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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.4. Fatores a serem considerados no processo de resfriamento e/ou

2.4.4. Diluidores de sêmen de suíno

2.4.4.1. Componentes dos diluidores

2.4.4.1.4. Macromoléculas

2.4.4.1.4.1. Gema de ovo

Polge, em 1956 afirmou que um dos maiores obstáculos para a disseminação do uso da inseminação artificial em suínos envolvia a dificuldade para a manutenção

72 da motilidade e fertilidade do sêmen do

varrão após a diluição e o armazenamento. Apesar da constante evolução das biotecnologias da reprodução animal, ainda não se estabeleceu nas rotinas das centrais o uso de um protocolo de resfriamento do sêmen a temperaturas inferiores a 15°C, que viabilizaria o armazenamento e transporte do sêmen por períodos mais longos de tempo. Isto se deve, principalmente, à insistência no uso de diluidores comerciais, que apesar de fornecerem boas taxas de fertilidade com o resfriamento até 15°C, não são os mais indicados para o resfriamento do sêmen do varrão a temperaturas inferiores.

A descoberta dos efeitos benéficos da gema de ovo sobre a fertilidade do sêmen diluído por Phillips, em 1939, liderou seu uso nos diluidores para bovinos. Em 1942, Lasley et

al. observaram a capacidade da gema em

proteger os espermatozoides contra o choque térmico. Em 1949, a descoberta de que o sêmen bovino poderia ser congelado com o glicerol por Polge et al. direcionou as pesquisas sobre as qualidades protetoras da gema de ovo.

Diferentes pesquisadores, dentre eles Roy (1955), Du Mesnil du Buisson (1956), Du Mesnil du Buisson e Dauzier (1956), Polge (1956a) e Dziuk (1958) já afirmavam que os diluidores que melhor preservavam a motilidade do sêmen pareciam ser aqueles contendo glicose ou glicina associadas à gema de ovo ou leite.

Durante os últimos 60 anos, os crioprotetores utilizados nos diluidores de sêmen têm sido continuamente revisados, embora os ingredientes básicos destes diluidores continuem os mesmos. A gema de ovo, o leite e o glicerol são indispensáveis em praticamente todos os diluidores usados para a preservação do sêmen resfriado ou congelado (Bergeron e Manjunath, 2006).

A gema de ovo, sendo um produto de origem animal, representa um risco em potencial de contaminação do sêmen, além de não haver uniformidade na sua composição. Consequentemente, há crescente interesse no desenvolvimento de novos diluidores livres de produtos de origem animal. No entanto, é difícil encontrar substitutos para a gema de ovo porque os mecanismos envolvidos na proteção espermática conferida contra os danos causados pela estocagem, resfriamento e/ou congelamento continuam obscuros (Bergeron e Manjunath, 2006). Normalmente, a gema de ovo é usada na concentração de 20% (v/v) no diluidor, existindo evidências de que os constituintes responsáveis pela ação protetora da gema de ovo são as lipoproteínas de baixa densidade (LDL´s) (Pace e Graham, 1974; Watson, 1976; Foulkes, 1977; Amirat et al., 2004). No entanto, os mecanismos pelos quais esta proteção é realizada continuam elusivos. Existem três hipóteses sobre a possível ação das LDL sobre os espermatozoides. A primeira sugere que as LDL se associam com a membrana espermática, de forma a fornecerem proteção às células espermáticas através da estabilização da membrana (Watson, 1975; Foulkes, 1977; MacDonald e Foulkes, 1981). De acordo com a segunda hipótese, os fosfolípides presentes na LDL protegem os espermatozoides pela formação de um filme protetor na superfície espermática (Quinn et al., 1980) ou pela reposição dos fosfolípides da membrana celular espermática que são perdidos ou danificados durante o processo de resfriamento ou congelamento (Foulkes et

al., 1980; Graham e Foote, 1987).

Finalmente, de acordo com a terceira hipótese, as LDL competem com peptídeos catiônicos (<5 KDa) deletérios, presentes no plasma seminal, pela ligação na membrana espermática, conferindo, desta forma, proteção à mesma (Vishwanath et

73 Uma quarta teoria foi recentemente

proposta por Bergeron e Manjunath (2006). De acordo com os autores, as proteínas ligadoras de lipídeos, presentes no plasma seminal de touros, as denominadas proteínas BSP´s (Bovine Seminal Plasma Proteins) têm capacidade de se ligar ao grupo colina dos fosfolípides das LDL´s, formando com estas um complexo estável. A sua capacidade de ligação é muito alta, com uma molécula de LDL podendo ligar 240-555 moléculas de BSP´s.

