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O art, 4a do CP, em sua redação anterior, dispunha que a lei bra­ sileira era aplicável ao crime cometido, no todo ou em parte, no ter-

litório nacional ou que nele, embora parcialmente, produziu ou devia produzir seu resultado.

Estava, pois, consagrada a teoria da ubiquidade.

O art,, 6S atual não se apartou do modelo de 1940 Deu-lhe, ape­ nas, redação diferente, de molde a retirar da epígrafe “lugar do crime” a regra atinente à eficácia espacial da lei penal, desta tratando em dispositivo à parte e, ao mesmo tempo, em vez da expressão “crime cometido” , preferiu, para dissipação de dúvida, a fórmula do art 6° do Códice Penale italiano, “1’azione o 1’omissione..”

Trata-se, aliás, de diretriz traçada pela Comissão Redatora do Código Penal Tipo para a América Latina. Assim ficou redigido o art. 6- do citado diploma legal: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado” .

A disposição é por demais relevante, Se a lei brasileira é aplicá­ vel ao crime cometido no território nacional, quando se pode dizer que um crime foi cometido no território nacional? A respeito do assunto há várias teorias: a) Teoria da ação ou da atividade, segundo a qual o lugar do crime é aquele onde o agente praticou a atividade voluntária Considera-se, tão somente, o momento da execução, sen­ do indiferente o do resultado. Assim, se alguém é ferido no Canadá e vem, em conseqüência da lesão, a falecer nos Estados Unidos, a lei aplicável é a do Canadá, porque aí é que se verificou a atividade vo­ luntária. b) Teoria do resultado, qúe considera lugar do crime “ali, onde ocorreu, de fato, o resultado típico procurado pelo agente”, c)

Teoria da intenção, em que se leva em conta, na determinação do

lugar do crime, a intenção do agente Explicn Maggiore: se o agente queria, por exemplo, envenenar uma pessoa na França, ali se teria cometido o delito, ainda quando o efeito letal se houvesse verificado noutra parte, d) Teoria mista ou da ubiquidade. É a que tem prevale­ cido e que foi adotada pelo nosso Código. “Lugar do crime é aquele onde se realiza um dos momentos da sua marcha objetiva: um mo­ mento qualquer da execução ou do resultado final” (cf Aníbal Bruno,

Para que se aplique a lei brasileira, basta que uma fração da ati­ vidade executiva do agente tenha sido praticada em território nacional ou tenha nele, embora em parte, produzido seu resultado. Com a teoria da ubiquidade solucionam-se os problemas dos chamados crimes a distância Assim, se A prepara em Aracaju uma bomba para matar B em Assunção, e remete o engenho para o seu destino e, realmente, vem a matar B ou a não matar por circunstâncias alheias à vontade do agente, este responde pelo crime perante a Tustiça brasileira Se o fato for punível também no lugar onde o crime produziu ou devia produzir seu resultado, aí, também, ele será punido, Mas, para evitar o bis in

idem, isto é, a dupla condenação pelo mesmo fato, o art 82 do CP

proclama: “A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”

O exemplo dado pode ser invertido, e a situação, para a aplicação da lei brasileira, não se altera<

O art, 5Q do CP, estadeando o princípio da territorialidade, con­ signa, entretanto: “...sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional...”, oferecendo, desse modo, diz Aníbal Bruno, caminho à oportuna aplicabilidade de outros princípios, que aí estejam consagrados.

Entre nós, à maneira do que se passa na maioria dos Estados soberanos, não vige, apenas, o princípio da territorialidade da lei penal, Este constitui a regra. Mas, ao seu lado, há outros princípios.

Assim, se alguém, na Argentina, vem a cometer um crime contra o patrimônio federal, estadual ou municipal, ou contra a fé pública da União, de Estado ou de Município brasileiro, aplica-se a lei penal pátria, a despeito de a atividade criminosa desenvolver-se, inteiramen­ te, naquele país Trata-se da adoção do princípio real ou da proteção, invocável, também, nos crimes contra a vida ou a liberdade do Presi­ dente da República, bem como nos cometidos contra a administração pública, por quem está a seu cargo.

