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Sobre a experiência/conscientização com acesso aberto

6 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA

6.3 Discussão dos resultados da pesquisa

6.3.2 Sobre a experiência/conscientização com acesso aberto

Os resultados deste estudo mostram que os pesquisadores do CNPq, embora tenham relativo conhecimento sobre os movimentos de acesso aberto, não conhecem o Projeto de Lei 1120/2007 que estabelece uma política nacional de informação em ciência e tecnologia e nem possuem conhecimento dos desdobramentos desse fenômeno social, inclusive suas sanções. Têm pouca conscientização e experiência com ambientes digitais de acesso aberto à informação científica, mesmo nas grandes áreas do conhecimento que mantêm repositórios digitais internacionais de acesso aberto estabelecido, como nas Ciências Exatas (arXiv.org), Biológicas e da Saúde (BioMed Central). Poucas instituições de ensino e pesquisa encorajam seus pesquisadores nesse sentido, embora um bom percentual delas possua repositórios ou arquivos abertos para disseminação da informação via Internet. O termo “auto-arquivamento” é desconhecido pela maioria dos respondentes. A disponibilização de preprint e postprint na Internet ainda é pouco praticada pelos pesquisadores brasileiros, principalmente de preprint, com poucas exceções para as ciências Sociais Aplicadas e as Exatas. Embora boa parte dos pesquisadores publique em revistas de acesso aberto, desconhece seus desdobramentos e as principais referências sobre o assunto, como: o Diretório Internacional de Revistas de Acesso Aberto (DOAJ), as políticas editoriais das revistas na base SHERPA/RoMEO e as orientações da SPARC para retenção dos direitos autorais no momento da publicação do artigo científico.

Os Discursos dos Sujeitos Coletivos (DSCs) mostram claramente a falta de conhecimento dos pesquisadores com relação ao processo de publicação e das políticas editoriais de divulgação das revistas científicas. Para os respondentes, o que importa é publicar em revistas de impacto para atender exigências da CAPES com relação aos programas de pós-graduação e manter suas bolsas de produtividade em pesquisa no CNPq. Na visão de alguns respondentes, as revistas de acesso aberto são de baixa qualidade e estão na contramão das políticas das agências de fomento à ciência e tecnologia. As revistas de acesso aberto, na opinião dos respondentes, é como se fossem uma segunda opção para aqueles que

não conseguem publicar em revistas de primeira linha e de alto impacto. Essa percepção, no entanto, parece um tanto quanto equivocada e revela desinformação por parte dos respondentes com relação aos aspectos de qualidade de editoração de uma revista científica. A forma de divulgação e acesso de uma revista não implica necessariamente se ela é de baixa qualidade ou de pouco impacto na comunidade científica. A qualidade de uma revista científica leva em consideração uma série de fatores, desde a composição de seu corpo editorial, com adoção do sistema de revisão por pares (peer review) até os aspectos relacionados à gestão e política editorial da revista (FERREIRA, 2005).

Embora as revistas de acesso aberto sejam ainda muito jovens (menos de vinte anos) em relação ao sistema tradicional por assinatura (mais de três séculos), elas já começam a despontar e assumir posições de destaque nas grandes bases indexadoras internacionais como foi mostrado nos Gráficos 7 e 8. As revistas da Public Library of Science (PLoS), tais como PLoS Biology e PLoS Pathogens assumiram as primeiras posições em suas respectivas áreas de investigação (JCR/2008)168. As revistas brasileiras: Brazilian Journal of Physics; Journal of the Brazilian Chemical Society; Scientia Agricola e Memórias do Instituto Oswaldo Cruz alcançaram posições de destaque no JCR/2008.

