• Nenhum resultado encontrado

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3 O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

3.7 A comunicação científica

3.7.1 O periódico científico

O periódico científico desempenha um importante papel na comunicação cientifica e é considerado essencial para o progresso da ciência e a competitividade entre os pesquisadores. O periódico científico (journal, em inglês) é uma revista científica21 que reúne uma coletânea de artigos científicos de diferentes autores, nos quais os pesquisadores apresentam e discutem, com rigor científico e metodológico, os resultados de suas pesquisas. Estima-se que existam atualmente no mundo em torno de 25 mil periódicos referendados pelos pares (peer

20

Uma sociedade científica é uma associação de especialistas ou eruditos de um ramo do conhecimento ou das ciências em geral, que permite aos seus associados reunir-se, expor os resultados de suas pesquisas aos colegas dos mesmos domínios do conhecimento e difundir seus trabalhos através de uma publicação especializada (WIKIPÉDIA, fev.2010).

21 Revista científica não deve ser confundida com magazine (revista de cunho popular) ou jornal (diário de

review), e 2,5 milhões de artigos publicados ao ano em todas as áreas do conhecimento, conforme afirma Harnad (2006), com base nos levantamos no diretório da ULRICH‟S22

. O que constitui um “periódico científico” é ainda uma questão que provoca dúvidas dentro da comunidade científica. Meadows (1999, p.15) chama a atenção para duas questões: 1) revistas que publicam apenas artigos de revisão devem ser consideradas como periódico científico? Que proporção de artigos originais um periódico deve conter? A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), agência vinculada ao Ministério da Educação (MEC) do Brasil, responsável pela avaliação da qualidade da produção científica dos programas de pós-graduação stricto sensu brasileiros, em seu documento para reestruturação do Qualis23, deixa essas questões para os representantes de cada área e estabelece como conceito básico para periódicos científicos “veículos com corpo editorial reconhecido, com avaliação pelos pares (pareceristas ad hoc) e dotados de ISSN24” (CAPES, 2008).

O parâmetro mínimo estabelecido por pesquisadores do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), na avaliação de periódicos brasileiros, leva em consideração o agrupamento dos periódicos em: científicos, técnicos e de divulgação, de acordo com a natureza do material veiculado. Aqueles com mais de 50% dos artigos resultantes de investigação científicas são chamados de científicos. Aqueles com mais de 50% de artigos com comentários, opiniões e pontos de vista sobre determinados temas são denominados técnicos e, aqueles que priorizam notícias curtas, informes e similares são de divulgação (TARGINO; GARCIA, 2000, p. 109).

O periódico científico desempenha pelo menos quatro funções essenciais conforme afirma Mueller (1999): certificação da ciência com o aval da comunidade cientifica; canal de comunicação entre os cientistas e de divulgação mais ampla da ciência; arquivo ou memória científica e registro da autoria da descoberta científica.

Há, pelo menos, três tipos principais de editoras envolvidas na produção de periódicos científicos, de acordo com Meadows (1999, p. 127):

22

Ulrich‟s é um diretório eletrônico que reúne informações sobre todos os tipos de periódicos, desde revistas populares até científicas <http://www.ulrichsweb.com/ulrichsweb/>. Acesso em: 01 jul 2010.

23 Qualis é um sistema de avaliação dos periódicos científicos utilizados pelos programas de pós-graduação

brasileiros <http://www.capes.gov.br/avaliacao/qualis>. Acesso em: 14 dez. 2009.

24

ISSN (International Standard Serial Number) – código padrão internacional de oito dígitos para identificar qualquer publicação periódica, seja impressa ou eletrônica, independente da língua e do país de publicação <http://www.issn.org/2-22635-What-is-an-ISSN.php> Acesso em 15 dez.2009.

a) editoras comerciais - as maiores editoras comerciais geralmente cobrem ampla variedade de campos do conhecimento e tem interesse predominante nas publicações científicas, tecnológicas e médicas (CTM). Suas vendas são maiores porque contam com um público internacional. Editoras comerciais menores geralmente tendem a se concentrar em determinados nichos das CTM e algumas se especializam na publicação nas áreas das ciências sociais e humanidades;

b) editoras universitárias – ao contrário das comerciais, dão particular atenção à produção de conteúdos nas áreas das ciências sociais e humanidades. As editoras universitárias foram criadas com a finalidade de oferecer às universidades canais para a comunicação de pesquisas científicas que, de outra forma, seriam difíceis de publicar. Deve-se levar em conta também que assuntos relacionados às ciências sociais e humanidades despertam pouco interesse nas editoras que visam o comércio editorial. Além disso, nessas áreas as temáticas geralmente estão relacionadas a problemas e línguas locais.

c) editoras de sociedades e associações científicas e profissionais – concentram-se na publicação de periódicos de prestígio uma vez que representam entidades científicas.

