• Nenhum resultado encontrado

2 Revisão da literatura

3.6 Coleta dos dados

3.6.2 Observação direta

A observação direta é um dos métodos mais utilizados na coleta de dados em estudos qualitativos para apreensão de comportamentos dos indivíduos (ZANELLI, 2002). Essa técnica permite observar o que as pessoas estão fazendo, como elas fazem, seus padrões de respostas e conduz o pesquisador a prestar atenção nas ocorrências, eventos e interações (CARSON et al., 2005). Segundo Carson et al. (2005), o uso da observação direta para melhor compreender o comportamento pode ser aplicado a diferentes objetivos. Entre eles, analisar os comportamentos

espontâneos, a percepção de atitudes não verbais (ZANELLI, 2002), o realismo da situação estudada (GUNTHER, 2006), entre outros.

A observação direta também se refere à participação efetiva do pesquisador no campo, necessária para se compreender com profundidade as nuances do fenômeno em análise (CARSON et al., 2005). Segundo Zanelli (2002), a observação direta coloca o pesquisador no cenário de forma que ele possa se familiarizar com o ambiente e entender a complexidade psicossociais dos integrantes, que algumas vezes o próprio indivíduo não tem consciência que orientam o seu comportamento (ZANELLI, 2002). Além disso, essa inserção possibilita que o investigador e os participantes desenvolvam um relacionamento e confiança, necessários para estes últimos revelarem "os bastidores das realidades" de sua experiência, que geralmente são escondidos de estranhos (PATERSON; BOTTORFF; HEWAT, 2003).

Nos estudos do marketing, a revelação dessas experiências tem um importante papel para compreender o comportamento dos indivíduos em situações de compra. Assim como Carson et al. (2005) comentaram, analisar o comportamento do consumidor em algum contexto ou circunstancia específicas de consumo permite aprofundar o entendimento em torno das ações das pessoas, objetivas e subjetivas, protagonizadas em determinados momentos de consumo. Como por exemplo, obter e registrar as reações dos consumidores, a visualização das suas respostas aos estímulos, ou das suas reações emocionais durante as interações com os provedores de serviço (FERREIRA; TORRECILHA; MACHADO, 2012).

Nesse sentido, a possibilidade de obter uma compreensão mais aprofundada do comportamento dos indivíduos pela observação direta permite a captação de informações por vezes não apreendidas por outros métodos, o que leva a ocupar um papel mais amplo e integrativo com outros procedimentos metodológicos (FERREIRA; TORRECILHA; MACHADO, 2012). Tendencialmente, a integração ocorre com o uso das entrevistas. De acordo com Tjora (2006), entrevistas e observação são técnicas interativas, visto que a entrevista conduz o pesquisador para a observação, enquanto que as observações podem sugerir os aprofundamentos necessários para as entrevistas. Perguntas posteriores derivadas da observação podem ser feitas tomando por base informações referentes aos estilos dos participantes, a comunicação e como eles interagem uns com os outros, além de poder documentar processos

fisiológicos e psicológicos durante a investigação (PATERSON; BOTTORFF; HEWAT, 2003; FERREIRA; TORRECILHA; MACHADO, 2012).

Seguindo os apontamentos Tjora (2006), nesta tese, a observação direta não participante foi utilizada em conjunto com as entrevistas, sendo esta última considerada para apreender as experiências dos consumidores e da sua relação com a imagem de sustentabilidade do destino, enquanto que a observação foi desenvolvida com o propósito de captar informações relacionados ao contexto de interação, para conhecer os potenciais participantes, para entender o comportamento dos consumidores a determinados estímulos e para avaliar as reações fisiológicas e psicológicas às perguntas durante as entrevistas (PATERSON; BOTTORFF; HEWAT, 2003). Entretanto, assim como as entrevistas, a observação possui uma sistematização específica, que lhe garante a denominação de observação cientifica e a validade de seus resultados.

Torna-se importante, então, apresentar as classificações que delimitam os tipos de observação e qual a utilizada neste estudo. A primeira forma de classificação se refere a natureza da participação do pesquisador ou do uso de meios mecânicos (suportes eletrônicos). Na observação não participante, o pesquisador permanece alheio à comunidade ou processo ao qual está pesquisando, tendo um papel de espectador do objeto observado (GIL, 2006). Já na observação participante, o observador torna-se parte da situação a observar, o comportamento verbal e não verbal dos participantes, de seu meio ambiente, das anotações que ele mesmo fez quando no campo, de áudio e vídeo disponíveis, entre outros (MOREIRA, 2004).

Outra forma de classificação está relacionada à existência ou não de um protocolo de observação, cuja delimitação define se é estruturada, semi-estruturada ou não estruturada, ou seja, o pesquisador pode ir a campo com um roteiro previamente estabelecido ou sem ele (FERREIRA; TORRECILHA; MACHADO, 2012). A observação estruturada pressupõe a existência de um protocolo no qual são listados fatores específicos para serem observados em campo. A observação não estruturada, por sua vez, não possui um foco específico pré-concebido para ser observado. Já na observação semi-estruturada, o observador define algumas categorias de observação, porém mantém-se aberto à formação de novas categorias. A observação não estruturada, na qual o observador age livremente observando e decidindo o que pode ser significativo para a pesquisa, não é a mais indicada para estudos científicos (GIL, 2006).

