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Foto 31 – Orquestrim – 1

5.2 Processos de ensino e aprendizagem nas Oficinas do Conexão

5.2.7 Orquestrim

Trata-se de um Grupo instrumental formado por alunos de todas as Oficinas de Música do Conexão. No entanto, não estão presentes todos os alunos das Oficinas e sim apenas os que são eleitos pelos professores para desempenharem as atividades musicais junto ao Grupo. A formação do Grupo compreende instrumentos de Percussão, Sopro e a Rabeca.

Os motivos pelos quais alguns alunos são chamados para o Orquestrim, e outros não, estão relacionados ao grau de intimidade e certo domínio instrumental que o jovem tem com seu instrumento e outros nem tanto e, por isso mesmo, não participam da formação.

Nos instrumentos de Percussão estão a Alfaia, Zabumba, Pratos de tamanhos diferentes, Pandeiros, Triângulos, Ganzás e Caxixi. Já os instrumentos de Sopro estão compreendidos as Flautas (Doce, Pífaro e Transversal), Clarinete, Saxofone, Trompete, Trombone de vara, Bombardino e Bombardão.

Foto 31 - Orquestrim - 1

Foto 32 - Orquestrim - 2

Fonte: O autor (2016).

Anterior a esta formação existia o Conexão Rabeca, composto primordialmente por Rabecas, depois Flautas Doce e Pífaro, instrumentos de Percussão e, por vezes, Berimbaus. Porém, a ONG viu a necessidade e decidiu modificar a estrutura da massa sonora do Grupo. Nesse sentido e em relação à mudança, a textura sonora com a entrada dos Metais foi ampliada, onde o Conexão Rabeca deixou de existir e deu lugar a uma transformação que apresentou questões de diversas ordens, como a própria massa sonora, novidade de timbres, quantidade de alunos, mudanças técnicas e adaptações na forma de tocar instrumentos que também foram implicações nas Oficinas de Rabeca e Flautas (informação verbal)75.

Quando, em entrevista, perguntamos a Fabrício Cardoso o que representou a entrada dos instrumentos de Metais no seio para tocar junto com as Rabecas, a que nos respondeu dizendo: “a gente teve ganhos e perdas, na verdade” (informação verbal)76.

Nos ensaios que acompanhamos foi perceptível a soberania sonora dos Saxofones, Trombones, Trompete e Tuba (aproximadamente 6 Metais) sobre um grupo de 12 Rabecas, a média presente.

Nessa discussão, Abner Moabe apresenta seu entendimento a respeito:

Foi muito de uma experiência da Rabeca junto com o Projeto Villa-Lobos. Por conta dessa experiência de tocar junto com a Orquestra Popular Tuhu77 75Informação fornecida por Carlos Zens, Osawa Gaudêncio, Fabrício Cardoso, Abner Moabe e Leonardo Santos,

na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015.

76Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015.

77Para maiores informações sobre a Orquestra Tuhu do Projeto Villa-Lobos e as crianças, acessar:

[...]. E assim, eu acho que, às vezes, funciona em alguns momentos. Porque se fosse pra criar algo maior, talvez seria mais interessante, até pela proposta do Projeto, ser incluído de repente uma Viola, um Acordeon... Algo que tivesse um pouco mais haver. Não que os Sopros não tenham (informação verbal)78.

Abner Moabe apresenta que entende a inserção dos instrumentos de Sopro no Projeto, porém a quantidade deles é grande e, juntos com as Rabecas, não fazem com que ela não seja percebida como antes (informação verbal)79. Ainda comenta que, se os alunos desses

Instrumentos já tivessem maiores habilidades se poderia ouvir mais a Rabeca e nessa percepção diz que:

Olhando por uma questão técnica mesmo [...] a maioria não tem a questão da dinâmica... Às vezes, você ter a habilidade de tocar, de amenizar um pouco mais. Ainda mais quando a gente toca num canto aberto, principalmente. [Pois] existe uma diferença de tocar com pessoas que tem uma técnica maior que vão conseguir fazer a coisa realmente... fazer com que a Rabeca consiga aparecer no meio. E Metal tá só ali fazendo a caminha pra [sic] Rabeca [...]. Mas, ainda soa muito gritante. [...] e eu sempre pensei que os Sopros fariam a harmonia pra [sic] Rabeca fazer o solo e aparecer (informação verbal)80.

Quanto a isso, Fabrício Cardoso diz que: “também não dá pra [sic] colocar uma criança num processo e deixar ela como base pra [sic] o outro aparecer, entende?” (informação verbal)81. Abner Moabe se refere a questões ligadas aos papeis e funções dos

instrumentos em cada Grupo, tomando como exemplo “a característica principal da Tuba em uma orquestra” (informação verbal)82. Nesse ponto, Abner Moabe defende a ideia da prática

de uma orientação no sentido de funções de cada instrumento do grupo em um arranjo, onde “cada um deve ter seu espaço determinado em uma música” (informação verbal)83.

Além dessas questões há uma que está relacionada com o processo anterior onde todos os instrumentistas – flautistas e rabequeiros – tocavam uma mesma melodia em uníssono. E, pela quantidade de Flautas Pífaro, na época, ser menor que a quantidade de Rabecas, todos estavam satisfeitos por poderem se ouvir – onde as dificuldades eram de outras ordens. Fabrício Cardoso fala que:

78Informação fornecida por Abner Moabe, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 79Informação fornecida por Abner Moabe, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 80Informação fornecida por Abner Moabe, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 81Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 82Informação fornecida por Abner Moabe, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 83Informação fornecida por Abner Moabe, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015.

[...] E tem uma coisa do desejo do Grupo, que a gente sempre tocou um repertório muito igual, né? Mesmo repertório quase que sempre e a gente só mudava quando vinha algum artista e tinha que tocar junto. E vontade era de fazer um resgate de músicas mais antigas do Boi... pra [sic] tocar Rabeca. Pegar alguma coisa do cavalo-marinho pra [sic] ficar mais específico pra [sic] em algum momento apresentar tecnicamente da Rabeca (informação verbal)84.

Porém, esse trabalho de pesquisa deles encontrou uma realidade que fez com que repensassem essa empreitada. O rabequeiro diz que “com a chegada dos meninos do Sopro a gente não pode aumentar [o repertório] e deixar os outros pra [sic]trás” (informação verbal)85.

Notamos aqui uma situação na qual esses ex-alunos tiveram que brecar, pelo menos por tempo indeterminado, o avanço da ampliação de um repertório mais aprofundado baseado nas músicas de brincadeiras de tradição oral.

Apesar disso, Fabrício Cardoso diz que: “a Rabeca continua sendo o carro-chefe, a linha de frente e talvez só mais na questão de som que aí tá compartilhando espaço agora, né?” (informação verbal)86, concordando com Abner Moabe quanto à questão da técnica que

os alunos iniciantes não tem. “O Conexão não tá aí pra [sic] pensar só na Música, né? Tá aí pra [sic] Educação e a gente não bate muito nessa tecla” (informação verbal)87.

Essa foi a realidade com a qual o músico Leonardo Santos se deparou ao chegar no Projeto e lidar com o ensino em grupo de Instrumentos de Banda de Música (como os Metais e Madeira), além da existência de um instrumento comum a folguedos de tradição e ainda mais com um repertório específico, base do trabalho no Conexão.

Em entrevista, Leonardo Santos diz que o tempo passa e ele ainda percebe que precisa se acostumar, que “é bem diferente do trabalho com Banda de Música” (informação verbal)88.

Pois,

Eu vim de uma realidade de Banda de Música de interior que tem um repertório voltado para tocar valsas, dobrados e músicas populares de uma forma mais geral. Eu não imaginava que fosse me deparar com uma situação diferente como essa do Conexão quando fui convidado por Carlinhos Zens (informação verbal)89.

84Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 85Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 86Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 87Informação fornecida por Fabrício Cardoso, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 88Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015. 89Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015.

Apesar dessa informação, perguntamos a Leonardo Santos se ele poderia nos apresentar pontos mais específicos das diferenças entre suas práticas com outras formações de bandas de Música e sua atuação no Orquestrim, o que nos esclareceu que não seria possível responder com algo especialmente objetivo, mas falou da sua trajetória de início de estudos em bandas de Música de interior, sua entrada na faculdade e seu retorno aos contextos das bandas, dessa vez, como mestre (informação verbal)90.

No entanto, quando recebeu o convite para atuar no Conexão sua reação foi de prontidão, mas não sabia ao certo qual seria a real situação. Até que, após entrar, compreendeu não ser bem diferente do que já havia feito. O que com estranhamento disse que se perguntou: “mas peraí... Será que vocês querem um professor com essas minhas características? O que as pessoas já me disseram é que ‘existe um patrimônio imaterial e o foco é preservar e continuar esse material’” (informação verbal)91.

A esse respeito Kleber (2006) diz que os objetivos dos dois projetos sociais que pesquisou são diferentes – Associação Menino do Morumbi em São Paulo (SP) e o Projeto Villa-Lobinhos no RJ. Porém, segundo Kleber (2006, p. 115), as instituições estudadas têm como objetivo comum “[...] congregar crianças e jovens, atingidos pela desigualdade social, em situação de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e a realização de um trabalho socioeducativo voltado para o exercício da cidadania”. Ou seja, se faz necessário que o profissional entenda cada ambiente de ensino como sendo ímpar, pois lhe exigirá certo esforço e dedicação para compreender as demandas específicas de cada público e poder atuar de forma a contribuir (SANTOS, 2001; ARROYO, 1999; GREEN, L., 2000).

Lembrando de quando chegou no Projeto e preocupado com o que seriam suas atribuições, Leonardo Santos já queria desenvolver suas atividades pensando trabalhar o repertório para apresentar resultados, quando se deparou com a informação (dada pela Coordenação) de que:“’não há um resultado. Não se espera um resultado’. Porque o que há, além da preservação desse patrimônio, é o processo; a construção de um todo’” (informação verbal)92.

