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6 A pesquisa: o caso dos projetos anuais

6.3 Casa da Memória

6.3.2 Projeto Pergunta Ao Tempo

O projeto “Pergunta ao Tempo” iniciou sua primeira edição no ano letivo 2016/2017, sendo propostas algumas alterações para a segunda edição em 2017/2018.

o “Pergunta ao Tempo” é, sobretudo, o grande projeto. É um projeto educativo, de mediação, dedicado ao público escolar. É claro que nós mantemos a nossa programação, nomeadamente a oferta de visita, a oferta que temos de visitas orientadas e de oficinas, que também se dirige ao público escolar e ao público geral, no sentido mais lato. Mas um projeto pensado, estruturado especificamente para esse tipo de público é, realmente, o “Pergunta ao Tempo” e é aquilo, como tu dizes, que nos ocupa o ano letivo todo. O ano letivo todo e, depois, o tempo de exposição que ainda, portanto, se prolonga pelos meses do verão até setembro ou outubro (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 389).

Desde o início, o projeto foi concebido em parceria com a Câmara e com a vereadora da Educação, o que possibilitou o suporte logístico e financeiro do município no projeto, de forma que não houve, assim, qualquer custo para participação das escolas no projeto.

a secretária de vereação, lançou o desafio: “-Ah, vocês podiam fazer um projeto. Criar um projeto para trabalhar com a escola, para se trabalhar com o Primeiro Ciclo”. Foi logo a indicação: Primeiro Ciclo. Nessa reunião, estava eu e a Catarina e nós ficamos a pensar naquilo” (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 389).

Durante o período de negociação e articulação entre a Câmara e o serviço educativo, bem como do longo da produção dos materiais para o projeto, Raul Pereira, mediador, e Catarina Pereira, diretora do Museu, estiveram presentes, trabalhando conjuntamente com a coordenadora Marta Silva.

Para Marta Silva (Coordenadora, Apêndice Q) “foi logo muito claro que nós tínhamos que relacionar o projeto com a exposição permanente da Casa da Memória, porque, na altura da abertura, […] Ainda não tínhamos o espaço ‘exposições temporárias’ nem tínhamos o ‘Repositório’”. A responsável pelo serviço educativo leu exaustivamente “os cadernos de encargos que a equipa Opium e Cabin Crew tinham deixado”, quando do planejamento da Casa da Memória, responsáveis pela implementação e guiãos expositivos, juntamente com Andrew Howard Studio, responsável pelo Layout Expositivo da Casa da Memória.

No relatório da Opium (2015), as condições essenciais para que o papel da mediação pelo serviço educativo se concretizasse era “articular a oferta educativa/pedagógica com o programa de serviço educativo dos equipamentos municipais, promovendo a complementaridade da oferta e o desenvolvimento de projetos temáticos que gerem programas inovadores” (OPIUM, 2015, site). Já no que concerne à Mediação Cultural, esta deveria ser amparada em três dimensões: “Visitar e Experimentar; Conhecer e Divulgar e Descobrir e Inovar” (OPIUM, 2015, site).

À primeira dimensão “Visitar e Experimentar” corresponde o desenvolvimento do conjunto de ações que promovem a visita aos núcleos expositivos (permanente e temporário), auxiliadas por instrumentos e ferramentas de mediação adequados ao perfil dos públicos alvo. “Conhecer

e Divulgar” acomoda as ações que se desenvolvem a partir do repositório e

que terão um carácter educativo e pedagógico, procurando-se estimular o desenvolvimento de investigação e produção de conhecimento nestas áreas de trabalho. Por fim, Descobrir e Inovar conforma projetos que são concretizados em rede com outros equipamentos culturais e criativos (OPIUM, 2015, site, grifo nosso).

Esses documentos orientaram o trabalho do serviço educativo, do museu e o delineamento do projeto, bem como:

A missão interpretativa da Casa da Memória estava sempre no meu pensamento e levou-me a refletir como é que podíamos cumprir esta missão interpretativa através das crianças. Essa missão interpretativa seria através dos núcleos, pensei eu, não é? Temos vários núcleos na exposição permanente da Casa da Memória que se podem assumir como temas. Temas que podem ser interpretados de diversas formas. (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 390 ).

