um método comparativo, focado essencialmente em semelhanças, se revelará bastante vantajoso na diminuição das dificuldades do estudo dos tópicos em português, pois facilita o processo de mobilização de saberes entre uma língua e outra.

Atualmente, apesar de o conflito existente entre a terminologia a usar em latim e a que é usada em português, ainda se encontram mais semelhanças do que diferenças entre tais orações em latim e as que lhes correspondem em português. Embora, em relação a outras questões de morfologia e sintaxe, seja notório um conflito terminológico causador de alguns obstáculos no momento de ensino-aprendizagem, no que diz respeito à frase complexa essa situação não se coloca de forma tão relevante, existindo, entre elas, mais pontos de contacto do que de distanciamento. Ainda que a descrição gramatical de tais orações em latim apresente algumas diferenças relativamente à língua portuguesa, continua a existir uma proximidade entre essas estruturas sintáticas, nas duas línguas.

Posto isto, na nossa opinião, a introdução das orações nas aulas de Latim A pode e deve ter, sempre, um momento prévio de revisão de noções básicas acerca das mesmas em português, para que, daqui, se parta para a exposição do conteúdo na língua latina, à medida que se vão reconhecendo pontos de contacto entre ambas as línguas. Para nós, mais importante do que ultrapassar as diferenças entre uma convenção e outra é tentar, ao máximo, aproximar estruturas, mesmo que tenhamos de lhes dar “nomes” distintos. Este processo deverá terminar com atividades de explicitação e sedimentação de conhecimentos (como, por exemplo, exercícios de versão e retroversão), que obriguem o aluno a refletir sobre a estrutura das duas línguas, relacionando-as entre si. Como resultado, os alunos aprofundarão os seus conhecimentos acerca das duas realidades linguísticas.47

Em segundo lugar, partindo do geral para o particular, defendemos que determinados princípios reguladores destas orações se tornarão mais claros em português,

47 Cf. Anunciação (2013: 48-51) e Almeida (2015: 49-50). Estes trabalhos servem de apoio à nossa reflexão

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quando estudados na língua latina. Os nossos alunos de latim pensam em português, logo estarão sempre a fazer a ponte entre as duas realidades linguísticas. Deste modo, os conhecimentos resultantes da aprendizagem de algumas regras de funcionamento morfossintático em latim facilmente serão transportados para a língua portuguesa, clarificando e consolidando determinados aspetos gramaticais comuns às duas línguas. Por exemplo, em relação às orações subordinadas relativas, defendemos que a introdução da regra de concordância do pronome relativo (em género e número) com o antecedente, ajudará o aluno a compreender melhor o conceito de antecedente e a perceber mais eficazmente a função do pronome relativo na oração relativa. Além disso, julgamos que o discente, ao perceber que o pronome relativo pode ser flexionado, facilmente depreende que este possui, necessariamente, funções sintáticas. Logo, distingue-se das conjunções, que são meros elementos de ligação.

Quanto às orações subordinadas completivas, julgamos que o estudo do funcionamento morfossintático das mesmas, nomeadamente o das infinitivas, facilita o entendimento das orações subordinadas substantivas completivas em português. Na nossa perspetiva, a introdução da regra que dita em que caso o sujeito deste tipo de orações se deve encontrar ajudará o aluno a perceber a definição de oração completiva, já que este se apresenta no acusativo, por integrar, tal como em português, o complemento direto da frase. Por isso, tais orações são um complemento ao sentido do verbo da oração subordinante, daí se designarem por “completivas”.

De uma forma geral, acreditamos que o fundamental, nas aulas de Latim A, é manter uma constante ligação com a língua portuguesa, para que o aluno desenvolva a capacidade de relacionar a estrutura das duas línguas. Quanto mais consciente o aluno estiver de todas as semelhanças e diferenças entre o português e o latim, mais aprofundados serão os seus conhecimentos gramaticais, tanto de uma língua como de outra.

Ainda assim, temos perfeita noção de que o estudo do latim não é suficiente para dissipar todas as dificuldades que decorrem do processo de ensino-aprendizagem das orações em português, mas pode, e muito, ajudar a diminuí-las. Além disso, embora esse seja um elemento com interesse e não negligenciável, não se aprende latim apenas para aperfeiçoar o português ou numa lógica comparatista – o latim também se aprende por si mesmo, pelo conjunto de janelas que abre por si só.

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Capítulo III - Relato da investigação-ação: