141mento central para a identificação e ação política do
10. Discurso e Prática em Intervenções Urbanas em Áreas Centrais Históricas As experiências de Salvador e Recife
10.1. Centro Histórico de Salvador Do Programa de Recuperação do Centro Histórico ao Plano de Reabilitação do Centro Antigo
10.1.5. Uma Nova Proposta? O Plano de Reabilitação e a Retomada da Sétima Etapa de Intervenção
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A área de abrangência vinculada à nova proposta foi ampliada em relação ao Programa an-
terior, correspondendo a 2,25% da área de Salvador e abrangendo 14 bairros. Segundo o Escritório de
Referência do Centro Antigo, a nova área, com sete Km2, definida como Centro Antigo, engloba o Centro Histórico, que representa 21% da população resi- dente do Centro Antigo, a Área de Proteção Rigo- rosa Municipal e a Área Contígua à de Proteção Ri- gorosa (Lei Municipal número 3.289/83) (Figura 08).
A partir desta redefinição da área alvo das
intervenções, novas diretrizes foram formuladas, uti-
lizando-se para este fim tanto as leis de Incentivos
Fiscais58 quanto as legislações do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU 2008), cujas prio- ridades estão voltadas à criação de um Plano Espe-
cífico para o Centro Antigo, “complementando ações
de preservação, recuperação e possibilidades de sustentação econômica”. As novas diretrizes de in-
tervenção, definidas para atender a esse conjunto de
mudanças proposto, foram divididas em cinco pon- tos principais. Estes dizem respeito à composição de um Plano Urbanístico, modernização do porto, ordenamento e controle do comércio informal, o for- talecimento da área como uma centralidade de valor simbólico, cultural, político e econômico e a reversão da tendência de esvaziamento através de medidas que priorizem os usos residenciais e atividades com- plementares e estímulo a novos empreendimentos multiresidenciais e de uso misto.
Estabelecidas as diretrizes, a implementa- ção do projeto passa a se estruturar a partir das “Es- tratégias de atuação para a Reabilitação”, conside- rando-se que o novo Plano de Reabilitação deve ser conduzido de forma “integrada e participativa”, com ações que apresentem resultado a curto, médio e longo prazo, de acordo com a urgência na busca por soluções para os problemas enfrentados na área.
Foram consideradas ações prioritárias a 58. Em relação aos incentivos fiscais, estão previstas as isenções de
IPTU e ISS para empreendimentos no CAS (Legislação Urbanística e Cultural, número 6.779/05), incentivos à instalação de empresas de tec-
nologia e financeira (Lei número 6.779/05) e a isenção de impostos para
o apoio a projetos culturais, incluindo a preservação do Patrimônio Ma- terial e Imaterial (Lei número 6.800/05).
Antigo:
Delimitação da área de abrangência
Fonte dos dados: Escritório de Referência do Centro Antigo
Centro
FIGURA 08
BRAGA, Centro Antigo de Salvador, 2013.
Área de abrangência: Plano de Reabilitação Área Contígua à de Proteção Rigorosa Municipal Centro Histórico Área de Proteção Rigorosa Municipal Setor 1 Setor 2 Área de estudo Baía de Todos os Santos
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curto prazo59 aquelas relacionadas à sistematização das propostas apresentadas pela sociedade civil, englobando, em tese, as considerações da popu- lação quanto às intervenções necessárias na área. Dentro destes aspectos, destacaram-se, em primei- ro lugar, as ações voltadas às áreas de cultura, lazer e educação; em segundo lugar, questões sociais e de segurança. O turismo aparece apenas em tercei- ro lugar nas preocupações da população local, ao lado de questões como limpeza e meio ambiente.
Estas novas diretrizes e formas de intervir agora adotadas têm no novo título do projeto de in- tervenção e no novo slogan associado à proposta, a intenção de se posicionarem de forma contrária às ações até então realizadas e duramente criticadas.
Busca-se, desta forma, uma afirmação e aceitação
da nova forma de atuação, antes mesmo que as ações sobre o território sejam concretizadas.
A partir do momento em que se passa a adotar a expressão Centro Antigo de Salvador, o novo plano busca contrapor-se ao anterior no que diz respeito à abrangência da área de atuação, ante- riormente restrita à parcela do centro histórico. Esta
alteração na definição da área de intervenção, que
agora se apresenta mais abrangente, nos remete à crítica quanto aos perímetros delimitados de atuação que as intervenções adotam, levando a processos de segregação e fragmentação do território. Ao pro- por-se Integrado e Participativo, indica levar em con- sideração as necessidades e desejos da população, desvinculando a nova imagem da prática anterior
59. As demais atuações, que demandam um maior tempo de elabora- ção, desenvolvimento e implantação, dizem respeito ao investimento pú- blico em habitação, Monumentos, manutenção e infra-estrutura.
de expulsão da população local. Quanto ao slogan,
que veicula a idéia de morar e trabalhar na área, a mescla de usos aponta para a integração da área à dinâmica urbana da cidade e ressalta os atributos culturais. Este último item está ainda atrelado à ha- bitação, antes negligenciada, e aos aspectos econô- micos, que não deixam de existir.
