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8 Conhecer o museu

8.2 O museu vai à escola

A visita dos alunos a Serralves não é um pré-requisito para participação no projeto e na exposição final. Essa informação foi dada pelos mediadores nas entrevistas e causou, inicialmente, surpresa. Não parecia ter sentido que uma escola se inscrevesse no projeto e, posteriormente, entregasse o trabalho final sem que fosse exigida qualquer participação em reunião, oficinas ou acompanhamento no projeto, já que isso denotaria um trabalho produzido sem um desenvolvimento significativo, isolado apenas na escola e não em uma relação entre as instituições, conforme premissa inicial.

Para as mediadoras, esse fato “mais do que desvirtua, não faz sentido enquanto chamar-se Projeto em Escolas e ter um período temporal” (Ana, mediadora, Apêndice K).

basta que uma escola se inscreva no projeto e faça o objeto que vai participar na exposição. Não é, ou melhor, não existe aqui, aparentemente, um acordo em que essa turma se inscreva numa oficina, venha ao museu, trabalhe comigo ou com outros colegas e, depois, no decurso de trabalhar o tema da exposição, o tema do projeto, com alguém da equipa, através de uma oficina…(Malu, mediadora, Apêndice N)

A possibilidade de inscrição no projeto e participação na exposição foi justificada a partir das dificuldades que as escolas enfrentam para conseguir levar os estudantes aos museus, devido a custos associados a essa atividade – já que em Serralves a atividade de visita e oficina é paga –, além do transporte e de outros empecilhos que surgem no decorrer do projeto. Para a coordenadora, condicionar a participação na exposição à participação em qualquer outra etapa prevista na estrutura do projeto, incluindo a vista ao museu, não seria pedagógico.

não posso obrigar, é contra pedagógico obrigar a escola. O projeto tem esse desenho e a gente aconselha nesse projeto o professor a participar, mas eu não posso dizer:” - Ah! Professor, você que não participou em uma oficina, você não pode trazer trabalho”. Porque eu não posso fazer isso, porque há inúmeras problemáticas que a escola enfrenta (Denise Pollini, coordenadora, Apêndice U).

Coincidentemente, as professoras participantes do Projeto Anual com Escolas e entrevistadas nesta investigação, também não conseguiram visitar o museu com suas turmas.

“Eles participaram do projeto, mas depois não os consegui levá-los lá.” (Fernanda, professora, Apêndice AC).

A maioria das escolas não dispõe de transporte e os encarregados de educação (pais ou responsáveis pelas crianças) é que arcam com estes custos; ou seja, qualquer pedido de saída do ambiente escolar envolve logística e uma listagem de justificativas para a direção da escola, além de burocraticamente terem de preencher os mais variados papéis para saída do espaço escolar. Uma das professoras contou que participou em várias edições do projeto, mas que apenas em duas situações conseguiu levar os estudantes para conhecerem o Museu de Serralves:

uma ou outra vez que eu os consegui levá-los foi porque tinha a Câmara que disponibilizava a camioneta ou, que aconteceu uma vez, eu consegui convencer a escola a deixar levar os alunos integrado na visita final de ano, entendes? Mas isso só me aconteceu uma vez! (...) Sou eu que tenho que os convencer (Lisete, professora, Apêndice AB).

Em escolas públicas, que carecem de recursos, há “uma certa disputa de recurso raro e fundamental: o transporte. A suposição de insucesso da expedição faz a escola analisar se ações mais populares como uma ida ao parque, ao jardim zoológico, não seriam mais adequadas ao investimento” (BUCHMANN, 2014, p. 02).

Como superar essa dificuldade? Como falar aos estudantes sobre um projeto, sobre uma exposição a ser realizada no museu, com os trabalhos a serem produzidos pelos estudantes, mas sem levá-los? Duas professoras, explanaram que superam essa questão, levando o museu até as crianças, porém por imagens. Afirmam que, ao explicarem o que é um museu, fazem-no sem se deterem a Serralves, já que existem tipos diferentes de museus.

