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1.3 Arte e Educação

1.3.1 O ensino de artes na Educação Infantil

O direito à educação para crianças de zero aos seis anos e a afirmação do binômio “educar e cuidar” como funções indissociáveis nesse atendimento foram, pela primeira vez, incorporados à legislação brasileira na Constituição de 1988. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96 confirma a função educativa desse atendimento e regulamenta seu funcionamento. Essa mesma Lei anuncia, também, que o Brasil não terá mais currículo nacional para nenhum nível de ensino e sim uma base comum nacional, sob a forma de áreas de conhecimento.

Em 1998, foi publicado o RCNEI – Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – esse documento constitui um conjunto de orientações pedagógicas oficiais para o desenvolvimento de práticas educativas na Educação Infantil. Trata-se de uma proposta aberta, flexível e não obrigatória, pautada em dois eixos: (1) formação pessoal e social e (2) conhecimento de mundo.

Os objetivos gerais enumerados na proposta governamental são: fortalecer e elevar a auto-estima da criança, ampliar as relações sociais do sujeito, garantir o

espaço e o lugar da brincadeira, usar diferentes linguagens – corporal, musical, plástica, oral e escrita – para a comunicação, propiciar a interação significativa de conhecimentos mais amplos da realidade humana.

O documento esclarece que o faz-de-conta constitui excelente oportunidade de interação para as crianças e que essa modalidade de atuação lúdica deve ter lugar assegurado na rotina pedagógica das creches e pré-escolas ao longo de toda a Educação Infantil. Entretanto, Japiassu ressalta que:

Embora a proposta do MEC relacione o desenvolvimento da capacidade estética como um dos objetivos da educação infantil, apenas a música e as artes visuais são as linguagens artísticas explicitamente recomendadas para os conteúdos a serem pedagogicamente trabalhados com crianças de zero a seis anos (JAPIASSU, 2007, p. 17).

Não cabe a esta pesquisa fazer uma análise do RCNEI, mas explicitar algumas diretrizes existentes para o trabalho com artes na Educação Infantil, ainda que sejam obrigatórias ou não, ou que tratem de conteúdos que estejam em desacordo com as visões dos profissionais de determinadas áreas.

Na entrevista que realizei com Sônia Cristina Lima Fernandes, diretora da Educação Infantil do município de Florianópolis13, por exemplo, Sônia afirma que o RCNEI foi criticado por profissionais da área e que existem pareceres contrários aos referenciais neles contidos. Sônia14 fala que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil são obrigatórias e guiam as diretrizes curriculares do município de Florianópolis (as quais serão apresentadas posteriormente), mas que o RCNEI não possui o mesmo caráter de obrigatoriedade.

Em 1999, o Conselho Nacional de Educação (CNE) definiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, (CEB 1/99)15, que orientam a organização das instituições que se dedicam ao atendimento de crianças da faixa etária do zero aos seis anos. Essas Diretrizes, de caráter mandatório, estabelecem novas exigências para asinstituições de Educação Infantil, particularmente quanto

13 Entrevista já citada anteriormente. Alguns conteúdos dessa entrevista serão abordados ao longo do texto.

14Sempre que tratar das falas das entrevistadas, utilizarei o primeiro nome, para diferenciá-las dos autores levantados na pesquisa, dos quais utilizo o sobrenome.

às orientações curriculares e processos de elaboração de seus projetos pedagógicos.

Elas estabelecem, entre outros, osprincípios éticos, políticos e estéticos que devem fundamentar as propostas pedagógicas na Educação Infantil, a adoção da metodologia do planejamento participativo, por exemplo, eafirmam a autonomia das escolas na definição da abordagem curricular a ser adotada.

Desta forma, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, ao contemplarem o trabalho nas creches para as crianças de zero aos três anos e nas chamadas pré-escolas ou centros e classes de Educação Infantil para as de quatro aos seis anos, além de nortearem as propostas curriculares e os projetos pedagógicos, estabeleceram paradigmas para a própria concepção destes programas de cuidado e educação.

