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Métodos e técnicas de construção de cenários

2 CENÁRIOS PROSPECTIVOS NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

2.1 PLANEJAMENTO E ESTUDOS PROSPECTIVOS

2.1.6 Métodos e técnicas de construção de cenários

Cenários têm por base jogos de hipóteses sobre comportamentos plausíveis e prováveis das incertezas, sendo que a essência da metodologia está na delimitação e no tratamento dos processos e dos eventos incertos. Para Van der Heijden (2009), o segredo da metodologia de cenários reside no reconhecimento e na classificação dos eventos em graus diferentes de incerteza. Seja qual for a metodologia ou técnicas selecionadas para a construção de cenários prospectivos, organização e tratamento das incertezas são pontos cruciais de todas as metodologias.

Para Buarque (2003), as metodologias de construção de cenários podem ser classificadas em dois conjuntos distintos segundo o tratamento analítico: processo indutivo e processo dedutivo.

No método indutivo os cenários são construídos partindo da reunião e combinação de hipóteses sobre o comportamento dos principais eventos e constituem um jogo coerente de acontecimentos singulares. Este método explora a diversidade ao máximo e enriquece os cenários provendo escopo para incorporação de distintas visões, estimulando o trabalho em equipe, a conversação, o engajamento, o diálogo, a construção de equipe e a formação de consenso (HEIJDEN, 2009, p. 287). O método Godet é considerado indutivo, de dentro para fora, ou seja, iniciando de uma análise de suas características internas, busca identificar os elementos exógenos que podem influenciar os processos e eventos.

O método dedutivo, por outro lado, consiste em descobrir estruturas de futuro a partir dos dados e das informações apresentados pelos eventos e constitui um marco geral a partir do qual são formulados os cenários. Assim, procura-se deduzir o quadro de referências do conjunto dos eventos saindo do geral e indo para o particular por meio de uma descrição do estado futuro que traduza a natureza básica da realidade. Na sequência, procura-se distribuir os eventos de forma consistente com a descrição geral, organizando os processos como eventos singulares (BUARQUE, 2003, p. 31). Este método é considerado o mais analítico, o melhor para explorar novas áreas nas quais o pensamento ainda não penetrou e possui uma forte ênfase de fora para dentro. O método dedutivo também oferece uma abordagem passo a passo mais codificada. (HEIJDEN, 2009, p. 285-286). O método

da Global Business Network (GBN) é considerado dedutivo. O método Grumbach é uma mescla de ambos os métodos.

Sérgio Buarque destaca os seguintes princípios e diretrizes de orientação da metodologia e da prática de construção de cenários (BUARQUE, 2003, p. 29-30):

 Evitar o impressionismo e o imediatismo: não se deixar dominar e impressionar pelos problemas do cotidiano e pelas questões emergenciais que tendem a dramatizar a análise da realidade, questões estas que não constituem orientações para o futuro de realidades marcadas por grandes mudanças. Assim, é necessário não se deixar levar pela instabilidade nem pelas inércias estruturais de curto prazo;

 Recusar consensos: duvidar e desconfiar do senso comum e das ideias dominantes, tentando pensar diferentemente das visões consensuais e, aparentemente, indiscutíveis. A moda e as verdades consolidadas são os piores adversários de um bom trabalho de construção de cenários porque reduzem a capacidade de percepção dos fatores de mudança e das alternativas diferentes no futuro;  Ampliar e confrontar as informações: não se deixar levar e

influenciar pelas informações e afirmações da mídia, as quais são quase sempre dominadas pelos fatores de curto prazo, dramatizando e superdimensionando os problemas e os fatores inerciais. Por isso, é necessário ampliar as fontes de informação e conhecimento, recorrendo à produção científica, a dados e a informações estruturais;  Explorar a intuição: procurar dar espaços para que a intuição e a sensibilidade das equipes possam fluir livremente na busca da identificação das tendências e da definição das hipóteses de comportamento futuro. Como pensar o futuro não é um exercício estritamente técnico, é necessário estimular a manifestação dos sentimentos e das percepções, passando depois pelo tratamento técnico e pela análise de plausibilidade;

