• Nenhum resultado encontrado

Eva Márcia Arantes Ostrosky Ribeiro 1 Tiago Mainieri 2

2. Esfera pública: reflexões iniciais

Para entender o conceito de “esfera pública”, apoiamo-nos em Haber-mas (1984), que faz um estudo da polis grega e do modo como o cidadão se comporta na vida pública, buscando assim uma diferenciação da esfera pública e privada.

A esfera pública, nesses moldes, se caracteriza, então, por ser um en-contro de cidadãos para discussão de assuntos de relevância pública. De acordo com o Habermas, “à esfera do mercado chamamos de esfera priva-da; à esfera da família, como cerne da esfera privada, chamamos de esfera íntima” (HABERMAS, 1984, p. 73).

119

Vol ta r a o S úm ár io

De acordo com Barros,3 “com o advento do Estado Absolutista e o de-senvolvimento do capitalismo, a esfera pública burguesa se transformou em um ambiente de resistência à autoridade política estatal.” (BARROS, 2008, p. 25).

Assim, um dos temas de reivindicação e crítica da burguesia foi a es-fera política. O fato é que, segundo a autora, desde o princípio, a ideia da esfera pública se baseava em racionalidade e argumentação.

Confirmando esse pensamento de racionalidade e argumentação da es-fera pública, percebe-se que eram discutidos assuntos de interesse público por meio de debates e críticas. As maiores críticas eram destinadas aos gover-nantes, já que os burgueses detinham o poder financeiro, mas não o político.

Habermas (1984) enfatiza que os burgueses são pessoas privadas, e, assim, o alvo de suas críticas e reivindicações se faz contra a dominação vigente; ou seja, a forma de atuação do governo na sociedade.

A esfera pública burguesa busca discutir e refletir sobre interesses co-letivos, porém as discussões eram restritas apenas aos cidadãos cultos e que detinham propriedade: os burgueses. Nesse sentido é que se encon-tram as maiores críticas da teoria habermasiana.

Para alguns autores, a esfera pública conceituada por Habermas tinha uma característica de exclusão. Para Thompson (2008) e Gomes (2004), Habermas pensa a esfera pública constituída por homens cultos, excluin-do, desse moexcluin-do, mulheres e pessoas não cultas, além de pessoas que não possuíam propriedades.

Habermas aborda a questão da mudança na estrutura da esfera pú-blica e sustenta que, com o advento dos meios de comunicação de massa, o público não mais se encontra em lugares públicos para discutir e deba-ter assuntos importantes e relevantes para dedeba-terminada comunidade, pois o acesso às informações pode ser feito em qualquer esfera de suas vidas, principalmente na esfera privada, em sua intimidade. As pessoas, com o desenvolvimento da imprensa, não precisam mais se reunir em grupos para ter acesso à informação.

3 Acessado em: https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/arqcom/article/view/671, no dia 02.10.2020.

120

Vol ta r a o S úm ár io

Nesse sentido, aliás, Habermas aponta a questão do público como

“consumidor de cultura”, ao invés de crítico e pensador. Pois, de acordo com o autor, o público não discute mais assuntos relevantes; apenas recebe as notícias transmitidas pelos meios de comunicação.

A principal crítica levantada à teoria habermasiana de refeudaliza-ção da esfera pública, de acordo com Thompson, diz respeito à receprefeudaliza-ção dos conteúdos apresentados pela mídia. Para o autor, Habermas “tende a presumir que os receptores dos produtos da mídia são consumidores rela-tivamente passivos que se deixam encantar pelo espetáculo e facilmente manipular pelas técnicas da mídia” (THOMPSON, 2008, p. 72).

Ainda para o autor,

O desenvolvimento dos meios de comunicação criou novas formas de interação, novos tipos de visibilidade e novas redes de difusão de informa-ção no mundo moderno, que alteraram o caráter simbólico da vida social tão profundamente que qualquer comparação entre política mediada de hoje e práticas teatrais das cortes feudais é, no mí-nimo, superficial. Mais do que comparar a arena das mediações deste século XX com eras passa-das, precisamos repensar o significado do “caráter público” hoje, num mundo permeado por novas formas de comunicação e de difusão de informa-ções, onde os indivíduos são capazes de interagir com outros e observar as pessoas e eventos sem sequer os encontrar no mesmo ambiente espaço--temporal. (THOMPSON, 2008, p. 72).

Neste sentido, não tem como pensar a esfera pública sem a visibilidade proporcionada pelo advento dos meios de comunicação de massa, inclusive a Internet. Para Gomes (2008), “é a visibilidade que ancora a discutibilidade na democracia.” (GOMES, 2008, p. 162). Ou seja, percebe-se que a visibilidade não enfraquece a esfera pública, mas amplia a esfera conversacional, poden-do trazer maiores possibilidades de engajamento por parte poden-do cidadão.

121

Vol ta r a o S úm ár io

Assim, Gomes afirma que, “a esfera pública é o âmbito da negociação argumentativa dos cidadãos, o domínio do seu debate racional-crítico.”

(GOMES, 2008, p. 40). De acordo com pensamento do autor, a esfera pú-blica é o espaço do uso público da razão, sendo uma esfera do raciocínio público. O que significa, para o autor “que a esfera pública é justamente o âmbito em que as pessoas privadas, reunidas num público, engajam-se num esforço argumentativo voltado para o recíproco esclarecimento acerca de objetos comuns de discussão”. (GOMES, 2008, p. 38).

Ainda para o autor, a esfera pública não é um lugar ou uma instituição, mas sim “uma prática social, obediente a certas regras de procedimento e conforme certas circunstâncias... a rigor, não há uma necessidade impe-riosa de ficarmos presos na metáfora da praça grega para a democracia de massa moderna. (GOMES, 2008, p. 141).

Portanto, a esfera pública não tem como exigência a comunicação face a face, como pensada inicialmente por Habermas (1984). Ela acontece em qualquer locus que promova um contexto de argumentação pública, debate e discurso argumentativo. Já Maia (2008) percebe a esfera pública como um lugar de argumentação, discussão de questões de interesse comum, sendo uma esfera conversacional deliberativa.

Com base nesses autores, torna-se importante trazer um quadro com elementos essenciais da esfera pública.4

Elementos Gerais Constitutivos de uma Esfera Pública:

Habermas (1984):

4 Quadro elaborado pelos autores.

122

Vol ta r a o S úm ár io

Assim, deve-se ressaltar a importância da esfera pública para as socie-dades complexas e modernas, e não tem como pensar essas sociesocie-dades sem a presença dos meios de comunicação de massa, e principalmente a Inter-net. Para Gomes “a internet pode fazer muito pela participação política”

(GOMES, 2008, p. 313)

Dessa forma, será refletido no próximo tópico, acerca da esfera pú-blica virtual ou hiperconectada, baseado em diferentes autores, e levan-do em consideração os elementos gerais constitutivos para a formação de uma esfera pública.

3. Esfera pública e internet - surgimento de uma