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Classificado na Carta Constitucional como “Função Essencial à Justiça”, a conceituação do Ministério Público está definida no artigo 127 daquele diploma legal: “[...] O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”115

Como princípios institucionais o mesmo dispositivo elenca a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional, consolidando, dessa forma, os pilares da instituição a fim de mitigar a vulnerabilidade do órgão na defesa dos interesses sociais.

Paralelamente, há o dever de agir do Ministério Público. Isso quer dizer que identificada uma das hipóteses de atuação, não poderá o representante ministerial eximir-se da ação. É o que afirma Mazzilli: “se o Ministério Público identifica a existência da lesão em caso no qual a lei exija sua atuação, não pode

115 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 2 de junho de 2017.

alegar conveniência em não propor a ação pública[...] salvo quando a própria lei lhe permita o juízo de conveniência e oportunidade.”116

Assumindo os papéis definidos no processo, o Ministério Público poderá atuar de maneiras distintas, como parte, ou como fiscal da Lei.

4.1.1 Como parte

O Ministério Público tem legitimidade para atuar nos processos coletivos, conforme já abordado no item 2.3, em razão do disposto na Constituição da República Federativa Brasileira, no Código de Defesa do Consumidor e na Lei da Ação Civil Pública. Assumirá a condição de parte sempre que propuser a ação coletiva, ou ocupar o polo passivo da demanda.

Das possibilidades de atuação do Ministério Público como parte no processo coletivo, a mais conhecida é aquela exercida no polo ativo das ações coletivas. Como por exemplo, na propositura de uma ação civil pública.

Além da defesa de direitos coletivos, é possível que, no polo ativo, o Ministério Público venha a postular uma ação para defesa de interesses próprios. Como, por exemplo, uma ação para defesa “do princípio da independência funcional”. Nesse caso estaria exercendo a legitimação ordinária, em exceção a consagrada legitimação extraordinária (quando age como substituto processual).117

Outra forma de atuação do MP, enquanto parte, é aquela exercida no polo passivo da ação. Nesse caso, “é possível concluir pela legitimidade passiva do Ministério Público no processo coletivo passivo e nas ações incidentais ou acessórias ao processo coletivo.” Assim, no caso de ações (embargos à execução, ação rescisória, ou outra de caráter incidental e acessório) propostas pelo réu do processo coletivo, o polo passivo será ocupado pelo Ministério Público. 118

116 MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 94. 117 DIDIER JÚNIOR, Fredie; GODINHO, Robson Renault. Questões atuais sobre as posições do ministério público no novo CPC. In: DIDIER JÚNIOR, Fredie, Fredie (Coord.) Ministério público: coleção repercussões do novo CPC. Salvador: Juspodvim, 2015. v. 6 p.15-42.

118 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de processo coletivo: volume único. 3. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 263.

Outra forma de atuação do Ministério Público no processo é como fiscal da Lei, que será o objeto do próximo item.

4.1.2 Como Fiscal da Lei

O Ministério Público atua como fiscal da lei, cumprindo sua missão constitucional precípua de promover “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. O § 1º, do art. 5º da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985) dispõe que o “Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei”.119

É a atuação conhecida como “Custos Legis”, expressão em latim que significa “guardião da lei”120.

Depreende-se do dispositivo acima citado que o Ministério Público sempre participará da ação coletiva, seja como parte ou como fiscal da lei. Sobre o assunto é importante destacar que “não existe atuação dupla do Ministério Público na ação coletiva”, ou seja não poderá desempenhar ao mesmo tempo o papel de parte e de fiscal da lei.121

A importância da atuação do Ministério Público como fiscal da lei, ou fiscal da ordem jurídica, está relacionada a relevância das ações coletivas e dos direitos tutelados. O órgão ministerial atua nesses casos de modo a garantir a correta aplicação da lei no curso do processo. Esse é o entendimento de Didier ao afirmar que “as demandas coletivas estão regradas para tutelar o interesse público primário, justifica-se por este motivo a especial preocupação com a participação do Ministério Público na realização deste intento.”122

Outro importante papel desempenhado pelo Ministério Público, na qualidade de fiscal da ordem jurídica, é o controle de constitucionalidade, tanto pela

119 BRASIL. Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (VETADO) e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7347Compilada.htm>. Acesso em: 05 jun. 2017.

