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Questões metodológicas da análise de necessidades

2.3 Análise de Necessidades

2.3.2 Questões metodológicas da análise de necessidades

Long (2005, p. 19) relata que, cada vez mais, os educadores de línguas confiam e se baseiam nos resultados da análise de necessidades para elaborar seus cursos. Em contrapartida, o autor afirma que a maioria dessas análises se apoiam em entrevistas semiestruturadas ou questionários, elaborados e aplicados por professores ou linguistas sem o devido conhecimento do campo a ser trabalhado. Além disso, os participantes da pesquisa muitas vezes são unicamente os alunos, que nem sempre têm consciência do que exatamente precisam saber para se comunicar na língua-alvo.

Desde Munby (1978), alguns autores se dedicam ao estudo da análise de necessidades como uma forma de aperfeiçoar a prática de obtenção e análise dos dados. Long (2005, p. 19) ressalta a importância dos resultados obtidos por essas investigações para o avanço na coleta de dados consistentes a respeito das

51 necessidades dos alunos, sobretudo ressaltando os fatores de malogro de uma análise de necessidades, dentre eles, a utilização dos alunos como fontes primárias, por vezes únicas, de análise.

O pesquisador afirma que nem sempre o aluno tem o conhecimento suficiente da sua real demanda de aprendizagem ou da necessidade de uso da língua na situação-alvo, cabendo ao professor, tal como um médico, assumir a responsabilidade pelo diagnóstico, assim como “selecionar um tratamento adequado” (LONG, 2005, p. 20).

Cunningsworth (1983, p. 149) também assinala a importância de se debruçar a uma análise da situação-alvo, isto é, da língua utilizada em situação real de uso, alertando contra a excessiva preocupação direcionada à língua utilizada em situação de aprendizagem. A unilateralidade de uma análise de necessidades que coloca em relevo unicamente a situação de aprendizagem, deixando de lado as questões relacionadas às necessidades da situação-alvo, pode ser, segundo o autor, devida ao fato de o analista ser geralmente o designer do curso, o professor da disciplina, o autor do material didático, que se envolve intensamente, não sem razão, muito mais com as questões que emergem da situação de aprendizagem.

De acordo com Cunningsworth (1983), deve-se dar igual atenção à situação- alvo, já que o objetivo final é a utilização da língua em situação real de uso, enquanto que a utilização da língua em situação de aprendizagem se constituirá no meio para se chegar a um fim.

Em contrapartida, Hutchinson e Waters (1987, p. 55) afirmam que as informações sobre a situação-alvo não são suficientes para o desenho de um curso voltado para as necessidades dos alunos. Os autores fornecem um exemplo a respeito, mencionando os alunos que precisam aprender a ler textos sobre Sistemas na situação-alvo. Embora alunos tenham motivação suficiente em seu trabalho ou estudo para ler os textos longos e entediantes sobre o assunto, isso não quer dizer que terão a motivação, em sala de aula, para aprender a partir desses textos. Seria mais apropriado procurar por textos mais leves e que promovam a motivação em aprender a língua e que dão base para a leitura dos textos da situação-alvo (HUTCHINSON E WATERS, 1987, p. 61).

Outra questão importante relacionada à análise de necessidades é o tipo e a qualidade dos dados coletados. Conforme Dudley-Evans e St. John (1998, p. 122), as informações obtidas de clientes e alunos somente serão boas se tanto as

52 perguntas feitas, quanto a análise das respostas forem igualmente boas. Para exemplificar esse princípio, os autores mencionam o caso de quem irá ensinar inglês para policiais. Imagine-se que um professor deva desenhar um curso para esse público específico e nada sabe sobre a profissão do policial. As perguntas que ele irá fazer no levantamento de necessidades poderão ser numerosas, tornando-se difíceis de serem classificadas em relevantes e triviais.

Assim, Dudley-Evans e St. John (1998, p. 123) aconselham o pesquisador ou professor a fazer um levantamento preliminar antes de abordar alunos e profissionais da área. Esse trabalho de base tem por princípio checar a literatura relevante na área, fazer contato com colegas da área de linguística ou professores que tenham experiência com grupos de profissionais da situação-alvo, procurar por materiais didáticos já produzidos na área, etc.