Embora o periódico científico, até os dias atuais, não seja o veículo preponderante em todas as áreas do conhecimento, as revistas científicas indexadas e arbitradas pelos pares tornaram-se o centro do sistema tradicional de comunicação científica, cujo status de canais preferenciais foi concedido pela comunidade científica, com a atribuição de confirmar a autoria da descoberta científica e conferir prestígio aos cientistas e aos periódicos científicos por meio de um sistema de avaliação baseado em indicadores como: quantidade de publicações, índices de citação e visibilidade internacional (MUELLER, 2006)25.

Meadows afirma que “um periódico de prestígio pode ser definido simplesmente como aquele que publica as melhores pesquisas pelos melhores pesquisadores” (MEADOWS, 1999, p. 127). Para Mueller, a afluência de bons artigos depende da regularidade de publicação e facilidade de acesso aos potenciais leitores. O rigor na seleção de artigos científicos e a indexação em bases de dados internacionais são condições

25

“ao criar metas quantitativas, definidas por indicadores específicos, cria-se uma dinâmica de avaliação onde o formalismo da atividade científica passa a predominar muitas vezes sobre o conteúdo da própria atividade” (SCHWARTZMAN, 2005).

indispensáveis para que um periódico alcance reputação na comunidade científica (MUELLER, 1999).

Alguns aspectos devem ser considerados para que um periódico científico alcance prestígio ao longo de sua existência:

1) “[...] gozar de reputação consolidada no seio da comunidade científica pertinente. Isso implica, por sua vez, que o periódico deva existir já algum tempo e ser bem conduzido [...]” (MEADOWS, 1999, p. 167);

2) estabelecer e manter padrões formais de editoração - normalização, periodicidade, continuidade, regularidade, acessibilidade, etc.;

3) incorporar padrões de qualidade - qualificação do editor e abrangência do corpo editorial; qualidade e proporção de artigos originais; abrangência das publicações e de autores, etc.;

4) ser indexado em bases de dados relevantes e reconhecidas na comunidade científica e tecnológica.

Os serviços de indexação de periódicos científicos têm por objetivo avaliar, organizar, controlar e dar acesso à informação científica. As bases indexadoras são mais um filtro da avaliação da qualidade da pesquisa científica, possibilitando maior visibilidade dos conteúdos e controle bibliográfico via registro, acesso e preservação da memória científica, além da participação nos indicadores da produção científica (BARBALHO, 2005, p. 146).

Segundo Rowley citado por Barbalho (2005), as bases de dados de indexação de periódicos científicos podem ser classificadas como:

a) referenciais – orientam o usuário para uma outra fonte, isto é, remetem para as fontes primárias;

b) de textos completos – trazem artigos de periódicos na íntegra;

c) índices de citação – bases de dados que analisam quantitativamente o impacto dos artigos por meio do número de citações recebidas.

Entre as bases de dados de citação mais utilizadas na bibliografia especializada destacam-se aquelas organizadas pelo Institute for Scientific Information (ISI)26, tais como: Science Citation Index (SCI), Social Sciences Citatation Index (SSCI) e Arts & Humanities

Citation Index (AHCI). As bases do ISI utilizam índices bibliométricos27 para análise dos aspectos quantitativos referentes à geração, propagação e utilização de informações científicas (PINTO; ANDRADE, 1999), visando conhecer quem influencia os rumos da ciência, seja de um país, de uma comunidade científica ou de uma instituição por meio de mapeamentos- chave, sua cronologia, seu relacionamento e sua importância, além de servir para refutar mitos que prevalecem na ciência (TARGINO; GARCIA, 2000, p. 105).