 Aceitar o impensável: recusar as posturas e atitudes inibidoras da criatividade e do pensamento não convencional, isto é, aquelas que descartam a priori hipóteses inovadoras. O importante consiste em interrogar e questionar, com abertura intelectual, sobre a lógica, as causas prováveis dos eventos e a plausibilidade das afirmações;  Reforçar a diversidade de visões: evitar grupos de trabalho com

grande uniformidade de visão de mundo e com tendência à convergência ou ao consenso fácil em relação à realidade e às

hipóteses sobre o futuro e procurar então criar um ambiente de criatividade e de confronto de percepções. Embora não possa haver um antagonismo tão grande de visões de mundo que impeça um trabalho em equipe, os grupos devem apresentar, intencionalmente, um leque razoável de diversidade e de capacidades técnicas e intelectuais;

 Ressaltar a análise qualitativa: antes de qualquer quantificação na descrição do futuro, é necessária a compreensão da natureza e da qualidade dessa realidade futura, baseada em um processo lógico e tecnicamente fundamentado no comportamento das variáveis e das incertezas. As quantificações com os modelos matemáticos possíveis e disponíveis servem apenas para dar a ordem de grandeza das trajetórias gerais e para a realização de teste de consistência.

Lindgren e Bandhold enfatizam que os cenários são instrumentos poderosos por diversas razões, destacando algumas delas (LINDGREN; BANDHOLD, 2003, p. 28-29, tradução nossa):

 Formato compatível com a mente humana: o pensamento baseado em cenários corresponde à forma como o cérebro funciona. O formato da descrição dos cenários (imagens e estórias) os torna facilmente memorizáveis. O que você pode visualizar, você pode acreditar;

 Abertura ao pensamento divergente: um conjunto de cenários pode representar qualitativamente futuros diferentes. Ao forçar sua mente para pensar qualitativamente em diferentes direções, treina-se a capacidade de pensar no impensável e, assim, melhorar a habilidade de antever eventos não usuais. O formato aberto, sem “certo” ou “errado”, também ajuda na exploração compartilhada do futuro;  Formato redutor de complexidades: Por intermédio de cenários,

características complexas e genéricas podem ser reduzidas a uma quantidade gerenciável de incertezas. Eles facilitam a redução da complexidade sem excesso de simplificações;

 Formato comunicativo: cenários são fáceis de comunicar e discutir. Um conjunto compartilhado de cenários dentro de uma organização, provê uma linguagem comum e uma visão de mundo que simplifica a tomada de decisão.

Planejar por meio de métodos e técnicas de cenários prospectivos implica em definir estratégias que definirão a vida futura da

organização, e, para tanto, estão disponíveis no mercado inúmeras ferramentas e metodologias.

Na sequência serão descritos, de forma resumida, seis métodos de construção de cenários. Cabe destacar que existem outros métodos, mas os que serão elencados abordam a construção de cenários prospectivos e possuem sólida base conceitual. A diferença existente entre eles se refere aos passos utilizados e não à filosofia. Todos seguem os princípios descritos pela prospectiva e definem claramente as etapas para a construção de cenários. Os métodos selecionados foram descritos por Michael Porter, Michel Godet, Peter Schwartz, Kees Van Der Heijden, Raul Grumbach e Gilberto Moritz, cujas sínteses foram baseadas nas respectivas obras desses autores.

Também serão descritas, resumidamente, algumas técnicas que auxiliam na construção de cenários prospectivos.

2.1.6.1 O método de Michael Porter

O método apresentado por Porter (1992), também conhecido como método de cenários industriais, como o próprio nome indica, tem como foco a indústria e como objetivo a elaboração de cenários industriais. Parte do princípio que os cenários prospectivos são a melhor ferramenta a ser utilizada por uma empresa no momento de escolher sua estratégia competitiva e também de que os possíveis comportamentos de qualquer empresa são funções do comportamento do macroambiente interagindo com o ramo industrial da própria empresa e que, por isso, ambos devem ser estudados.

Para Porter (1992), as incertezas regem todo ramo industrial e constituem a base conceitual para a construção dos cenários. Assim, todo ramo industrial é regido por cinco forças que são a base da definição das estratégias competitivas da empresa, a saber: a entrada de novos concorrentes no mercado, as ameaças de produtos substitutos, o poder de negociação dos compradores, o poder de negociação dos fornecedores e a rivalidade entre os concorrentes.

A metodologia é composta por oito etapas, nas quais os estudos das variáveis macroambientais e mercadológicas são analisados de forma harmônica e interativa, explicitando o comportamento da concorrência.

O Anexo E mostra as etapas do método descrito por Porter e seus respectivos objetivos.

A figura 8 ilustra o método esquematizado por Michael Porter.

