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Primeiras Intervenções Os Modelos Iniciais e a Instauração do Conflito

141mento central para a identificação e ação política do

10. Discurso e Prática em Intervenções Urbanas em Áreas Centrais Históricas As experiências de Salvador e Recife

10.1. Centro Histórico de Salvador Do Programa de Recuperação do Centro Histórico ao Plano de Reabilitação do Centro Antigo

10.1.1. Primeiras Intervenções Os Modelos Iniciais e a Instauração do Conflito

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Centro Histórico da Bahia é: não a pre- servação de arquiteturas importantes, (como seria em Minas) mas a preser- vação da Alma Popular da Cidade. Em poucas palavras: o plano deve ser “sócio-econômico” para não repetir os erros de conhecidos interventos em ci- dades ilustres, como Roma, Bologna, Venezia, e inúmeros maravilhosos re- cantos do Velho Mundo que mudaram a base social de inteiras Regiões, com os moradores de anos e anos jogados longe e a média-classe-média, toman- do conta. Para evitar isso estamos procurando juntar o trabalho à habita- ção (é a... Idade Média ao contrário) e a um pequeno comércio: uma espécie de economia subterrânea. (FERRAZ, 1996, p. 270)

Dentro deste contexto, é importante ressal- tar a postura apresentada pela arquiteta Lina Bo Bar- di. Suas considerações colocam, para além da pre- servação do patrimônio construído, a conservação do que a arquiteta nomeia como “alma popular”, ou seja, a manutenção da população através de melho- rias no contexto sócio-econômico e do fortalecimen- to do uso habitacional.

Podemos observar nas colocações de Lina Bo Bardi uma postura que vai de encontro a elemen- tos aqui trabalhados. O primeiro deles diz respeito ao Patrimônio Imaterial, cujo reconhecimento da im- portância está presente na defesa da manutenção da população local como detentora da cultura que caracteriza o lugar. O segundo elemento, também vinculado à população, diz respeito à crítica à Gen-

trificação, ao alertar sobre as demandas sociais e

habitacionais desta mesma população.

Este primeiro grupo de intervenções já nos

permite identificar elementos fundamentais, nortea- dores principais das intervenções dirigidas ao Centro Histórico de Salvador e que serão repetidos nas in- tervenções seguintes. Neste momento já é possível

ressaltar o uso do Patrimônio Cultural como justifica- tiva (necessidade de preservação e restauro) e meio

de intervenção. Também verificamos o destaque

atribuído à atividade turística, foco das intervenções realizadas. O discurso, neste caso, está atrelado à temática do Turismo Cultural, veiculado como forma de promoção da cidade, meio de preservação do Pa- trimônio Cultural e atividade capaz de gerar incre- mento econômico para a cidade, viabilizando tanto

as ações de conservação e manutenção das edifica- ções existentes quanto novos investimentos.

Por fim, quanto à forma de intervir adota- da neste caso, já vemos delineada a estrutura que servirá de base para as intervenções posteriores e que vai de encontro às estratégias de intervenção já

identificadas. Quanto a este tema podemos identifi- car a delimitação de um perímetro restrito, cujo foco centrava-se no Pelourinho, portanto constituindo-se em intervenções pontuais, não considerando a tota- lidade do tecido urbano. No que se refere ao direcio- namento de usos, como apontado acima, vemos que o turismo já se apresentava neste momento como o uso prioritário, em detrimento das problemáticas sociais e econômicas ali presentes, evidenciando a falta de um projeto sócio-econômico mais abran- gente. Buscava-se atrair novo público, composto por consumidores e investidores e, ao mesmo tempo,

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marginalizada.

Sem solução, os conflitos decorrentes da

não inserção da população moradora local às novas propostas para a área, foram se agravando, tornan- do-se mais evidentes a partir de 1991. Ainda que já

houvesse a consciência da ineficiência de interven- ções dessa natureza, estes preceitos não foram con- siderados no momento de implantação das interven- ções a partir de 1991 e estas questões continuaram ao largo das discussões centrais, ainda que cons- tassem na base teórica do Programa. Esta proble- mática acabou sendo prejudicial à própria intenção de incremento turístico para a área, tema central do Programa de Recuperação, forçando a revisão do

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O interesse por ações efetivas de interven- ção na área foi retomado a partir de 1985, quando o Centro Histórico de Salvador foi reconhecido como Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Este reco- nhecimento colocou em evidência, neste momento, sobretudo a representatividade do Patrimônio Arqui- tetônico, ainda que o parecer apresentado conside- rasse, além do referencial construído, também o ca- ráter de “ponto de convergência” cultural (BRAGA, 2008, p. 66, 67), reconhecendo o valor do Patrimônio Imaterial para a constituição da Identidade Cultural local.

Com isso, a área, já marcada por um esta- do avançado de degradação física das edificações, com imóveis até mesmo em estado ruínas, voltou a chamar a atenção do poder público, fato aliado ainda ao reconhecimento do Pelourinho como um grande potencial turístico para a cidade do Salvador. Esta articulação entre o reconhecimento como Patrimô- nio da Humanidade e o viés turístico da intervenção proposta ressalta a relação já analisada entre Pa-

trimônio Cultural e Turismo, a princípio classificado

também como Cultural.

No ano de 1991, quando Antonio Carlos Magalhães, um político conservador, vinculado às antigas oligarquias locais, assumiu pela terceira vez o governo do estado, as intervenções no Centro His- tórico foram retomadas. Estabelecia-se, a partir de então, o Programa de Recuperação do Centro His-

tórico de Salvador, que tinha por objetivo, segundo

o discurso oficial, a revitalização e reestruturação ur- bana deste Centro Histórico.

Assim como nos projetos citados anterior- mente, a área de atuação, nesta proposta, perma- necia concentrada na recuperação do Pelourinho42, mantendo-se a visão setorizada e fragmentada desta parcela do território, tanto em relação à cidade como um todo quanto dentro do próprio Centro Histórico. As atividades turísticas e de lazer e diversão tam- bém permaneciam como foco principal deste plano, já indicando as problemáticas decorrentes da trans- formação da cultura local em objeto de consumo, di-

rigidas a um público usuário específico, mudando as

formas de apropriação do local. Estes temas, cerne das intervenções aplicadas a este centro histórico, nos remetem tanto aos marcos teóricos quanto às

formas de intervir identificadas. Estes, bem como sua

análise conjunta, serão retomados a seguir, quando da descrição das fases e formas de intervenção em cada uma delas.

Para que o projeto fosse possível, inicial- mente foram usados recursos do Tesouro Nacional

e, em um segundo momento, foram incluídos finan- 42. A escolha da área de intervenção também se justifi cou por serem A escolha da área de intervenção também se justificou por serem

quase todos os imóveis desta localidade de propriedade do Estado, possibilitando a intervenção sem maiores confrontos, segundo esclare- ce Carlota Gottschall (Mestre em Comunicação e Cultura e economista pela Universidade Federal da Bahia – UFBA, coordenadora de estudos da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia – SEI, pesquisadora do CULT / UFBA e professora universitária), em depoi-em depoi- mento concedido na cidade do Salvador, 30 jul. 2007.

10.1.2. A Consagração como Patrimônio da Humanidade. Uma Retomada do