Baseando-se nestes achados, os autores propuseram que no momento da ejaculação as BSP´s secretadas pelas vesículas seminais do touro são liberadas junto aos espermatozoides (Manjunath et al., 1994). As BSP´s se ligam então à membrana espermática e induzem a saída de colesterol e fosfolípides (Thérien et al., 1998, 1999). É importante ressaltar que este efluxo de colesterol e fosfolípides, estimulado pelas BSP´s, é tempo e concentração dependente (Manjunath e Thérien, 2002). Desta forma, quando o sêmen não é diluído, os espermatozoides são continuamente expostos a altas concentrações de BSP´s e a uma remoção lipídica continua, que resulta em menor resistência ao choque térmico, bem como ao resfriamento e/ou congelamento. No entanto, quando os ejaculados são diluídos com diluidores contendo gema de ovo, minutos após a coleta, as LDL sequestram a maior parte das BSP´s presentes no sêmen, de forma a garantir alterações mínimas na membrana espermática (Bergeron e Manjunath, 2006). Além disso, é sabido que espermatozoides contendo baixas concentrações de colesterol em sua membrana plasmática, apresentam menor resistência ao choque térmico. No sêmen diluído com gema de ovo ou LDL, aproximadamente 80% menos BSP´s se associam aos espermatozoides; consequentemente, o efluxo de colesterol e fosfolípides é menor (Bergeron et al., 2004). Desta forma, as funções espermáticas tais como motilidade,

integridade acrossômica e a viabilidade são protegidas. As BSP´s participam do processo de capacitação espermática, pela retirada de colesterol e fosfolípides da membrana espermática, bem como da ligação das células espermáticas às células do oviduto (Manjunath e Thérien, 2002). Desta forma, a redução das BSP´s ligadas aos espermatozoides, na presença da gema de ovo, pode ser uma das razões pelas quais o sêmen criopreservado ou resfriado tem menor fertilidade que o sêmen fresco (Bergeron e Manjunath, 2006), considerando-se que a capacitação é fundamental para a fertilização do ovócito.

As BSP´s possuem homólogos

aparentemente ubíquos distribuídos entre os mamíferos, embora sua concentração possa variar no plasma seminal das diferentes espécies. Desta forma, este mecanismo de ação acima proposto pode também ser uma realidade para outras espécies que não a bovina (Bergeron e Manjunath, 2006). O componente protéico da gema de ovo é composto principalmente por 68% de lipoproteínas de baixa densidade, 16% de lipoproteínas de alta densidade, 10% de livetinas e 4% de fosvitinas, localizadas em duas frações facilmente separáveis da gema, os grânulos e o plasma (Sirvente et al., 2007). O plasma corresponde a 78% da matéria seca da gema, enquanto os grânulos representam 22%. Considerando-se os componentes químicos, a matéria seca da gema contém 33% de proteínas, 63% de lípides, que são por sua vez divididos em triglicerídeos (43%), colesterol (2,6%) e fosfolípides (18%). Os fosfolípides, por sua vez, são compostos de 16% de fosfatidilcolina e de 2% de fosfatidiletalonamida (Anton e Gandemer, 1997). Os grânulos são estruturas microscópicas, irregulares e insolúveis na gema. São constituídos de 70% de lipovitelinas, que correspondem às lipoproteínas de alta densidade (High density lipoproteins – HDL), 16% de fosvitinas e 12% de lipoproteínas de baixa

74 densidade (LDL). As LDL´s são compostas

por cerca de 11-17% de proteína e 89% de lipídeos, sendo os últimos divididos em triacilglicerol (69%), fosfolípides (27%), colesterol e ésteres de colesterol (4%) (Anton e Gandemer, 1997).

As LDL‟s apresentam-se como uma microemulsão biológica com importantes partículas envolvidas no transporte e no metabolismo de colesterol. São formadas por uma estrutura esférica de 17-60 nanômetros de diâmetro, apresentando um centro composto de triglicerídeos e ésteres de colesterol, circundado por fosfolípides e apoproteínas. Como seus grupos hidrofílicos estão orientados para a superfície e os hidrofóbicos voltados para o interior, as LDL´s se mostram muito solúveis em água, apresentando densidade de 0,982g/mL (Evans et al., 1968). Além disso, possuem alta solubilidade e boa estabilidade, não demonstrando alteração estrutural em temperaturas extremas (-80°C a 75°C) (Anton et al., 2003).