O CP, no art 7S, dispõe: “Ficam sujeitos à lei brasileira, embora

I — os crimes:

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da Repú­

blica;

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do

Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;

c) contra a administração pública, por quem está a seu

serviço”

Nesses casos predomina o princípio real ou da proteção. Pouco importa seja o agente nacional ou estrangeiro, pouco importa tenha sido o crime praticado fora do território nacional, pouco importa que o fato seja ou não punível no país em que foi cometido, que o agente tenha sido condenado ou absolvido no estrangeiro pelo mesmo fato, que o agente ingresse ou não no território nacional. Enfim: a aplicação da lei penal pátria, nas hipóteses retrossalientadas, independe de qual­ quer condição Fala-se, então, em extraterritoriaiidade incondicionada. Protegem-se aqui os interesses nacionais vulnerados pelo crime.

Óbvio que o réu deve ser citado Possivelmente mediante roga- tória. Não atendido o chamamento e tampouco autorizada a extradição ante eventual procedência da ação penal, a condenação terá apenas efeito moral.. a não ser que ele adentre o território brasileiro.

O art. 7a, I, d , do citado diploma dispõe, também, ser aplicável a lei brasileira ao crime de genocídio, quando o agente fo r brasileiro ou

domiciliado no B rasil Não se trata, como bem se percebe, da aplicação

do princípio real ou da proteção, mas, sim, do da personalidade ativa, uma vez que se considera, apenas, a figura do agente: brasileiro ou domiciliado no Brasil. No mesmo sentido, Aníbal Bruno e Nilo Batis­ ta (Teoria da lei penal, Revista dos Tribunais, 19 74, p . 23).

O art. 7°, II, do CP dispõe: “Ficam sujeitos à lei brasileira, em­ bora cometidos no estrangeiro: a) os crimes que, por tratado ou con­ venção, o Brasil se obrigou a reprimir ; b) praticados por brasileiro”

Na hipótese primeira, consagra-se o princípio da universalidade da lei penal, ou da justiça cosmopolita, ou da ultratenitorialidade ab­ soluta. Tais crimes são em número reduzido: danificação de cabos

submarinos, tráfico de mulheres ou crianças, comércio não autorizado de entorpecentes, comércio de publicações obscenas etc. Nessas hi­ póteses, o Brasil pode e deve perseguir e punir o autor do fato infrin- gente da norma, sem se importar com a sua nacionalidade ou lugar da perpetração do crime.

Na segunda— crimes praticados por brasileiros — vigora o princípio da nacionalidade ou da personalidade. A lei do Estado segue o nacional.

Em qualquer dessas duas situações a aplicação da lei penal bra­ sileira fica na dependência do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato também punível no país onde foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável

O art,. 7a do CP, com a reforma, no seu inc. II, c, trouxe uma novidade: “aplica-se a lei brasileira aos crimes praticados em aerona­ ves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade pr ivada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados”.

Trata-se de um novo princípio, o da representação, recomendado pela Comissão Redator a do Código Penal Tipo para a América Latina, em face de sugestão do saudoso Sebastian Soler (cf. Aníbal Bruno e Nilo Batista, Teoria, cit., p. 15). Na verdade, se o agente não for bra­ sileiro, tampouco a vítima, sem a adoção desse princípio não se apli­ caria a lei brasileira.

Tal princípio, segundo a reforma penal, sujeita-se àquelas con­ dições fixadas nas alíneas a, b, c, d e e d o § 29 do art. 7Q do CP, isto é: entrar o agente no território nacional; ser o fato punível também no país em que foi praticado; estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; não ter sido o agente ab­ solvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extin­ ta a punibilidade, segundo a lei mais favorável

O § 3- do mesmo artigo reza que a lei brasileira é também apli­ cada ao crime com etido por estrangeiro contra brasileiro fora do

Brasil. A aplicação da lei brasileira, nesse caso, subordina-se não só àquelas condições referidas no § 2- já citado, mas, também, a duas outras: a) que não tenha sido pedida ou tenha sido negada a extradição;

b ) que haja requisição do Ministro da Justiça

Trata-se do princípio da personalidade passiva, segundo alguns autores, ou, segundo outros, simples extensão do princípio real, da defesa ou da proteção

