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Os direitos autorais e de copyright

4 O ACESSO ABERTO À INFORMAÇÃO CIENTÍFICA

4.2 Antecedentes históricos

4.2.3 Os direitos autorais e de copyright

Os direitos autorais são mecanismos legais de proteção aos criadores e suas obras por meio da lei de propriedade intelectual, sejam invenções, marcas e patentes, sejam obras literárias, artísticas ou desenho arquitetônico.

O direito autoral advém do direito francês e o copyright do direito anglo-saxão. O direito de autor defende os direitos morais do autor e o copyright compreende apenas os direitos patrimoniais (MEDEROS, 2007, grifo nosso). Nesse sentido, o direito de autor difere do copyright, enquanto aquele se relaciona à pessoa do direito, ou seja, o autor, este se relaciona ao objeto do direito, ou seja, a obra. O direito de autor tem por escopo fundamental a proteção do criador (direito de autoria e de integridade da obra) e, o copyright protege a obra em si, ou seja, o produto, dando ênfase à vertente econômica, à exploração patrimonial das obras através do direito de reprodução, tradução, adaptação e representação. O direito de autor, no entanto, poderá colocar a obra à disposição do público a título oneroso ou gratuito53.

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RCUK (Research Councils UK <http://www.rcuk.ac.uk/cmsweb/ownloads/rcuk/documents/2006statement. pdf>. Acesso em: 22 jun.2010.

50 A SPARC é uma aliança internacional de bibliotecas de pesquisa e acadêmica para equilibrar o sistema de

publicação cientifica.

51

Disponivel em: <http://www.arl.org/sparc/about/index.shtml >. Acesso em: 19 maio 2009.

52 Ducth SURF Foundation <http://www.surf.nl/>

Com o surgimento da Internet e a possibilidade ampla de compartilhamento e disseminação rápida da informação, as tradicionais leis de propriedade intelectual tornaram-se entraves na realidade atual. De proteção ao criador, os tradicionais mecanismos passaram a ser objeto de manipulação e especulação nas mãos de grandes empresas, principalmente daquelas dedicadas ao ramo editorial com fins lucrativos. Para Willinsky (2002), o modelo de negócio baseado em taxas de assinatura corre contra o espírito da lei de copyright, a qual é designada para proteger os interesses dos criadores e do público leitor, principalmente no que diz respeito à possibilidade de ampla audiência formada pelos potenciais leitores.

Ao submeter os originais de pesquisa para publicação geralmente o autor é obrigado a transferir os direitos de copyright de sua obra para a editora. O argumento das editoras é que nesse processo de transferência tanto o autor quanto sua obra serão protegidos por elas. Na realidade a única “proteção” que um autor recebe de uma editora, nesse contexto, é a garantia do registro de sua obra e, conseqüentemente, a prioridade nas descobertas, embora existam outras formas para garantir esse direito por meio das redes de comunicação informal que une colegas e rivais no mundo inteiro (ZIMAN, 1972).

Para Harnad (1998), o pesquisador teme o plágio de seu trabalho, mas não o fato de ter seu texto apropriado indevidamente como alegam as editoras. Para Willinsky (2002), o interesse dos autores é assegurar que seus trabalhos sejam reconhecidos como de sua autoria quando citados, mas não impedir que sejam reproduzidos ou lidos. O autor, portanto, espera que o direito autoral o proteja contra plágio, mas não contra o acesso ou reprodução de texto (MUELLER, 2006).

A maioria dos autores, segundo Mederos (2006), seja de uma publicação científica, de uma obra literária, de uma composição musical ou de um quadro de belas artes, sente-se reconfortado quando a sociedade dispõe de sua criação. É justo que a sociedade o recompense por seus esforços, entretanto não é justo que esses esforços sejam manipulados e estagnados em benefícios de terceiros. Limitar a reprodução e a disseminação de um material na sociedade traz conseqüências negativas para ambas, uma vez que sem contato com a obra o autor não é reconhecido pela sociedade, e esta, não compartilha dos potenciais benefícios advindos das novas descobertas.

O direito autoral não pode se converter em obstáculo para o progresso científico e tecnológico e nem favorecer o enriquecimento acelerado de uma minoria. O direito autoral deve proteger o autor contra as práticas de plágio e ao mesmo tempo garantir que interesses particulares não interfiram na livre e ampla circulação da obra na sociedade.

O acesso universal aos resultados de pesquisa científica e tecnológica é possível através da Internet; entretanto, nossos sistemas jurídicos e sociais nem sempre permitem que a idéia seja realizada. O copyright foi criado muito antes do surgimento da Internet, o que torna difícil desfrutar de todo potencial da rede mundial de computadores. A configuração padrão do direito de autor requer permissões explícitas para realizar o acesso universal54.

