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2 CENÁRIOS PROSPECTIVOS NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

2.1 PLANEJAMENTO E ESTUDOS PROSPECTIVOS

2.1.2 Risco, incerteza e mudança

Em meados do século XVII e início do século XVIII, as contribuições de Pascal, Fermat e Leibniz, além de outros cientistas e matemáticos, foram significativas e decisivas para a humanidade. A teoria da probabilidade passou a ser um importante e poderoso instrumento de organização, interpretação e aplicação das informações. Paulatinamente foram surgindo técnicas quantitativas de administração do risco que auxiliaram a impulsionar os tempos modernos (BERNSTEIN, 1997).

Passado quase um século das descobertas de Pascal e Fermat, um inglês chamado Thomas Bayes deu outra importante contribuição para o avanço da estatística ao demonstrar como tomar melhores decisões mesclando matematicamente as novas informações com as informações velhas, o que ficou conhecido como Teorema de Bayes.

Todas as ferramentas atualmente utilizadas na administração do risco e na análise das decisões, na teoria dos jogos e aos desafios da teoria do caos, são resultantes das evoluções ocorridas entre 1654 e 1760, com apenas duas exceções: Francis Galton, em 1875, descobriu a teoria da regressão à média. Sempre que se toma uma decisão baseados na expectativa de que as coisas voltarão ao normal, emprega-se a noção de regressão à média, e o ganhador do prêmio Nobel Harry Markowitz, em 1952, na época um jovem estudante de doutorado em pesquisa operacional na Universidade de Chicago, demonstrou matematicamente que colocar todos os ovos na mesma cesta é uma estratégia inaceitável e arriscada. Essa revelação desencadeou o movimento intelectual que revolucionou Wall Street, as finanças corporativas e as decisões empresariais em todo o mundo (BERNSTEIN, 1997).

Bernstein afirma que:

A ideia revolucionária que define a fronteira entre os tempos modernos e o passado é o domínio do risco: a noção de que o futuro é mais do que um capricho dos deuses e de que homens e mulheres não são passivos ante a natureza. Até seres humanos descobrirem como transpor essa fronteira, o futuro era um espelho do passado ou o domínio obscuro de oráculos e adivinhos que

detinham o monopólio sobre o conhecimento dos eventos previstos (BERNSTEIN, 1997, p. 1).

Buarque corrobora com a assertiva acima ao manifestar que:

Nos tempos modernos, com a descoberta do risco e com a menor sujeição da humanidade aos caprichos da natureza, a expectativa em relação ao futuro assume um papel importante como referência para as decisões e escolhas, tanto as individuais quanto as coletivas (famílias, empresas ou nações). [...] Por conta disso, era inevitável que o futuro se constituísse na própria essência do planejamento e das escolhas coletivas da sociedade ou das organizações, perscrutando as alternativas para definir e calibrar suas ações, introduzindo um componente de racionalidade e análise técnica para tratar a incerteza (BUARQUE, 2003, p. 8).

Não há consenso quanto à etimologia da palavra risco4, dado que seu significado está mais próximo da ideia de ‘suposição’ do que de ‘certeza’. Por ser uma terminologia polissêmica, admite-se ter sua origem derivada tanto do baixo latim – do verbo resecare (risicu, riscu) quanto do espanhol ‘risco’, significando cortar, a qual se supõe ter sido utilizada para falar de penhascos sob os mares que ameaçavam afundar as naus e seus tripulantes. Possivelmente sua utilização na contemporaneidade como possibilidade, mas não como evidência imediata.