A coordenadora também relatou que uma feliz coincidência, relacionada com uma companhia de teatro, acabou por delinear o que faltava para o desenho do projeto ganhar forma:

Passou cá uma companhia de teatro – que é a “Amarelo Silvestre” – que tem um espetáculo muito, muito, muito interessante que é “O museu da existência”, que é baseado no museu da inocência do Orhan Pamuk, que é um turco que tem um museu da inocência na Turquia. Ele tem um modesto mote para os museus, e o que ele diz é que o futuro dos museus está dentro da nossa casa. Eu achei aquilo muito bonito, porque acabei por participar também um pouco na construção do espetáculo. Na altura, eles precisavam de moradores, pessoas que vivessem em Guimarães para irem apresentar o projeto e para fazer empréstimos de pequenos objetos. O espetáculo é belíssimo. Portanto, eles compõem um espetáculo em torno de objetos que sejam muito significativos para as pessoas. (...) Eram vitrinas, onde juntavam as peças que foram recolhendo e criando todo um imaginário à volta daquilo. Muito, muito, muito bonito. (...) De repente, eu já imaginava que, “pois é, realmente, a Casa da Memória é um museu de objetos. Nós podíamos fazer isto com as crianças, não é?” Isto era espetacular. Eles terem o seu próprio micromuseu dentro de um museu que é a Casa da Memória (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 391).

Somados esses elementos no delineamento do Projeto, Marta Silva contou que encontrou na internet o kit de recolha do Patrimônio Imaterial, no site da Direção Geral da Educação, baseado nas diretrizes da UNESCO. Esse material serviu de mote para a elaboração do material de apoio do projeto, criando “um método investigativo com mais rigor do que estarmos a criar uma coisa de raiz. Provavelmente, conseguimos fazer uma adaptação com isto” (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 392). O material produzido, que será detalhado na PARTE III dessa tese, foi intitulado na 1ªedição de “Diário de Bordo” e na 2ªedição renomeado de “Guia de Viagem”.

A ideia de a exposição integrar a etapa final do projeto partia da intenção de as crianças “terem o seu próprio micromuseu dentro de um museu que é a Casa da Memória” (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 391) e “um dos objetivos principais, também, com que nós tentamos guiar logo ao início era o seguinte: nós queríamos que fosse um projeto aberto à comunidade, não parasse só nas crianças” (Raul Pereira, mediador, Apêndice O, p. 369).

Retomamos novamente o conceito de “museu aberto”, por Beites (2011), citado no Capítulo 5, que permite que cada participante – no caso, as crianças e suas famílias –, tenham um espaço de exposição no museu, seja expondo ou não objetos pessoais. A ideia de um museu convidativo e comunicativo volta à tona.

Promover projetos como o “Pergunta ao Tempo” junto ao público escolar auxilia na divulgação do espaço do museu junto à comunidade, uma vez que esse público geralmente está acompanhado dos seus familiares; e, consequentemente, na proposta de museu feito “com todos” de Sternfeld (2012). A partir de objetos ou memórias afetivas de avós, pais ou tios, inicia-se o diálogo sobre o patrimônio e do museu para com a comunidade. Estratégias de “revisar a abordagem e as informações fornecidas, bem como favorecer a apropriação do patrimônio por meio de seu uso, ou seja, ressuscitado do presente, são pontos de partida que ampliam as possibilidades de participação do visitante do museu” (CALVO, 1996, p. 105, tradução nossa)25.

O Projeto estrutura-se em algumas etapas, a partir também de uma temática, sendo que é atribuído a cada uma das turmas um dos 07 núcleos temáticos do núcleo expositivo da Casa da Memória. As etapas são:

1. Um encontro na Casa da Memória com coordenadores/as de 1ºciclo dos agrupamentos escolares de Guimarães e professores que participariam do projeto; 2. Visita à Casa da Memória;

3. Oficina de Educação para o Patrimônio na escola;

4. Três sessões de visita de acompanhamento do projeto nas escolas; 5. Exposição dos trabalhos na Casa da Memória.

A estrutura proposta para o projeto pelo serviço educativo da Casa da Memória é mais estática, pois se tratam de etapas pré-definidas de que estudantes e professores participam. No entanto, conforme já mencionado e pontuado com auxílio de Hernandez (1992; 1994) sobre Projetos de Trabalho, apesar de a temática ser determinada pelo museu e não partir dos estudantes, é possível que haja uma relação dialógica entre os envolvidos (mediadores, professores e estudantes), a fim de traçar seus percursos, desdobrar em novos questionamentos, estes pertinentes aos interesses dos estudantes, delineando as etapas do projeto e as lacunas das etapas iniciais, pré-determinadas. As visitas de acompanhamento do

25 Revisar el enfoque y la información que se brinda, así como favorecer la apropriación del patrimônio por

médio de su uso, es decir ressignificado desde el presente, son puntos de partida que amplían las possibilidades de particiación del visitante del museo (Calvo, 1996, p. 105).

projeto nas escolas permitem uma aproximação da escola com o museu, relação essa frisada por Alderoqui (2009) como essencial para uma parceria entre as instituições.

