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5. Educar para os Valores

5.2. O papel dos professores na Educação para os Valores

Segundo Ortega Ruiz e Mínguez Vallejos (2001, p. 29), é frequente a preocupação dos professores em saberem como ensinar valores, deixando de parte a questão fundamental: quais os valores a ensinar. Muitas vezes, alguns sentem-se perplexos diante de alguns conteúdos, como é o caso dos valores, pois os métodos e técnicas utilizados para o ensino destes afastam-se daqueles a que estão habituados.

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Outros optam por utilizar a mesma metodologia que utilizariam para ensinar, por exemplo, Matemática, o que não resulta pois a temática ao redor dos valores, sendo distinta das disciplinas ditas “normais”, exige, também, técnicas distintas. Então perguntamos: como é que os professores devem abordar os valores na sala de aula?

Segundo Jedličová (2004), existem bons argumentos para professores e educadores fortalecerem a educação para os valores de crianças e jovens. Deste modo, a autora refere que os professores escolheram esta profissão, com a melhor das intenções para fomentar o desenvolvimento da personalidade das crianças; e estudaram vários anos, pelo que têm a qualificação certa para o seu trabalho como agentes educacionais. Assim, “teachers and educators have both the necessary conditions to realize good educational work: they have strong motivation for it and they have also necessary professional equipment” (Idem, p. 118).

Tuvilla Rayo (2004, p. 192) enfatiza a importância dos professores na educação para os valores dizendo que “os professores são uma peça-chave em um sistema democrático de educação preocupado com os direitos humanos, com a paz e com a democracia, cuja função consiste em apresentar aos alunos a problemática mundial e demonstrar-lhes a importância que tem encontrar respostas satisfatórias para resolvê-la”.

Comecemos por falar nos cursos de formação inicial de professores. Segundo Gonçalves (2004a, p. 16), “training teachers is also training people and citizens, and this entails the presence of an ethical component in teacher training”. Segundo a mesma autora, a formação inicial de professores e educadores deve incluir uma reflexão sobre os valores sociais prevalentes na nossa sociedade, de forma a promover o desenvolvimento psicológico e moral dos professores. Por outro lado, as atividades e prática desenvolvidas durante a formação de professores devem estar estritamente ligadas a experiências concretas, para que os professores-em-curso sejam motivados e estimulados. Deste modo, a autora indica algumas estratégias para estimular a evolução e conhecimento dos mesmos, bem como aperfeiçoar as suas competências e atitudes. Essas estratégias passam pelo uso de “pedagogical games, projects, debate situations, co-operative teams for the resolution of problems, study cases, and film, image and texto analysis” (Idem, p. 19).

Segundo a Declaration and Integrated Framework of Action on Education for Peace, Human Rights and Democracy da UNESCO (1995, p. 12), “the training of personnel at all levels of the education system - teachers, planners, managers, teacher

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educators - has to include education for peace, human rights and democracy”. Segundo Tuvilla Rayo (2004), de modo a capacitar os agentes educativos para uma educação para a paz, direitos humanos e democracia, ou seja, para os valores, é necessário aperfeiçoar o corpo docente, de modo a modificar a “função e (…) [o] papel do professor tanto no seio da sociedade (agente social) como no interior da escola (agente docente)” (Idem, p. 196). De forma a aperfeiçoar a função e o papel do professor como agente social, a sua formação deve prepará-lo para adquirir as capacidades de (Buxarrais, 1997 in Tuvilla Rayo, 2004, p. 196): “

a) Criar um clima escolar que favoreça o diálogo, o intercâmbio de idéias e a construção de novos conhecimentos;

b) Criar situações nas quais os alunos possam viver experiências conflitivas, a partir de um ponto de vista moral que os obrigue a agir moralmente e a reciclar suas dimensões nesse âmbito;

c) Escutar, aconselhar e ajudar na formação e no desenvolvimento integral de seus alunos, motivando-os e estando atento a seus interesses e inquietações;

d) Construir um modelo teórico próprio e adaptado à situação educativa concreta, adequando e recriando, quando necessário, todas e cada uma das atividades propostas;

e) Incentivar os grupos e analisar seu funcionamento, compreender o sentido e dinâmica das situações que se apresentam na sala de aula; f) Trabalhar sobre a própria pessoa e interrogar-se sobre si mesmo

dentro de sua prática docente, que lhe permita ter um autoconceito ajustado e positivo que lhe facilite o exercício de sua função;

g) Dirigir discussões morais que lhe exijam ter competência para enfrentar e manejar situações conflitivas a partir de um ponto de vista moral, e estar disposto a colocar seus valores pessoais em julgamento”.

No segundo caso, ou seja, no aperfeiçoamento da função e do papel do professor como agente docente, é necessário que este, no âmbito da educação para os valores, desenvolva, segundo Magendzo (1994 in Tuvilla Rayo, 2004, p. 196):

“a consideração dos direitos humanos como catalisadores da mudança na escola; a articulação de um processo de mudança das formas de trabalho em equipe e na globalidade do trabalho escolar; a consideração do aperfeiçoamento como um processo permanente, que permita o desenvolvimento constante de inovações; a formação neste tipo de educação deve funcionar, por fim, como eco das próprias vivências e experiências pessoais do professor”.

