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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.5. Endocrinologia da fêmea suína

2.5.1. Período pós-parto

Durante a lactação, as concentrações e a pulsatilidade do LH são inibidos devido à supressão das ondas de liberação de GnRH (De Rensis et al., 1993). O grau de supressão do LH está relacionado não apenas à intensidade das mamadas pelos leitões mas também ao balanço energético negativo das fêmeas. Os efeitos da lactação no FSH são menos consistentes e se devem, primariamente, ao feedback negativo da inibina, produzida pelos folículos antrais de crescimento limitado.

Durante as últimas décadas, vários avanços tecnológicos permitiram o estudo de alterações endócrinas relacionadas ao desenvolvimento folicular na porca. Antes da introdução da ultrassonografia transretal por Soede et al. (1992), somente era possível estudar o desenvolvimento folicular na porca através do exame morfológico dos ovários realizado após abate (Holness e Hunter, 1975; Dalin, 1987) ou através de exames laparoscópicos (Holness e Hunter, 1975; Kunavongkrit et

al., 1983).

Os dados descritos por Varley e Foxcroft (1990) sugeriram que, em porcas lactantes, o crescimento folicular pode ser acelerado por aumentos na secreção episódica de LH na presença de concentrações adequadas de FSH. A redução do efeito inibitório da amamentação e/ou lactação pode estimular mudanças hormonais que levam ao crescimento folicular. A ultrassonografia

realizada sistematicamente pode correlacionar o crescimento folicular com os níveis plasmáticos de gonadotrofinas, hormônios esteróides, inibina e outros hormônios. Desta forma, tem sido possível um melhor entendimento sobre os mecanismos que possibilitam uma redução do IDC pelo desmame parcial (Zak et al., 2000); da indução do cio lactacional pela mamada intermitente (Gerritsen et al., 2008) ou sobre os efeitos da alimentação na liberação de hormônios (Kauffold et al., 2008).

Com exceção de cios anovulatórios que podem ocorrer em algumas porcas nos primeiros dias pós parto (Baker et al., 1953), normalmente as porcas domésticas permanecem em anestro durante as primeiras 4-6 semanas de lactação (Britt et

al., 1985). Acredita-se que este cio

anovulatório pós-parto seja resultado das altas concentrações de estrógenos circulantes na porca antes do parto (Gordon, 1997).

A lactação representa um período produtivo, onde existem poucas chances de se iniciar uma nova gestação (Varley e Foxcroft, 1990). Trata-se de um período curto, embora a expectativa seja que as matrizes em reprodução produzam leitegadas numerosas, sejam capazes de nutrir adequadamente estas leitegadas durante a lactação de 3-4 semanas, e ao final, entre em cio e ovule dentro de cinco dias após o desmame (Varley e Foxcroft, 1990).

Nos primeiros 7-10 dias após o parto ocorrem a involução uterina e a reparação endometrial. Evidências sugerem que o útero se torna rapidamente capaz de sustentar outra gestação (Hughes e Varley, 1980). No entanto, durante o período inicial da lactação os ovários estão quiescentes até aproximadamente 10 dias. Após este período, folículos pequenos (2-3mm) começam a se desenvolver, embora nenhum

97 deles alcance a dominância (9-10mm) (Britt

et al., 1985).

No decorrer da lactação a pulsatilidade do LH é restaurada, o que pode estar relacionado à redução na freqüência de

mamadas e/ou ao aumento da

responsividade do LH hipofisário ao GnRH. Concomitantemente ao aumento da pulsatilidade do LH, o diâmetro folicular aumenta no transcorrer da lactação. Assim, os folículos aumentam de diâmetro apesar de não ultrapassarem 3-4 mm. Ao final da lactação a maioria das porcas aparentam ter ondas sincronizadas de desenvolvimento folicular, com folículos chegando a 4-5 mm de diâmetro e regredindo em seguida (Soede et al., 2011).

Pouco se sabe a respeito da distribuição de folículos de diferentes tamanhos durante a lactação. Antes da desmama a maioria dos folículos tem menos de 5 mm de diâmetro. Entretanto, a desmama resulta em crescimento imediato dos folículos para mais de 8 mm (Warnick et al., 1950; Britt

et al., 1985). O número de folículos antrais

não muda durante a lactação, embora ocorra aumento gradual do seu tamanho, que se torna acentuado após a quinta semana de lactação. Em contrapartida, a percentagem de folículos atrésicos declina no decorrer da lactação, parecendo haver uma relação inversa com a percentagem de folículos maiores (Britt et al., 1985).