O fator de impacto, em algumas áreas do conhecimento, é considerado como um dos principais atrativos na escolha de uma revista no momento da submissão de originais de pesquisa a uma revista, conforme mostraram os resultados da pesquisa. Entretanto, o fator de impacto está mais relacionado à visibilidade da revista do que propriamente à qualidade de seus conteúdos169. O periódico que restringe seus conteúdos a um pequeno grupo de leitores provavelmente será menos citado do que aqueles indexados em bases de dados de acesso amplo à comunidade nacional e internacional. Não apenas a visibilidade, mas a acessibilidade ao conteúdo completo aos artigos, sem custos para o leitor, é uma condição que tende a influenciar positivamente o fator de impacto, como mostram vários estudos, por exemplo, por Lawrence (2001); Kurtz, (2004); Brody et.al. (2004); Antelman (2004); Eysenbach (2006). De acordo com Willinsky (2002) é através de uma ampla audiência de potenciais leitores é que o pesquisador constrói sua reputação na carreira profissional e dela obtém os benefícios esperados.

168

JCR - Journal Citation Reports – publicação anual da Thomson Reuters sobre os raking das revistas acadêmicas com base nas citações que elas recebem de outras revistas.

169 “ao criar metas quantitativas, definidas por indicadores específicos, cria-se uma dinâmica de avaliação onde o

formalismo da atividade científica passa a predominar muitas vezes sobre o conteúdo da própria atividade” (SCHWARTZMAN, 2005).

Ampliar a audiência de suas pesquisas é o desejo da maioria dos respondentes. Entretanto, para alguns deles, os repositórios digitais encontram-se numa fase embrionária e ainda não alcançaram credibilidade na comunidade científica como forma eficiente de divulgação de conhecimento sério. Essa visão dos respondentes faz sentido, uma vez que os repositórios digitais de maior credibilidade são aqueles que já alcançaram legitimação (consenso) no campo científico, como o “arXiv.org” para as áreas da Física e ciências afins e, principalmente aqueles que foram legitimados sob políticas consistentes de alguns países como o Reino Unido e os Estados Unidos (BioMed Central e UK PubMed Central, respectivamente). A aceitação dos repositórios digitais dependerá, nesse sentido, do grau de intervenção externa que o campo receberá para legitimá-los como veículos adequados à divulgação do conhecimento científico.

Mueller (2006) argumenta que a hierarquia que há no campo científico também existe entre os diversos veículos de comunicação. Embora o periódico científico tenda a ser o suporte mais adequado para o registro do conhecimento, ele, certamente, não é o veículo de divulgação mais eficiente. Mesmo alcançando visibilidade com a indexação em bases de dados internacionais, essa visibilidade é parcial e não permite, na maioria dos casos, o acesso ao conteúdo completo.

Pesquisa realizada sob o patrocínio do Joint Information System Committee (JISC) e do Open Society Institute (OSI) com pesquisadores que já publicaram ou não em revistas científicas de acesso aberto, de abrangência internacional, mostrou que a maioria dos respondentes (quase 2/3) tem consciência dos movimentos de acesso aberto, sendo que apenas ¼ desses pesquisadores tomaram conhecimento por suas instituições. Por outro lado, aqueles pesquisadores que já tinham publicado em revistas de acesso aberto, 42% tomaram conhecimento por suas instituições e iniciativas de seus próprios países para promover o acesso aberto. Dentre as razões para publicar em revistas de acesso aberto, 90% disseram que foi o princípio de livre acesso à informação para todos. Esses autores perceberam também que as revistas de acesso aberto são mais rápidas do que as tradicionais, abrangendo maior audiência e, com isso, aumentando o número de citações em seus trabalhos. Uma das principais razões para não publicar nessas revistas é não estarem suficientemente familiarizados com essas revistas em seu campo de pesquisa para submissão de seus trabalhos.

Quanto às taxas de publicação, a pesquisa acima revelou que mais da metade (55%) dos respondentes que publicaram em revistas de acesso aberto não a pagaram de seu próprio bolso. A pesquisa considera que esse resultado pode ter sido influenciado pelo número de

respondentes filiados às instituições parceiras da BioMed Central (BMC). Entretanto existe consenso de que as taxas de publicação em revistas de acesso aberto devem vir, em primeiro lugar, de seus grants de pesquisa e, em segundo lugar, de sua instituição ou de suas bibliotecas.

A pesquisa revelou também que a grande preocupação dos autores em publicar em revistas de acesso aberto seria o risco de afetar suas chances na captação de recursos para pesquisa (grants) ou limitar o potencial impacto de suas pesquisas, mesmo sabendo que estudos já realizados sobre o assunto (LAWRENCE, 2001; WILLINSKY, 2002, etc) mostram o contrário.

