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O desenvolvimento da Psicologia Social no Brasil

3.3 A Psicologia Social

3.3.1 O desenvolvimento da Psicologia Social no Brasil

Na América Latina, até a década de 70, predominava a versão americana de Psicologia Social, de matriz positivista, experimental, individualista e neutra, com foco sobre a mudança de atitudes, a harmonização e minimização de conflitos nas relações grupais. No Brasil, a supremacia dessa vertente também decorria da formação de muitos psicólogos brasileiros nos EUA e da proliferação de traduções bibliográficas de autores de referência dessa perspectiva (LANE, 1999; SAWAIA, 2009).

Nesse período, empreenderam-se críticas sobre a ineficiência dessa modalidade em responder às necessidades políticas e sociais da América Latina, um continente marcado pela intensa desigualdade social, com alguns países sendo assolados pela ditadura. Diante desse cenário, defendeu-se a necessidade de romper radicalmente com esse modelo e de reestruturar o campo da Psicologia Social.

Esse processo foi fortalecido no encontro da SIP (Sociedade Interamericana de Psicologia), em 1979, que fomentou o debate sobre a urgência da definição de novos rumos para Psicologia Social latino-americana e aprovou a criação das associações nacionais de Psicologia Social que poderiam substituir a ALAPSO. Silvia Lane, Martin Baró e Paulo Freire foram referências

importantes desse movimento, também impulsionado pela fundação da Associação Brasileira de Psicologia Social – ABRAPSO, em 1980, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

De acordo com Guzzo e Lacerda Júnior (2011), Martín Baró, baseado nas concepções da filosofia marxista, defendia uma reestruturação da Psicologia em termos de concepção de mundo, objetivos e categorias de análise que rompessem com o prisma individualista e a-histórico, abrangendo uma perspectiva mais dialética, compreendendo a organização social a partir da luta de classes, da historicidade do objeto da Psicologia, de seu caráter político e da necessidade de tomar a realidade como ponto de partida para qualquer análise psicossocial.

Enquanto Silvia Lane, também influenciada por Vigotski, propôs uma Psicologia Social crítica que compreendia o homem como um sujeito histórico, definido pela macroestrutura, pela mediação da vida cotidiana e pela forma particular como ele assimila a realidade social. Desse modo, não concebe o sujeito como produto das determinações sociológicas ou psicológicas, mas constituído na intersecção dialética entre a sua história e a história de sua sociedade, portanto, produto e agente das condições sociais, rompendo com a dicotomia entre indivíduo e sociedade (LANE, 1999; PAULINO-PEREIRA, 2012).

A autora também considera que, para intervir nas condições sociais reprodutoras da desigualdade, é necessário compreender que a dinâmica das relações grupais é mediada por estruturas como: a linguagem, o pensamento/consciência, a atividade, as instituições, ideologia, a atribuição de papéis sociais, as representações sociais; elementos que, assim como a sociedade, estão em constante mudança, não são prontos, estáticos ou acabados (LANE, 1999).

Como método de intervenção social, defende que o compartilhamento de experiências sócio- históricas comuns produz a identificação entre os sujeitos e a conscientização sobre as condições ideológicas e opressoras; isso pode favorecer o engajamento em uma ação em prol de mudanças e melhorias para o grupo.

Desse modo, sinaliza que o trabalho empreendido pelo pesquisador social não é neutro, pois está implicado em uma visão de mundo e de homem e tanto pode favorecer a manutenção quanto a transformação das relações sociais. Portanto, denomina “práxis”, a intervenção social crítica e politicamente comprometida, que reconhece a transformação mútua, produzida na interação pesquisado- pesquisador, sujeitos e agentes histórico-culturais.

Assim, na América Latina, foi delineada uma Psicologia Social Crítica ou Psicologia Social Histórico-Crítica, expressão que abarca diferentes perspectivas teóricas, tais como: o socioconstrucionismo, a Psicologia institucional, a análise do discurso, a teoria crítica, a Psicologia marxista, dentre outras, que convergem e divergem entre si (ALMEIDA, 2012; FERREIRA, 2011).

No Brasil, Ângela Arruda e Celso Sá foram referências nas pesquisas fundamentadas na teoria das Representações Sociais; Georges Lapassade, Gregório Barenblit e Oswaldo Saidón, da Análise Institucional e Silvia Lane esteve à frente da Psicologia Sócio-Histórica.

De modo sucinto, pode-se dizer que a análise institucional baseia-se nos conceitos de Foucault, Deleuze, Guatarri, dentre outros autores, visando compreender o funcionamento das relações de poder estabelecidas pelas instituições na mediação das interações humanas. Enquanto, as pesquisas fundamentadas na teoria das representações sociais, voltam-se para o estudo da ideologia, da identidade de sujeitos e de grupos, do cotidiano, assim como outros temas. Ao passo que, a teoria sócio-histórica orienta-se pela epistemologia do materialismo histórico e pelo método de investigação dialético e aposta na transformação social e no trabalho comunitário.

No entanto, esses modos de fazer Psicologia Social têm em comum a utilização da análise de grupos para a compreensão da dinâmica das relações sociais, o comprometimento político com a realidade social e a crítica ao positivismo, a não-historicidade e a neutralidade do investigador, contrapondo-se ao modelo totalizante dos EUA. Por isso, constituem-se na vertente sociológica da Psicologia Social (ANTUNES, 2012).

Desse modo, pode-se dizer que, atualmente, a Psicologia Ssocial constitui-se em uma disciplina plural que convive com várias tendências, a partir da utilização de diferentes matrizes teóricas e que situa-se na interface entre a Psicologia e outras áreas das ciências humanas, como a Sociologia, a Psicanálise, a Antropologia, a História e a Linguística. Além disso, que seu objetivo é compreender o comportamento humano a partir da interação mútua entre o contexto intraindividual e o social e seu campo específico de intervenção, reflexão e discussão consiste nos processos grupais (PAULINO-PEREIRA, 2012; FERREIRA, 2011)