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Capítulo II – Enquadramento teórico

3. Orações subordinadas adjetivas e orações subordinadas substantivas – contexto

3.1. Em português

3.1.2. Processo de ensino-aprendizagem das orações substantivas e das

Após uma revisão atenta dos principais aspetos descritivos e morfossintáticos dos dois grupos de orações31, concluímos que há, de facto, vários fatores que podem

contribuir para que o aluno sinta dificuldade em distinguir e classificar, corretamente, diferentes frases complexas com tais construções. Com efeito, consideramos que essas dificuldades se baseiam, essencialmente, em três situações diferentes; estas serão apresentadas de seguida, pela lógica progressiva dos programas32.

3.1.2.1. Orações subordinadas adjetivas - relativas restritivas vs. relativas explicativas

Na fase de diagnóstico desta nossa investigação-ação, verificámos que o único critério utilizado pelos discentes, para distinguirem as orações relativas restritivas das orações relativas explicativas, é a presença/ausência de vírgulas entre estas e a oração principal. Além destes dados observados nas turmas em causa, podemos afirmar, com base na nossa experiência pessoal enquanto estudantes, que esta é uma situação recorrente entre os alunos dos ensinos básico e secundário.

De uma forma geral, nos materiais didáticos, são utilizados três critérios de distinção entre a oração restritiva e a explicativa. O primeiro consiste na possibilidade ou impossibilidade de omissão de cada uma dessas orações na frase. O segundo baseia-se numa reflexão sobre a diferença de sentido entre elas. A acrescentar a estas duas formas de distinção, as definições vêm sempre acompanhadas da ideia de que, ao contrário das restritivas, as explicativas são sempre separadas por vírgulas.

Contudo, apesar de estas orações serem distinguidas semanticamente, a maioria dos discentes fixa-se nesta última referência relacionada com a pontuação, por ser, do

31 Como apoio à nossa reflexão foram consultadas as gramáticas de Mateus, Brito, Duarte & Faria (2003:

655-685) e de Moreira & Pimenta (2017: 190-193), e o Dicionário Terminológico para consulta em linha.

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ponto de vista deles, “mais fácil de memorizar”. Deste modo, os alunos acabam por não compreender verdadeiramente a função de cada uma das orações, preocupando-se, apenas, em encontrar uma forma “infalível” de as classificar corretamente.

Na nossa perspetiva, só é possível obter uma plena compreensão do funcionamento da oração restritiva e da oração explicativa, se forem considerados, estudados e compreendidos todos os aspetos que envolvem estes dois tópicos gramaticais: morfossintáticos, semânticos, pragmáticos e fonológicos (Pezatti & Câmara, 2014: 145). Se os alunos desenvolverem uma compreensão inadequada destas estruturas, também não serão capazes de as utilizar e interpretar corretamente. Além disso, é preciso transmitir aos alunos a ideia de que “a presença/ausência de vírgula na escrita é consequência da escolha do falante, da sua intenção comunicativa de construir uma restritiva ou uma explicativa” (Pezatti & Câmara, 2014: 152). Logo, é fundamental que os alunos façam o raciocínio no sentido inverso – em vez de reterem a ideia de que as orações explicativas “são explicativas, porque se separam por vírgulas”, devem antes reter que “por serem explicativas, se separam por vírgulas”.

Assim sendo, consideramos que esta questão deve constituir uma preocupação para os professores de português. Para nós, não é suficiente que os alunos respondam corretamente às questões em que têm de as classificar, porque, ao usar o método mencionado para as distinguir, a falta de uma compreensão adequada acaba por passar despercebida. Por isso, é sobretudo necessário aferir o correto entendimento das orações, a nível semântico.33

3.1.2.2. “Que” - conjunção subordinativa completiva vs. pronome relativo

Na nossa língua, muitos são os casos em que duas palavras, embora possuindo a mesma grafia e o mesmo som, pertencem a classes gramaticais diferentes (palavras homónimas). O vocábulo “que”, ora classificado, por exemplo, como conjunção subordinativa completiva, ora como pronome relativo, representa um desses casos. Quando classificado como conjunção subordinativa funciona como principal elemento introdutório das orações subordinadas substantivas completivas; quando classificado como pronome relativo é responsável por introduzir a maioria das orações subordinadas adjetivas.