Os princípios norteadores, propostos pelas Diretrizes Curriculares citadas, melhor detalhados, são os seguintes:

1 – Princípios Éticos da Autonomia, da Responsabilidade, da Solidariedade e do Respeito ao Bem Comum; 2 – Princípios Políticos dos Direitos e Deveres de Cidadania, do Exercício da Criticidade e do Respeito à Ordem Democrática; 3 – Princípios Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade, da Qualidade e da Diversidade de manifestações Artísticas e Culturais (BRASIL, 1999, p. 01).

Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, como se pode perceber, há um olhar voltado para o caráter estético e sensível, para o desenvolvimento e exploração da criatividade da criança, sem, no entanto, exigir a presença de uma determinada área artística. Isso também não ocorre ao longo da redação da proposta da lei. Não é feito menção a nenhuma área artística em particular, ainda que os aspectos lúdico e sensível sejam sempre exaltados pela Conselheira Regina Alcântara de Assis – relatora da proposta de lei. Tal afirmação pode ser observada nas citações a seguir, retiradas de tal proposta:

Os programas a serem desenvolvidos em centros de Educação Infantil, ao respeitarem o caráter lúdico, prazeroso das atividades e o amplo atendimento às necessidades de ações planejadas, ora espontâneas, ora dirigidas, ainda assim devem expressar uma intencionalidade e, portanto, uma responsabilidade correspondente [...] (ASSIS, 1998, p. 06).

É possível verificar que, ainda que o caráter lúdico seja ressaltado como importante e necessário, a lei orienta que a ação pedagógica tenha uma intencionalidade, que o professor tenha consciência das ações propostas e da responsabilidade a elas vinculada. Não cabe, portanto, uma atividade livre, de pintar livremente, por exemplo, de brincar à vontade, se esta proposta não tiver uma intencionalidade clara.

Este é, pois, o grande desafio que se coloca para a Educação Infantil: que ela constitua um espaço e um tempo em que, de 0 a 3 anos haja uma articulação de políticas sociais, que lideradas pela educação, integrem desenvolvimento com vida individual, social e cultural, num ambiente onde as formas de expressão, dentre elas a linguagem verbal e corporal ocupem lugar privilegiado, num contexto de jogos e brincadeiras, onde as famílias e as equipes das creches convivam intensa e construtivamente, cuidando e educando. E que, para as crianças dos 4 aos 6 anos, haja uma progressiva e prazerosa articulação das atividades de comunicação e ludicidade, com o ambiente escolarizado, no qual desenvolvimento, socialização e constituição de identidades singulares, afirmativas, protagonistas das próprias ações, possam relacionar-se, gradualmente, com ambientes distintos dos da família, na transição para a Educação Fundamental (ASSIS, 1998, p. 07).

Ao exaltar a linguagem corporal como forma de expressão da criança, o texto da lei me remete aos trabalhos de expressão corporal que desenvolvi junto aos professores de Educação Infantil do município de Florianópolis nos anos de 2008 e 2009. As dificuldades encontradas por esses professores em se expressarem através do movimento, da mímica, do gesto, os bloqueios para tocar o corpo do outro, para deixar-se conduzir por uma música. Penso, cada vez mais, na real necessidade de uma formação constante que propicie a esse professor vivências corporais, que possam pôr seus corpos em movimento para que, aos poucos, possam se aventurar na condução de suas crianças em processos semelhantes.

A ênfase que a lei coloca em relação aos processos de socialização e articulação entre ambiente familiar e ambiente escolar, leva-me a reafirmar as ideias ressaltadas ao longo deste texto, do papel do professor em ampliar o capital cultural da criança, de compreender o espaço criativo e incentivar a construção do espaço potencial para o desenvolvimento sensível da criança. O teatro é uma ferramenta capaz de construir esses vínculos entre a criança e a família, a criança e o outro, a criança e o professor, a criança e a cultura, a criança e o conhecimento.

Desta forma, ser, sentir, brincar, expressar-se, relacionar-se, mover- se, organizar-se, cuidar-se, agir e responsabilizar-se são partes do todo de cada indivíduo, menino ou menina, que desde bebês vão, gradual e articuladamente, aperfeiçoando estes processos nos contatos consigo próprios, com as pessoas, coisas e o ambiente em geral (ASSIS, 1998, p. 11).