As práticas de auto-arquivamento de artigos em repositórios digitais também foram consideradas pouco conhecidas e utilizadas pelos pesquisadores. Um pequeno grupo de respondentes disponibiliza artigo na página web pessoal. Evidências apontam que esta motivação depende de mecanismos de incentivo para romper as barreiras culturais que estão por trás do tradicional processo de comunicação, conforme mostraram os estudos de Swan e Brown (2005), assim como da legitimidade dos repositórios na comunidade científica.

Dados recentes divulgados pelo Projeto SOAP, mostram a percepção dos pesquisadores brasileiros que já têm certa conscientização sobre acesso aberto. Essa pesquisa foi conduzida no período de março/2009 a fevereiro/2011. Dos 43.029 pesquisadores de vários países envolvidos na pesquisa, os brasileiros compõem um grupo de 1197 respondentes (2,8% do total e o 9º em participação) em todos os campos de pesquisa. O Brasil, junto com os Estados Unidos e a Alemanha, é apontado na pesquisa como país que acredita no acesso aberto, enquanto a China, Iran, Japão e Turkia compõem o cluster (grupo) de países céticos no que diz respeito ao acesso aberto. Em relação às grandes áreas do conhecimento, as ciências biológicas, ciências sociais, matemática, computação, assim como as ciências da comunicação e informação compõem o cluster de cientistas otimistas com o acesso aberto. Por outro lado, os químicos e engenheiros são mais céticos170. Este ceticismo pode estar associado às seguintes razões: os químicos geralmente produzem mais pesquisas básicas e publicam mais no formato de artigos em revistas científicas de circulação internacional, que geralmente são controladas por editoras comerciais; os engenheiros, por sua vez, desenvolvem mais pesquisas aplicadas e publicam mais em veículos de circulação nacional. Entretanto, essas pesquisas geralmente envolvem segredos de patentes que os inibem a divulgar

170 Apresentação do Projeto SOAP <http://www.slideshare.net/ProjectSoap/soap-symposiumtalkii>. Acesso em

amplamente suas descobertas. Nesse sentido, os químicos são mais dependentes das editoras comerciais e os engenheiros dos registros de patentes.

Com relação aos pesquisadores brasileiros que responderam à pesquisa do Projeto SOAP, o Gráfico 18 mostra que os pesquisadores brasileiros estão mais convictos de que pesquisas públicas devem estar disponíveis publicamente e que os artigos publicados em acesso aberto (OA) são mais lidos, e consequentemente, mais citados. Os pesquisadores brasileiros que já têm certa experiência com acesso aberto não acreditam que o sistema contribua para publicação de pesquisa de baixa qualidade e que debilite o processo de revisão por pares (peer-review). Esse sentimento de otimismo com o acesso aberto é refletido na maioria dos pesquisadores respondentes do Projeto SOAP, em 160 países (ver Mele, 2011).

Gráfico 18 – Percepção dos pesquisadores brasileiros sobre publicação em acesso aberto

Fonte: dados extraídos dos dados do Projeto SOAP171 (n=1.110)

171 Projeto SOAP <http://project-soap.eu/highlights-and-data-of-the-soap-survey-now-available/>. Acesso em

01mar.2011.

0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 90,0 100,0 retenção direitos autorais para OA

taxa de publicação penaliza instituições intensivas em pesquisa

pesquisa pública deve estar disponível publicamente sem barreira de acesso

não é benéfico para o publico geral ter acesso a pesquisas médicas e científicas

artigos OA são mais lidos e citados publicação OA debilita sistema peer-review publicação OA contribui para artigos de baixa qualidade publicação OA tem mais custo-efetivo e assim beneficiará

investimentos públicos em pesquisa

se os autores pagam taxa de publicação então menos dinheiro disponível para pesquisa

Lingüística, Letras e Artes (n=37) Engenharias (n=77) Ciências da Saúde (n=207) Ciências Sociais e Aplicadas (n=239) Ciências Humanas (n=108) Ciências Exatas e da Terra (n=176) Ciências biológicas (216) Ciências Agrárias (n=51)