120 VALLE, Gabriel. Dicionário de expressões jurídicas: latim-português. 2. ed. Campinas: Copola Livros, 2002.

121 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de processo coletivo: volume único. 3. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 265.

122 DIDIER JÚNIOR, Fredie; ZANETI JÚNIOR, Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo. 8. ed. Salvador: JusPODIVM, 2013. v. 4. p.363.

forma difusa (por meio da Ação Civil Pública), quanto pela concentrada (por meio da Ação Direita de Inconstitucionalidade). A finalidade, nesses casos, é a proteção das normas constitucionais e, também, do Estado Democrático de Direito.123 Delimitada

a atuação do Ministério Público como fiscal da lei, impõe-se a compreensão das situações em que a atuação ministerial será exigida, razão pela qual passa-se a elencar as regras de intervenção no processo.

4.1.3 Regras de intervenção no processo

O título V do novo Código de Processo Civil (CPC) de 2015 apresenta regras de intervenção no processo pelo Ministério Público. Além de reafirmar os preceitos constitucionais para atuação do órgão ministerial (artigos 176 e 177), elenca, no artigo 178, as possibilidades dessa intervenção. Nesse dispositivo é definido o prazo de 30 dias para a intimação quando o parquet intervir como “fiscal da ordem jurídica”, especialmente nos processos que envolvam: interesse público ou social; interesse de incapaz e litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana.124

Embora o novo Código de Processo Civil não tenha trazido grandes avanços na disciplina da defesa dos direitos transindividuais, como situou a doutrina125, o título dedicado à atuação do Ministério Público é de notável

importância para as atividades ministeriais e aplica-se ao processo coletivo. Sobre as inovações do novo CPC em relação a intervenção do Ministério Público, Robson Renault Godinho destaca como relevantes as relacionadas a seguir:

1) reprodução do artigo 127 da Constituição, tornando claramente didática a definição da regra-matriz que inspira a atuação do Ministério Público; 2) não repetição das referências às ações de estado, disposições de última vontade e à ausência; 3)intervenção em ações de família somente quando presentes incapazes; 4) expressa referência às hipóteses de intervenção do art. 178, quando se tratar também de jurisdição voluntária; 5) fixação de prazos próprios e modificação na forma de fixação e contagem de prazos; 6) previsão de responsabilidade por ilícito processual; 7) expressas disposições sobre a possibilidade de suscitar incompetência relativa e

123 JATAHY, Carlos Roberto de Castro. Curso de princípios institucionais do ministério público. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 344-347.

124 BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 5 jun. 2017. 125 Conforme Nota 6, p. 14

requerer desconsideração da personalidade jurídica; 8) clara definição do papel do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica, sem qualquer similitude com a figura de curador especial; 9) necessidade de intervenção obrigatória em casos de incidente de resolução de demandas repetitivas; 10) intervenção obrigatória em caso de litígio coletivo pela posse rural ou urbana; 11) procedimento específico para a citação de pessoas com deficiência; 12) decretação de invalidade pela ausência de intervenção apenas após a intimação do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou não de prejuízo.126

A intervenção do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica consolida o papel desse órgão que está “consagrado, com autonomia e independência funcional, à defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, da ordem jurídica e do regime democrático.”127 Acentue-se que o objetivo que se

evidencia é a garantia da justiça social e do acesso à justiça.

Ainda sobre a atuação do Ministério Público, pela peculiaridade de sua função na tutela dos direitos transindividuais, percebe-se que há uma aproximação da instituição com a sociedade, seja para a satisfação de um direito negado ou para assegurar garantias constitucionais. De todas as maneiras, a informação do trabalho desenvolvido é um importante elemento de interlocução entre o órgão ministerial e os cidadãos, assegurando a possibilidade de acesso à justiça. Esse motivo, esse tema será o objeto de discussão a seguir.