No entanto, as ações empreendidas por este novo plano são relativamente recentes e não podem ser tomadas como mudanças concretas e efetivas nos caminhos tomados, mas sim como in- dicações de novas perspectivas de atuação, que se
pretende implementar até 2014. O cuidado em ava- liar a nova postura adotada se dá pelo fato de, em muitos casos, as ações concretas realizadas não corresponderem às intenções pretendidas.
Podemos verificar esta incongruência entre
discurso e forma de atuação através da análise da maneira como vem sendo tratada a quatão da habi- tação no contexto da sétima etapa de intervenção, elemento que teve papel fundamental na transição do Programa de Recuperação ao Plano de Reabili- tação. As primeiras análises quanto à forma de tra- tamento da questão habitacional, ressaltada como aspecto principal desta “mudança de postura”, nos dão indicações das reais intenções do Plano, ainda que com uma nova roupagem.
Após a entrega do primeiro imóvel recupe- rado para habitação de interesse social aos morado- res remanescentes da área, em outubro de 2007, os resultados do desenvolvimento do projeto habitacio- nal, que abrange 76 edifícios, sendo 338 unidades habitacionais e 55 pontos comerciais, indicam dois
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aspectos que merecem destaque. O primeiro deles diz respeito à localização das habitações dentro da área da sétima etapa e o segundo refere-se à quali- dade das habitações construídas (Figura 09).
O projeto de recuperação das edificações
para reconversão em unidades habitacionais está apoiado em dois programas, o Programa de Habi- tação de Interesse Social (PHIS) e o Programa de Habitação para Servidores Estaduais (PROHABIT). O primeiro contempla 103 apartamentos e treze pon- tos comerciais, destinados aos antigos moradores, reunidos através da AMACH. O Segundo programa é direcionado aos servidores públicos estaduais, in- tenção já presente antes da reformulação do plano,
com 234 unidades habitacionais e 42 pontos comer- ciais.
Para a realização destes projetos, o Monu- menta participaria da restauração das fachadas e
recuperação dos telhados das edificações, sendo o
valor por ele aportado redirecionado ao Fundo Muni-
cipal de preservação, para o financiamento de ações
posteriores de conservação e restauro. O governo do estado, por sua vez, faria o pagamento das inde- nizações referentes aos imóveis privados e o Minis- tério das Cidades concederia um subsídio de 17,5 mil reais para cada família dos antigos moradores. Para as obras destinadas aos servidores públicos, o
Fundo de Previdência do Estado financiaria as habi-
tações (BONDUKI, 2010, p. 345).
A partir destas duas demandas habitacio- nais, e da forma como foram distribuídas no territó- rio, pode-se reconhecer o primeiro ponto de análise, a localização das unidades como elemento segrega-
dor da população no espaço urbano. Nesse sentido, Mourad (s.d.) observa que nas quadras mais próxi- mas aos monumentos e à Praça do Terreiro (19S e 20S), portanto mais valorizadas por apresentarem potencial turístico, foram selecionados catorze imó- veis para uso residencial. No entanto, nenhum deles faz parte do PHIS, ainda que muitos moradores ocu- passem esta área e apesar da premissa acordada de manutenção das famílias nos espaços por elas ocupados antes do início das obras.
Para reforçar esta separação entre as famí-
lias mais pobres e os servidores públicos, definindo
territórios e impedindo a alegada “mistura social”, aos primeiros foram destinados imóveis na área mais estigmatizada do perímetro de intervenção. Na quadra 31S, entre as ruas São Francisco e 28 de Setembro, estão onze dos 21 imóveis selecionados
para o PHIS, portanto 52% do total (MOURAD, s.d.).
Outro problema ressaltado por Mourad (s.d.) neste processo de seleção das áreas destina- das à habitação, além da segregação da população no território, diz respeito ao comprometimento das formas de vivência anteriormente estabelecidas:
A recuperação do patrimônio desarti- cula as relações sociais, quando não se preocupa em conservar a diversida- de cultural, onde o cotidiano de grupos e categorias sociais são reconhecidos como dignos. (MOURAD, s.d.)
Quanto ao segundo ponto, a qualidade das
habitações, cabem as análises realizadas por BON- DUKI (2010). Os elementos destacados pelo autor
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