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Planejamento estratégico e planejamento por cenários

2 CENÁRIOS PROSPECTIVOS NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

2.1 PLANEJAMENTO E ESTUDOS PROSPECTIVOS

2.1.1 Planejamento estratégico e planejamento por cenários

Os avanços científicos e tecnológicos descortinam novas perspectivas marcadas por profundas reestruturações econômicas, tecnológicas e sociais, tendo como elemento propulsor a Sociedade do Conhecimento. Para enfrentar com competência os desafios que se apresentam no século XXI, o conhecimento é tido como recurso imprescindível para as organizações e indivíduos.

Autores como Freeman e Soete (1994; 1995), Lundvall e Foray (1996), por exemplo, afirmam em seus trabalhos que a sociedade está diante de uma importante transição para uma forma de economia ainda mais forte e diretamente enraizada na produção e uso de conhecimentos. O ponto principal de tais contribuições é que as tecnologias de informação “dão à economia baseada no conhecimento uma nova e diferente base tecnológica, que radicalmente amplia as condições de produção e distribuição de conhecimentos, assim como sua inter-relação com o sistema produtivo” (LUNDVALL; FORAY, 1996, p. 13-4).

Marcial e Grumbach corroboram afirmando que

não constitui tarefa de fácil realização o acompanhamento de processos transformadores induzidos pelos vertiginosos avanços da ciência, pela revolução tecnológica e pela internacionalização da produção. Essas vertentes da globalização aliam-se a novos paradigmas políticos, ambientais, sociais e culturais, de forma que passam a exercer forte influência sobre o cidadão comum, as empresas e os países (MARCIAL; GRUMBACH, 2008, p. 11).

Assim, a evolução da ordem econômica, social e política requer um novo posicionamento das organizações frente às novas demandas de um mercado altamente competitivo e mutável. O planejamento e sua implantação nas empresas e instituições demandam um constante desafio aos gestores e governantes comprometidos com a efetividade organizacional.

O planejamento é um processo de decisão que envolve “o que fazer” e “como fazer” antes da ação ser implementada. “O planejamento

é necessário quando o estado futuro que se deseja envolve uma série de decisões interdependentes” (ACKOFF, 1970, p. 2).

Matus afirma que o planejamento “não é outra coisa que tentar submeter à vontade (do sujeito ou ator considerado) o curso encadeado dos acontecimentos cotidianos” (MATUS, 1996, p. 191). Negar o planejamento é negar a possibilidade de escolher o futuro, é aceitá-lo seja ele qual for.

Para Kilian (2009), o planejamento representa um processo de aprendizagem, uma preparação mental que aumenta a compreensão de uma situação. Simplificadamente, o planejamento é a reflexão antes da ação. Mesmo que o plano não seja executado precisamente como foi concebido, o processo deve resultar em uma consciência situacional mais profunda, a qual melhora e aperfeiçoa o processo decisório. O planejamento deve ser tomado como uma atividade de aprendizagem que facilita o exercício do julgamento.

Em síntese, o planejamento é essencial em situações novas nas quais a experiência não está presente previamente. A parcela significativa do valor do planejamento é que ele pode servir, em algumas situações, como um substituto para a experiência. Quando se tem experiência em determinada situação, pode-se intuir o que esperar, quais objetivos são viáveis e que ações tomar. Em situações novas, deve-se usar o planejamento como forma de pensar sobre o problema e conceber uma solução efetiva.

Kilian (2009) enfatiza que qualquer decisor deve primeiramente conhecer suas metas, objetivos ou fins. No entanto, apenas isso não é o suficiente, é necessário que o conjunto de decisões importantes estejam “imbricadas com a estratégia e o planejamento, dentro de um processo denominado planejamento estratégico, o qual deve considerar possíveis estados do futuro, baseados em estimativas razoáveis” (KILIAM, 2009, p. 19).

O planejamento é considerado estratégico quanto mais extenso no tempo for seu efeito e mais difícil de ser revertido2. Logo, o planejamento estratégico está ligado a decisões que possuem efeitos mais duradouros e difíceis de reverter. Ele é de longo prazo e é complementado pelo planejamento tático, de curto prazo. Ambos são necessários e não podem ser separados. O planejamento estratégico tende a afetar as atividades da organização como um todo (ACKOFF, 1970, p. 5).

