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A presente pesquisa foi conduzida na área da Linguística Aplicada, doravante LA. Com o intuito de estabelecer o referencial teórico que norteia a metodologia do presente trabalho, explicitarei as definições e conceitos de diversos autores teóricos da pesquisa qualitativa em Ciências Humanas e Sociais.

Primeiramente, o conceito de pesquisa adotado para este trabalho tem fundamento nos preceitos de Lüdke e André (1986, apud Chizzotti, 2006), Luna (1989, apud Chizzotti, 2006), e Pádua (1997, apud Chizzotti, 2006). Lüdke e André consideram que para realizar uma pesquisa é preciso promover o confronto entre “(...) informações coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teórico acumulado a respeito dele” (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p. 1-2). Luna afirma que pesquisa “é uma atividade de investigação capaz de oferecer (e, portanto, produzir) um conhecimento “novo” a respeito de uma área” (LUNA, 1996, p. 15). Finalmente, reformulando a definição fornecida por Luna, Pádua afirma que “toda pesquisa tem uma intencionalidade, que é a de elaborar conhecimentos que possibilitem compreender e transformar a realidade” (1997, apud Chizzotti, 2006, p. 30).

Conforme poderá ser observado a seguir, todos os conceitos de “pesquisa” assumidos neste trabalho têm estreita relação com o conceito de pesquisa

55 qualitativa realizada no campo das Ciências Humanas e Sociais, particularmente em Linguística Aplicada. Esta área “implica um modelo híbrido de pesquisa e práxis” (PENNYCOOK, 2006, p. 67), isto é, “opera dentro de uma visão de construção de conhecimento que tente compreender a questão de pesquisa na perspectiva de várias áreas do conhecimento, com a finalidade de integrá-las” (MOITA LOPES, 2006, p. 98). As investigações em LA inserem-se no paradigma qualitativo de pesquisa. De acordo com Denzin e Lincoln, elas se estabelecem em contraste com uma visão positivista quantitativa e neutra (DENZIN & LINCOLN, 2006), contra o “cientismo” (RAJAGOPALAN, 2003), sendo de base interpretativista, “território movente” (FABRÍCIO, 2006), uma vez que está impregnada de fatores sociais, crenças e formas socialmente construídas de conceber o mundo, por parte dos respondentes e do próprio pesquisador.

O histórico da pesquisa de base qualitativa permite entender que esse tipo de pesquisa consolidou-se ao longo dos anos, tendo lhe sido atribuída validade científica, e sendo, sobretudo, marcada pela compreensão e transformação da realidade. Sua origem e desenvolvimento remonta um processo de rupturas e tensões teóricas, marcadas, sobretudo, por seu gradual distanciamento em relação ao monopólio de uma única teoria, metodologia e práxis de pesquisa (Chizzotti, 2006, p. 48). Sua história pode ser descrita por meio de cinco marcos que definem as transformações que influenciaram as práticas de investigação desse tipo de pesquisa. Conforme Chizzotti (2006, p. 48-56), os marcos são, resumidamente:

a) Primeiro marco (final do século XIX): associado ao romantismo e ao idealismo, reclamando uma metodologia independente e que compreendesse as ciências do mundo da vida. Caracterizado, também, pelos primeiros passos de recusa das disciplinas das ciências humanas em geral – sobretudo a história, antropologia, sociologia, psicologia social, economia –, em adotar rigorosamente os procedimentos metodológicos das ciências da natureza;

b) segundo marco (primeira metade do século XX): caracterizado pela consolidação de disciplinas como a história, antropologia, sociologia, educação como novos campos de investigação científica, sobretudo, em resposta ao desenvolvimento de uma metodologia das ciências histórico- sociais. Em particular, a antropologia ganha nova força em pesquisa