Os diluidores utilizados para congelar o sêmen do varrão são baseados na gema de ovo e glicerol como agentes crioprotetores, incluindo, ainda, alta concentração de açúcares e um detergente, a trietanolamina lauril sulfato (Orvus es paste – OEP, vendido como Equex STM, Nova Chemical Sales Inc., Scituate, MA, USA). O diluidor mais comumente usado é o lactose-gema de ovo (Westendorf et al., 1975) além do diluidor denominado BF-5 descrito por Pursel e Johnson (1975), cuja composição inclui a glicose, a gema de ovo e o Tris como tampão.

Graham et al. (1971) observaram que a adição do surfactante OEP aos diluidores de sêmen apresentando gema de ovo em sua formulação reduziu os danos do congelamento nos espermatozoides do varrão. A hipótese atual, ainda que não comprovada, é que as propriedades anfipáticas do OEP permitem a emulsificação e dispersão dos lipídeos da

gema de ovo, tornando-os mais disponíveis à membrana plasmática espermática. Vale salientar, neste sentido, que Pursel et al. (1978) verificaram que o sêmen suíno, incubado durante uma hora com 0,1% de OEP, em diluidor sem gema de ovo, apresentou grande efeito lesivo sobre o acrossoma e a motilidade espermática. Por outro lado, Yi et al. (2002) observaram que a utilização de um diluidor apresentando uma concentração final de 0,5% de OEP e 20% de gema de ovo, resultou em um aumento significativo do número de espermatozoides com crista apical normal e

móveis, após o

congelamento/descongelamento do sêmen. Watson (1981) estudando o papel das LDL´s sobre os espermatozoides do carneiro resfriados a 5°C verificou uma forte ligação entre a membrana plasmática dos espermatozoides com as LDL´s, a partir dos seus componentes protéicos. Além disso, Cookson et al. (1984) afirmaram que nos bovinos esta ligação é muito forte, resistindo a mais de dez processos de lavagem. De acordo com estes autores, a remoção do conteúdo lipídico das lipoproteínas implicaria na redução de sua capacidade ligante com as membranas plasmáticas.

Foote (2002) utilizou o sêmen diluído em diluidor à base de gema de ovo, resfriado a 5°C e preservado por 48 horas para inseminar 70 leitoas e 55 porcas, e obteve uma média de 10,8 leitões nascidos. A taxa de parto foi de 63%, sendo que as porcas pariram 1,7 leitões a mais por leitegada que as leitoas. Neste estudo, o sêmen foi diluído em diluidor contendo 20% de gema de ovo, 0,33% de citrato de sódio, 0,33% de glicina, 1% de glicose, 1000 UI de penicilina e 1000 µg de estreptomicina/mL. A diluição foi feita a uma temperatura de 20-25°C, sendo o sêmen diluído e resfriado por 4 horas até 5°C. Apesar da rápida taxa de resfriamento, a motilidade do sêmen não declinou mais do que 10% durante as 48 horas de armazenamento.

75 Jiang et al. (2007) avaliaram a qualidade

dos espermatozoides suínos congelados em um diluidor Tris-glicose contendo concentrações de 6-10% (p/v) de lipoproteína. Observaram, neste estudo, que a concentração de 9% foi capaz de preservar a motilidade espermática, a integridade da membrana e do DNA. Sugeriram, ainda, que a determinação da concentração ótima de lipoproteína a ser usada, bem como o seu mecanismo de ação precisam de mais estudos.

Ao compararem as características físicas do sêmen e a fertilidade de fêmeas suínas inseminadas, Braga et al. (2009) utilizaram o sêmen diluído em BTS® e armazenado em geladeira a 17°C como grupo controle com o sêmen diluído no diluidor glicina-gema de ovo (GGO), proposto por Foote (2002), e armazenado a 5°C, em contêiner especial proposto por Roner et al.(2006). No que se refere à manutenção das características físicas seminais (motilidade e vigor), o sêmen diluído em GGO foi superior (p<0,05) ao sêmen diluído em BTS® a 17°C, após 19,79 horas de armazenamento a 5ºC. Além disso, obtiveram uma taxa de gestação de 97,14% para as fêmeas inseminadas com o sêmen diluído em BTS® (17°C) e estocado por 18,39 horas e de 77,14% para o sêmen diluído em GGO (5°C). Entretanto, não observaram diferenças estatísticas quanto ao número de leitões nascidos totais (14,87 vs 10,72) e vivos (13,26 vs 10,12), respectivamente, para o BTS® e para o GGO.