O crescimento folicular durante e após a lactação depende da secreção de gonadotrofinas pela hipófise. Sabe-se que a inibição do LH e do FSH na lactação se estabelece entre 24 e 48 horas após o parto (Sesti e Britt, 1994). No entanto, entre 3-4 dias após o parto há um breve período hipergonadotrófico devido à súbita remoção do efeito feedback negativo da progesterona e dos estrógenos feto-placentários sobre o eixo hipotálamo-hipofisário (Britt et al., 1985).

Kunavongkrit (1984) observou maiores concentrações de LH durante a lactação em

porcas amamentando pequenas leitegadas (2-4 leitões) do que em porcas amamentando leitegadas de 7 a 12 leitões. Bevers et al. (1981) demonstraram que a resposta da hipófise à aplicação de 25 µg de GnRH sintético liberando LH aumentou da primeira para a segunda semana de lactação, sendo esta resposta independente da presença dos leitões, mesmo sob concentrações de prolactina sete vezes maiores.

A capacidade do estradiol em estimular os pulsos de LH parece mudar durante a lactação. Quando Elsaesser e Parvizi (1980) desafiaram porcas com benzoato de estradiol (60µg/kg) no dia 5 da lactação, não houve evidência de um pico pré ovulatório de LH. No entanto, quando este tratamento foi feito aos 35 dias de lactação, observou-se aumento nas concentrações de LH, entre 48 e 72 horas após a aplicação, sendo que quatro de nove porcas tratadas ovularam.

De acordo com Sesti e Britt (1994), as concentrações circulantes de LH começam a declinar com 24 horas após o parto, continuam caindo até 30 horas e, permanecem baixas durante a primeira semana de lactação. Os autores sugeriram ainda que os sinais neuronais oriundos do estímulo físico nas glândulas mamárias das porcas são a primeira razão para a inibição da secreção de gonadotropinas durante a lactação.

Muitos hormônios estão envolvidos no estabelecimento e na manutenção da lactação. A prolactina e a oxitocina são os fatores lactogênicos principais, embora os hormônios do crescimento, tiroideanos e adrenais estejam, também, envolvidos (Varley e Foxcroft, 1990).

As concentrações plasmáticas de LH e de prolactina estão, geralmente, inversamente relacionadas na porca em lactação (Dusza e Tilton, 1990). Provavelmente, isto se deva aos efeitos inibitórios da amamentação em

98 neurônios dopaminérgicos e nos produtores

de GnRH (Foxcroft, 1992).

Grande número de estudos tem demonstrado que os peptídeos opióides endógenos (POE) estão envolvidos no controle da secreção de LH, FSH e prolactina durante a lactação. Assim, a injeção (Barb et al., 1986) ou infusão (Armstrong et al., 1988) de naloxone, um antagonista dos POE aumentou a secreção de LH em porcas lactantes. O efeito estimulante da amamentação na secreção de prolactina é mediado pela inibição de neurônios dopaminérgicos. Assim, o tratamento de porcas com bromocriptina, um agonista dopaminérgico, inibiu de forma efetiva a secreção de prolactina no início e no final da lactação (Bevers et al., 1981; Mattioli e Seren, 1985, citados por Foxcroft, 1992). O aumento de intensidade da mamada durante os primeiros dias pós parto, provoca redução gradual das concentrações basais de FSH e LH acompanhados por redução no tamanho dos folículos (Palmer et al., 1965a,b; Sesti e Britt, 1994).

A segunda semana de lactação pode ser considerada como um período de transição para a porca. Neste período, mesmo que as concentrações periféricas de gonadotrofinas e esteróides ovarianos continuem baixas (Stevenson e Britt, 1980), as concentrações de FSH e LH na hipófise aumentam, diante da capacidade do hipotálamo de liberar GnRH. As concentrações de LH na hipófise são maiores aos 28 dias de lactação do que aos 14 dias, sendo que as concentrações de FSH tendem a aumentar da metade para o final da lactação (Sesti e Britt, 1993). No decorrer da lactação, o hipotálamo deixa de sofrer, gradualmente, os efeitos inibitórios exercidos pelos POE liberados em decorrência das mamadas. Além disso, há aumento nas concentrações plasmáticas de LH e FSH após a terceira semana de lactação (Stevenson e Britt, 1980). Estes fatos são atribuídos principalmente à

redução da intensidade das mamadas no decorrer da lactação (Varley e Foxcroft, 1990).

