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3.1 QUEM SOMOS NÓS

3.1.3 O mergulho

Sereia do Mar

Eu sempre fui uma pessoa que gostei muito de estudar. Eu via nos estudos o caminho para vencer na vida e procurava nas aulas e em casa aproveitar o máximo possível acerca dos conhecimentos transmitidos na escola.

Eu sempre fui uma aluna que nas avaliações tirava notas boas, quando isso não ocorria ficava muito chateada. Isso me impulsionava para estudar mais. Como a condição dos meus pais não permitia que eu me deslocasse para a capital, fiz o meu primeiro curso secundário de técnico em contabilidade na cidade em que morava. Angustiava-me muito porque o curso não preparava para o vestibular, era um curso técnico para trabalhar em escritório. Eu sabia que as oportunidades de trabalho eram poucas em vista do número reduzido de escritórios existentes na cidade.

Apesar disso, eu gostava do curso e em alguns momentos eu ensinava na própria sala de aula para os colegas acerca do conteúdo trabalhado pelo professor quando eles tinham dúvidas. Eu achava muito legal, pois todos ficavam muito atentos e aprendiam. Diziam que eu explicava melhor do que o professor. Penso que aqui já iniciava a minha carreira de professora, embora não tivesse consciência disso. A escola em que estudava se chamava Escola Estadual Nossa Senhora da Conceição; nessa escola, eu estudei o meu Ensino Fundamental e até o segundo ano do Ensino Médio, pois com muita luta consegui com os meus pais me mudar para a capital.

Em Teresina, fui morar com três primos para dar continuidade no curso de técnico em contabilidade. Estudava à noite em uma escola próxima da casa em que morava para conter gastos e evitar pagar condução. Já tinha dado um passo em minha vida, estava morando na capital e embora dando continuidade no curso eu tinha uma nova perspectiva em relação ao emprego e ao vestibular. Passei um semestre batalhando uma bolsa para fazer cursinho.

No segundo semestre ingressei no cursinho e apesar de ter virado muitas noites de estudo não consegui passar no vestibular. Para mim foi uma tristeza. No ano seguinte, comecei a estagiar em um escritório de contabilidade e passei apenas três meses porque não recebia pagamento. Aqui já não morava mais com meus primos.

Foi então que a minha mãe resolveu mandar a minha irmã mais nova e a mais velha para morarem comigo e estudarem. Como as minhas irmãs iam estudar na Escola Normal Oficial Antonino Freire, escola de formação de professores, resolvi também fazer o mesmo. Segundo a minha mãe, era o melhor caminho para filho de pobre, pois o curso oportunizava ingressar mais rápido no mercado de trabalho.

O primeiro ano na escola para mim foi muito chato, pois era uma repetição do primeiro ano de contabilidade comum a todos os cursos considerados técnicos. Aqui, mais uma vez, ensinava os meus colegas de sala, tirava dúvidas e às vezes era surpreendida pelo professor nesse exercício. Quando isso acontecia, o professor pedia que continuasse e até ajudava. Foi o ano que pratiquei muitas indisciplinas, pois os conteúdos não tinham nenhuma relevância para mim. Lembro que sempre chegava atrasada à aula, tendo às vezes que pular o muro da escola ou enganar o vigia; dormia na sala de aula; não ia com o fardamento completo, chegando muitas vezes a ter de embora por conta disso.

Os dois últimos anos foram diferentes, pois já estudava os conteúdos pedagógicos e frequentava os estágios nas escolas. Confesso que não gostava muito. Eu sentia certa resistência ao magistério por conta da forma como ingressei, uma imposição da minha mãe. Concluí o magistério e por ter tido uma formação geral dos conteúdos para ingressar em outra área do conhecimento, resolvi fazer o vestibular para Pedagogia, sendo aprovada na primeira tentativa, pois antes tinha tentado fazer Serviço Social.

Eu nunca fui de desistir acerca dos cursos que iniciava. Tudo na minha vida, seja profissional ou pessoal, eu sempre vou até o fim. Então eu fiz dois cursos secundários, o de técnico em

contabilidade, que tive poucas experiências, e o normal, que ingressei no mercado de trabalho logo que terminei. Primeiro como auxiliar de secretaria e depois como professora das disciplinas educação artística, matemática, educação para o lar, estudos sociais etc. Aqui já frequentava o primeiro ano de Pedagogia. Estava começando a gostar do curso e da ideia de ser professora, de me assumir como professora de fato e de direito.

Na universidade, basicamente no curso de Pedagogia, eu tive a certeza que queria realmente ser professora, gostava das aulas, dos professores e sempre procurava participar das aulas e dos eventos promovidos pela instituição da melhor maneira possível. As aulas de metodologia do ensino pré-escolar eram as que me identificava mais enquanto professora, sempre passava um pensamento na minha cabeça: “eu ainda vou ser professora da universidade só para ministrar essa disciplina”, chegava a externar esse sonho com os meus professores e também a vontade de ser professora da universidade.

Ao terminar o curso, como eu já estava trabalhando como professora, eu fui convidada para ser Supervisora de Ensino em uma creche. Aceitei de imediato, aqui desenvolvia um trabalho diferente, pois coordenava um grupo de professores acerca dos planejamentos e das atividades escolares. Nós trabalhávamos em equipe, pois na creche tinha o psicólogo, a pedagoga, que era eu, a nutricionista, a assistente social e o médico. Todas as atividades a serem desenvolvidas eram discutidas por todos.

