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Foto 31 – Orquestrim – 1

5.2 Processos de ensino e aprendizagem nas Oficinas do Conexão

5.2.3 A Oficina de Rabeca

5.2.3.1 Primeira aula de Rabeca

O professor de Rabeca, Osawa Gaudêncio, de acordo com o exposto por ele em entrevista, para a primeira aula da Rabeca, o aluno é apresentado a ele e logo fica sabendo das partes que compõem o Instrumento (voluta, espelho, alma, braço, cravilha, cordas e corpo acústico de uma forma geral). Em seguida, apresenta o arco, suas especificidades e composição (madeira, crina ou náilon) e explica que também faz parte do Instrumento.

Seguindo o raciocínio da aula, Osawa Gaudêncio explica que para se produzir som na Rabeca é necessário friccionar a parte da crina (ou náilon) do arco nas cordas da Rabeca. Percebe-se que, nesse momento, os alunos estão muito atentos na sua exposição, pois após sua fala ele demonstra um exemplo friccionando o arco na corda prima da Rabeca (corda mais aguda: nota mi32). Os alunos ficam se olhando uns para os outros e para o professor com

aspecto de surpresa e encanto.

Na continuidade da aula, cada um dos alunos recebe uma Rabeca para poderem experimentar as informações que acabaram de ser passadas pelo professor. Eles viram, ouviram e já desejam tocar. Esse é um momento no qual alguns alunos já pegam e tentam reproduzir sons de qualquer maneira, envolvidos pela emoção do contato instrumental. De outra parte, percebe-se também que outros perguntam ao professor como se deve segurar.

Nesse momento, o professor pede a atenção de todos e diz, em breves palavras, que cada um pode segurar a Rabeca e o arco como acharem melhor, pois o importante é tirar som. O professor interage com os alunos dizendo que:“toque como tocar, tirando som é o que importa” (informação verbal)33.

Quase que imediatamente à fala do professor em relação a tocarem como quiserem, os alunos já pedem que ele toque novamente para que eles possam ver como se toca. Então, primeiro ele repete as informações iniciais e toca. O professor continua repetindo por um bom tempo e os alunos ficam vendo e ouvindo enquanto tentam repetir o que está à frente deles. É um processo de imitação inicial que vai perdurar durante todas as aulas seguintes. No entanto, outras informações são acrescentadas ao longo dos encontros em sala. Esse modelo é referência das práticas da oralidade presentes nas tradições dos mestres rabequeiros.

No processo que acompanhamos, percebemos que o professor apresentou o breu ao final da primeira aula, e explicou sua serventia para a crina do arco. Alegando a necessidade

32Este é o nome dado à nota da prima da Rabeca, não significando a altura real em Hertz (Htz) mi5, podendo

se aproximar de mi bemol, por exemplo.

de ser utilizado para melhorar o contato do arco com a Rabeca e assim produzir melhor sonoridade.

À medida que os alunos conseguem tocar as notas que o professor vai sugerindo, imediatamente, ele cuida de acrescentar um dedo ali daquela mão que está segurando a Rabeca. Faz isso na primeira posição e, sem mencionar nada, espera que os alunos percebam seu procedimento e tentem imitá-lo. E somente após um e outro aluno perguntarem ou já irem imitando é que ele resolve – enquanto continua tocando – explicar para o restante o que está acontecendo. E quando alguns não conseguem reproduzir, ele vai tocando mais perto do aluno. Também pede a outro aluno que já entendeu, que ajude aquele que ainda está no processo, fomentando a partilha de conhecimentos em meio a construção deles.

Veja-se que, nesse momento, o processo vai da parte prática para uma explicação verbal do acontecimento musical, que logo é fornecido concomitante à prática. Nesse ambiente de ensino, o aprendizado vai sendo organizado. Fato que só foi possível por causa das aulas que Osawa Gaudêncio teve com seu professor. Porém, esse processo em sala de aula nem sempre foi assim no Conexão. Quando, depois de ter aulas com Josenilson Moraes, Osawa Gaudêncio e seus colegas da época tinham que entrar em contato com o Mestre Cícero da Rabeca para aprenderem com ele, instaurava-se certo caos em suas cabeças. Eles, todos ao mesmo tempo, não conseguiam acompanhar o que o Mestre rabequeiro tocava e nem concatenavam seu modo de fazer música.

Aliverti (2011) tem um caso bem parecido de aulas de mestre de Rabeca em instituições e projetos, como é o caso de Seu Zito, tocador de Rabeca da Marujada no Pará. Nesse contexto, diz que:

[...] o tocador tocava e os aprendizes tentavam imitá-lo. Passado alguns dias após seu início, os alunos foram até o presidente da Marujada se queixar de que Seu Zito não estava conseguindo ‘ensinar’. O que acontecia é que cada vez que o rabequeiro repetia um trecho do Retumbão para os alunos tocarem, ele o fazia de forma diferente e os alunos não conseguiam acompanhar (ALIVERTI, 2011, p. 180, grifo do autor).

Um mestre tem seu jeito próprio de tocar e é peculiar, como visto no exemplo, que cada vez que se toca é uma nova forma de tocar. Também é de se perceber que tanto o Mestre Cícero da Rabeca quanto Seu Zé Brito não estavam no ato das brincadeiras de atuação e que se a ideia era de aprender com os mestres, que fosse feito segundo suas práticas para que os alunos pudessem ter uma compreensão de acordo com a realidade desses tocadores de folguedos. Acredita-se que uma dinâmica entre as aulas com os mestres rabequeiros e as aulas

em sala com professores, também rabequeiros, pudesse enriquecer o aprendizado, visto que os alunos estariam em constante contato com os dois sistemas.