Desse modo, a lei penal pátria é eminentemente territorial, sem embar go de, em alguns casos, admitir a ultratenitonalidade, conforme vimos. Nas hipóteses cuidadas no art. 7-, I, fala-se de ultraterritorialí- dade incondicionada Nos demais, condicionada. Parece-nos mais correta a expressão “ultraterritorialidade” em vez de “extraterri tona­ lidade”. Esta dá a entender que a lei de um Estado pode ser aplicada em outro... Ademais, deve-se atentar ainda para a circunstância de que, embora a lei pátria seja aplicada aos crimes cometidos no território nacional, os agentes diplomáticos escapam à jurisdição criminal por­ que continuam submetidos à do seu pr óprio Estado, que pode julgá-los e puni-los. De modo geral as nações civilizadas concedem tais imu~ nidades aos agentes diplomáticos, escapando eles da jurisdição penal do Estado onde se encontrem acreditados Essas imuoidades diplo­ máticas encontram seu fundamento nas relações entre os Estados, como Poderes Soberanos e iguais, regra que depende, contudo, da reciprocidade de tratamento. Os cônsules, porque agentes administra­ tivos, não desfrutam desse privilégio, salvo se, em relação a eles, for celebrado algum tratado, Não o havendo, nos crimes comuns serão processados no Brasil e, nos funcionais, no seu país de origem (cf,

RTJ, 63/65).

Com razão pondera Aníbal Bruno: Há de se reconhecer também tal imunidade ao Chefe de Estado estrangeiro, quando se encontre em território nacional, inviolabilidade esta que se estende, também, aos membros de sua comitiva {Direito, c i t , p. 240 e s..).

Além disso, se algum crime for cometido no interior de um navio ou aeronave de natureza publica ou a serviço de Governo estrangeiro, em território nacional, sobre ele não incide a lei penal pátria. É que tais navios ou aeronaves são consideradas como extensão do território do Estado soberano a que pertencem.

No pertinente às sedes das embaixadas, são elas consideradas como território nacional, de sorte que, se algum crime for ali cometido, aplica-se a nossa lei penal (salvo se o agente gozar de imunidades)., Sem embargo disso, o nosso CPP, no art. 369, adianta que as citações que houverem de ser feitas em legações estrangeiras serão efetuadas mediante carta rogatória,, Trata-se, é bem de ver, de simples cortesia internacional

Os nossos deputados federais e senadores gozam de imunidades, desde a expedição do diploma Tais imunidades são materiais e formais, São eles “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opi­ niões, palavras e votos” , É como soa o art 53 da CF, Por outro lado, não podem ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável “Nes­ se caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão” (§ 2S do art., 53), Em face da Emenda Constitucional n. 35/2001, aboliu-se a licença prévia para o processo e julgamento dos congressistas. A propósito, o § 3a do mesmo artigo: “Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respec­ tiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação” , E o § 4- complementa: “O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de qua­ renta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora” . Anterior­ mente, o processo não podia ser instaurado se a Casa respectiva não autorizasse Agora, o processo pode ser instaurado, mas a Suprema Corte é obrigada a comunicar à Câmara dos Deputados ou Senado, conforme o caso, ter sido recebida denúncia ou queixa contra o con­ gressista, e fica aguardando, dentro naquele prazo, autorização para o prosseguimento da ação penal A nosso juízo, houve apenas “un jeu de mots...” A imunidade continua, de maneira diferente, mas continua, Se antes da EC n 35, a Câmara ou Senado dificilmente autorizava a instauração de processo, ante solicitação da Suprema Corte, por que cargas d ’água iria agora permitir o andamento do processo? Os vereadores são também invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do M u­

nicípio (CF, art, 29, VIII}. A imunidade formal não lhes foi concedi­ da. Quanto aos deputados estaduais, aplicam-se as mesmas regras sobie imunidades de que tratam o art, 53 e seus parágrafos da CF, com a redação dada pela EC n. 35/2001, por força do disposto no §

1G do a rl 27 do mesmo diploma.