33 Muito do que é dito nos trabalhos de Silva (2012: 50-52, 64-66, 73-78) e Almeida (2015: 28) serviu de

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Referindo-se a este vocábulo como um constituinte relativo, Mateus et al. (2003: 662) afirmam o seguinte: “o relativo ‘que’ é sem dúvida um dos mais polivalentes, pois além de ter a mesma forma do ‘que’ completivo, da partícula de ‘realce’ (…) e do segundo termo de comparação, tem outros valores semânticos”.

Dada a natureza morfossintática deste vocábulo, consideramos que estão reunidas as condições para que se criem dificuldades nos alunos durante o estudo das orações adjetivas e das orações substantivas. Se não existir uma correta compreensão do que caracteriza cada uma das estruturas sintáticas, os alunos não serão capazes de identificar o “que” corretamente e, por sua vez, classificarão de forma errada as orações por ele introduzidas.

Com efeito, defendemos que esta situação exige, do docente, um elevado cuidado e rigor, no momento da exposição da matéria. A nosso ver, o docente deve insistir naquilo que distingue, sintaticamente, a conjunção do pronome e, no mesmo sentido, deve procurar destacar a diferença entre uma oração que acrescenta informação sobre um nome e uma oração que é selecionada pelo verbo da oração subordinante. O trabalho do professor deve realizar-se, portanto, sem nunca esquecer esta questão, ou seja, no desenvolvimento das suas estratégias didáticas, o docente deve sempre ter em conta a possibilidade de os alunos confundirem os dois vocábulos, assim como os dois tipos de orações, e trabalhar no sentido de evitar que isso aconteça.

3.1.2.3. Orações relativas - subordinadas substantivas vs. subordinadas adjetivas

Em relação às orações subordinadas substantivas relativas sem antecedente e às orações subordinadas adjetivas relativas com antecedente, embora, desde logo, estas designações permitam distingui-las, há determinados aspetos que as aproximam. De entre eles, pretendemos dar ênfase ao facto de serem introduzidas por elementos morfológicos idênticos, ou seja, pertencentes às mesmas classes de palavras – pronomes, advérbios e quantificadores relativos. As primeiras são introduzidas pelos conectores relativos “quem”, “o que”, “onde” e “quanto”. As segundas são introduzidas por “que”, “quem” e “onde” (conectores relativos invariáveis) e por “o que”, “cujo” e “quanto” (conectores relativos variáveis).

Além destes aspetos que as tornam próximas, Mateus, et al. (2003: 678) dão-nos conta de várias outras situações em que, “dado o paralelismo entre as relativas livres e as

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relativas com antecedente (…), é possível estabelecer desde logo uma aproximação entre os dois tipos de construção”.

Vejamos o seguinte exemplo dado pelas autoras (2003: 680): “Quem vai ao mar perde o lugar”. Nesta frase, temos uma oração subordinante – “perde o lugar” – e uma oração subordinada substantiva relativa – “Quem vai ao mar” – introduzida pelo pronome relativo “Quem”. Tendo em conta as características semânticas do pronome relativo “quem” - que, neste caso, “corresponde a uma variável universalmente quantificada” -, a frase apresentada pode ser substituída por outras, mantendo a mesma significação: “Quem vai ao mar perde o lugar” é o mesmo que dizer “Aquele que vai ao mar perde o lugar” ou “Todo aquele que vai ao mar perde o lugar” (Mateus et al., 2003: 678-680).

Atentando nestas construções relativas, facilmente se depreende uma proximidade com as orações relativas com antecedente expresso, já que a segunda e a terceira frase, apesar de terem o mesmo significado da primeira, apresentam uma estrutura sintática diferente – estamos, portanto, diante de uma construção frásica em que temos um antecedente, representado por um determinante demonstrativo, seguido de uma oração adjetiva relativa iniciada por “que”.

Tendo em conta o fator de proximidade existente entre as substantivas relativas e as adjetivas relativas, defendemos que também estes dois tipos de orações são passíveis de serem confundidos pelos alunos, se não existir um trabalho sistemático por parte do professor no sentido de colocar em evidência os principais aspetos que as distinguem, tais como: o tipo de funções sintáticas que cada uma pode ocupar; o facto de as adjetivas relativas se referirem a um nome que as antecede, enquanto as substantivas relativas não possuem um antecedente expresso.