Dudley-Evans e St John (1998, p. 122) apontam os benefícios de se fazer esse tipo de levantamento preliminar: primeiro, ele permite que o pesquisador saiba exatamente o que perguntar, evitando realizar inquirições triviais. Segundo, o conhecimento prévio do maior número de informações possíveis sobre a área profissional ou disciplina acadêmica às quais se destinará o curso evitará perda de tempo de clientes e alunos. Terceiro: estar bem informado faz com que ao pesquisador seja atribuída maior credibilidade, consequentemente fazendo com que ele angarie um maior número informações relevantes. Por último, o conhecimento obtido com o levantamento prévio de informações também ajudará no modo como será realizada a coleta e análise dos dados. Seguindo as orientações de Dudley- Evans e St. John, realizei esse trabalho de base, o qual está descrito na Metodologia, especificamente no item 3.4, denominado Passos Iniciais.

Com relação à escolha das fontes de dados, Long (2005, p. 24) afirma que se devem utilizar várias fontes em análise de necessidades, dentre elas, a literatura disponível, alunos, professores e linguistas aplicados, especialistas do assunto (conteúdo da disciplina) e, em seguida, deve-se fazer a triangulação dessas fontes.

De acordo com Long (2005, p. 28), a triangulação de fontes é utilizada há muito tempo por estudiosos e pesquisadores para validar os dados obtidos nas análises e, consequentemente, aumentar a credibilidade das interpretações dos dados. Esse processo exige que o pesquisador compare dados de fontes diversas, podendo ser duas ou mais fontes, métodos ou teorias. Ainda para o autor, a triangulação dos dados pode envolver o uso de diversos instrumentos de coleta de

53 dados, tais como entrevistas, questionários, diários de observação, etc.

A esse exemplo, Jasso-Aguilar (2005, p. 30) realizou um levantamento de necessidades de inglês para camareiras de um hotel em Waikiki, recorrendo a fontes diversas (supervisora das camareiras, um membro do RH, supervisores do hotel) e utilizando múltiplos instrumentos de coleta, tais como shadowing, entrevistas não- estruturadas e questionários, fazendo uma triangulação de métodos e fontes. Na pesquisa em questão, a triangulação não só ajudou a pesquisadora a identificar as discrepâncias entre as fontes como também a explicá-las. Conforme Long (2005), a pesquisadora encontrou problemas, tais como: diferenças raciais entre os analisados; diferenças de pedidos por parte dos hóspedes com relação ao turno; dificuldades com a língua inglesa falada e escrita (JASSO-AGUILAR, 2005, p. 30). Dessa forma, o autor enfatiza que uma análise de necessidades adequada é um empreendimento que requer tempo e conhecimento na área, principalmente dos métodos de pesquisa adotados (LONG, 2005, p. 62).

Finalizando esta Seção, pode-se afirmar que Inglês para Fins Específicos estabeleceu-se, com o evoluir de suas práticas, não como um produto, isto é, como o ensino de uma linguagem específica, mas como uma abordagem de ensino e aprendizagem de língua guiada por necessidades de aprendizagem dos estudantes (DUDLEY-EVANS e ST. JOH, 1998, p. 19). De acordo com Hutchinson e Waters (1987, p. 19), todas as decisões relacionadas ao conteúdo e a metodologia nessa abordagem serão determinadas pela identificação das necessidades do aluno.

Ainda conforme Long (2005), utilizar a tarefa como unidade de análise apresenta diversas vantagens, permitindo ao pesquisador a identificação e precisão das necessidades da situação-alvo, bem como devem-se utilizar como fontes de dados não só alunos, bem como especialistas da área. Também devem-se utilizar diversos instrumentos de coletas de dados, estabelecendo assim a triangulação dos dados para a validação dos resultados.

Conforme colocado no início deste item, os instrumentos utilizados nesta pesquisa foram questionários e entrevistas semiestruturadas. Esses e outros aspectos metodológicos concernentes à pesquisa serão explanados detalhadamente na próxima seção.

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3 METODOLOGIA DA PESQUISA

Os que se encontram com a prática sem a ciência são como os timoneiros que entram no navio sem timão nem bússola, nunca tendo certeza do seu destino.

Leonardo Da Vinci

Nesta seção, abordo a pesquisa qualitativa de caráter interpretativista em Ciências Humanas, particularmente realizada em Linguística Aplicada, com base na definição fornecida pelos autores Denzin e Lincoln (1998) e Chizzotti (2006), fazendo, em seguida, o recorte para o estudo de caso qualitativo, metodologia de pesquisa adotada na presente investigação. Apresento, também, o contexto da pesquisa e a caracterização dos participantes, bem como descrevo os instrumentos e procedimentos de coleta e análise dos dados.