• Nenhum resultado encontrado

Os movimentos para o acesso aberto

4 O ACESSO ABERTO À INFORMAÇÃO CIENTÍFICA

4.2 Antecedentes históricos

4.2.1 Os movimentos para o acesso aberto

Os movimentos para o OA à literatura científica surgiram no início dos anos 90 impulsionados pelos avanços nas tecnologias de informação e comunicação, conforme mostra a Figura 2. Do lado esquerdo da figura as iniciativas dos „arquivos abertos‟ e suas derivações e, do outro, os movimentos para o „acesso aberto‟ e seus desdobramentos. No centro, novas definições para os direitos autorais e modelos de negócios para editores científicos, que serão comentados em itens específicos mais adiante.

A iniciativa para os “arquivos abertos” estão centradas num escopo puramente tecnológico, ou seja, a criação de ferramentas e arranjos estruturais para acomodar arquivos digitais, enquanto o movimento para o acesso aberto busca a conscientização dos cientistas e demais atores envolvidos no processo de construção e disseminação do conhecimento científico para os benefícios que essas novas tecnologias trazem para o processo de comunicação científica e, conseqüentemente, para o avanço da ciência.

Figura 2 – Diagrama representativo das iniciativas para o acesso aberto Fonte: elaboração do autor

A primeira iniciativa de implantação dos arquivos abertos surgiu com o desenvolvimento do chamado arXiv destinado a armazenar e disponibilizar a literatura científica em ambientes digitais nas áreas da física e ciências afins. Essa iniciativa recebeu apoio da comunidade científica internacional, de bibliotecários e de outros segmentos da sociedade ligados à difusão do conhecimento científico como alternativa para a solução da “serial crisis” provocada pelos aumentos abusivos dos custos das assinaturas dos periódicos científicos.

Inspirado nessa iniciativa, em 1994, o professor de ciência cognitiva, Stevan Harnad, deu início ao movimento do acesso aberto com a chamada “proposta subversiva”. Essa proposta consistia numa posição radical a partir da premissa de que aos pesquisadores interessam apenas compartilhar suas idéias com a maioria possível de seus pares e ganhar visibilidade de seus papers. A principal motivação de Harnad baseou-se no preço das assinaturas das revistas científicas que se tornara um entrave para esse compartilhamento do conhecimento, e por isso, ele concluiu que na era da Internet não haveria necessidade dos pesquisadores se submeterem ao processo tradicional de publicação científica e conclamou-os a disponibilizarem seus artigos em ambientes de livre acesso na Internet, assim maximizar o impacto de suas idéias e mais efetivamente, alcançar “[...] os olhos e as mentes dos pares, colegas cientistas e pesquisadores no mundo todo.” (POYNDER, 2008).

Em 2001, a biblioteca pública de ciência, Public Library of Science (PLoS)40, lança um manifesto para incentivar os pesquisadores a publicarem fora dos meios tradicionais nos quais os editores não aceitem que cópia dos artigos, após seis meses de sua publicação, sejam arquivados paralelamente em servidores de livre acesso. Não obtendo os resultados esperados, a PLoS boicota os editores comerciais e faz o lançamento de sua própria editora.

Em 2002, a Budapest Open Access Initiative (BOAI)41 estabelece os fundamentos do que se tornará o movimento em favor do acesso aberto: disponibilização on line, gratuita e sem restrições de acesso aos resultados de pesquisa. Para isso são propostas duas estratégias complementares: por um lado, o auto-arquivamento de papers em arquivos abertos, segundo o modelo arXiv; e por outro, a criação de revistas alternativas e apoio às revistas existentes que desejarem direcionar-se para esse novo modelo. O propósito da BOAI foi acelerar o progresso no esforço internacional para tornar os artigos de todos os campos acadêmicos disponíveis na Internet. Nesse encontro foram discutidos muitos pontos de vistas e os participantes exploraram como as iniciativas isoladas poderiam trabalhar juntas para alcançar amplo, profundo e rápido sucesso.