Autores contemporâneos dos campos das ciências sociais e das ciências da saúde como Giddens (1991;1998), Beck, (1992), Schramm & Castiel (1992), Spink (1997;2001), Lieber (2003), Czeresnia (2004) salientam que a sociedade globalizada vê o risco de forma exacerbada em todas as esferas da vida, seja ela pública ou privada. Destacam que a “metáfora da modernidade reflexiva”5 em determinados momentos

4 A palavra “risco”, para Ferreira (2004, p.1764), possui diversos significados: “perigo ou

possibilidade de perigo”; “situação em que há probabilidades mais ou menos previsíveis de perda ou ganho como, por exemplo, num jogo de azar ou numa decisão de investimento”; “em contratos de seguros, evento que acarreta o pagamento da indenização”, como também pode significar “qualquer traço em cor, ou sulco pouco profundo, na superfície de um objeto” ou “delineamento, debuxo, traçado, esboço” ou ainda na gíria “facada ou navalhada”.

5 A expressão “metáfora da modernidade reflexiva’ traduz, além dos múltiplos sentidos da

subjuga e em outros é subjugada por e entre diferentes contextos, que a apreende ora como forma de se relacionar com o futuro, ora como aventura na qual a imprevisibilidade é parte do jogo, ou ainda como estratégia de controle e dominação.

Segundo Ferreira (2004, p. 1764), incerteza é “falta de certeza; hesitação; indecisão, perplexidade, dúvida”.

Choy (1993) descreve uma relação indeterminada entre o elemento em foco e o seu entorno. Em uma situação que foge a zona de conforto, confusa ou conflitante onde não há uma linha de ação e ideia definidas, existe incerteza. O simples fato da existência da incerteza aponta para a necessidade de elaborar julgamentos objetivando subsidiar o processo decisório para solucionar a situação. A incerteza é, portanto, um estado de dúvida.

Para Choi (Op. cit.) as fontes de incerteza podem ser classificadas em:

 A complexidade relativa do cálculo - até em situações que, a priori, são mais conhecidas, podem ser percebidas com certo grau de incerteza por um decisor, cujas habilidades para calcular e raciocinar não estão à altura da tarefa. É difícil estar ciente de todos os possíveis desdobramentos ou resultados em um momento, ao lidar com uma situação;

 A imprevisibilidade do futuro – a determinação dos eventos futuros não depende somente das ações, como também de fatores que estão além do conhecimento e controle de quem decide. Não há garantia que regularidades observadas no passado irão ser preservadas no futuro;

 A interdependência das ações humanas – a maioria da produção social é levada a efeito por um esforço conjunto e o seu valor é difícil de verificar;

 A mesma natureza dos processos mentais - o ser humano tenta retirar a névoa do conhecimento por meio da inferência. O método de inferência mais frequente é a causalidade, imposta pela mente humana no sensoriamento dos dados da situação. Devido a isto, a incerteza está sempre presente.

Beck (1992), a qual traduz a possibilidade de ironizar o duplo processo de permanentemente desenvolvimento e produção de novos riscos.

Quanto à tipologia da incerteza, o Anexo B apresenta visões de diferentes especialistas (Knight, 1921; Afuah apud Órtegon 2006; Heijden, 2009; Porter, 1992; Matus, 1996).

A partir das classificações apresentadas, e considerando que os cenários lidam com todos os tipos de incerteza, pode-se inferir que:  As incertezas leves e estruturais críticas são consideradas em todos

os cenários de acordo com seus valores qualitativos e quantitativos, passíveis de ocorrência;

 As incertezas imponderáveis, aquelas de baixa probabilidade e alto impacto, são consideradas nos cenários-surpresas. Os elementos constantes, certos ou pré-determinados fazem parte de todos os cenários. As demais incertezas constituem subtramas no conteúdo dos cenários;

 A incerteza se manifesta pelas mudanças que ocorrem no ambiente, já que os acontecimentos, os eventos do cotidiano, são manifestações da variação do ambiente.