No Brasil, os estudos bibliométricos iniciaram-se com Morel e Morel (1977) no final da década de 70 e ganharam corpo no início dos anos 90, quando alguns pesquisadores começaram a advogar a importância de se levar em consideração o fator de impacto de revistas científicas e o número de citações de pesquisadores na avaliação por pares (PINTO; ANDRADE, 1999).

O conjunto de técnicas bibliométricas aliado à qualidade e à reputação do corpo editorial de um periódico científico são os principais fatores que influenciam os pesquisadores e os leitores, que geralmente são os próprios pesquisadores.

A reputação de um periódico na comunidade científica leva algum tempo para se estabelecer. Entretanto, a partir do momento que se estabelece, corre o risco de perder submissões e eventualmente assinaturas para um periódico rival, se ele deixar que sua qualidade decline ao longo do tempo. Para maximizar o fator de impacto e contagem de citações, compete aos editores atrair artigos de renomados cientistas. Similarmente, compete aos cientistas publicar em periódicos de renome para assegurar fundos para suas pesquisas (SPRINGER SCIENCE..., 2008, p. 7).

Publicar em periódicos de qualidade é um fator decisivo para o pesquisador alcançar status na comunidade científica e adquirir competência científica (poder científico) para falar e agir legitimamente em nome da comunidade, assim como autoridade científica para ocupar posições técnicas e políticas fora do campo científico (poder social), como afirma Bourdieu (2003).

Para Bourdieu (2003, p. 113), o campo científico “é o lugar e o espaço de uma luta concorrencial”, onde o pesquisador busca o monopólio da autoridade científica e da competência científica. Nesse campo de interesse e de luta concorrencial, o pesquisador deixa de lado as normativas do comportamento científico descritas por Merton (1973), relacionada ao “despreendimento” do pesquisador em relação aos resultados de suas pesquisas, e passa a

27

A bibliometria é um campo da Ciência da Informação relacionado à aplicação de técnicas estatísticas sobre os registros dos documentos recuperados em bases de dados, com apoio de metadados que elas possuem, permitindo-se classificar, separar e agregar valor aos dados coletados (BARBALHO, 2005, p. 132-133).

assumir uma posição estratégica orientada pela “maximização do lucro científico, a obtenção do reconhecimento dos pares concorrentes” (BOURDIEU, 2003, p. 116).

A partir desse fato, a qualidade e a rapidez da publicação científica em um periódico científico passaram a ter prioridade na agenda do pesquisador. Os pesquisadores buscam a rápida publicação para formalizar e garantir a prioridade original da descoberta, previamente debatida nas redes de comunicação informal, tais como conferências, seminários, intercâmbio de manuscritos, etc.. que são mais velozes que os procedimentos normais da publicação oficial (ZIMAN,1972, p. 138-140).

Reif lembra que às vezes os autores preocupados em ver seus estudos publicados o mais rapidamente possível recorrem à imprensa cotidiana e acabam tendo seus artigos reprovados por seus pares (REIF, 1961 apud BOURDIEU, 2003, p. 116-117), uma vez que esse canal de publicação não detém a estrutura necessária para avaliar, com o rigor científico esperado, os trabalhos a ele submetidos. Bourdieu compartilha dessa afirmação alegando que somente os cientistas engajados no mesmo campo detêm os meios para avaliar e reconhecer os méritos da obra científica. “Um autor que apela a uma autoridade exterior ao seu campo de pesquisa só atrai descrédito sobre si” (BOURDIEU, 2003, p. 117).

Para Velho, a publicação rápida geralmente acontece nas áreas mais consolidadas com razoável grau de consenso paradigmático interno e com maior nível de competição entre seus membros. Nas ciências humanas o grau de organização da comunidade científica, segundo a autora, ainda não foi alcançado e, com isso, a pressão por publicar é bem menor do que nas ciências naturais (VELHO, 1997a, p. 29).

De acordo com Harnad (2006), existem 25 mil revistas referendadas pelos pares publicadas em inglês, seja impressa ou online, seja de acesso aberto ou restrito. O Directory of Open Access Journals (DOAJ) lista 3.620 revistas de acesso aberto. A SHERPA28 organiza um sumário estatístico no qual dos 523 publicadores comerciais, registrados em sua base de dados, 63% (329) permitem alguma forma de auto-arquivamento, seja de preprint ou postprint.