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3. As Atribuições das Entidades Reguladoras e o Princípio da

3.2 O Executivo e o Poder Regulamentar: atividade normativa

3.2 O Executivo e o Poder Regulamentar: atividade normativa 3.2 O Executivo e o Poder Regulamentar: atividade normativa 3.2 O Executivo e o Poder Regulamentar: atividade normativa 3.2 O Executivo e o Poder Regulamentar: atividade normativa secundária

secundáriasecundária secundáriasecundária

A atuação do poder Executivo no processo legislativo pode ocorrer em momentos diversos: no processo de elaboração de lei ou na produção de ato normativo, dotado ou não de força de lei.

No procedimento de elaboração de lei, o Executivo se faz presente pela iniciativa exclusiva, prevista no artigo 61, § 1º, II, a-f da Constituição Federal53, pela sanção ou veto, e, pela promulgação e publicação de leis.

Na produção de ato normativo, pode atuar como legislador primário, inovando na ordem jurídica por meio das medidas provisórias54 ou editar atos normativos destituídos de força de lei, ao realizar o exercício do poder regulamentar do chefe do Poder Executivo Federal, conferindo eficácia às leis que não tragam em seu conteúdo as características que permitam sua auto-aplicação. A análise, neste tópico, se restringirá a atividade normativa secundária, por meio dos decretos regulamentares.

Historicamente, procurou-se legitimar a atuação do Executivo, como agente legislativo, por meio da adoção do princípio monárquico,55 em que se afirmava que as matérias não afetas à competência do Parlamento ou a outros órgãos, seriam atribuídas ao monarca, que manteria consigo um poder normativo residual, limitado, exclusivamente, por constituições nacionais.

Conjugando-se o contexto histórico narrado ao postulado de soberania da lei, como expressão da vontade geral, desenvolveu-se a prática de que somente a lei votada e aprovada pelos representantes, poderia alterar preceitos referentes à liberdade dos cidadãos e suas relações entre si e com o poder público. Ao monarca, caberia dispor sobre as matérias que não fossem reservadas ao domínio legal, de modo que a atuação do Executivo somente seria legítima se adstrita às limitações legais.

Dessa forma, ao lado do princípio do monarca, instrumentalizado pela produção de regulamentos aplicados, precipuamente, às funções administrativas, desenvolveu-se o princípio democrático em que a lei, expressão máxima do Legislativo, representaria a vontade geral.

Os regulamentos56 representam a competência normativa atribuída, privativamente, ao Presidente da República, conforme dispõe o art. 84, IV da Constituição57 e possuem caráter de generalidade e abstração, vez que não se restringem a um caso específico e tampouco se aplicam a destinatários certos.

Constituem atos administrativos normativos de segunda grandeza, por guardarem seu fundamento de validade nos atos normativos primários, aqui, genericamente, entendidos como a lei. Como atos infralegais, e, em observância ao princípio da legalidade, previsto no artigo 5º, II da Constituição da República, não podem

53 “Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou

Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. § 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI; f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva”.

54É instituto recente, criado em substituição aos decretos-leis, que eram atos normativos

produzidos pelo Poder Executivo, dotados do mesmo status jurídico de uma lei aprovada pelo Legislativo, com o diferencial de não depender da aprovação do parlamento.

55Sobre o tema conferir panorama histórico fornecido Leomar B. A. de SOUSA. A Produção.

.... Op. cit., pp. 130-132 e Clèmerson M. CLÈVE. Atividade Legislativa... Op. cit., pp. 272- 276.

56Os regulamentos assumem, genericamente, uma natureza de ato administrativo normativo

(geral e abstrato) expedidos por órgãos da Administração pública. Devem guardar relação de conformidade com o instrumento normativo do qual derivam, sob pena de ilegalidade. Em contraposição, conferindo-lhes uma interpretação restrita, será ato normativo editado pelo chefe do Poder Executivo.

exceder os limites definidos no instrumento legal que reclama sua atuação. Procuram, dessa forma, dar execução às leis, não podendo ampliar ou restringir direitos.

Portanto, a Constituição de 1988 amarra ao princípio da legalidade o reconhecimento, exclusivo, do regulamento de execução de modo que a ordem jurídica tutela-os, apenas, se habilitados por lei. Eventual atuação excessiva no exercício do poder regulamentar suscitará controle do Congresso Nacional, por força do art. 49, V da Carta Política.58

Nesse contexto, a produção normativa dos regulamentos implica observância de limitações formais e materiais. A limitação formal encontra-se, de um lado, vinculada à competência, pois o exercício regulamentar é atribuição privativa e indelegável do Chefe do Executivo federal, estadual e municipal59 e, de outro, ao instrumento de formalização do ato, o decreto, que se publicado produz efeitos em relação a terceiros.

No tocante às limitações materiais, recordamos que não há previsão constitucional ou legal de matéria reservada ao regulamento60. Encontra-se subordinado à ordem jurídica nos exatos termos a que se acha subordinada a lei habilitadora.61 Sobre o tipo de lei que estaria ao alcance do exercício do poder regulamentar, tem-se admitido somente aquelas que sofrem aplicação pelo próprio poder Executivo, afastando as que disciplinam relações entre particulares.

Note-se, ainda, que a natureza jurídica do regulamento executivo se difere, sobremaneira, dos atos normativos administrativos.

57 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: IV - sancionar, promulgar e

fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução.

58 Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (...) V - sustar os atos normativos

do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa.

59 Desde que por outorga da Constituição Estadual ou Lei Orgânica. Tratando-se o Brasil, de

uma federação, somente o chefe do Executivo federal estaria apto a regulamentar as leis de competência da União, sendo-lhe defeso regulamentar lei estadual ou municipal.