Figura 8 – Método de Michael Porter

Fonte: Marcial e Grumbach (2008)

2.1.6.2 O método de Michel Godet

O método para construção de cenários prospectivos apresentado por Godet (1993), é baseado no princípio da causalidade para inferir as variáveis do sistema pela seleção e priorização das incertezas críticas e atores como entradas de seu modelo. Pode ser considerado um método rigoroso e que requer tempo para ser desenvolvido.

Os objetivos do método Godet (1993) são:

 Detectar os problemas prioritários (variáveis-chaves) para o estudo pela identificação das relações entre as variáveis do sistema específico sob estudo por meio de análise estrutural;

 Determinar, especialmente na relação entre as variáveis-chaves, os principais atores e suas estratégias e os meios à sua disposição para tornar seus projetos uma realidade;

 Descrever, na forma de cenários, o desenvolvimento do sistema sob estudo, levando em consideração o caminho evolucionário mais provável das variáveis-chaves e utilizando uma série de hipóteses sobre o comportamento dos vários atores.

O método proposto por Godet (1993, p. 28) é composto por seis etapas. O Anexo F mostra as etapas do método e seus respectivos objetivos.

A figura 9 ilustra o método esquematizado por Michel Godet.

Figura 9 – Método de Michel Godet

Fonte: Stollewerk apud Marcial e Grumbach (2008)

2.1.6.3 O método de Peter Schwartz

Peter Schwartz, ex-funcionário da Royal Dutch/Shell onde trabalhava com planejamento estratégico baseado em cenários, criou em 1988 a empresa norte-americana Global Link Network (GBN), cujo método concebido por Schwartz é também conhecido como método da

Global Link Network.

Em todas estas etapas do método são sempre levados em consideração os modelos mentais dos dirigentes, ou seja, seu paradigma, sua visão de mundo, suas preocupações e incertezas. Segundo Schwartz (1996, p. 61) é importante também o conhecimento dos modelos mentais do grupo responsável pela elaboração dos cenários, pois estes tendem a impedir a realização de perguntas adequadas que possibilitem o esclarecimento da questão que levará à melhor tomada de decisão.

A metodologia proposta por Schwartz (1996) é composta por oito etapas. As etapas do método descrito por Peter Schwartz e seus respectivos objetivos estão sintetizados no Anexo G.

A figura 10 ilustra o método esquematizado por Peter Schwartz.

Figura 10 – Método de Peter Schwartz

Fonte: Marcial e Grumbach (2008)

2.1.6.4 O método de Raul Grumbach

O método para elaboração de cenários prospectivos apresentado por Raul Grumbach (1997) baseia-se nos conceitos definidos pela prospectiva de que existem vários futuros possíveis e de que o futuro não será, necessariamente, uma extrapolação do passado.

Grumbach, brasileiro que estudou na Espanha, aliou algumas ideias de autores consagrados como Igor Ansoff, Michael Porter e Michel Godet às suas próprias conclusões e à sua equipe de colaboradores, fruto de diversas consultorias prestadas em órgãos públicos e empresas privadas no Brasil.

O método descrito por Grumbach (1997) fundamenta-se em conceitos de:

 Planejamento estratégico com visão de futuro baseada em cenários prospectivos, empregando simulação Monte Carlo;

 Análise de parcerias estratégicas, levando em conta princípios da teoria dos jogos que permitem a gestão estratégica, com base em análise de fatos novos obtidos pela inteligência competitiva.

O método Grumbach de gestão estratégica se ampara em várias técnicas e métodos: o brainstorming, os métodos Delphi e de impactos cruzados, o teorema de Bayes, a simulação de Monte Carlo, a teoria dos jogos e o processo de simulação e construção de futuro. Tem ainda seu

emprego facilitado por dois softwares: o Puma – sistema de planejamento estratégico e cenários prospectivos, e o Lince – sistema de simulação e gestão do futuro.

O método proposto por Grumbach (1997) é composto por quatro fases. As etapas do método descrito por Raul Grumbach e seus respectivos objetivos estão descritas no Anexo H.

A figura 11 ilustra o método esquematizado por Raul Grumbach, mostrando a integração entre as fases, etapas e passos, informatizados pelos softwares Puma e Lince.

Figura 11 – Método de Raul Grumbach

Fonte: Marcial e Grumbach (2008)

2.1.6.5 O método de Kees Van Der Heijden

O método para elaboração de cenários prospectivos apresentado por Kees Van Der Heijden (2009), a exemplo de outros especialistas, baseia-se nos conceitos definidos pela prospectiva de que existem vários futuros possíveis.