Desta forma, durante a terceira semana de lactação há aumento gradual da secreção pulsátil de GnRH e gonadotropinas (Stevenson e Britt, 1980), assim como do número e do tamanho dos folículos presentes nos ovários (Palmer et al., 1965a; Kunavongkrit et al., 1982; Sesti e Britt, 1993).

Lucy et al. (1999) descreveram quatro padrões de crescimento folicular durante a lactação, sendo estes padrões observados utilizando ultrassonografia. Os dois primeiros padrões de desenvolvimento folicular envolveram a ovulação e a formação de folículos císticos, antes da desmama. O terceiro padrão foi representado pela inatividade ovariana, caracterizada por folículos extremamente pequenos (<2mm de diâmetro). Finalmente, o quarto padrão descrito foi o de ondas de crescimento folicular sincronizadas prévias à desmama. Estas ondas são formadas por 20-30 folículos que crescem de 2mm até 4- 6mm, e se tornam co-dominantes. Estes folículos co-dominantes regridem e são substituídos por uma nova onda. De acordo com este padrão de crescimento, o intervalo da desmama ao cio (IDC) irá depender do estágio de desenvolvimento folicular de um grupo de folículos no momento da desmama. Ou seja, porcas desmamadas durante o desenvolvimento de um grupo de folículos irão retornar ao cio rapidamente, enquanto aquelas desmamadas durante a regressão de uma onda folicular apresentarão um maior intervalo desmama cio.

Após o parto, há uma mudança no metabolismo corpóreo, que passa de um estado anabólico durante a gestação para um estado catabólico durante a lactação, dando à glândula mamária prioridade sobre os demais tecidos (Collier et al., 1984).

99 Frequentemente, a ingestão de alimentos

não é suficiente para compensar a produção de leite havendo mobilização das reservas corporais de gordura e proteína, resultando no estabelecimento de um balanço energético negativo durante a lactação (Quesnel e Prunier, 1995; Mejia- Guadarrama et al., 2002). O pico de produção de leite nas porcas ocorre com aproximadamente 2-3 semanas pós-parto (Toner et al. 1996). Este período coincide com a idade de desmama em criações comerciais, que é de 3 a 5 semanas, período no qual as fêmeas se encontram em anestro lactacional (Quesnel e Prunier, 1995), havendo retorno ao estro dentro de 3 a 7 dias pós-desmama (Britt, 1986).

Os suínos representam um bom modelo para estudar a interação existente entre a nutrição e a reprodução (Cosgrove e Foxcroft, 1996). O catabolismo tissular durante a lactação reforça, invariavelmente, a supressão induzida pela amamentação na secreção de LH, principalmente em porcas de primeiro parto. A relação entre as concentrações de insulina, a secreção de LH e a fertilidade pós desmama está bem estabelecida nesta espécie. Cosgrove e Foxcroft (1996) observaram que limitadas reservas corporais de gordura associadas à alta demanda energética para a produção de leite e crescimento corporal, são provavelmente os principais fatores relacionados com a redução da fertilidade após a desmama em primíparas.

No entanto, Quesnel e Prunier (1995) concluíram que a inibição do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal durante a lactação na porca se deve, principalmente, aos reflexos neuroendócrinos induzidos pela amamentação, de forma que as condições nutricionais se tornam relativamente mais importantes durante a terceira e quarta semanas após o parto. A supressão da liberação de LH durante a lactação influencia tanto o desenvolvimento folicular lactacional quanto a retomada da

atividade ovariana após a desmama (Quesnel et al., 1998). Além disso, os mecanismos de feedback positivo do estradiol nos picos de LH amadurecem no transcorrer da lactação, aumentando a capacidade das porcas em estabelecer um pico pré-ovulatório de LH de magnitude suficiente (Sesti e Britt, 1993b). Estes mecanismos juntos formam a base do efeito da lactação nas variáveis de fertilidade subseqüentes, tais como: intervalo desmame-cio (IDC), taxa de ovulação e até mesmo sobrevivência embrionária, que afetará por sua vez a taxa de parição e tamanho da leitegada (Soede et al., 2011).