Trago essa citação da lei para reafirmar o argumento de que a escola e o professor precisam dispor de um ambiente propício ao desenvolvimento da sensibilidade e atentar-se para a responsabilidade da formação social e cultural da criança. Observar quais aspectos naturais da ludicidade e criatividade são exaltados pela criança em suas atividades e conduzir tais práticas à experiências conscientes de apropriação das linguagens artísticas, de forma gradual e sem “castrações” advindas de conceitos ultrapassados do fazer artístico, baseados em juízos de certo e errado, bonito e feio.

No município de Florianópolis, a Educação Infantil foi implantada no ano de 1976 e, segundo Sônia, nasceu baseada em uma visão assistencialista, cujo foco principal era suprir as carências das crianças. Por conta disso, a diretora de Educação Infantil do município retrata que ainda não existe uma identidade definida no trabalho desenvolvido, mas que está se delineando aos poucos.

Uma das iniciativas de criação de uma identidade para a Educação Infantil do município, realizada no ano de 2010, foi o lançamento das “Diretrizes Educacionais Pedagogias para a Educação Infantil”, em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, com o Plano Nacional de Educação e da Organização, Financiamento e Manutenção do Sistema Municipal de Ensino de Florianópolis, bem como com o Plano Municipal de Educação.

Esse documento, em forma de livro digital, busca estabelecer diretrizes para o sistema educacional no que se refere à organização e funcionamento das instituições de Educação Infantil. Tais Diretrizes foram elaboradas pela professora Eloísa Acires Candal Rocha, com o objetivo de ampliar, esclarecer e atualizar as bases teóricas já definidas, especialmente, a função social da Educação Infantil, os núcleos de ação pedagógica e as implicações desses aspectos na definição do caráter da docência, ou seja, do papel dos professores.

As Diretrizes foram apresentadas aos professores conferencistas, como um texto referência, para que os mesmos proferissem conferências a partir dos indicativos apresentados em tais Diretrizes. As conferências, realizadas por

professores convidados, foram apresentadas a todos os professores e auxiliares de ensino da rede de Educação Infantil do município e publicados em forma de artigos no documento oficial. Deste modo, o documento está organizado em duas partes. Na parte um são apresentados os textos elaborados pelos professores conferencistas e na parte dois, algumas experiências praticadas nas unidades educativas da rede.

Embasada nas Diretrizes Nacionais já citadas, a professora Eloísa Rocha ressalta o seguinte acerca das premissas das Diretrizes Municipais:

[...] reafirmamos o reconhecimento da especificidade da educação infantil como primeira etapa da educação básica, cuja função sustenta-se no respeito aos direitos fundamentais das crianças e na garantia de uma formação integral orientada para as diferentes dimensões humanas (linguística, intelectual, expressiva, emocional, corporal, social e cultural), realizando-se através de uma ação intencional orientada de forma a contemplar cada uma destas dimensões como núcleos de ação pedagógica (ROCHA, 2010, p. 12).

Os núcleos de ação pedagógica expostos no texto são os seguintes: *Linguagem: gestual-corporal, oral, sonoro-musical, plástica e escrita:

A diversificação das linguagens objetiva: 1. a expressão e as manifestações das culturas infantis em relação com o universo cultural que lhe envolve; 2. o domínio de signos, símbolos e materiais; 3. a apreciação e a experiência literária e estética com a música (na escuta e produção de sons, ritmos e melodias); com as artes plásticas e visuais (na observação, exploração e criação, no desenho, na escultura, na pintura, e outras formas visuais como a fotografia, o cinema, etc.); 4. com a linguagem escrita, no sentido de uma gradual apropriação desta representação (no momento, com ênfase na compreensão de sua função social e suas estruturas convencionais em situações reais) em que se privilegie a narrativa, as histórias, a conversação, apoiadas na diversificação do acesso a um repertório literário e poético (ROCHA, 2010, p. 14).

*Relações sociais e culturais: contexto espacial e temporal; identidade e origens culturais e sociais:

Seu objetivo se pauta na identidade pessoal-cultural, no reconhecimento das diferentes formas de organização social, no respeito à diversidade, nas manifestações culturais e normas de funcionamento grupal e social, na ética da solidariedade e tolerância através de experiências de partilha em espaços de vida social,

relacionando as formas conhecidas com as diferentes das suas, as do presente com as do passado, as próximas com as distantes, etc. (ROCHA, 2010, p. 14).

