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MONTEIRO LOBATO EDITOR: JARDIM SECRETO DE FRANCISCA DE BASTO CORDEIRO (1875-1969)

No documento Processos de criação em debate (páginas 107-115)

Emerson Tin33 Em dezembro de 2014, tive a oportunidade de adquirir uma carta inédita de Monteiro Lobato34, que assim vinha descrita pelo vendedor:

Pequena carta manuscrita e assinada por Monteiro Lobato em papel timbrado, datada de 21 de março de 1923. Não consegui decifrar algumas palavras, mas o conteúdo é mais ou menos este: “Sr. Francisco, em mãos sua carta última. Acho que seu livro está com um bom guia (?), que ---. A carta de ---- deve sair na revista de junho, e o resto que ficou (?) aqui vae. Eu continuo firme na minha ideia primitiva: fazer o livro com unidade – só de pensamentos. O resto ficava para outros livros, mais tarde. Não acha que deve ser assim? Em junho ---. Lobato” Muito bom estado de conservação.

Seguindo as informações apresentadas pelo livreiro e antes de ter acesso ao documento, comecei a formular algumas hipóteses em torno da carta: quem seria o destinatário, identificado como “Sr. Francisco”? Talvez o escritor Martim Francisco Ribeiro de Andrada (1853-1927), um dos editados por Lobato. Afinal, a carta se referia a um livro, e Martim Francisco havia publicado dois deles pela Monteiro Lobato & Cia.: Rindo, de 1919 (ainda pela chancela da Revista do Brasil) e Contribuindo, de 1921. Seria um novo projeto de publicação, já que Lobato pretendia “fazer o livro com unidade – só de pensamentos”? E de quem seria a carta mencionada por Lobato, cuja autoria o livreiro não conseguira distinguir, e que seria publicada na “revista de junho”?

Eram muitas as questões, mas a solução delas só poderia vir no momento em que me visse com a carta nas mãos.

Chegada a carta, percebi que alguns elementos haviam sido decodificados equivocadamente pelo livreiro, a começar pela data da carta, que não era 21 de março de 1923, mas 31 de maio. Quanto ao destinatário, não se tratava de Sr. Francisco, um homem, portanto, ou Martim Francisco, como eu supus, mas de Sra. Francisca, uma mulher! Quem seria essa Sra. Francisca?

Ao prosseguir na leitura da carta, outro elemento desfez um enigma: a carta que seria publicada no número de junho da Revista do Brasil, conforme projetava Lobato, era do russo

                                                                                                                         

33Doutor em Teoria e História Literária pelo Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP (2007). Professor Doutor I das

Faculdades de Campinas. Professor Conselheiro do time Enactus FACAMP desde 2013.  

34Tive conhecimento da existência da carta por meio do Prof. Marcos Antônio de Moraes (IEB/USP), que

Leon Tolstoi (1828-1910). Com isso, eu já tinha uma pista: procurar, na Revista do Brasil, nesse período, algum texto que se referisse a – ou que trouxesse alguma carta de – Tolstoi. Consultando a revista, encontrei, no número de julho (e não no de junho), o texto “Ultimo escripto de Tolstoi, por Francisca B. Cordeiro”.

Francisca B. Cordeiro? Quem seria ela? O dicionário de Heloisa Buarque de Hollanda e Lucia Nascimento Araújo (1993, p. 114) traz essa pequena nota:

FRANCISCA (CAROLINA SMITH DE VASCONCELOS) DE BASTO CORDEIRO Rio de Janeiro, RJ, 1875 — 1969 Escritora e organizadora de saraus lítero-musicais, foi figura importante das letras, principalmente nas décadas de 20 e 30 [...].

A partir desse nome, comecei a desenrolar o fio da trama em torno da misteriosa carta de Lobato, cuja transcrição é a seguinte:

[papel timbrado: MONTEIRO LOBATO / RUA GUSMÕES, 70 / Caixa 2-B – S. PAULO]

S.Paulo 31.5.923 Sra. Francisca

Em mãos sua carta ultima. Acho / que seu livro está com um bom guia, / que tal é o Oiticica.

A carta de Tolstoi deve sair / na revista de Junho, e o resto / que ficou aqui vae. Eu continuo firme na minha / idéa primitiva: fazer o livro com / unidade – só de pensamentos. O / resto ficava para outros livros, mais tarde. Não acha que deve ser assim?

Em Junho devo apparecer por / ahi e então conversaremos melhor De seu aor. e cª.