Ortega Ruiz e Mínguez Vallejos (2001) afirmam que a formação dos professores é uma das maiores dificuldades na educação para os valores, uma vez que muitas vezes estes tendem a aplicar as mesmas estratégias e técnicas que utilizam para o ensino de outras áreas, como já foi referido anteriormente. Por outro lado, existem também os que se manifestam indiferentes à educação para os valores, uma vez que atribuem essa tarefa

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somente à família. Portanto, arriscaríamos afirmar que é necessário que os professores utilizem algum do seu tempo para fazer uma introspeção de forma a avaliarem qual é o seu papel na sua profissão. Por vezes, os professores e agentes educativos que estão na escola, estão mais tempo com as crianças do que os próprios pais. Será que isso não acarreta nenhuma responsabilidade pela educação para os valores dos seus educandos?

Segundo Herzele (2004), apesar de todas as funções dos professores e considerando que muitas vezes interpretam mais papéis durante a sua vida profissional do que um ator, é essencial que possuam as competências para “communicate learnable knowledge, permit social learning and educate” (Idem, p. 109). É de notar que nos últimos anos é, cada vez mais, função da escola e, consequentemente, dos professores, educar e sociabilizar jovens, muitas vezes de modo a apoiar a educação dada (supostamente) pelos pais. Na opinião da autora, é crucial que professores do século XXI integrem na sua profissão os seguintes objetivos: estimular interesses; fortalecer o carácter; e obter valores. Assim sendo, o primeiro objetivo recai sobre o facto de o conhecimento estar em contínua evolução, pelo que os professores necessitam de ser capazes de o comunicar, de forma global, para estimular os alunos a iniciarem um processo de aprendizagem ao longo da vida. Relativamente ao segundo objetivo, a autora considera que “it is the teacher’s profession to help pupils to find themselves, to givem them self-confidence, and identity, to address the individuality of each pupil and to bring them to regard each other reciprocally as individuals” (Idem, p. 110). No que diz respeito ao terceiro objetivo, que é para este trabalho o mais significativo, afirma com convicção que “there is no education without value education!” (Idem, p. 110), pelo que é necessário que os professores parem para pensar nas mudanças sociais que têm ocorrido nos últimos anos, especialmente na União Europeia. Comenta que se a União Europeia pretende ser uma comunidade pacífica e social, motivada para a paz, liberdade, justiça, cooperação e solidariedade, “it is essential that value education gets a special significance in teachers’ profession. More than till now we have to integrate sociocritical, humanistic and ecological-oriented aspects and values into our concepts of education, and we have to use our classes for responsible value education” (Idem, p. 111).

Ortega Ruiz e Mínguez Vallejos (2001, p. 30) referem que “la enseñanza- aprendizaje de los valores no se identifica, en modo alguno, com la transmisión de ideas, conceptos o saberes, algo a lo que la escuela, desde hace tiempo, viene

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acostumbrada. Es otra cosa, reclama y exige la referencia a la experiencia del valor”. Posto isto, podemos concluir que o papel do professor, na educação para os valores, não é a simples transmissão daqueles que deseja que os alunos adquiram. O professor deve, no entanto, proporcionar vivências que permitam aos educandos experimentar determinados valores. Como refere Herzele (2004, p. 109), “today the education of values is connected with the condition that the acting person realizes the substantial effectiveness of a value”. Ou seja, segundo esta autora o conceito de justiça ou igualdade é insignificante para os alunos, no entanto quando eles estão a jogar um jogo e estão sujeitos a regras, os alunos podem perceber e experimentar o que é a justiça e a igualdade. De forma semelhante, Ortega Ruiz e Mínguez Vallejos (2001, p. 30) também indicam que “la tolerancia no se enseña porque se transmita la idea o concepto de tolerancia, sino porque, además y sobre todo, se perciban y oferten comportamentos de personas tolerantes”. Mais uma vez, não é dever do professor transmitir o conceito de um determinado valor, mas reconhecer e oferecer comportamentos de pessoas que pratiquem esse mesmo valor, de forma a se tornarem modelos para os seus alunos.

Segundo Ortega Ruiz e Mínguez Vallejos (2001), a educação para os valores, ao contrário de outras disciplinas ou áreas de conteúdo como é o caso de Matemática ou Língua Portuguesa, não é tarefa de um só professor. Os autores citam Bolívar (1998 in Ortega Ruiz & Mínguez Vallejos, 2001, p. 33) ao dizer: “un centro escolar educa en actitudes y valores más por el ambiente y relaciones vividas en la organización que por lo que aisladamente enseña cada profesor en su aula”. É necessário que os docentes trabalhem em conjunto de modo a proporcionar aos alunos uma melhor aprendizagem e aquisição de valores, até porque todos os professores e outros agentes presentes na escola acabam por ser modelos para as crianças, como referem os autores. “Sus palabras, silencios omisiones, conductas, aprobaciones, rechazos, valoraciones, no pasarán desapercibidos para los educandos” (Idem, p. 34), pelo que todo o cuidado será pouco, especialmente no que diz respeito aos comportamentos e estilos de vida dos professores que são, no fundo, exemplos para os seus alunos.

Embora a escola tenha um importante e fundamental papel na educação para os valores de crianças e jovens, “a educação do cidadão não pode ser responsabilidade exclusiva do setor educativo pelo que este deve cooperar estreitamente, para cumprir eficazmente suas funções com os demais agentes de socialização: a família, os meios de comunicação, o mundo do trabalho e as organizações não-governamentais” (Tuvilla

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Rayo, 2004, p. 198), salientando-se a importância da relação com a família, com o meio e com a comunidade, como já foi referido anteriormente.