Essa ideia é compartilhada pelo professor Carlos Zens, pois fazendo relação com outros ambientes escolares que ministra aulas de Flauta, diz que:“nessas escolas, a gente tem

90Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015. 91Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015. 92Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015.

que preparar o aluno pra [sic] tocar os recitais. Mas aqui não. Aqui num [sic] tem como o aluno tá pronto. Nem eu mesmo tô [sic]pronto. Não dá mesmo” (informação verbal)93.

Leonardo Santos diz que não existe uma estratégia em si para desenvolver as atividades educacionais: “O tempo todo a gente tá [sic] buscando uma estratégia. E ano após ano, as coisas mudam porque os meninos mudam” (informação verbal)94. Com essa

declaração, são confirmadas as falas de Fabrício Cardoso e Abner Moabe a respeito da não possibilidade de aprofundar na questão de repertórios. Ou seja, se há uma circulação contínua de novos alunos em todo o Projeto, o Orquestrim sempre apresentará uma característica de não continuidade que facilite esse aprofundamento.

A partir de informações como essas constatamos que, no Grupo, essas dificuldades causadas por uma questão de características técnicas referentes ao domínio de instrumentos (de Metais: bocais e palhetas), por parte dos alunos que são em sua maioria iniciantes. Porém, será que essa situação marca certa estagnação na procura por novos repertórios?

O repertório do Orquestrim é composto, principalmente, por músicas do Boi de Reis de Felipe Camarão, como: Pastorinho oh mano, O Jaraguá, A Burrinha, Trabalha Marujo, Despedida do Boi, Boi Tungão e Baile do Boi entre outras, como: Na chegada desta casa (MARINHEIRO, 2015), O trenzinho do caipira (Heitor Villa-Lobos), Essa ciranda (Lia de Itamaracá) e A Gia canta (Mestre Cícero da Rabeca).

Também há músicas de alunos mais antigos que, atualmente, atuam como professor de Rabeca, como A chegada do cavalo-marinho (Osawa Gaudêncio) e Rabeca Peixe-Boi (Osawa Gaudêncio) bem como a música Índios do Brasil (Mirele Taís), e uma composição comunitária (ou em grupo) denominada o Rap de Felipe Camarão (Carlos Zens e alunos). Em todas essas, após apresentadas a seus professores de Instrumentos e, esses últimos observarem e perguntarem a seus pequenos compositores da possibilidade de transcrevê-las para distribuir entre as demais Oficinas e elaborar arranjos instrumentais, entre os alunos e demais professores, as músicas foram trabalhadas com todos e com o Orquestrim (informação verbal)95.

É percebida nessa ação conjunta uma atitude de grandeza social, pois se levou em consideração a produção composicional espontânea desses alunos, em seguida, sendo apresentadas a outros de mesma e outras Oficinas, bem como a apropriação do Projeto como um todo tendo coparticipação inclusive dos professores.

93Informação fornecida por Carlos Zens, em sua residência, em Natal - RN, em setembro de 2015. 94Informação fornecida por Leonardo Santos, na sede do Conexão, em Natal - RN, em setembro de 2015. 95Informação fornecida por Carlos Zens, Osawa Gaudêncio, Fabrício Cardoso, Abner Moabe e Leonardo Santos,

O problema do não aprofundamento de repertório do Orquestrim, alegado por Abner Moabe e Fabrício Cardoso, pode afetar de modo a se poder dar continuidade em atividades do Grupo neste sentido. No entanto, também pode estar relacionada a questões de patrocínio (sem contar as distribuições internas de recursos) que não apresentam como suficientes para suportar as necessidades sem interrupções das anuais.

Na verdade, este motivo causa certa insatisfação por parte dos professores do Projeto porquê os resultados gera a quebra de processos. Pois

[...] quando a gente começa a ver que os alunos estão avançado... aí chega a hora de ter que ensaiar as músicas para o evento do final do ano. E que depois disso, todo mundo se dispersa. E aí, depois disso... no outro ano... alguns alunos vêm mas, a maioria não retorna mais por várias questões que a gente mesmo nem sabe. E mesmo esses que voltam, demoram a voltar (informação verbal)96.

Outro ainda comenta,

[...] Mas ainda bem que tem uns alunos que voltam pras [sic] aulas... porque se não, a gente tava [sic] acabado mesmo, viu? Teria que começar com todo mundo do zero mesmo. Esses que voltam, eles até ligam pra [sic] gente no meio do recesso, sabe? Mesmo assim, uns que ligam nunca mais nem vê. Por se mudarem do bairro ou pra [...] sei lá onde. Tem sido assim já faz uns anos (informação verbal)97.

Apesar de ter sido assim há alguns anos, identificamos que o Orquestrim também tem se mantido com as atividades de ensaios, apesar das dificuldades em lidar com questões que os desanimam pela não continuidade.