Eu, desde que iniciava, sempre fazia uma breve contextualização e levava imagens do que era museus. Eu não falava só do projeto. Eu falava e partia da questão o que é um museu, o que para eles é um museu [...] que tipo de museu é que existe o que podemos fazer num museu, o que é um Serviço Educativo. Todas as questões, e não só especificamente o museu de Serralves é que eles vêm (Ana, professora, Apêndice AA).

a solução que eu arranjei e, ao mesmo tempo, fui mostrando sempre imagens do museu, tudo que podia mostrar, como pequenos vídeos, pequenas imagens, fotografias das exposições que estive lá... para, depois, mostrar-lhe e lhes passei em CD para que cada um ficasse com um registro. É aquela história... não podes ir até o museu, o museu vem até ti, através da imagem e do discurso, que a gente consegue valorizar ou não, e foi uma das soluções que nós fomos arranjando (Lisete, professora, Apêndice AB)

Diante da impossibilidade de levar os estudantes ao museu, os professores tentam minimizar essa perda, desdobrando-se em formas de superar a carência de materiais e recursos da escola. Participam de projetos desta natureza, em parceria com o museu, para

terem uma motivação na realização de seu trabalho docente e para superar as próprias dificuldades de formação com o tema da arte contemporânea. Todo esse esforço deve ser levado em consideração, pois está dentro das possibilidades destas docentes, reféns de um sistema público de ensino que sucateia as escolas e desmotiva a opção profissional pela docência, dadas as condições de trabalho.

Infelizmente, há situações, como a visita a um museu, que não podem ser reproduzidas, pois envolvem muitos outros pormenores, como “o contato com a materialidade do trabalho [...]. Esse encontro é composto pelo momento antes de ir ao museu, com todas as expectativas que ele contém, o momento da visita e o posterior com sua memória” (ALDEROQUI, H. 1996, p. 77)39.

Na turma da qual acompanhei o desenvolvimento do projeto, a dinâmica decorreu em outro formato: a professora falou-lhes do projeto de que participariam em Serralves e que fariam um trabalho a ser lá exposto, partindo do pressuposto que saberiam sobre o local a que se referia; porém, pelos registros, não lhes foram mostradas imagens ou outros pormenores, tanto que, segundo alguns registros da coleta de dados, os estudantes não associaram a instituição referida como um museu ou com outro local em que já haviam estado.

a professora falou que eles participariam de um Projeto de Serralves e lá fariam uma exposição, fariam uma obra de arte (esse foi o termo utilizado). Uma menina perguntou: - O que é Serralves? Nenhum outro aluno se mostrou interessado ou sabendo o que seria Serralves. A resposta também não lhes foi dada. (Extraído das Notas de Campo. Porto, 28 de fevereiro de 2018. Local: Colégio O)

Esse fato foi bastante interessante, pois os estudantes passaram a realizar atividades relativas ao projeto na escola e falava-se em Serralves, mas nenhum deles se manifestava, até que, em uma das aulas, uma aluna associou o local de Serralves com seu símbolo, uma pá gigante vermelha cravada na entrada do parque, - disponível na Figura 11, página seguinte –, que desencadeou alguns comentários, recordando que a turma já havia visitado aquele local no ano anterior.

-Eu já fui em Serralves! É onde tem uma pá vermelha gigante. (aluno 1) -Eu também já fui. (aluna 2) -Ah! Eu também (aluno 3) -Eu nunca fui (Sofia) - Você já foi sim! Lembra com a turminha de 05 anos? (aluna 2) -Não. Não fui! (Sofia) – Foi sim! Todos fomos! (aluna 2) (Extraído das Notas de Campo. Porto, 09 de maio de 2018. Local: Colégio O)

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[...] el contacto con la materialidad de la obra; experiencia que es importante y no implica sólo un momento. Este encuentro se compone tanto del momento previo a ir al museo, con todas las expectativas que ésta encierra, el momento mismo de la visita y el posterior con su recuerdo (ALDEROQUI, H. 1996, p. 77).

Figura 11 – Obra exposta no Parque de Serralves, de autoria de Claes Oldenburg & Coosje van

Bruggen, cujo título é Plantoir [Colher de jardineiro], 2001.

Fonte: fotografia de elaboração própria, 03 de junho de 2019.

Houve, nesta investigação, uma tentativa de avaliação com os estudantes que acompanhamos no desenvolvimento do Projeto Anual com Escolas a fim de sondar os hábitos culturais, assim como realizamos com os participantes do Projeto Pergunta ao Tempo – apesar de estes não terem ido ao museu no âmbito do projeto com as escolas. A pergunta aberta era: Quem já foi em um museu ou numa exposição de arte? Foram com quem?

Como tratava-se de uma turma de estudantes com a idades de 6 (seis) e 7 (sete) anos, percebeu-se que o conceito de museu era abstrato, apesar de já terem visitado Serralves no ano anterior com a escola, sendo essa questão retirada da análise dos dados.