Mais tarde, em 2002, o modelo arXiv foi objeto de discussão na Convenção de Santa Fé, Novo México-EUA, ao qual foram incorporados dispositivos técnicos que permitem a interoperabilidade dos diferentes arquivos pelo chamado Protocol for Metadata Harvesting (OAI-PMH)42. Nessa mesma Convenção foram estabelecidas as condições de criação de repositórios institucionais, nos quais todo manterial técnico-científico de determinada

40

< http://www.plos.org/>

41 BOAI. Disponível em: <http://www.soros.org/openaccess>. Acesso em: 21 dez. 2009. 42 <http://www.openarchives.org/>

instituição de ensino e pesquisa poderia ser armazenado e colocado à disposição dos interessados.

Em outubro de 2003, a Declaração de Berlim43 promove a Internet como um instrumento funcional para a base do conhecimento científico global e estabelece medidas para as quais os agentes públicos - instituições de pesquisa, agências de financiamento à pesquisa, bibliotecas, museus - necessitam adotar. Dentre elas, o mandato de armazenamento da literatura científica produzida com recursos públicos, em repositórios digitais interoperáveis e de amplo acesso à sociedade.

No Brasil, várias manifestações em apoio a esse movimento foram conduzidas pela comunidade científica brasileira, dentre as quais destacam as declarações de São Paulo, Florianópolis, Salvador e do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT. Esta foi lançada em setembro de 2005 como o “Manifesto Brasileiro de Apoio ao Acesso Livre à Informação Científica”. Na mesma época, no âmbito do 9º Congresso Mundial de Informação em Saúde e Bibliotecas, foi elaborada a “Declaração de Salvador sobre o Acesso Aberto: a perspectiva dos países em desenvolvimento”; em dezembro de 2005 um grupo de professores, pesquisadores, bibliotecários, alunos, cidadãos e representantes de organizações da sociedade civil brasileira mostraram apoio por meio da “Carta de São Paulo” e, em 2006, a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (ANPEPP) lança, em seu congresso, a “Declaração de Florianópolis”.

Para consolidar o compromisso do Brasil em apoio à essas manifestações, em 2007 foi apresentado ao Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 1120/200744, que estabelece como parâmetros para uma política nacional de acesso livre à informação os seguintes preceitos:

 todas as instituições de ensino superior públicas (IES), assim como as unidades públicas de pesquisa, ficam obrigadas a criar repositórios digitais, segundo o modelo internacional proposto pela Iniciativa dos Arquivos Abertos (OAI), ou seja, esses repositórios devem incorporar um protocolo de interoperabilidade por meio da exposição de metadados dos documentos de acordo com o padrão internacional estabelecido por essa iniciativa;

43 Declaração de Berlin. Disponível em: <http://oa.mpg.de/openaccess-berlin/berlindeclaration.html>. Acesso

em: 21 dez, 2009.

44 Este PL foi arquivado em janeiro de 2011 em função da nova legislatura. Petição pública para

 toda produção técnico-científica dos alunos e professores dessas IES deve ser armazenada nesses repositórios. Aquela que envolve materiais protegidos por patentes ou passíveis de patenteamento deve estar disponível tão logo cesse essa proteção;

 todos os pesquisadores que recebem recursos públicos para o desenvolvimento de suas pesquisas científicas são obrigados a depositar cópia de suas publicações no repositório de sua instituição, sob pena de tornarem-se inelegíveis na captação de novos recursos públicos;

 a responsabilidade pela integração, consolidação e disseminação dos repositórios na rede mundial de computadores ficará a cargo da União. A proposta de uma política nacional de acesso livre à informação será objeto de discussão nos principais segmentos da comunidade científica.

Embora esse PL tenha tramitado com êxito em várias comissões do Congresso Nacional, foi indevidamente arquivado pela Câmara dos Deputados em razão da nova legislatura. Petição pública, elaborada por Hélio Kuramoto (IBICT), um dos principais defensores do acesso aberto no Brasil, solicita seu desarquivamento para a devida reativação das discussões e encaminhamento para aprovação.45