2 O termo estratégico está intimamente ligado à incerteza. Quanto maior a incerteza, maior o

Chiavenato (2004) ressalta que o planejamento estratégico abarca a empresa em sua totalidade, abrangendo todos os recursos e áreas de atividade; preocupa-se em atingir objetivos no nível organizacional, é definido pela cúpula da organização e corresponde ao plano maior, ao qual todos os demais estão subordinados.

Oliveira define planejamento estratégico como:

o processo administrativo que proporciona sustentação metodológica para estabelecer-se a melhor direção a ser seguida pela empresa, visando ao otimizado grau de interação com os fatores externos – não controláveis – e atuando de forma inovadora e diferenciada (OLIVEIRA, 2007, p. 17).

Ogilvy (2002, p. 12) destaca que o planejamento estratégico tradicional “consiste principalmente em “prever” o futuro, modelar uma visão e, então, identificar os passos para cumprir a visão no contexto do futuro como previsto”. Daí, conclui-se que no planejamento estratégico tradicional há uma única interpretação do futuro, admitindo-se que os organismos e os atores sociais comportam-se de maneira previsível, em uma visão estática de tempo e de mundo.

Drucker (1995) assinala que o planejamento tradicional faz a seguinte indagação em relação ao futuro: “O que é mais provável que aconteça?”. Já o planejamento para a incerteza pergunta: “O que já aconteceu que irá criar o futuro?”. São abordagens completamente distintas. O tradicional caracteriza o pensamento linear; o segundo, foge a este padrão.

Assim, no planejamento estratégico tradicional as decisões, embora focadas no futuro, são tomadas na análise do passado e do presente. Não havendo fatos futuros para serem reduzidos a dados, o passado é dominante. Ideias sobre o futuro derivadas do passado e presente não levam em consideração o que pode acontecer, mas somente o que aconteceu e o que está acontecendo, o que caracteriza a extrapolação linear do passado e presente.

Para Kilian (2009), os dados utilizados no planejamento tradicional tendem a ser quantitativos, sugerindo uma hipótese de que, seguindo-se à análise, uma única interpretação do futuro é possível. “O resultado é um cenário padrão que não incorporou qualquer coleta sistemática de informações qualitativas. O plano construído em torno deste cenário padrão é o resultado dos processos.” Kilian (2009, p. 63).

Bertero (1995) enfatiza a necessidade de se rever o conceito de planejamento estratégico, afirmando que sua vida útil estendeu-se mais do que o previsto no ambiente administrativo das empresas, até meados dos anos oitenta. Em sua análise, o planejamento estratégico era predominantemente visualizado como um instrumento de previsão, coordenação e controle administrativo com foco financeiro, tendo como produto final uma multiplicidade de orçamentos, previsões e projeções de demonstrativos financeiros.

Para Moritz,

O conceito de planejamento estratégico deixou de funcionar exatamente no momento em que as condições dos negócios se alteraram, forçando uma revisão da própria maneira de se entender a questão estratégica. Planos estratégicos, embora construídos como voltados ao futuro, na verdade nada tinham a ver com ele. Os planos eram simplesmente memória do desempenho e das condições passadas da empresa. O planejamento estratégico não formulava nem criava estratégias, mas apenas ordenava e enunciava, sem jamais ter lançado luz sobre o futuro (MORITZ, 2004, p. 33).

O revés do planejamento estratégico se fez claro quando ocorreram as rupturas no ambiente de negócios das empresas em função das mudanças tecnológicas, sociais e econômicas. Daí ficou caracterizada a crescente incerteza, o surgimento das turbulências, a descontinuidade e em especial as mudanças bruscas no ambiente organizacional.

Segundo Goedert, Paez e Castro (1994) seja qual for a metodologia adotada para elaboração de planejamento estratégico, certamente passará pela abordagem de cenários. Nesse diapasão identificam-se duas abordagens: a “projetiva” de um único cenário e a “prospectiva” de múltiplos cenários. É na abordagem prospectiva que, modernamente, está calcada a maioria dos planejamentos estratégicos de instituições bem-sucedidas.

Cenários são construção de visões do futuro que poderão se realizar e objetivam preparar a empresa para antecipar-se às contingências, com consciência dos riscos e da realidade futura. Desta forma, as decisões presentes passam a se basear na expectativa de ocorrências futuras, de fatos ou conjunturas.