Para dar resposta a essas contradições do copyright, várias iniciativas de caráter cooperativo surgiram nos últimos anos. A primeira remonta à década de 70, com o desenvolvimento do software livre pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) por meio do compartilhamento dos códigos fontes dos programas de computador, permitindo que qualquer pessoa interfira na criação, seja modificando ou desenvolvendo novos programas a partir das bases anteriores. O projeto GNU Operating System (sistema operacional apoiado em software livre)55 concebido em 1983, por Richard Stallman, deu consistência ao modelo do MIT e estabeleceu os princípios do que seria o software livre56. Com base nesses princípios nasce uma organização sem fins lucrativos dedicada ao desenvolvimento de softwares, chamada Free Software Foundation (FSF). Mais tarde, uma combinação de sistemas deu origem a GNU/Linux. A partir daí vários indivíduos, grupos de usuários e companhias começaram a reunir e compilar estas aplicações em formatos determinados. Em 1998, o termo software livre passou a denominar-se Open Source Software (Software de Fontes Abertas), culminando na Iniciativa de Fontes Abertas (Open Source Initiative) (MEDEROS, 2006).

Com o progressivo aumento de cooperação nessas iniciativas foi necessário desenvolver-se mecanismos de proteção desses novos princípios para evitar que os avanços conquistados acabassem sendo controlados por corporações com fins lucrativos, como aconteceu com o copyright. Foi assim que nasceu o copyleft, que traduzido literalmente, significa “direitos de cópia” (WIKIPÉDIA, 2009).

O copyleft (all rights reversed) nasceu como um mecanismo opositor ao copyright (all rights reserved) e deu origem a vários tipos de licenças, seja em relação a programas de computador, seja na literatura, na música ou na arte. Toda obra sob uma licença copyleft requer que suas modificações ou extensões da mesma, sejam livres, passando adiante a

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Creative Commons <http://creativecommons.org/about>. Acesso em 14 fev.2011.

55 Projeto GNU <http://www.gnu.org/gnu/gnu-history.html>. Acesso em 24 dez. 2009.

56 Software livre (liberdade) não deve ser confundido com software grátis (preço). Liberdade, no caso específico,

quer dizer que os usuários estão livres para utilizar o código fonte do software, modificá-lo e desenvolver um novo a partir deste e compartir com seus colegas, desde que mantido os mesmos princípios de não restrição dos trabalhos derivados.

liberdade de copiá-la e modificá-la novamente. O copyleft é uma forma de usar a legislação de proteção dos direitos autorais com o objetivo de retirar barreiras à utilização, difusão e modificação de uma obra criativa devido à aplicação clássica das normas de propriedade intelectual (WIKIPÉDIA, 2009)57.

Atualmente existem vários projetos que seguem a filosofia do copyleft. Embora o copyleft tenha nascido para compartilhamento de programas de computador (software), outras criações como obra de arte, livros, uma pintura exigem adaptações de acordo com seu contexto.

Na perspectiva do acesso aberto à literatura científica, o uso dos direitos autorais está sendo direcionado para as licenças flexíveis estabelecidas pela Creative Commons (CC)58 e suas derivações para orientar, apoiar e assegurar a retenção dos direitos do autor no momento da publicação de seus artigos em revistas científicas. Seu objetivo é facilitar as formas de licenciamento para poder compartir criações em rede.

Para facilitar o intercâmbio das obras na Internet foram criados os sistemas de metadados, que descrevem e identificam o tipo de licença da obra, permitindo que os mecanismos de buscas associem cada obra com seu tipo de licença. Essas licenças originam- se da licença GNU/GPL59 e são em torno de 4, porém podem combinar-se entre si até alcançar um total de 11. As quatro licenças principais são, de acordo com Vercelli (2003):

 atribuição – permite a outros copiar, distribuir, exibir e executar o trabalho e trabalhos derivados deste (o único crédito é para o autor correspondente);

 não comercial – permite a outros copiar, distribuir, exibir e executar o trabalho e outros trabalhos derivados destes apenas com propósitos não comerciais;

 sem trabalhos derivados – permite a outros copiar, distribuir, exibir e executar apenas cópias do trabalho, mas não permite trabalhos derivados deste;

 compartilhar sob condições similares – permite a outros distribuir trabalhos derivados sob condições de uma licença idêntica à licença que regeu o trabalho.