O autor não restringe o uso de cenários ao porte da organização e baliza sua análise preponderantemente por critérios qualitativos sem, no entanto, descartar o uso de ferramentas e técnicas quantitativas, como por exemplo, simulações. Também não exige dados históricos da organização.

Embora Van Der Heijden não tenha especificado etapas em seu método, o Anexo I descreve sob forma de etapas, visando melhor entendimento do método proposto para construção de cenários.

A figura 12 ilustra o método esquematizado por Heijden (2009), representando o percurso do planejamento por cenários.

Figura 12 - Percurso do planejamento por cenários de Van Der Heijden

Fonte: Ribeiro, Correia e Carvalho (1997, p. 55)

2.1.6.6 O ciclo estimulador de cenários de Gilberto Moritz

Baseado na observação de que o ambiente de prospecção de cenários, no Brasil, necessitava de uma ferramenta que estimulasse a aplicação dos métodos nas organizações e fundamentado na pesquisa baseada em casos, em ambiente acadêmico, Moritz estruturou o Ciclo Estimulador de Cenários.

O referencial metodológico organizado por Moritz e denominado Ciclo Estimulador de Cenários (Moritz, 2004) leva em conta elementos

de diversos cenaristas, tais como Godet e Grumbach, acrescido da experiência vivenciada pelo autor.

O autor observa que referido Ciclo Estimulador foi concebido para ser aplicado em ambiente com grupos de no máximo 50 pessoas, com tempo médio de aplicação entre 90 e 120 horas, dependendo do contexto e perfil organizacional. O Anexo J representa as fases de estruturação do Ciclo Estimulador para construção de cenários.

A figura 13 ilustra o método esquematizado por Moritz (2004), representando as fases do Ciclo Estimulador de Cenários.

Figura 13 - Ciclo Estimulador de Cenários de Moritz

Fonte: Moritz (2004)

2.1.6.7 Técnicas e métodos de apoio à elaboração de cenários

Diversas são as técnicas e métodos factíveis de serem empregadas, como apoio, na construção de cenários prospectivos. Entretanto, independentemente da técnica utilizada, “somente a análise de múltiplos cenários é a ferramenta indicada para examinar incertezas e expandir o pensamento das pessoas” (SCHOEMAKER apud MARCIAL e GRUMBACH, 2008, p. 75).

Geralmente as técnicas de elaboração de cenários são utilizadas de modo combinado nas organizações. No ambiente moderno da prospecção, por estimularem o potencial reflexivo e criativo das pessoas, as técnicas qualitativas têm maior destaque do que as técnicas quantitativas.

A cenarização interage com inúmeras disciplinas de distintas áreas, como por exemplo, a psicologia, a política, a economia, a demografia, entre outras. Mas, via de regra, o processo inicia com discussões sobre quais técnicas vão ser utilizadas para análise do ambiente e organização.

Marcial e Grumbach (2008) classificam as técnicas e métodos de apoio à elaboração de cenários em três grupos:

 De ajuda à criatividade;  De avaliação;

 De análise de multicritério.

As técnicas de ajuda à criatividade visam fazer o homem liberar sua criatividade auxiliando na descoberta desse processo criativo. O Anexo K ilustra as técnicas brainstorming, sinéctica, análise morfológica e questionários e entrevistas, utilizadas na construção de cenários prospectivos.

No que se refere às técnicas de avaliação, estas visam a estimar as variações de comportamento de determinados parâmetros e como tais variações repercutem em um dado sistema. O Anexo K ilustra as seguintes técnicas: método Delphi, método dos impactos cruzados e modelagem e simulação.

Quanto às técnicas de análise multicritérios, trata-se de um conjunto de técnicas e métodos cujo objetivo é facilitar as decisões referentes a um problema, quando se necessita levar em consideração distintos e múltiplos pontos de vista. O Anexo K apresenta algumas técnicas e métodos mais difundidos, como: método dos Exámenes, método Pattern, método Eléctre, método AHP e método Macbeth.

O Anexo L relaciona as técnicas árvore de relevância, data

mining, análise swot, estruturação dedutiva de cenários e

desenvolvimento de histórias, que também podem ser utilizadas como apoio na construção de cenários.

Em resumo, pode-se afirmar que os métodos e técnicas de construção de cenários quando baseados em uma análise consistente da realidade atuam como protagonistas na integração das incertezas para a edificação do futuro, rumando para além da projeção de cenários satisfatórios, na medida em que conduzem a uma transformação substancial na organização, sendo tão ou até mais importante quanto a construção dos próprios cenários.