A globalização é um processo iniciado há muito tempo e que tem ocasionado profundas mudanças nas últimas décadas, mudando substancialmente as relações entre povos, trazendo consequências de toda ordem. Alguns estudiosos falam que esse fenômeno iniciou nos anos 80, quando os governos começaram a implantar o programa econômico neoliberal, abrindo suas portas à entrada do capital e das mercadorias estrangeiras. Outros acreditam que a origem da globalização remonta à segunda metade do século XIX, aproximadamente, quando as grandes economias capitalistas iniciaram a primeira grande onda de investimentos no exterior. Finalmente, para outros estudiosos, a globalização é um fenômeno bem mais antigo, que surgiu com as grandes viagens marítimas dos séculos XV e XVI, a partir das quais exploradores, burgueses e governantes europeus submeteram as terras conquistadas do chamado Novo Mundo à dinâmica da política econômica mercantilista, integrando colônias e metrópoles no comércio mundial.

Independente de seu início é um processo de integração mundial que se intensificou nos últimos anos. A globalização é um fenômeno resultante de três aspectos: a revolução tecnológica, a interdependência dos mercados financeiros em escala mundial e a formação de áreas de livre comércio.

A revolução nas tecnologias da informação contribui decisivamente para essa abertura, proporcionando uma crescente homogeneização cultural, além de agilizar o comércio, o fluxo de investimentos e a atuação das organizações transnacionais. Fronteiras geográficas não podem mais isolar as empresas de pressões competitivas provocando assim mudança de postura das organizações frente aos novos desafios impostos pela nova ordem mundial.

É sem precedente a rapidez com que avança a mudança, causando impacto sobre as organizações. O crescimento de novos produtos, serviços e novas tecnologias que vão sendo substituídas pelas mais antigas geram mudanças no ambiente. As mudanças para Ansoff e McDonnell (1993) tornam-se cada vez mais complexas, diferentes e descontínuas, em relação à experiência anterior. Como consequência da celeridade das mudanças está a dificuldade crescente para planejar uma resposta às surpresas.

Joseph (1994, p.1) caracteriza a mudança como algo que:  Altera alguma coisa ao longo do tempo;

 Tem uma direção, ritmo de alteração e trajetória;  É causada por alguma coisa;

 Pode gerar deslocamentos e resultar no desenvolvimento de algo novo;

 Pode ter impactos positivos e negativos no curto prazo;  Possui consequências no longo prazo;

 Apresenta problemas, ameaças e oportunidades;  É frequentemente progressiva;

 A quantidade de mudanças acelera à medida que a base de conhecimento da sociedade avança;

 Possui um caminho voltado para o futuro e pode ser identificada e pesquisada.

A observação das mudanças sociais consiste em mapear as tendências, os eventos e os propósitos dos grupos e organizadores (atores sociais) que podem estar direta ou indiretamente relacionados com os assuntos no tempo. Significa perguntar de onde viemos, onde estamos e para onde podemos ir. Consiste em verificar mediante fatos, dados e interpretações, a partir de qual sistema social, qual sua origem, seu estado atual e sua possível evolução.

O futuro é observado como produto da constante interação entre os fatores de inércia que tendem a reproduzir o passado e os fatores de mudança que produzem a variabilidade no desempenho das tendências (movimentos sociais, descobertas, inovações, conflitos, novas políticas, decisões, eventos). As forças motrizes ou motoras e as forças restritivas ou retardadoras podem levar a continuidade ou descontinuidade das tendências (VASQUÉZ; ÓRTEGON, 2006, p. 162, tradução nossa).

A tipologia das mudanças está representada no Anexo C elencando os diversos elementos que a caracterizam.

Em linhas gerais, observa-se que na medida em que a realidade evolui, as mudanças se fazem mais evidentes e céleres e as incertezas em relação ao futuro crescem visivelmente, crescendo também a necessidade de antecipação do futuro. Como já manifestado anteriormente, no subitem 2.1.1, o ambiente de negócios é incerto e pressupõe riscos. Planejamento estratégico e cenários lidam com incertezas. Na construção de cenários são analisadas as incertezas decorrentes das mudanças a fim de criar hipóteses por suas combinações que constituam alternativas de futuro possíveis. “Da exploração das incertezas nascem as oportunidades” (KILIAN, 2009, p. 67).