A participação no projeto aconteceria por contato com agrupamentos escolares de Guimarães, sendo que cada um deles indicaria um professor que lecionasse naquele ano para uma turma do 4º (quarto) ano do 1ºciclo. A delimitação das turmas do 4º ano foi devida “a complexidade dos conteúdos” (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 391).

Essa indicação dos professores participantes por parte dos agrupamentos gerou controvérsias, pois, nos “primeiros contatos com os professores, começamos logo a despistar quem é que estava por vontade” (Marta Silva, coordenadora, Apêndice Q, p. 396).

Dos professores participantes da edição 2016/2017, foram entrevistados:

 Professor Amadeu (nome fictício), entrevistado em 13 de jun. 2017 (Apêndice C);  Professora Brisa (nome fictício), entrevistada em 13 de jun. 2017 (Apêndice D);  Professora Luiza (nome fictício), entrevistada em 14 de jun. 2017 (Apêndice E);  Professora Cristina (nome fictício), entrevistada em 14 de jun. 2017 (Apêndice F).  Professora Sara (nome fictício), entrevistada em 14 de jun. 2017 (Apêndice G). Foram também entrevistados alguns professores participantes da edição 2017/2018:  Professora Maria José de Oliveira Gomes da Costa, entrevistada em 14 de junho de

2018 (Apêndice V);

 Professora Júlia (nome fictício), entrevistada em 14 de junho de 2018, (Apêndice W);

 Professora Inês (nome fictício), entrevistada em 19 de junho de 2018 (Apêndice X);

 Professora Carla Luciana Fernandes Moraes, entrevistada em 19 de junho de 2018 (Apêndice Y);

 Professora Elsa Gomes, entrevistada em 19 de junho de 2018 (Apêndice Z).

Quanto à participação dos professores, alguns relatos surgiram reafirmando que o agrupamento escolar é que os escolheu para representá-los, sendo que as reações foram as mais diversas. Sara (Professora, Apêndice G), por exemplo, relatou que não queria participar, mas como ninguém se disponibilizou, acabou aceitando “Aí eu disse que também não gosto que digam que de S. Torcato não vai ninguém, que não participa, porque também não gosto disso. Pronto, então vou eu”. O relato de Brisa (Professora, Apêndice D) também confirma que “Quem me inscreveu no projeto na verdade não fui eu. Foi o agrupamento e, na altura,

disseram que um professor de história ia ajudar muito aqui a turma. Só que, lá no fundo, não acompanharam, não foi o que aconteceu”. Já a professora Luiza (Professora, Apêndice E) confessa que “fiquei contente por me chamarem para esse projeto”. Nesse caso, a professora se sentiu lisonjeada por ser lembrada pelo agrupamento como alguém que se comprometeria e estaria envolvida no projeto. Certamente foram professores escolhidos pelos respectivos agrupamentos, que de alguma forma se destacaram dos demais, visto que a exposição final no museu seria uma representação do trabalho daquele agrupamento.

Ao final da edição 2016/2017, foram realizadas avaliações pilotos com os estudantes dos professores entrevistados. Na edição 2017/2018, os estudantes que participaram das avaliações, são também das turmas dos professores entrevistados e mencionados anteriormente. Todas as datas, atividades e instrumentos metodológicos relativos a essa investigação no Projeto Pergunta ao Tempo estão expostos no Apêndice AD.

Na avaliação realizada com os estudantes, composta de questões abertas e grupo focal, conforme delineamento descrito no Capítulo 6. Os estudantes das 06 (seis) turmas participantes do projeto totalizaram 122 (cento e vinte e dois) avaliações, tendo os estudantes do 4º ano do 1ºciclo a média de 10 (dez) anos de idade.

As Figuras 8 e 9 são exemplos de uma das folhas respondidas pelos estudantes, cujas questões abertas, foram:

1. Vocês têm aulas de expressões plásticas? O que costumam fazer nas aulas? 2. que é arte?

3. que é patrimônio?

4. Quem já foi em um museu ou numa exposição de arte? Foram com quem? 5. Quais museus lembram que foram? O que tinha lá? Conseguem descrever?

6. Vocês visitaram a Casa da Memória duas vezes durante o projeto, o que lembram? O que foi mais marcante?

7. Do projeto Pergunta ao Tempo...Que etapa para vocês foi mais significativa? O que lembram ou o que marcou do projeto?

Figura 8 – Frente da folha com as quatro primeiras questões abertas respondidas pela estudante

Mariana, da Escola A, Guimarães, em 14 de junho de 2018.

Figura 9 – Verso da folha com as últimas questões abertas respondidas pela estudante Mariana, da

Escola A, Guimarães, em 14 de junho de 2018.

Materiais disponibilizados às escolas, bem como pormenores de como o projeto foi desenvolvido pelas escolas e serviço educativo serão expostos e analisados nos capítulos seguintes.

PARTE III