*Natureza: manifestações, dimensões, elementos, fenômenos físicos e naturais:

A ação pedagógica aqui se baseia na exploração, na descoberta, nas primeiras aproximações com as explicações científicas pautadas na manipulação, na observação, no uso de registros básicos de medidas e mensurações, nas pesquisas de campo, comparações em situações de brincadeira, construções com diferentes materiais e com os elementos da natureza, controle do ritmo temporal e relações matemáticas (ROCHA, 2010, p. 15).

Constatei, ao analisar a descrição dos núcleos de ação pedagógica, a forte presença das manifestações artísticas e o incentivo ao desenvolvimento cultural e sensível das crianças. O questionamento que me faço diz respeito à formação inicial do professor de Educação Infantil, se esta consegue abarcar os conteúdos e metodologias específicas para o desenvolvimento de atividades dentro do universo artístico. Uma vez que a própria professora Eloísa Rocha, ressalta que “[...] amplia- se a função docente e as exigências formativas, quando a ação pedagógica extrapola uma perspectiva simplesmente reprodutora e transmissiva” (ROCHA, 2010, p. 16). Há de se ampliar também a formação continuada desse professor para que ele possa, cada vez mais, compreender as especificidades de cada área e promover, de forma consciente, o contato dessas crianças com as artes.

A autora das Diretrizes Municipais cita Josefina L. Hurtado ao ressaltar que:

[...] É mais importante que as crianças se interessem em ler, ao gosto de escutar um conto, a satisfação por comunicar-se com os demais, que aprender já alguns fonemas ou grafemas que correspondem à aprendizagem da leitura no primeiro grau. Como se pode ver, se trata de trabalhar aspectos do desenvolvimento e da formação da criança, mais que do que deter-se aos conhecimentos (HURTADO apud ROCHA, 2010, p. 17).

[...] utilizando ao máximo o enriquecimento da experiência comunicativa da criança com os adultos e coetâneos e a realização de atividades, que além de dar-lhes prazer, constituam para seu desenvolvimento e enriquecimento intelectual, como são o jogo, a construção, o desenho, as atividades plásticas e criativas em geral (ROCHA, 2010, p.18).

No tocante as artes, de forma específica, as Diretrizes Municipais apresentam dois textos: “Educação infantil, arte e criação: ensaios para transver o mundo”, da professora Luciana Esmeralda Ostteto. Pensar na presença da arte como um componente do projeto educacional-pedagógico na Educação Infantil, bem como da educação estética, das múltiplas linguagens e criação é o que trata o texto. Ostetto retoma algumas concepções e práticas relacionadas ao desenho, ao espaço da sala enquanto um ambiente que contribua para a construção cultural do olhar e da sensibilidade, e, trata do papel do professor como pessoa-chave para mediar os caminhos da criança no mundo simbólico da cultura.

Segundo Ostetto:

Nós, professores, caminhamos amparados por certezas pedagógicas, um porto seguro das regras e modos de fazer, e então temos medo do desconhecido, do que não podemos controlar, do campo do afeto e da sensibilidade. De modo geral, essa é uma característica da contemporaneidade que, cindida, separa emoção e pensamento, lazer e trabalho, arte e vida, empurrando-nos só para um lado da existência: a racionalidade e a ciência – ao que é comprovado. Neste contexto, é evidente a dificuldade da Pedagogia em lidar com a arte, com a poética da vida, dar espaço para a imaginação, autorizar-se a criar, experimentar, errar. Em nossa história da educação temos sido prescritivos, normativos (OSTETTO, 2010, p. 55).

Ainda que a autora traga uma visão bastante pautada nas artes visuais, sua contribuição enquanto incentivadora da criação de um ambiente propício ao desenvolvimento de habilidades artísticas, do gosto estético, da fuga de temáticas puramente comerciais, traz uma excelente contribuição para o professor perceber-se enquanto formador de um ser que necessita conectar-se com sua sensibilidade. Outro ponto que a autora chama atenção em seu texto é nas “maneiras de” se fazer algo, nos discursos e práticas estratificados, que não dialogam com o novo, com a criatividade, bem como com as novas concepções filosóficas e educacionais. E traz

ainda a dificuldade dos pedagogos em transitarem pelo universo artístico, dialogando, pois, com o exposto ao longo dessa dissertação.