Lobato

Como vimos, a “carta de Tolstoi” viria a ser publicada com o título de “Ultimo escripto de Tolstoi” apenas na revista de julho de 1923, e não na de junho, como previa Lobato.

Oiticica, o “bom guia” mencionado por Lobato, é José Oiticica (1882-1957), catedrático do Colégio Pedro II, com quem Lobato mantinha relações e que viria a ser autor, entre outras obras, de um Curso de Literatura, publicado postumamente, em 1960.Mas qual seria o livro a que se referia Lobato? Tratava-se de Jardim secreto, que seria publicado entre o final de 1923 e o início do ano de 1924. Embora não haja data registrada na edição35, é possível imaginar sua

publicação nesse período, já que o prefácio, assinado por Coelho Neto, é datado de junho de 1923, e as primeiras resenhas do livro começariam a ser publicadas na imprensa a partir de março de 1924.

                                                                                                                         

35A ausência de data na edição foi motivo de equívocos, como o de Alexandre Eulálio (1989: 194), que registra

Jardim secreto como sendo de 1925 (talvez levado a isso por ter o livro recebido a menção honrosa da

Em que consistia esse Jardim secreto?

Era o livro de estreia da escritora. Como lembra Brito Broca, em seu artigo A revolução

editorial de Monteiro Lobato (1994, p. 65) Monteiro Lobato, ao lançar escritores “novos, soube

escolher, de preferência, os que podiam interessar o público”.

Antes de ser o título de um célebre best-seller para colorir, já existiam os romances de Marcel Prévost (1862-1941), Le jardin secret, de 1897, e de Frances Hodgson Burnett (1849- 1924), The secret garden, publicado em livro em 1911. “Jardim secreto” também era o título que o médico baiano Carlos da Veiga Lima (1889-1939) pretendia dar a um livro anunciado em vários números da Revista da semana 36, periódico em que mantinha a coluna “Consultório Médico”. O

livro de Veiga Lima, ao que tudo indica, seria bastante semelhante ao de Francisca de Basto Cordeiro, pois reuniria, além de contos, algumas máximas e reflexões do autor. Diante da coincidência dos títulos, Veiga Lima acabou, aparentemente, publicando seu livro sob outro título:

O sorriso da chimera, pelas Edições Pan, em 1924.37

A escolha do título, para o editor Monteiro Lobato, não era questão irrelevante. Afinal, nesse mesmo ano de 1923, Lobato, em carta ao poeta taubateano Cesídio Ambrogi (1893-1974), recomendava:

Não acho bom o título; um tanto pretensioso. Precisamos descobrir um melhor. Os títulos femininos são os melhores; falam à libido do homem – e forçam a saída. As Moreninhas, ótimo título. Ou coisa assim, que dê a entender que há mulheres lindas dentro. (TIN, 2007, p. 403)

O livro de Ambrogi seria publicado justamente com o título sugerido pelo editor. Conselho semelhante seria dado a Alberto Rangel (1871-1945), em carta de 9 de junho de 1923:

                                                                                                                         

36“Pensamentos sem direcção [...] (Do livro Jardim Secreto).” (Revista da semana, Anno XXIV, nº 3, 13 de janeiro de

1923, p.2); “Publicarei brevemente novo livro de contos ‘Jardim Secreto’ que será entregue proximamente ao editor. Gratissimo. DR. VEIGA LIMA” (Revista da semana, Anno XXIV, nº 10, 3 de março de 1923, p.42); “Diante da natureza o espirito se singularisa – a emoção da fórma adivinhada ma luz indecisa da paizagem é como a primeira impressão amorosa: um deslumbramento... A paizagem é sempre um estado de alma. Agradeço a gentileza da sua carta, tão finamente espiritual. Quando publicarei ‘Jardim Secreto’? Ainda este anno. A arte enche a alma de alegria e felicidade e dá ao espirito o sorriso encantado da chiméra! Gratissimo” (Revista da semana, Anno XXIV, nº 13, 24 de março de 1923, p.39); “Agradeço a amabilidade da sua carta. Já publiquei ‘Cidade Harmoniosa’ e publicarei ainda este anno ‘Jardim Secreto’, livro de contos. Sim, disse algures que o espirito é uma harmonia fóra da natureza. Enviarei aos consulentes um exemplar do ‘Jardim Secreto’.” (Revista da semana, Anno XXIV, nº 42, 13 de outubro de 1923, p.44). Em dezembro, Veiga Lima já passa a anunciar O Sorriso da Quimera, definido pelo próprio autor como “livro de contos e pensamentos” e publicado no mês de maio do ano seguinte: “Publicarei brevemente um livro de contos ‘O Sorriso da Chiméra’.” (Revista da semana, Anno XXIV, nº 51, 15 de dezembro de 1923, p.50); “Publicarei no proximo anno um novo livro de contos ‘O Sorriso da Chimera’, que já entreguei ao editor.” (Revista

da semana, Anno XXIV, nº 52, 22 de dezembro de 1923, p.46)