A CC possui entre suas metas principais, a criação de um espaço que promova, facilite e garanta o intercâmbio coletivo de obras e trabalhos de artistas, cientistas e criadores de

57 Wikipédia <http://pt.wikipedia.org/wiki/Copyleft>. Acesso em: 29 dez. 2009. 58

Creative Commons é um projeto sem fins lucrativos que disponibiliza licenças flexíveis para obras intelectuais. Mais informações no endereço: <http://www.creativecommons.org.br/index.php? option=com_content&task=view&id=122&Itemid=1 >. Acesso em 13 maio 2009.

59 GNU/GPL (GNU General Public Licence) <http://www.gnu.org/copyleft/gpl.html>. Acesso em: 24

programas de computador, como forma de proteger uma cultura da liberdade, baseada na confiança de poder facilitar intercâmbios criativos comunitários (VERCELLI, 2003).

A Scholarly Publishing and Academic Resources Coalition (SPARC)60, em conjunto com a Creative Commons e a Science Commons têm estimulado a emergência de novos modelos de comunicação científica para expandir a dimensão da pesquisa científica e reduzir as pressões financeiras sobre as bibliotecas61. Assegurar a retenção dos direitos autorais e, com isso, permitir que os autores escolham o meio mais apropriado para disseminação e uso de seus trabalhos é o principal objetivo dessas organizações. Por meio do Author Addendum62, instrumento legal que modifica os acordos dos editores, a SPARC orienta os autores sobre os procedimentos legais para assegurar seus direitos e arquivar cópias de seus artigos em ambiente online.

Desde 2007, a revista Nature, uma das mais conceituadas publicações científicas no mundo, adota a licença Creative Commons para os artigos relacionados ao genoma humano. A licença permite que as versões em PDF e HTML dos artigos sejam reutilizadas e dá liberdade ao usuário para copiar, distribuir, transmitir e adaptar a contribuição, desde que atendendo a propósitos não-comerciais, sujeitos às mesmas ou a similares condições e atribuições da licença.

No contexto acadêmico-científico, porém, existe um projeto específico derivado do Creative Commons denominado Science Commons63. O propósito desta iniciativa é exatamente explorar os mecanismos jurídicos e técnicos para remover as barreiras que possam impedir o compartilhamento de informações científicas em acesso aberto.

A licença Science Commons amplia a fisolofia e a metodologia da CC para a pesquisa científica no mundo. Parte de suas atividades é servir como “engenheiros sociais” para os cientistas e criar caminhos técnicos e legais para acelerar e compartilhar o acesso à ciência em domínio público.

A diferença de propósito entre as licenças Criative Commons e a Science Commons é que aquela foca sobre a criação individual e seus copyrights, enquanto esta tem um foco de abordagem mais amplo. Foca sobre a inacessibilidade de artigos de revistas científicas, sobre as ferramentas que estão por trás dos complexos contratos entre pesquisadores e editores; licenças de patentes socialmente irresponsáveis e dados obscurecidos pela tecnologia ou

60 A SPARC é uma aliança internacional de bibliotecas de pesquisa e acadêmica para equilibrar o sistema de

publicação cientifica.

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Disponivel em: <http://www.arl.org/sparc/about/index.shtml >. Acesso em: 19 maio 2009.

62 Disponível em: <http://www.arl.org/sparc/author/addendum.shtml>. Acesso em: 19 maio 2009. 63 Ver seguinte endereço para mais informações <http://sciencecommons.org/ >. Acesso em 14 maio 2009.

acordos de licença para usuários. A Science Commons está sendo desenvolvida sob três perspectivas: a publicação protegida por copyright; a licença protegida por patente e contrato; e dados, que nos EUA são protegidos apenas por contrato. Os acordos entre financiadores e detentores de grant, entre universidades e pesquisadores e entre financiadores e universidades são alvos dessa licença (LESSIG, 2005).

A Science Commons possui ferramentas como a Scholar’s Copyright Addendum Engine que auxiliam os pesquisadores a auto-depositarem seus artigos em repositórios de acesso aberto. Como a maioria dos jornais possui licença distinta de auto-arquivamento, essa ferramenta foi desenvolvida para ajudar os pesquisadores a negociar os direitos que precisam para usar e distribuir o trabalho, eliminando confusão e dúvida quando e onde tornar seus artigos disponíveis para o mundo64.

Nesse cenário de ação compartilhada para assegurar o acesso universal à informação científica, várias revistas de acesso restrito já permitem alguma forma de acesso aberto aos seus conteúdos, seja livre ou com custo de publicação para o autor ou por algum período de embargo pela editora.