56 qualitativa com o trabalho de Malinowski, o qual foi importante para validar a pesquisa etnográfica nas ciências sociais e humanas. O pesquisador utilizou o método da etnografia para investigar a cultura de um grupo primitivo que vivia nas remotas regiões de Nova Guiné e das Ilhas Trobiand, na Melanésia. A etnografia ganhou, nesse momento, validade científica, com a consistência dos procedimentos de investigação e da descoberta de Malinowski, sendo, por muito tempo, a metodologia mais utilizada em pesquisa qualitativa;

c) terceiro marco (pós-II Guerra até os anos 70): fase marcada pela consolidação da pesquisa qualitativa como modelo de pesquisa. Apesar de reascender-se o debate qualitativo versus quantitativo, a pesquisa qualitativa, estritamente atrelada ao positivismo, ainda recorre ao formalismo rigoroso do estabelecimento de métodos científicos qualitativos;

d) quarto marco (década de 70 e 80): fase caracterizada não só pelos investimentos em pesquisa provenientes do setor público e privado, como também pelo questionamento feito por pós-positivistas a respeito do positivismo presente na pesquisa qualitativa. A fenomenologia, o marxismo, o positivismo, o construtivismo também procuram responder às questões encetadas pela crítica, ética, o estatuto da verdade, o feminismo, etc. Nesse marco, há uma “fusão transdisciplinar das ciências humanas e sociais” (CHIZZOTTI, 2006 p. 55); e

e) quinto marco (década de 90 em diante): período marcado pela globalização planetária do capitalismo e do neoliberalismo político; pela crítica que denuncia as desigualdades no mundo. Nesse período também assume-se que o pesquisador é influenciado pela realidade social em que está inserido.

Pode ser observado, ao longo do seu desenvolvimento, uma característica marcante: apesar de não furtar-se ao rigor e à objetividade, a pesquisa qualitativa tem se caracterizado, ao longo dos anos, fortemente pela fusão transdisciplinar e pelo pós-positivismo, que coloca em relevo a importância social da pesquisa como tendo papel transformador na sociedade por uma vida melhor.

57 O traçado histórico da pesquisa qualitativa também pode ser encontrado na obra de Denzin e Lincoln (1998, p. 13-22). Os autores fornecem a definição de pesquisa qualitativa a qual foi acolhida para este trabalho: a de que a pesquisa qualitativa tem foco multimetodológico, caracterizada por uma abordagem naturalista, isto é, por conduzir investigações in loco (DENZIN E LINCOLN, 1998, p. 3) e, por consequência, interpretativista. Devido a essas características, o pesquisador qualitativo é considerado um bricoleur7, metáfora utilizada para referir-

se à prática de ligar partes de um todo para fornecer soluções a um problema originado de uma situação concreta (DENZIN E LINCOLN, 1998, p. 3). Em outras palavras, o pesquisador conecta teorias, metodologias, visões de mundo para interpretar, compreender e solucionar problemas relacionados à vida real. A metáfora da bricolagem serve, também, para descrever o caráter multimetodológico da pesquisa qualitativa, uma vez que a triangulação de métodos, amplamente utilizada em pesquisa qualitativa serve às tentativas de se aprofundar a compreensão de um fenômeno sob diversos ângulos de visão (DENZIN e LINCOLN, 1998, p. 4).

3.1.2 Estudo de Caso

Os métodos de pesquisa mais comuns em pesquisa qualitativa é a Etnografia e o Estudo de Caso, conforme Stake (1998) e Chizzotti (2006). Esses métodos servem ao propósito de compreender dados complexos, contextuais e detalhados, sendo eficientes na condução de pesquisas de base qualitativa em Ciências Humanas e Sociais. De acordo com Dörnyei (2011, p. 154), o estudo de caso prova ser útil à pesquisa qualitativa, porquanto esse tipo de pesquisa é o único capaz de documentar e analisar influências situadas e contextuais na aquisição e uso da linguagem.

Conforme exposto na Introdução, o objetivo desta investigação é identificar as necessidades de aprendizagem dos alunos do curso de Inglês para Bombeiro de Aeronáutica do Curso de Formação de Sargentos Bombeiros de Aeronáutica na EEAR, bem como identificar as tarefas que demandam o uso de língua inglesa na situação-alvo.