O segundo texto relacionado ao universo artístico apresentado nas Diretrizes é do professor Maurício Roberto da Silva, “Corpo em Movimento na Educação Infantil: a cultura corporal e os conteúdos/linguagens”, constitui-se no desafio de pensar o corpo em movimento das crianças nos ambientes das unidades educativas de Educação Infantil, considerando as categorias dialéticas implícitas no “movimento” do “corpo produtivo” e do “corpo brincante”. O texto possui uma visão um pouco centrada em questões sociológicas relativas ao corpo e um olhar que parte da área da educação física, na qual o professor atua.

Neste ponto, cabe uma ressalva quanto a um espaço que carece de apropriação pelos profissionais das artes. Vejo as questões relativas ao corpo dentro da educação ainda sob o domínio da educação física. É necessário ampliar os olhares sobre o corpo e colocar profissionais da dança, da expressão corporal, do teatro e da educação física a dialogarem sobre esse espaço. É necessária uma preocupação maior por conta das licenciaturas em artes de explorarem esse campo, não desmerecendo os trabalhos dos profissionais da educação física, mas delimitando esse espaço como interdisciplinar, pois acredito que temos profissionais gabaritados no nosso meio que possam ampliar as discussões acerca do corpo na educação.

Alguns aspectos me chamam a atenção no texto do professor Maurício por dialogarem com o conteúdo explícito nesta pesquisa:

[...] no corpo das crianças, nas creches ou fora dela, no âmbito das diferentes classes sociais, de algum modo, estão reverberados a „cosmologia‟, os valores, as marcas, as práticas sociais, enfim, o

ethos da sociedade na qual vivemos (SILVA, 2010, p. 80).

Ou seja, ele retrata a existência de hábitos corporais incorporados de maneira inconsciente, seja na maneira como nos portamos enquanto professores, seja no modo como a criança se vê (e consequentemente vê o seu corpo) no ambiente no qual está inserida, essa visão influenciará sua vida e a maneira de portar-se corporalmente. Seja pela falta de afetividade, ou influenciada pelos discursos e ações que a colocam, e também a sua família, em uma posição de “inferioridade

social”, fator que poderá influenciar também em sua postura corporal, na maneira de se relacionar com os outros e com os diferentes ambientes.

Silva cita Henri Wallon (1879 – 1972) ao afirmar que:

[...] há uma intrínseca relação entre o corpo-sujeito-criança, o jogo, a imaginação e a “motricidade expressiva”. Na perspectiva das “dimensões do movimento” walloniana, o ato motor, o mundo físico ou “motricidade de realização” e o mundo do movimento têm um papel fundamental na afetividade e também na cognição (SILVA, 2010, p. 82).

Os responsáveis pela ação pedagógica necessitam conhecer as crianças, observá-las e analisar suas manifestações para compreenderem o que elas já possuem de conhecimento, suas possibilidades reais e suas necessidades, aspirações e as novas exigências sociais que se colocam para elas. Portanto, a definição dos projetos educacionais / pedagógicos exige tomar as crianças como fonte permanente e privilegiada na orientação de ações educativas.

Para finalizar este tópico da pesquisa, gostaria de citar Ostetto que traz uma definição precisa de como se encontra o lado sensível de muitos professores, para os quais as Diretrizes colocam as responsabilidades de explorarem a criatividade, a expressividade, a ludicidade etc. das crianças.

No meio de toda essa história estamos nós, professores, que também fomos interditados na nossa ação de sonhar, de jogar e inventar mundos. Também fomos reprimidos em nossas linguagens e possibilidades expressivas. E então, o que acontece? Não raro, temos dificuldade em respeitar e valorizar o jogo das crianças, seus modos de criar e inventar modas, seus jeitos de dizer e representar o real. Resulta que, se não recuperarmos nossa dimensão inventiva e descobridora, dificilmente poderemos oferecer instrumentos que nutram e ampliem a sensibilidade, cognição e afeto, no jogo metafórico que engendra os universos infantis. Para seguirmos