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Capítulo II – Enquadramento teórico

3. Orações subordinadas adjetivas e orações subordinadas substantivas – contexto

3.1. Em português

3.1.3. As orações nos programas e materiais didáticos de português

3.1.3.2. Os manuais e as gramáticas escolares de português

Em relação à forma como são introduzidos e abordados estes conteúdos nos materiais didáticos, a nossa reflexão parte da análise de manuais e gramáticas escolares35,

utilizados, quase todos, na escola onde decorreu a iniciação à prática pedagógica. Iniciando a nossa reflexão pela análise do manual do 7.º ano, este apresenta, nas páginas 152-153, quatro exercícios36: os dois primeiros incidem sobre o estudo do

pronome relativo “que”; os dois últimos recaem sobre o estudo das orações subordinadas adjetivas relativas. O modo como foi construída a abordagem aos dois conteúdos segue aquilo que defendemos anteriormente - o estudo do pronome relativo em paralelo com o estudo deste grupo de orações, de forma a facilitar a assimilação dos conhecimentos. Quanto ao tipo de exercícios propriamente ditos, consideramo-los bastante úteis e

35 Neto, Guimarães, Brochado, Amaral & Nunes (2016a) – manual do sétimo ano; Neto, Guimarães,

Brochado, Amaral & Nunes (2016b) – manual do oitavo ano; Pinto & Baptista (2013) – manual do nono ano; Cameira & Andrade (2016) – manual do décimo primeiro ano; Falcão (2016) – gramática escolar do 3.º ciclo do ensino básico; Oliveira & Junqueira (2016) – gramática escolar do ensino secundário.

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eficazes, no sentido em que facilitam a compreensão do funcionamento morfossintático do pronome relativo (exercícios 1 e 2) e das orações subordinadas adjetivas relativas (exercícios 3 e 4). Nota-se, no entanto, que os dois últimos exercícios estão condicionados pela ausência de reflexão sobre os dois sentidos que uma oração deste tipo pode introduzir.

No exercício 3, os discentes são levados a transformar frases simples em frases complexas, seguindo o exemplo apresentado; ou seja, constroem orações subordinadas adjetivas relativas colocando-as sempre entre vírgulas. O exercício 4 apresenta frases complexas constituídas por orações subordinadas adjetivas relativas restritivas, sobre as quais é pedida a transformação das orações subordinadas em adjetivos. A nosso ver, não parece fazer muito sentido que os alunos sejam levados a lidar ora com relativas explicativas, ora com relativas restritivas, sem que se reflita sobre o que as distingue, isto é, sem que seja explicado por que razões umas ficam entre vírgulas e outras não. Por outras palavras, defendemos que, mesmo numa fase inicial, a questão da semântica aliada à pontuação não deve ser ignorada.

Quanto ao manual do 8.º ano, queremos salientar três momentos diferentes. Nas páginas 48 e 4937, encontramos três exercícios de gramática: o primeiro consiste na

revisão/consolidação das orações subordinadas adjetivas relativas; os dois últimos servem de introdução à função sintática de modificador do nome – um incide sobre o modificador do nome restritivo e o outro sobre o modificador do nome apositivo. Embora consideremos que os exercícios foram bem construídos, note-se que os mesmos surgem sem se estabelecer qualquer relação com o facto de estas serem as funções sintáticas desempenhadas pelas orações revistas. No nosso entendimento, este momento poderia ter sido aproveitado para abrir uma brecha sobre esse aspeto.

A página 20138 apresenta um exercício que visa a introdução das orações

subordinadas substantivas completivas. Neste são colocadas questões que levam os alunos a refletir a partir de diferentes perspetivas, sobre o comportamento sintático dessas orações. Por fim, são levados a concluir que estas orações se designam “substantivas”, pelo tipo de funções sintáticas que ocupam. Ainda que este exercício nos pareça bastante adequado para o efeito pretendido, encaramos a falta de uma questão de identificação do elemento que as introduz como um ponto menos positivo a apontar.

