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OS INSTINTOS ENQUANTO SIGNIFICANTES SEMIÓTICOS

1.2.4. A MENTE PARA ALÉM OU AQUÉM DO TEMPO E ESPAÇO: O INCONSCIENTE

1.2.4.2. OS INSTINTOS ENQUANTO SIGNIFICANTES SEMIÓTICOS

Apesar da sua interessante teoria, explicada por métodos nem sempre utilizados em psicanálise (ele refere que as premissas devem ser fundamentadas a partir da sua origem global e não da sua adaptação), Matte-Blanco não desenvolve a origem da significação, apenas a caracteriza como espácio-temporal. Encontramos este desenvolvimento em Bion e em Grotstein (1999). Pela sua caracterização da significação pela realização (presença/ausência) Bion refere-se mais ao processo mental da significação. Grotstein desenvolve uma teoria em que a significação deriva dos impulsos instintivos (ele fundamenta-se em Kant, 1787, Bion; 65, 70 e 92 e ainda nas duas obras de Matte-blanco), que se expõe em seguida.

Em 1999, ele caracteriza o inconsciente como sendo do “domínio do inefável (continente) que misteriosamente alberga conteúdos numenais” e que contém várias dimensões. Os impulsos instintivos são amais que um “caldeirão fervilhante” (Grotstein referindo-se a Freud, 1915 e 1923), são significantes semióticos, “mensageiros de um estado de vazio angustiante, de uma fome, de um Nada à espera de ser preenchido com alguma coisa”. Os instintos são “significantes semióticos da ausência, do vazio e da carência” que juntamente com os afectos “conferem sentido”. E o sentido é sempre uma significação pessoal, pois para significar é necessária a crença de que os próprios impulsos são responsáveis pelo mundo percebido, para que haja uma ligação (pelos afectos) com os eventos e assim eles podem ser significados. A função de ligação dos afectos inicia-se antes do nascimento, pela “presença de fundo da identificação primária”, que é na realidade a criação pelos pais de uma nova concepção – um novo bebé – que assim se torna o receptáculo de identificações projectivas inconscientes, concordantes e/ou complementares e/ou opostas do mundo

31 interno dos pais. O autor aconselha a substituir o termo objecto por presença, pois este último é um conceito numenal (uma presença oculta e fundadora) e não um objecto da percepção (fenomenal). A relação de vinculação entre mãe e bebé, dotada de sentido, vai permitir a aquisição posterior da função de significação (continente- conteúdo). Atribuir sentido é para Grotstein atribuir substância; um sentimento de “importância emocional e desejante” para um outro e a existência de um outro que se ofereceu previamente para atribuir sentido e definição ao próprio sujeito. Na ausência de um outro que signifique, o sujeito é relegado para o sem-sentido (a nível do conteúdo) e um espaço interior incapaz de significar - o Nada (a nível do continente). A existência de uma “identificação de fundo primária” pode levar tanto a uma concessão incondicional do sentimento de significação pessoal e individual, como à atribuição de um sentimento de amaldiçoamento. Mas se esta não existir o sujeito pode ser remetido para uma ausência de sentido, de Nada, de insignificância em relação ao self e seu lugar no mundo.

O autor também encontra no instinto de morte um potencial semiótico. Ela é considerada pelo autor “um veículo passivo de expressão” e portanto um significante. O instinto de morte é por ele considerado como um aviso para o “horizonte de acontecimentos” (a fronteira do buraco negro é em física o lugar para além do qual nada escapa à força da gravidade, nem ao espaço, nem ao tempo), que na mente é a aniquilação que se faz acompanhar por entropia (sem sentido) e pelo Nada. Os impulsos contém motivação e intencionalidade (determinismo associado à realização do desejo e ao principio do prazer) e também o contrário, a experiência da impotência ou não-intencionalidade, que é uma força centrípeta de atracção implosiva para o vácuo.

O Sem-sentido e o Nada remete para conteúdo e continente, respectivamente. O Sem-sentido é um conteúdo sem significado ou destituído de significado (de elementos beta primários) o Nada constituí a matriz vazia isto é, um continente criado para não significar, pode até mesmo gerar o Sem-sentido. Se o Sem-sentido se pode dividir em primário e secundário, sedo o primeiro um “vazio originário que aguarda o cumprimento e realização da experiência” e “emerge do infinito informe e profundo”; o segundo é subsequente a uma retirada, a um desinvestimento da experiência submergindo o sujeito num buraco negro; ou efeito da reversão da função alfa, isto é, quando é atacado o elo entre os elementos beta e sua componente

32 proto-representacional, anteriormente adquirida pela função alfa. Esta é a forma pela qual Grotstein considera o terror-sem-nome.

Também o Nada pode ser diferenciado em Nada primário ou Nada secundário, embora não seja tão fácil de compreender. O primeiro é a “matriz ou éter do Sem-sentido primário”, mas é também um vazio que tem de ser vivido de modo a permitir a “realização de experiências significativas”. O Nada primordial ocupa a posição de um continente primordial para um conteúdo (o Sem-sentido primário). O Nada secundário é quer a negação do ser, quer a negação do sentido (no Sem-sentido secundário), uma espécie de “ataques ao vínculo” (Grotstein, 1999 cita várias vezes Bion, 1959). Este Nada é considerado pelo autor como uma experiência em que a presença irruptiva e peremptória dos impulsos têm o poder paradoxal de potencializar a impotência, a implosão e a desintegração, de levar a que se passe da desorganização à anorganização, caos, entropia e indivisibilidade: o “poder aniquilador e dizimador” do Nada. O fenómeno do Buraco Negro ou morte psíquica, um fenómeno extremamente regressivo, é aquele que se segue à implosão centrípeta, aquele em que o sujeito experiencia o Nada e o Sem-sentido, a entropia (a entropia é a tendência que os elementos ganham cada vez mais graus de liberdade, isto é, se tornem homogéneos, absolutamente indiferenciados. Mas o Nada “é saudável no interior de um continente (desde que não esteja paradoxalmente encapsulado) porque o continente lhe proporciona um contexto significativo”. Sem continente, o Nada (Buraco Negro) aproxima-se do caos e da aleatoriedade e invoca a “in-substância”, a anti-matéria que se acumula no Buraco Negro para o preencher.