58 Tendo em vista a natureza e os objetivos desta pesquisa, optei por empregar o estudo de caso como suporte metodológico, uma vez que esta metodologia permite investigar um contexto específico, como explica Stake (1998). Foram escolhidas para este trabalho as definições de estudo de caso formuladas por Stake (1998), Yin (2005) e Gil (2010).

Particularmente, o estudo de caso tem uma característica que o difere dos demais métodos: é uma escolha do objeto a ser estudado, conforme orienta Stake (1998, p. 86). Não é o interesse por determinado método de investigação que caracteriza o estudo de caso e sim o interesse em um caso específico, individual, um sistema com fronteiras bem definidas que possa ser investigado.

O estudo de caso, segundo Yin (2005), possibilita uma compreensão de fenômenos sociais complexos. Essa metodologia também permite agregar pontos de vistas diversos, que se tornam relevantes para o resultado da pesquisa.

A partir da definição acima fornecida, com base nos preceitos de Stake (1998) e Yin (2005), o caso pode ser simples ou complexo, mas obrigatoriamente específico e bem delineado. A partir do interesse que determinará a escolha do caso, pode-se classificar o estudo de caso em três tipos (STAKE, 1998, p. 87):

a) Estudo de caso intrínseco: visa a uma representação de traços particulares do caso e não a uma generalização ou elaboração de um construto teórico;

b) estudo de caso instrumental: interessado em estudar fenômenos a partir de um modelo teórico, com o intuito de corroborar o modelo preestabelecido. Nesse tipo, a escolha do caso é baseada em sua possibilidade de avançar a compreensão de uma teoria existente; e,

c) estudo de caso múltiplo ou coletivo: é um conjunto de estudos de caso instrumentais, com o propósito de alcançar uma melhor compreensão, e talvez uma melhor teorização, sobre diversos casos (STAKE, 1998, p. 89). Foi adotado neste trabalho o estudo de caso intrínseco. Os participantes deste estudo, quais sejam, alunos em formação (pré-serviço), inserem-se em um contexto específico da vida real: uma instituição de ensino militar que tem por missão formar sargentos especialistas em diversas áreas.

59 Visando a atribuir maior credibilidade ao estudo de caso, Gil (2010, p. 123- 124) propõe, entre outros cuidados, fazer triangulação, pois o procedimento de triangulação consiste em “confrontar a informação obtida por uma fonte com outras, com vistas a corroborar os resultados da pesquisa (2010, p. 124).

Para Stake (2010, p. 123), a triangulação é uma forma de diferenciação que torna o pesquisador atento às diferenças, permitindo enxergar múltiplos significados. A triangulação, de acordo com o autor, muitas vezes ajuda o pesquisador a reconhecer que uma situação é mais complexa do que inicialmente aparentava ser (STAKE, 2010, p. 125). O autor afirma que a triangulação é uma situação “ganha- ganha”. Se a verificação feita pela triangulação confirma que estou certo, então eu ganho. Se a verificação não confirma, significa que tenho algo a desvendar, o que também significa um ganho (STAKE, 2010, p. 124).

Com base nos preceitos de Long (2005), a triangulação dos dados obtidos de variadas fontes (e não de uma só, por exemplo, apenas do profissional em serviço) possibilita ao pesquisador identificar as diferenças e semelhanças entre os pontos de vista dos participantes e conciliá-los no sentido de fornecer um subsídio relevante para o desenho de um curso que atenda às necessidades levantadas.

Nesta pesquisa, os procedimentos de coleta e análise dos dados descritos mais adiante permitiram a triangulação: utilizei diversos instrumentos de coleta (questionários, entrevista semiestruturada) e consultei diversas fontes (alunos, bombeiros especialistas, documentos) para a obtenção dos dados de pesquisa, bem como articulei e comparei os dados entre si, buscando semelhanças e discrepâncias. Os resultados serão informados na Seção 4, Apresentação e Discussão dos Resultados.

A seguir, passo à descrição do contexto em que está inserida a presente pesquisa.