37 Curiosa e coincidentemente, na seção “Alguns livros”, assinada por A. de S. e publicada, no dia 1º de novembro de

1924, na p.4, pelo jornal O Paiz, encontram-se resenhas de Jardim secreto, de Francisca de Basto Cordeiro, e de O

Sorriso da Chimera, de Carlos da Veiga Lima. O próprio Veiga Lima viria a resenhar o livro de Francisca de Basto

Lume e Cinza! Linda coisa deve ser! De mau título, porém. Nosso povo ledor avança de preferência em livros de títulos femininos. Imagina logo que há uma mulher dentro que faz das suas. Sou freudista, e aplico a teoria do alemão na capa dos livros. Título é o primeiro contato e se fala à libido do freguês ele logo o compra. Não imagina como saem mais os livros de títulos mulherengos que os de títulos másculos, ou abstratos. Se eu escrever uma tabela de logaritmos, um dia, hei de intitular: Aventuras de uma semivirgem. E derroto o Callet. Mude o título do Lume. Ponha, p. ex., As mulheres do Landou, e o livro sairá 5 vezes mais. A objeção de que tal título nenhuma relação tem com a obra, não procede. Título é nome, é designação. E que relação tem os nomes próprios com as pessoas que o trazem? Eu sou José, como poderia ser João ou Antonio. V. é Alberto como seria Teodoro. Porque mudar de sistema ao passar de homem a livro? (TIN, 2007: 310)

Jardim secreto até poderia não ser um título original 38, mas certamente agradou a Lobato, já que conciliava segredo e alma feminina – aspecto ressaltado no prefácio de Coelho Neto: “é este um livro de mulher” –, o que possivelmente interessaria ao público. Como se percebe deste trecho da carta, Lobato faz uma sutil objeção a uma possível sugestão da escritora quanto à estruturação do livro: “Eu continuo firme na minha idea primitiva: fazer o livro com unidade – só de pensamentos. O resto ficava para outros livros, mais tarde. Não acha que deve ser assim?” Ao afirmar que continuaria firme em sua ideia primitiva, Lobato posiciona-se quase que como um coautor do texto, dando-lhe a feição definitiva39. Além disso, a ideia primitiva de compor um livro com unidade, só de pensamentos, coadunava-se com o livro mais recente que havia saído dos prelos sob a assinatura do editor-autor: Mundo da lua, de Monteiro Lobato, publicado em 1923, seria descrito pela seção “Bibliographia” da Revista do Brasil (v. XXIII, anno VIII, n. 89, maio 1923, p.159) como “um livro todo inédito. Não são contos, são pequenos trechos de prosa que não passam de uma página ou pouco mais. Episódios da vida, cenas da rua, estados d’alma, observações [...]”.Um livro “só de pensamentos”, poderíamos dizer, portanto. A intervenção do editor Lobato, todavia, não se restringiria apenas ao processo de edição do livro. Afinal, não bastava editar o livro, era necessário vendê-lo, e o raciocínio utilizado em relação à citadíssima edição de 50 mil exemplares de Narizinho poderia se estender a toda a praxe comercial de Lobato:

O meu Narizinho, do qual tirei 50.500 – a maior edição do mundo! – tem que ser metido bucho a dentro do público, tal qual fazem as mães com o óleo de rícino. Elas apertam o nariz da criança e enfiam a droga e a pobre criança ou                                                                                                                          

38 A justificativa do título pode ser encontrada neste trecho: “Cada criatura occulta no coração um jardim secreto onde,

como num cemiterio sepultou as affeições passadas. Ahi jazem annos, esquecidas. Mas, um dia, sem motivos quasi, os tumulos se reabrem. E os mortos voltam sorridentes ao coração em que a saudade os conservou... E o Passado resurge inteiro.” (CORDEIRO, [1923], p. 108).