37 Ver Anexo II.

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Na página 24339, depois de um exercício de revisão e consolidação, sobre as

orações subordinadas (adverbiais, substantivas e adjetivas), realiza-se, em jeito de síntese da matéria, a distinção entre os três grupos oracionais, no que diz respeito ao tipo de dependência nas relações de subordinação na frase complexa. Esta descrição teórica pareceu-nos bastante apropriada, pois entendemos que, principalmente nesta fase, a criação de momentos em que, de facto, se evidencia a diferença entre uma oração que depende de um grupo nominal e uma oração que depende de um grupo verbal é absolutamente necessária.

Em relação ao manual do 9.º ano, na página 56 (correspondente à unidade didática em que o programa prevê que sejam introduzidas as orações subordinadas substantivas relativas), encontramos dois exercícios40 que incidem sobre os dois grupos de orações que

são objeto do nosso estudo. O exercício 1 trabalha a distinção entre os dois tipos de orações subordinadas adjetivas relativas – as restritivas e as explicativas – e a identificação do respetivo antecedente. O exercício 2 testa a capacidade dos alunos em reconhecer as orações subordinadas substantivas relativas, confrontando-os com outras frases que incluem orações subordinadas substantivas completivas. Nesta etapa, a realização destes exercícios torna-se muito útil, já que permite relembrar as orações subordinadas adjetivas relativas e as orações subordinadas substantivas completivas, ao mesmo tempo que se dá início ao estudo das orações subordinadas substantivas relativas.

Todavia, defendemos que, ao último exercício, se poderia acrescentar uma tarefa: a identificação das funções sintáticas ocupadas por cada uma das orações subordinadas presentes nas frases. Isto permitiria, desde logo, aproximar as orações substantivas relativas e as orações substantivas completivas, ao concluir que todas elas ocupam funções sintáticas características de grupos nominais e, ao mesmo tempo, distingui-las das orações relativas que seriam relembradas no exercício anterior. Com esta atividade, na nossa opinião, a resolução do exercício tornar-se-ia muito mais produtiva.

Nas unidades didáticas seguintes, o manual sugere a realização de vários exercícios que solicitam a divisão e classificação das orações em causa41. Estes seguem,

maioritariamente, dois caminhos: por um lado, trabalham-se os dois subtipos de orações subordinadas adjetivas relativas em conjunto, confrontando frases que contêm apenas estas orações; por outro lado, insiste-se no confronto entre as orações subordinadas

39 Ver Anexo II.

40 Ver Anexo III. 41 Ver Anexo III.

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adjetivas relativas e as orações subordinadas substantivas completivas, utilizando frases complexas constituídas com estas e outras orações subordinadas, por exemplo adverbiais. Relativamente às orações subordinadas substantivas relativas, notamos que acabam por ficar um pouco “esquecidas”, não reaparecendo muito mais vezes nos exercícios de gramática, o que nos parece ser uma lacuna de alguma relevância, visto que possuem o estatuto de conteúdo “novo” introduzido neste ano de escolaridade.

No manual do 11.º ano, encontramos o mesmo tipo de exercícios, embora em menor quantidade42, devido ao facto de, nesta fase, ser esperado que a retoma dos

conteúdos aconteça, já, em jeito de revisão e/ou consolidação.

Por último, ao consultar as duas gramáticas escolares supramencionadas, percebemos que os exercícios de aplicação são muito idênticos aos apresentados pelos manuais; são, no entanto, mais extensos e em maior quantidade e variedade, relativamente a cada tópico gramatical. Em relação à gramática do 3.º ciclo do ensino básico, nas páginas 176-17743, encontramos um exercício de aplicação que vai ao encontro daquilo

que defendemos. Este pede a classificação das orações presentes num conjunto de frases nas quais só existem orações subordinadas adjetivas relativas (restritivas e explicativas) e orações subordinadas substantivas (completivas e relativas), ou seja, num mesmo exercício, os quatro tipos de orações são colocados em confronto. Quanto à gramática do ensino secundário, nesta predominam as solicitações de divisão e classificação de orações, em exercícios que contêm frases com todos os tipos de orações, isto é, as atividades práticas já se apresentam, apenas, com o objetivo de consolidar os conhecimentos gerais acerca da frase complexa, seguindo a mesma lógica de objetivos dos manuais escolares.