O planejamento estratégico baseado em cenários são visões de situações futuras possíveis, dentro de determinado horizonte temporal, que podem romper com a tendência (projetiva), levando em consideração a possibilidade de influenciar o futuro por meio da ação no presente, oportunizando à organização ajustar a sua ação presente para alterar a probabilidade de uma ocorrência futura e para preparar a organização para enfrentar os acontecimentos que não podem ser alterados.

Assim, os rumos do planejamento estratégico atualmente devem estar prioritariamente voltados para o futuro do que para o presente. A única preocupação estratégica que faz sentido é voltar-se para o futuro. “As empresas que não se preocuparem com o futuro, embora bem sucedidas no presente, perderão vitalidade e o resultado será a paralisação estratégica” (MORITZ, 2004, p. 33).

Portanto, a estratégia volta-se para o futuro buscando não só delineá-lo, mas, também, preparar as empresas e instituições para poder atuar futuramente, competindo e obtendo sucesso, aprendendo a perceber tendências futuras, e a partir daí tentar inferir quais serão as qualificações, recursos e competências necessárias para que se obtenha sucesso no futuro que gradualmente é descortinado.

Marcial e Grumbach esclarecem que os estudos prospectivos não têm como objetivo prever o futuro e, sim,

estudar as diversas possibilidades de futuro plausíveis existentes e preparar as organizações para enfrentar qualquer uma delas, ou até mesmo criar condições para que modifiquem suas probabilidades de ocorrência, ou minimizar seus efeitos (MARCIAL; GRUMBACH, 2008, p. 19).

Lindgren e Bandhold (2003) destacam que o planejamento estratégico baseado em cenários é o planejamento estratégico que utiliza a técnica de construção de cenários como ferramenta para o planejamento de médio e longo prazo, onde o ambiente opera sob condições de incerteza. A “cenarização”3 ajuda a aguçar o pensamento estratégico, a desenhar planos para lidar com o inesperado e a manter uma visão maior dos problemas mais importantes e na direção

3 O termo “cenarização” refere-se ao uso da construção de cenários como ferramenta do

planejamento estratégico ou “planejamento baseado em cenários”, “planejamento por cenários” ou “prospectiva’.

adequada. O quadro 2 ilustra as diferenças entre o planejamento tradicional e o planejamento baseado em cenários.

Planejamento tradicional Planejamento baseado em cenários

Perspectiva Parcial, “tudo o mais é considerado igual”

Total, “nada é considerado como constante”

Variáveis Quantitativas, objetivas e conhecidas

Qualitativas, subjetivas, conhecidas ou ocultas Relações Estatísticas, estruturas

estáveis

Dinâmicas, estruturas emergentes

Lógica O passado explica o presente O futuro é a “razão de estado” do presente

Imagem do

futuro Simples e certo Múltiplo e incerto Método Determinístico e modelos

quantitativos (econômicos e matemáticos)

Análise de intenção, modelos qualitativos e estocásticos (impacto cruzado e análise de sistemas)

Atitude em relação ao

futuro

Passiva (o futuro será) Ativa e criativa (o futuro é criado)

Quadro 2 - Comparação entre planejamentos tradicional e planejamento baseado em cenários

Fonte: Lindgren; Bandhold (2003)

O ambiente de negócios é incerto. Pressupõe riscos. Planejamento estratégico e cenários lidam com incertezas. Enquanto os cenários iluminam as oportunidades e desafios, o planejamento estratégico explora as oportunidades dentro de um contexto de incerteza sobre o futuro, buscando reduzir as ameaças. Sem incerteza, todos estariam em uma mesma posição e não haveria sucesso ou falha. Pensar estrategicamente só faz sentido em condições de incerteza (HEIJDEN, 2009).

Em suma, os estudos prospectivos são mecanismos eficientes de planejamento, identificação de oportunidades e definição de ações. Assim, importante é considerar a prospecção um processo continuado de pensar o futuro e de identificar elementos para a adequada e melhor tomada de decisão, observando os aspectos econômicos, sociais, ambientais, científicos e tecnológicos. Cenários não são adivinhações, mas descrições, com base em hipóteses plausíveis, do que poderá

acontecer. O ponto de partida é de que o futuro não está predeterminado e, portanto, pode ser moldado pela ação dos atores sociais.