39 Em relação a outros autores, podemos perceber que o processo de intervenção do editor Lobato se aprofundava

mais. É o caso de Godofredo Rangel e seu romance Vida Ociosa, que já abordei em trabalho anterior (“Fragmentos da gênese de Vida ociosa, de Godofredo Rangel, n'A barca de Gleyre” In: X Congresso Internacional da Associação de

Pesquisadores em Crítica Genética, 2010, Porto Alegre. Disponível em:

engole ou morre asfixiada. Gastei 4 contos num anúncio de página inteira num jornal daqui. Faz de conta que é o Gelol. “Dói? Gelol.” (LOBATO, 1964, p. t.2, 230)

Em relação a Jardim secreto, certamente não seria o caso de gastar quatro contos num anúncio de página inteira num jornal. Todavia, seria o caso de fazer com que o livro encontrasse o caminho da crítica, por meio de nomes que o apadrinhassem. O primeiro deles seria justamente Coelho Neto (1864-1934). O escritor maranhense, a quem coube a função de prefaciar o livro, fazia parte do círculo de correspondentes de Lobato, era um dos medalhões editados por ele (no romance coletivo O mysterio, de 1920, escrito ao lado de Afrânio Peixoto, Medeiros e Albuquerque e Viriato Corrêa) e possivelmente estaria incluído também no rol de amizades da escritora. Ao que parece, porém, Coelho Neto levou mais longe – a pedido de Lobato, talvez? – seu papel de padrinho da nova escritora: enviou o livro a Múcio Leão (1898-1969), então crítico do Correio da manhã, que registra o fato em sua resenha publicada em 04 de abril de 1924: “O meu mestre, o sr. Coelho Netto, que prefaciou o livro da sra. Basto Cordeiro e que fez acompanhar de um cartão o exemplar que às minhas mãos chegou [...]”. Se enviar o livro a Múcio Leão teria sido uma estratégia editorial em busca de uma crítica favorável, o projeto parece não ter obtido muito êxito. A crítica de Múcio Leão é avassaladora. Inicia-se com uma descrição muito pouco elogiosa do livro e com a alusão à falta de originalidade do título:

A sra. Francisca de B. Cordeiro reuniu em volume algumas phrases soltas, algumas tentativas de pensamento. E deu ao seu livro o título de Jardim secreto. Os leitores sabem que Marcel Prévost tem um livro com esse mesmo título. Mas que importa isso? Deve haver muito jardim secreto, por esse mundo a fóra... e, quando temos a originalidade de alguma bella idéa ou de alguma bella palavra, a culpa dessa originalidade não é, por ventura, unicamente nossa? O livro de Prévost é um romance de tristeza, de soffrimento, e, tambem, de doçura. E seria injusto compararmos, sequer, a intensa melancolia que nelle respiramos, com as maximas, invariavelmente banaes, tão pobres de sabedoria, que encerra o livro da sra. Basto Cordeiro.

Após carregar nas tintas da crítica, Múcio Leão procura amenizá-la, considerando que

esse Jardim secreto testemunha um esforço. E é generoso acolher esforços alheios. O meu mestre, o sr. Coelho Netto, que prefaciou o livro da sra. Basto Cordeiro e que fez acompanhar de um cartão o exemplar que ás minhas mãos chegou, sabe, na sua indulgencia, quanto isso é verdadeiro. Depois, talvez eu me engane muito: talvez o livro da sra. Basto Cordeiro não seja, em definitiva, senão uma auspiciosa promessa; talvez, elle indique que essa escriptora, continuando a tentar meditar durante dez annos, venha a dar-nos alguma obra interessante.

Arremata a resenha, todavia, de modo cáustico:

Como quer que seja, e resumindo o meu juízo sobre essa collecção de notas e de phrases, eu direi que a sra. Basto Cordeiro nada tem do verdadeiro e claro espirito dos aphoristas. Seu livro representa, apenas, uma tentativa muito fragil de arte. Não deixa de ser louvavel, entretanto, que, numa época de frivolidade e de inconstancia, uma senhora procure pensar, quando já se vê cercada de netinhos.

Diante dessa crítica, uma das primeiras publicadas na imprensa, cabia uma reação. Essa reação viria da pena de José Oiticica, justamente o “bom guia” que Lobato mencionara em sua carta. Em “Num Horto”, artigo publicado no mesmo Correio da manhã duas semanas depois, em 19 de abril de 1924, Oiticica parece responder diretamente à acusação de Múcio Leão de que Francisca de Basto Cordeiro “nada tem do verdadeiro e claro espírito dos aforistas”:

Difficilmente poderia caber na feitura de Jardim Secreto estylo mais conciso, claro, elegante, fluente. A autora é uma aphorista nata. Ainda os pensamentos mais comezinhos ella os diz com precisão rara e rara harmonia de palavras. Eis algumas amostras dignas de La Rochefoucauld [...]