Após esta análise e reflexão, apresentamos, de seguida, algumas conclusões gerais, retiradas da revisão desses materiais didáticos.

Em primeiro lugar, verificámos que todos os manuais que foram analisados organizam as unidades didáticas fazendo uma divisão das atividades pelos domínios correspondentes, logo os exercícios gramaticais são separados de todos os outros. As gramáticas acompanham a seguinte sequência: exposição dos conteúdos através da simplificação das definições e das características de cada tópico gramatical e, no que diz respeito às orações, focalizando os principais aspetos dessas construções; depois da descrição de cada tópico gramatical, seguem-se os exercícios de aplicação. De acordo

42 Ver Anexo IV. 43 Ver Anexo V.

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com os objetivos propostos pelos programas para cada fase escolar, tanto nos manuais como nas gramáticas, há uma progressiva redução das atividades relacionadas com o ensino e treino da gramática (os exercícios sofrem, aos poucos, uma diminuição de quantidade, de variedade e de extensão), do ensino básico para o ensino secundário.

Posto isto, podemos afirmar que, apesar de várias alterações ao programa da disciplina, referidas no ponto 1. deste capítulo, não só a maioria dos materiais didáticos apresenta uma organização tradicional (apelando a um método mais expositivo e dedutivo), como também a maior parte dos exercícios possui, ainda, um cunho bastante normativo.44 Conforme é visível numa leitura atenta dos exercícios colocados em anexo,

apenas os manuais do sétimo e oitavo ano apresentam atividades de gramática com um cunho mais oficinal. Porém, defendemos que esse facto não coloca em causa a sua adequação, nem tão pouco os torna menos úteis e eficazes.

Ainda assim, constatámos que, além da lacuna que existe em relação às orações subordinadas substantivas relativas, não há um momento em que os vários aspetos diferenciadores (morfológicos, sintáticos, semânticos, etc.) sejam trabalhados em conjunto, numa perspetiva contrastiva.45 Nos exercícios que incidem sobre estes dois

grupos de orações, predominam as solicitações de divisão e classificação das orações. Por exemplo: questões que solicitem a identificação da função sintática desempenhada por tais estruturas poucas vezes são incluídas nos exercícios; questões que avaliem, concretamente, a correta compreensão daquilo que distingue, a nível semântico, uma relativa restritiva de uma relativa explicativa também não foram encontradas.

Concluindo, a nosso ver, consideramos que um dos aspetos a ser melhorado, no que diz respeito ao modo como são encarados estes conteúdos pelos materiais didáticos, talvez seja a criação de um momento em que se insista em exercícios que, pela forma como estão construídos, coloquem em evidência os vários aspetos caracterizadores dos dois grupos de orações. Isto ajudará, certamente, a clarificar e assimilar, mais eficazmente, as principais diferenças e semelhanças entre os mesmos. Seguindo esta orientação metodológica, os quatro subtipos de orações poderiam ser trabalhados em conjunto, num mesmo exercício, no qual seriam incluídas questões de ordem morfológica, sintática, semântica, etc.. Do mesmo modo, este tipo de trabalho pode basear-se na construção de três exercícios específicos que coloquem em contraste: as

44 Note-se o que Xavier (2013: 141-142) já tinha constatado no seu estudo.

45 Relembramos que, de todos os materiais consultados, encontramos apenas um exercício que reunia um

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orações adjetivas relativas restritivas e as orações adjetivas relativas explicativas, as orações substantivas completivas e as orações adjetivas relativas, as orações substantivas relativas e as orações adjetivas relativas, respetivamente.