Uma terceira classificação define a observação como natural ou artificial dependendo do ambiente em que é realizada. No primeiro caso, por vezes, podem ser percebidos pontos do fenômeno que não seriam evidenciados fora do campo natural (CANO; SAMPAIO, 2007). A observação no ambiente artificial requer a construção de um cenário onde as características podem ser alteradas para que sejam avaliadas como uma ‘experiência’ (CARSON et al., 2005). Neste caso, têm-se que o pesquisador deve construir objetivos prévios à pesquisa e realizar uma observação controlada (BORTOLI; TEIXEIRA, 1984; CANO; SAMPAIO, 2007; BELEI et al., 2008). Esse tipo de observação sistemática permite a produção de dados quantitativos, o que não é o foco desse estudo.

Portanto, nesta tese se utilizou a observação participante, realizada diretamente pela pesquisadora, ocorrida no ambiente natural de consumo, cujo foco foi registrar aspectos da prestação de serviços e das reações dos consumidores durante as entrevistas, e semi-estruturada, a partir de um roteiro pré-determinado, mas com caráter flexível para permitir que fossem incluídos outros aspectos a serem observados durante a pesquisa. O roteiro utilizado, contendo a lista dos principais aspectos do contexto de investigação, encontra-se no Apêndice B.

Além da definição do tipo de observação utilizada, para garantir o caráter científico deste estudo, Reyna (2005) também aponta a importância de apresentar o processo da observação, que contempla cinco componentes: o objeto de observação, o sujeito de observação, as condições de observação, os meios de observação e o sistema de conhecimentos a partir do qual formula-se o objetivo da observação. O objeto de observação se refere ao fenômeno em análise, o que deve ser observado. Nesse estudo, trata-se da experiência de consumo do indivíduo quando ocorre a co- criação e a imagem de sustentabilidade do destino resultante.

Com relação ao segundo componente, o sujeito da observação, utilizou-se os sujeitos de pesquisa apontados na seção 3.4, os consumidores de um cluster criativo de turismo que participaram ou tiveram a oportunidade de participar de uma atividade co-criada. Já em relação as condições de observação, que dizem respeito ao contexto no qual o objeto se manifesta, aqui foram analisadas as interações entre os turistas, os prestadores de serviço, a comunidade e outros turistas de um cluster criativo de turismo (o sítio histórico de Olinda).

Sobre os aspectos da prestação de serviços, em relação à interação ente os consumidores e os ofertantes, foram observados fatores que capacitaram a participação do indivíduo na

construção da experiência (a co-criação), mais precisamente sobre as visitas realizadas no Alto da Sé, especificamente: a visita a igreja, aos mercados de artesanato, ao centro de agremiação carnavalesca e a experiência com a culinária local (há feirantes vendendo comidas típicas no entorno). Adicionalmente, também foi observado a visita realizada no atelier do artista Silvio Botelho, que não se localiza no Alto da Sé, mas é um importante ponto do roteiro turístico da região. As questões avaliadas foram: a troca de informações e explicações sobre o ambiente, a capacidade e competência dos guias e atendentes das empresas, recursos tecnológicos e processuais para incentivar a co-criação (sinalização, workshops); cortesia/atenção no atendimento, orientações sobre procedimentos de segurança e conservação (CARSON et al., 2005), as reações dos consumidores aos estímulos, como gestos, nível de atenção/euforia, tom de voz, dilatação da pupila e expressões faciais, que também foram analisados durante as entrevistas (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007).

Quanto aos meios de observação, as informações foram registradas em notas de campo, por instrumentos que auxiliaram a pesquisadora, como blocos de anotações e caneta e instrumentos eletrônicos, como tablet e celular. Na tentativa de garantir uma maior exatidão sobre os dados observados, também foram utilizados instrumentos eletrônicos, como câmeras portáteis digitais. Vale destacar que as notas de campo foram escritas concomitantes à observação, para que não se perdesse nenhum registro importante. Como sugere Merriam (1998), nesse momento, as notas de campo devem ser escritas sem a preocupação com aspectos formais da linguagem, mas sim com a essência dos apontamentos.

Com relação ao último componente, o sistema de conhecimentos, seguiram-se as diretrizes já traçadas pela revisão da literatura apresentado na descrição das entrevistas, referente aos aspectos centrais extraídos dos principais conceitos adotados: a experiência, delimitada pela perspectiva hedônico/utilitária do consumo; a co-criação pelo valor em uso (RANJAN; READ, 2014), a alocação de recursos pessoais na tarefa (tangíveis e intangíveis) e o aprendizado resultante (CHATHOTH et al., 2013); a sustentabilidade pela perspectiva da proteção e conservação dos recursos culturais, sociais, ambientais e patrimoniais, e; a imagem do destino, a formada após a experiência (GARTNER, 1993).

Cabe ressaltar ainda que, sobre a participação direta da pesquisadora na observação, Martins (2005) aponta que existem níveis diferentes de participação, podendo o pesquisador

desde apenas assistir ou até agir na situação objeto da observação. Nesta tese a participação direta da pesquisadora no campo seguiu as orientações de Merriam (1998), a qual sugere que o processo de coleta de dados por meio da observação pode ocorrer em três estágios: a) entrada, b) coleta dos dados, e c) saída. A entrada no campo foi feita por meio da apresentação pessoal da pesquisadora aos potenciais entrevistados (quando a abordagem foi individual) e ao proprietário da agencia de receptivo, com a posterior apresentação da mesma para os turistas. Na fase de coleta de dados, houve uma aproximação maior com os respondentes, em que foi negociado o acompanhamento real da pesquisadora com os consumidores em algumas das atividades turisticas. O objetivo nesta etapa foi adquirir a confiança e aceitação da pesquisa junto aos potenciais respondentes, como também observar a parte operacional da prestação de serviços das empresas. Na saída do campo ficou acordado o tempo que a observação seria realizada para deixar os turistas mais a vontade em suas atividades.

Após a avaliação dos métodos de coleta de dados, a seção seguinte aborda o tipo de análise dos dados.