Nesta mesma linha de pesquisa, Alkmin (2010) utilizou o diluidor GGO, proposto por Foote (2002), para diluir os primeiros 15 mL de sêmen da fração rica em espermatozoides do ejaculado de varrões (P1). Neste estudo, o autor não encontrou diferenças estatísticas quanto às taxas de gestação quando comparou os resultados de fertilidade da P1 com os obtidos quando utilizou-se o restante do ejaculado (P2) diluído em MR-A® e armazenado a 17°C. No entanto, os espermatozoides diluídos em

GGO e resfriados a 5°C (P1), apresentaram um maior percentual (p<0,05) de lesões acrossômicas, quando comparados aos espermatozoides diluídos em MR-A® e resfriados a 17°C. Além disso, o sêmen diluído em MR-A® resultou em um maior número de nascidos vivos.

2.4.4.1.4.2. Albumina Sérica Bovina

A albumina sérica bovina (BSA – Bovine serum albumin) foi adicionada, pela primeira vez aos diluidores de sêmen suíno, em 1980, na Itália. A sua adição visava prolongar a manutenção da motilidade e, consequentemente, da longevidade dos espermatozoides armazenados. Trata-se de uma proteína plasmática obtida do sangue bovino, composta por mais de 580

aminoácidos, formando uma

macromolécula tridimensional (Weitze, 1990b).

O envelhecimento das células espermáticas, no transcorrer do armazenamento, pode ser atribuído a transtornos oxidativos da formação inadequada de espécies de oxigênio reativas (ROS) e/ou da subsequente peroxidação de lipídeos da membrana espermática. As mitocôndrias são o sítio principal da formação de ROS intracelular, resultando numa interrupção no transporte de elétrons, que afeta consequentemente a produção de ATP mitocondrial e a motilidade espermática. Visando diminuir os efeitos do envelhecimento in vitro, os diluidores utilizados para um armazenamento mais prolongado, os denominados diluidores de longa duração, contém além dos anti- oxidantes, substâncias que podem reduzir o choque térmico quando o sêmen é refrigerado para temperaturas entre 10- 15°C.

Os espermatozoides reagem à diluição mostrando, inicialmente, um aumento da atividade metabólica. Em seguida,

76 apresentam uma queda da motilidade e

aumento de danos na membrana. No caso de diluições excessivas, há perda considerável da viabilidade celular. Apesar de não existirem explicações detalhadas para o chamado “efeito diluição”, parece que surgem danos celulares, em consequência das perdas de componentes intracelulares e/ou devido à eliminação de substâncias extracelulares protetoras, presentes no plasma seminal. Resultados experimentais indicam que a eliminação do plasma seminal, devido a diluição progressiva, pode ser compensada parcialmente pela adição de BSA (Johnson

et al., 2000).

Bredderman e Foote (1971) demonstraram que a BSA pode promover a sobrevivência espermática do touro após a diluição. Tal ação protetora fornecida pelos componentes de alto peso molecular, especialmente a BSA, nos diluidores também tem sido observada por outros autores (Cheng et al., 1949; Blackshaw, 1953; White, 1953; Lindholmer, 1974a), os quais consideram ser esta ação exercida via reposição ou manutenção das lipoproteínas da célula espermática, cuja degeneração é o presságio da morte celular.

Harrison et al. (1978) afirmaram que o mecanismo de ação da BSA envolve, aparentemente, uma propriedade específica desta proteína. Entretanto, os ácidos graxos associados ou o grupo sulfidrila livre das proteínas não estão, aparentemente associados. Uma ação quelante também foi desconsiderada, apesar de Lindholmer (1974b) e Johnsen e Eliasson (1976) terem sugerido ser a ação da albumina, sobre os espermatozoides humanos, exercida através da sua atividade quelante do zinco.

De acordo com Weitze (1990a), a ação primária da BSA é estimular a motilidade espermática devido a sua alta afinidade, por várias substâncias de baixo peso molecular, envolvidas na remoção do fator inibitório dos espermatozoides, sem, no entanto,

alterar o metabolismo energético espermático, uma vez que não houve qualquer alteração nas concentrações de ATP. Além disso, a BSA está ligada à remoção de produtos lipídicos danificados da membrana, modificando a sua permeabilidade e, reduzindo, também, a ação da peroxidase lipídica. A BSA, quando comparada com outras macromoléculas, como a Polivinilpirrolidona (PVP) e a β – lactoglobulina foi mais efetiva, pois seu efeito independe da concentração de íons como Ca2+, HCO3- ou PO4-3.

A BSA melhorou a motilidade e a

integridade acrossômica de

espermatozoides suínos conservados por longos períodos a 15°C (Waberski et al., 1989).

Por seus efeitos protetores, a BSA é normalmente encontrada na composição de diluidores comerciais de longa duração, tais como o MR-A®, o Zorlesco®, o Modena® e o Androhep®.