60 Observe-se que em alguns países, como a França, a própria Constituição disciplina os

conteúdos de lei e do regulamento.

Enquanto aqueles são veiculados por decreto Presidencial, assumindo uma posição hierárquica superior aos demais atos normativos do Executivo e disciplinando conteúdo geral e abstrato, os atos administrativos normativos são instrumentalizados por portarias, resoluções ou circulares, produzidos por qualquer agente público competente e gerando efeitos concretos.

Do tratamento conferido ao regulamento executivo, destacam- se outras duas categorias de regulamentos propostas pela doutrina: os regulamentos autônomos e os regulamentos delegados ou autorizados.

Os regulamentos autônomos são aqueles que criam obrigações internas e externas à Administração, sem amparo legal. Portanto, inadmissíveis62 no ordenamento jurídico brasileiro por força do princípio da reserva de lei formal. Ou seja, o regulamento não pode inovar no mundo jurídico impondo direito, dever, obrigação, limitação ou restrição quando não previstos ou identificados na lei regulamentada. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal63 teve oportunidade de se manifestar, impugnando decreto presidencial que regulamentava a outorga de concessão e permissão de serviços de telecomunicações sem base legal fundante.

Há quem defenda que a inovação trazida pela Emenda Constitucional n.º 3264 teria autorizado a adoção do decreto autônomo

62Helly Lopes MEIRELLES, no entanto, admite o decreto autônomo desde que não invada

matéria reservada à lei. Nesse contexto, afirma que os decretos autônomos não substituem definitivamente a lei; apenas, suprem a sua ausência no que puder ser provido por ato do Executivo, até que a lei disponha a respeito. Promulgada a lei, o decreto ficaria superado. Cf. Direito Administrativo brasileiro. 21ªed. atual. São Paulo: Editora Malheiros, 1996, p. 163.

63Conferir ADI n.º 1435: “(...) Não havendo lei anterior que possa ser regulamentada, qualquer

disposição sobre o assunto tende a ser adotada em lei formal. O decreto seria nulo, não por ilegalidade, mas por inconstitucionalidade, já que supriu a lei onde a Constituição a exige (...).“

64O Presidente da República, nos termos do art. 84, VI, “a” da Constituição de 1988, passou a

ter competência privativa para dispor, mediante decreto, sobre a criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas. A redação anterior do art. 84, VI era a dispor sobre a organização e o funcionamento da administração federal, na forma da lei. Maria S. Zanella DI PIETRO sustenta que com a Emenda Constitucional n.º 32/2001 ficou restabelecido o regulamento autônomo no direito brasileiro, para a hipótese específica inserida na alínea “a” do art. 84 da Constituição Federal. Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2001, p. 89.

no tocante à modalidade de regulamento administrativo ou de organização, permanecendo vedada a edição de regulamento autônomo na modalidade de regulamento jurídico. No entanto, a mudança teria colaborado para o surgimento de uma espécie de reserva de decreto65, pois foi estabelecida uma competência legislativa para o Presidente da República.

Os regulamentos autorizados ou delegados66, por sua vez, conferem ao Executivo uma certa margem de discricionariedade, quando da regulamentação de lei que não preveja todas as hipóteses de sua aplicação. De uma maneira generalizada, todo regulamento assume um caráter de autorizado, pois nos casos em que a lei não é precisa, a atividade regulamentar será exercida dentro de uma margem de interpretação.67 Não foram recebidos pela Constituição de 1988, conforme se depreende da análise do art. 25, I dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) 68. O tema será abordado no item 3.3, sob o enfoque da atividade delegada.

65 GALVÃO, Gabriel de Mello. Fundamentos e Limites ...Op. cit.,p. 20.

66 Os regulamentos autorizados não se confundem com os regulamentos complementares ou

de integração, não mais permitidos em nossa ordem jurídica. Estes, representam espécies de regulamentos de execução, pois complementam preceitos apresentados pela lei, desde que autorizados constitucionalmente. Dessa forma, a lei se atém a traçar as bases gerais da regulação, que, posteriormente, será complementada pela atividade regulamentar do Executivo. Recordamos as leis-quadro portuguesas, também experimentadas pela Constituição Brasileira de 1937, em que o legislador se restringia a delimitar os objetivos e sinalizar os parâmetros no qual a atividade normativa deve se balizar.

67 GALVÃO, Gabriel de Mello. Fundamentos e Limites ... Op. cit.,p. 15.

68 “Art. 25. Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição,

sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange a: I - ação normativa”. Gabriel GALVÃO recorda que a restrição ao exercício do poder normativo, por outros órgãos não pertencentes ao Legislativo, decorre do art. 25 retro-transcrito. Interpretou essa limitação de duas maneiras: a primeira se fundamentaria em uma tentativa de resgate da função primordial do Congresso Nacional em manifestar a vontade popular cuja representação exerce. A segunda traduziria a intenção do Constituinte de preservar a competência legislativa do Congresso Nacional para o período subseqüente à promulgação da Carta Magna, pois como se trata de disposição transitória, apenas ao Congresso Nacional seria restituída a totalidade de sua competência normativa para que depois pudesse delegar, pontualmente, poder normativo dentro dos limites da Constituição. Afirma, ainda, que logo após a entrada em vigor da Constituição da República de 1988, foram editadas sucessivas medidas provisórias – posteriormente convertidas em lei – prorrogando o prazo previsto no art. 25 do ADCT de modo a assegurar ao Conselho Monetário Nacional sua competência normativa até a