Mesmo desenvolvendo as atividades de coordenação, vez por outra assumia a sala de aula. Eu me sentia realizada desenvolvendo o trabalho de professora com as crianças. Foi aqui que tive a oportunidade de fazer uma especialização em Educação Infantil. Estava caminhando em direção dos meus sonhos.

Antes mesmo de concluir, fiz um concurso para professor substituto da universidade em um

campus do interior, para mim, nesse momento da minha vida, não importava sair da capital e retornar

para o interior. Fui aprovada e tive a oportunidade de ministrar as disciplinas de metodologia do ensino pré-escolar, alfabetização, didáticas específicas e outras.

No ano seguinte fiz o concurso para professor efetivo, sendo contratada um ano depois. Tinha já a certeza que estava no caminho certo, a cada momento me identificava mais com a profissão. Já na universidade fiz o curso de mestrado, que muito contribuiu para a minha formação profissional.

As experiências que eu tive como aluna do curso de magistério na modalidade normal foram as seguintes:

 Durante o período de aulas na escola normal, em alguns momentos já exercia o magistério, pois tinha muita facilidade em aprender os conteúdos trabalhados pelos professores e consequentemente repassá-los aos alunos em sala de aula nos momentos de intervalos ou quando faltava algum professor. Isso me deixava orgulhosa em saber que os meus colegas estavam também aprendendo;

 O estágio exercido nas escolas durante o curso também contribuiu muito para a minha formação profissional;

 O uso de recursos didáticos, o uso do quadro negro;

 Na universidade eu já estava mais consciente que queria mesmo ser professora, então eu sempre prestava atenção para os movimentos dos professores em sala de aula;

 O domínio do conteúdo pelo professor; ser exigente em relação às atividades a serem desenvolvidas; o uso dos recursos didáticos; a relação professor-aluno como fator importante da aprendizagem; as dinâmicas usadas pelo professor para introduzir o conteúdo;

 A participação em congressos estudantis, culminando com a apresentação de trabalhos;  Ter cursado a disciplina metodologia do ensino pré-escolar com uma professora que me

incentivou muito a seguir a carreira de professora no Ensino Superior. Esta mesma professora foi quem me avisou do concurso para o campus da universidade em outro município. Penso que eu só tive experiências positivas que muito contribuíram, porque as negativas a minha memória não lembra.

O motivo que me levou a tornar-me professora foi o meu ingresso no curso normal secundário por causa da minha mãe e o fato de ter passado no vestibular para Pedagogia. Ainda cursando o segundo ano, percebi que o que me restava mesmo era seguir a carreira de professora. Isso só ficou mesmo definido quando ingressei na universidade e comecei a cursar as disciplinas pedagógicas.

A universidade se apresentou para mim como uma nova forma de ver o mundo, talvez porque o curso de Pedagogia proporcionasse essa abertura de trabalhar a formação do homem de forma ampla nas suas dimensões sociais, políticas, filosóficas, éticas, profissionais e pessoais. Penso que foi na Universidade, cursando Pedagogia, que me tornei professora, observando os meus professores e suas metodologias para ensinar os conteúdos.

Assim, eu tenho uma imagem positiva acerca da minha profissão de professora, porque ser professora para mim significa uma busca incessante acerca do conhecimento. Essa busca do conhecimento significa um prazer enorme, porque na medida em que aprendo eu estou contribuindo para a aprendizagem do meu aluno. É positiva, porque eu assumo a minha profissão com responsabilidade e hoje eu tenho certeza que eu não estou professora, eu sou professora, eu gosto de ensinar e ensino porque gosto.

A universidade me ensinou a pensar na importância social da educação para a vida do homem. Para mim ser professora é ser autora e coautora da minha própria história de formação com um percurso primeiro social, depois individual. Ser professora é assumir a responsabilidade de uma profissão tão complexa e cheia de dilemas cotidianamente. É ser aprendente da profissão com a literatura, com os alunos, com os pares mais experientes.

Eu me identifico com a profissão quando estou ministrando aula e sei que o meu aluno aprendeu o conteúdo, que o objetivo almejado pra aquela aula foi atingido, quando o aluno me procura para tirar suas dúvidas e eu consigo resolvê-las. O compromisso com o outro (aluno). Eu não posso fingir que ensino, pois ensinar é responsabilizar-se com o que faz e por que faz desse jeito e não de outro jeito.

Assim, a minha imagem de professora eu estou construindo a cada momento num processo contínuo de formação. Um dos fatores que tem contribuído é gostar de estudar e ter a consciência que somos sempre aprendizes da vida e estagiários da profissão. Algumas disciplinas cursadas na academia, os professores considerados por mim como sendo bons professores, a influência de professores mais experientes, foram fatores significativos e tiveram peso na minha vida profissional.

Hoje, não tenho dúvida nenhuma que escolheria novamente ser professora, se eu tivesse que escolher outra profissão. Acho que já nasci professora, apenas não podia assumir de fato e não tinha formação adequada para o cargo. Lembro que iniciei a docência ainda no Ensino Fundamental quando ministrava aulas de reforço para os meus colegas e depois no Ensino Médio Normal.

Escolheria ser professora porque se eu não gostasse do que faço eu teria parado no tempo e no espaço. Porque ser professora é estar sempre inovando, aprendendo com os outros e para os outros, é dialogar com vários campos do conhecimento e com vários sujeitos em perspectivas diferentes, é ver no aluno a possibilidade de crescimento e saber que você está contribuindo para a sua formação tanto individual quanto profissional, é você deixar a sua marca.