Despertava-se o interesse em torno do livro. Outras críticas viriam, menos ou mais elogiosas, até a consagração, em março de 1926, com a menção honrosa recebida da Academia Brasileira de Letras. Não era pouco para um livro de estreia.Francisca de Basto Cordeiro, hoje quase totalmente esquecida, teve importante papel na cena cultural carioca das primeiras décadas do século XX. Haveria outras cartas de Monteiro Lobato para ela? Ao que tudo indica, sim. Em abril de 1993, Eduardo de Oliveira e Eliane Azevedo, em reportagem publicada na revista Veja intitulada “Do lixo para a história”, noticiavam que,

por obra do acaso, um anônimo colecionador carioca deparou com um caixote de livros velhos cujo destino era a lixeira. Do monturo, ele resgatou uma preciosidade: dois álbuns de autógrafos repletos de assinaturas, poemas, dedicatórias, cartas e desenhos dos principais nomes da intelectualidade nacional e internacional de 1892 a 1966.40

                                                                                                                         

40 A descoberta desses álbuns também é registrada por Heloisa Buarque de Hollanda e Lucia Nascimento Araújo:

“Recentemente foram descobertos dois álbuns de autógrafos de sua propriedade, repleto de assinaturas e dedicatórias de grandes nomes das artes, nacionais e internacionais como o bailarino Nijinsky e os escritores Machado de Assis, Guimarães Rosa, Monteiro Lobato entre muitos outros” (1993, p. 114).

A dona dos álbuns: Francisca de Basto Cordeiro. Entre as cartas, pelo menos mais uma de Monteiro Lobato:

“Qual o perfume que usa no papel de carta?”, indaga, ansioso, Monteiro Lobato em sua missiva. “Achei-o tão delicioso que estou aflito por decifrar tal mistério.” Foi o escritor quem incentivou Francisca a publicar seu primeiro livro, Jardim Secreto, menção honrosa da ABL em 1926.

Onde estarão esses documentos? Somente mais pesquisas o permitirão saber e trazer mais informações sobre a atuação editorial de Monteiro Lobato na publicação de Jardim secreto.

O que se tem até agora – “biografia e correspondência do autor, conhecimento da obra no seu conjunto, testemunhos de terceiros, eventos históricos” –, no entanto, já nos permite, como assinala Almuth Grésillon, ter “informações sobre as condições externas dentro das quais se situa uma gênese” (2007, p. 42). No caso de Jardim Secreto, uma gênese que aponta não somente para a construção da obra, mas também para a sua recepção crítica, numa intervenção sutil, porém firme, do editor Monteiro Lobato.

REFERÊNCIAS

BROCA, Brito. “A revolução editorial de Monteiro Lobato”. In: _____. O repórter impenitente. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1994, pp.62-67.

CORDEIRO, Francisca de B. Jardim Secreto (Ensaios). São Paulo: Monteiro Lobato & Cia. Editores, [1923].

EULÁLIO, Alexandre. “Em torno de uma carta de Machado de Assis”. Novos estudos.

CEBRAP, nº 23, março de 1989, pp.188-195.

GRÉSILLON, Almuth. Elementos de crítica genética: ler os manuscritos modernos. Tradução de Cristina de Campos Velho Birck... [et al.] Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2007, p. 42. HOLLANDA, Heloisa Buarque de, ARAÚJO, Lúcia Nascimento. Ensaístas brasileiras:

mulheres que escreveram sobre literatura e artes de 1860 a 1991. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.

LEÃO, Múcio. “Jardim Secreto”. Correio da Manhã, 04 de abril de 1924, p.4. LOBATO, Monteiro. A Barca de Gleyre. São Paulo: Brasiliense, 1964.

OLIVEIRA, Eduardo de,.AZEVEDO, Eliane. “Do lixo para a História: descoberto, por acaso, um tesouro que retrata quase um século da vida cultural do país”. Veja. São Paulo: Abril, 1993, pp.66-67.

OITICICA, José. “Num Horto”. Correio da Manhã, 19 de abril de 1924, p.4.

TIN, Emerson. Em busca do “Lobato das cartas”: a construção da imagem de Monteiro Lobato diante de seus destinatários. 2007. 548f. Tese (Doutorado em Teoria e História Literária) – IEL, UNICAMP, Campinas, 2007.

ELEMENTOS FÍLMICOS NÃO ESPECÍFICOS:

No documento Processos de criação em debate (páginas 107-115)